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Ao investigar caso de lavagem de dinheiro, a autoridade policial responsável não pode dispensar a autorização judicial e solicitar informações sobre movimentação financeira de suspeitos diretamente ao Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Essa foi a conclusão da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento a recurso em Habeas Corpus para reconhecer a ilicitude de dois relatórios de inteligência financeira obtidos por um delegado de Polícia contra empresários suspeitos de lavagem de dinheiro.

A posição representa um endurecimento em relação à interpretação do STJ sobre como os órgãos de investigação devem tratar esses dados financeiros, ressaltando a necessidade de que essas requisições sejam tuteladas pelo Poder Judiciário por meio de autorizações prévias.

Como decidiu o Supremo Tribunal Federal em 2019, o compartilhamento de dados sigilosos entre a Receita Federal e o MP é possível sempre que houver a hipótese de atuação criminosa. Esses indícios vêm nos relatórios do Coaf, que hoje se chama Unidade de Inteligência Financeira (UIF) e está subordinado administrativamente ao Banco Central.

A partir dessa posição, o STJ passou a delinear como esse compartilhamento pode ser feito.

Em suma, o MP não pode requisitar diretamente à Receita Federal dados sigilosos sem ordem judicial, a não ser que o suspeito tenha aberto mão desse sigilo. Definiu também que, mediante autorização judicial, o MP pode pedir esses dados à Receita mesmo quando a conclusão administrativa for a de que não há indícios de crime.

Nesses precedentes, o contato do órgão ministerial é sempre com a Receita Federal. Já no caso julgado pelo STJ, há uma diferença importante: a requisição foi feita pela autoridade policial diretamente ao Coaf.

As investigações partiram de indícios de que os empresários, donos de uma cervejaria no Pará, causaram prejuízo de R$ 600 milhões ao erário a partir de 50 crimes fiscais, com lavagem de dinheiro. Os dados do Coaf recebidos pela polícia deram indícios contundentes de materialidade delitiva e serviram para embasar pedido de busca e apreensão.

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“A pergunta que fica é: por que não pedir uma autorização judicial?”, afirmou o relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro
Emerson Leal/STJ

Por que não pedir?
Por maioria de votos, a 6ª Turma entendeu que mesmo esse tipo de requisição é ilegal. Relator, o ministro Antonio Saldanha Palheiro votou por reconhecer a ilicitude do compartilhamento. Foi acompanhado pelo ministro Sebastião Reis Júnior e pelo desembargador convocado Jesuíno Rissato.

Para Saldanha, autorizar o contato direto entre MP e Coaf implicaria e conferir aos órgãos de investigação, em quaisquer inquérito, o poder de obter informações sigilosas. “A pergunta que fica é: por que não pedir uma autorização judicial? É uma maneira de conseguir um filtro para eventuais exageros”, disse.

“Essas informações estão lá [no Coaf], não vão desaparecer. Tem que ter um mínimo de controle desse tipo de procedimento”, concordou o ministro Sebastião. “Nunca sabemos o porquê dessas solicitações e onde essas informações vão parar. A autoridade policial pode pedir e nem usar. Não há controle nenhum. Eu tenho profundo receio disso”, complementou.

Nenhuma ilegalidade
Abriu a divergência o ministro Rogerio Schietti, que ficou vencido ao lado da ministra Laurita Vaz. Para ele, a hipótese dos autos não se enquadra nos precedentes até hoje julgados pelo STJ ou pelo STF, uma vez que estes trataram de dados sigilosos e detalhados no Imposto de Renda.

Para ministro Schietti, não há irregularidade porque relatórios não identificam dados sigilosos, só apontam movimentação atípica
Nelson Jr./STF

Nos dados enviados à polícia, o Coaf aponta que existe movimentação financeira atípica, mas sem delinear a natureza dessa atipicidade. Caberia ao órgão investigador qualifica-la ou não como ilícito penal, por meio de diligências posteriores, como a busca e apreensão.

Essa é a realidade de como funciona esse compartilhamento de dados. O Coaf recebe dados das instituições financeiras e, quando identifica atipicidades, prepara um relatório meramente descritivo, sem revelar dados específicos e particulares protegidos pelo sigilo.

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Quando existem indícios de prática delitiva, o órgão repassa a notícia criminal para a Polícia Federal, para o Ministério Público Federal e/ou para os Ministérios Públicos Estaduais, a depender da esfera de atribuição. É então que esses órgãos podem solicitar informações sobre operações suspeitas ou atípicas.

“Logo e em conclusão, em relação ao conteúdo, entendo que não há similaridade entre o relatório produzido pelo Coaf e as informações obtidas em decorrência da quebra dos sigilos fiscal ou bancário”, apontou o ministro Schietti. Para ele, não há nenhuma ilegalidade na requisição do relatório do Coaf feita pela autoridade policial.

RHC 147.707

Fonte: STJ