O mero comparecimento da vítima de estelionato à delegacia não basta para dar à autoridade policial a manifestação expressa de seu interesse em representar para fins penais. Para isso, é preciso que esteja clara a vontade de dar início à persecução penal.
Com base nessa conclusão, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro contra uma decisão favorável a um homem acusado de estelionato contra três pessoas e uma rede de hotéis.
Das quatro vítimas, apenas a empresa levou o caso à delegacia e manifestou a vontade de que houvesse uma punição penal. Essa exigência passou a existir com a entrada em vigor do pacote “anticrime” (Lei 13.964/2019).
A norma transformou a ação referente ao crime do artigo 171 do Código Penal de pública incondicionada em pública condicionada à representação — com algumas exceções descritas nos incisos do parágrafo 5º.
Ou seja, a persecução penal depende da vontade da vítima. No caso dos autos, as três pessoas não fizeram a representação para fins penais contra o réu, motivo que levou o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) a extinguir a punibilidade do acusado em relação a essas três vítimas.
Ao STJ, o MP-RJ argumentou que as três vítimas compareceram à delegacia para relatar a ocorrência do crime, o que seria suficiente para permitir ao órgão iniciar a persecução penal. No entanto, o relator da matéria, ministro Sebastião Reis Júnior, discordou.
Ele destacou que as vítimas só foram à delegacia por força de mandado de intimação expedido pela autoridade policial. Nas declarações dadas por elas no local, não consta manifestação explícita do desejo de representar.
“O comparecimento perante a autoridade policial só pode ser tomado como representação quando é espontâneo, tal como ocorre nos casos em que a vítima registra ocorrência policial ou mesmo comparece espontaneamente ao Instituto Médico Legal”, explicou o relator.
Por outro lado, se o comparecimento não é espontâneo, cabe à autoridade policial providenciar a representação, ainda que circunstanciando esse fato no próprio termo de declaração. Essa medida não foi tomada ou aceita no caso dos autos.
“Logo, considerando que as circunstâncias fáticas não indicam a vontade inequívoca das vítimas em representar, reputo inviável tomar o mero comparecimento das vítimas como efetiva representação”, concluiu o ministro. A votação na 6ª Turma foi por unimidade.
Fonte: Consultor Jurídico