Em decisão, unânime, os ministros reconheceram omissão do Congresso e estabeleceram o prazo de dois anos para criar a legislação
O Supremo Tribunal Federal (STF) deu um prazo de dois anos para o Congresso Nacional regulamentar o direito dos trabalhadores urbanos e rurais à participação na gestão das empresas. Em decisão, unânime, dada em plenário virtual na sexta-feira (14/2), os ministros reconheceram haver omissão do Congresso com relação ao tema.
Eles definiram o assunto, ao analisar a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 85), impetrada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Para a PGR, a falta de lei provoca redução arbitrária e injustificada do nível de proteção ao direito social dos trabalhadores, infringindo o princípio da proporcionalidade.De acordo com a Constituição (artigo 7°, inciso XI), são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais a participação nos lucros ou resultados, desvinculada da remuneração, e, “excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei”. Porém, mais de 35 anos depois da promulgação da Constituição, ainda não foi aprovada uma lei que regulamente esse direito.
Para o relator, ministro Gilmar Mendes, o Congresso extrapolou o tempo razoável para editar uma norma nesse sentido, diferentemente da participação nos lucros e resultados, que já foi regulamentada. Essa situação, para Mendes, inviabiliza a plena efetividade do artigo 7º, inciso XI, da Constituição e caracteriza omissão inconstitucional.
O relator reconheceu que o assunto é complexo e que há leis que já preveem a participação de empregados nos conselhos de administração das empresas públicas e sociedades de economia mista e a participação de representantes dos trabalhadores nos conselhos de sociedades anônimas. Contudo, a seu ver, ainda há um vasto universo de empresas para as quais não existem regras sobre o assunto. “Não há mais como remediar a solução desse problema, cabendo, dessa forma, ao legislador o devido equacionamento da matéria”, concluiu. Ele foi seguido pelos demais ministros.
Segundo o advogado Alberto Nemer, do Da Luz, Rizk & Nemer Advogados Associados, essa lei pode ser inócua, porque a Constituição fala de forma excepcional e seria difícil definir essa excepcionalidade. “ Como é que o trabalhador vai participar da gestão da empresa? Ele também eventualmente vai ser responsabilizado no eventual insucesso da empresa?”, diz. Para o advogado, o STF precisava gastar energia com outras coisas, até porque não é um pleito nem dos trabalhadores nem dos empresários. “Eu acho que não faz sentido ter essa lei, que pode ser uma lei que pode criar, inclusive, uma tensão inexistente entre empregador e empregado”, diz.
Já na opinião do advogado José Eymard Loguercio, do LBS Advogados, que assessora trabalhadores, são 35 anos de silêncio legislativo sobre um tema clássico, mas enormemente negligenciado no Brasil: a relação entre democracia e empresa. “A participação de trabalhadores ‘na gestão da empresa’ tem alguma regulação nas empresas públicas, nos Conselhos de Administração. É um embrião. Mas o chamado “modelo alemão”, de participação efetiva, aliado ao reconhecimento de representação sindical no local de trabalho, sempre foi um tabu. Teremos aí a chance de reacender esse debate em prol de empresas ancoradas na participação efetiva de trabalhadores na “gestão” do negócio.”
Fonte: Jota