PSOL pede para STF suspender decisão que derrubou decreto do IOF 

O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) entrou nesta sexta-feira (27) com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a deliberação da Câmara dos Deputados e do Senado que derrubou o decreto editado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para aumentar alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

A ação foi distribuída eletronicamente para o ministro Gilmar Mendes, que será o relator do caso. Não há prazo para decisão.

Na ação, o partido, que faz parte da base do governo, reconhece que a Constituição autoriza o Congresso a sustar medidas do Executivo. Contudo, a legenda diz que a suspensão só pode ocorrer nos casos em que houver exorbitância do poder regulamentar do presidente da República.

Para o PSOL, o decreto apenas alterou as alíquotas do IOF, “não havendo qualquer desrespeito ao limite de atuação normativa”.

“O Congresso Nacional, ao sustar o Decreto nº 12.499/2025, por meio do DL 176/2025, sem a devida demonstração de exorbitância de poder normativo, violou os próprios limites fixados no art. 49, V, da Constituição. O STF, inclusive, já declarou inconstitucional decreto legislativo editado nessas mesmas condições, como se verifica no julgamento da ADI 5744”, argumenta o partido.

Ontem (26), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o governo avalia se também vai recorrer ao STF contra a derrubada do decreto.

Decreto e MP

O decreto fazia parte de medidas elaboradas pelo Ministério da Fazenda para reforçar as receitas do governo e atender às metas do arcabouço fiscal. No fim de maio, o presidente Lula editou um decreto que aumentava o IOF para operações de crédito, de seguros e de câmbio. Diante da pressão do Congresso, o governo editou, no início de junho uma medida provisória com aumento de tributos para bets (empresas de apostas) e para investimentos isentos.

A medida provisória também prevê o corte de R$ 4,28 bilhões em gastos obrigatórios neste ano. Em troca, o governo desidratou o decreto do IOF, versão que foi derrubada pelo Congresso nesta semana.

*Colaborou Wellton Máximo

Fonte; EBC

Equilíbrio orçamentário e controle do gasto tributário: criação da Secgat

Uma questão que deveria ser evidente para todos os que acompanham o ambiente político brasileiro é a centralidade do Direito Financeiro e do Direito Tributário. É raro uma pauta política relevante que não trate destes dois temas ou que não seja de alguma forma condicionada por questões financeiras e tributárias. Atualmente, parece que temos uma grande questão, o equilíbrio fiscal, sendo que tudo o mais, do Perse ao IOF, são subtemas do tema maior que é o equilíbrio das contas públicas.

Em uma coluna anterior (aqui), dedicada à reforma da tributação da renda, chamei a atenção para a total falta de coerência dos diversos atores que clamam pelo equilíbrio fiscal no Brasil. Parece-me relevante trazer para este texto os seguintes trechos do que afirmei naquela oportunidade:

Temos ouvido muito a fala de que “o Congresso Nacional assumiu o seu papel e a sua relevância em relação ao orçamento público”, como referência ao fato de que a última década testemunhou um crescimento das atribuições de deputados e senadores em relação a decisões de alocação de recursos. Contudo, só gasto não é o orçamento. O orçamento é composto de despesas, mas também de receitas.
O que temos testemunhado é que o Congresso (i) não tem nenhuma ação clara de redução de sua fatia do orçamento, (ii) luta contra tornar os seus gastos mais transparentes – a transparência é uma imposição da LRF e do § 3º do artigo 145 da Constituição Federal, e (iii) não tem interesse em medidas de equilíbrio orçamentário que o coloque em rota de colisão com a elite do serviço público – que eles integram – ou com a elite econômica – que muitos e muitas deputados e senadores também integram. Esta é a quintessência da austeridade seletiva. É a austeridade desde que não seja feita por mim e que eu não sofra seus efeitos.
Não é uma realidade muito diferente da que encontramos no “mercado” e no mundo dos “analistas”. Como apontamos, o “mercado” quer equilíbrio fiscal, desde que não tenha que contribuir com ele. Seria muito mais coerente se, além de exigir desindexação de benefícios dos X% mais pobres da população, o “mercado” trouxesse para a mesa também estudos para a redução do nosso monumental gasto tributário, ou que o jornalista, fazendo aquela crítica indignada sobre a “crise fiscal”, lembrasse que muitas vezes recebe seus vencimentos via pessoa jurídica, pagando muito menos imposto do que um assalariado com remuneração equivalente.

Tributação e finanças públicas são, em essência, baseadas em decisões alocativas relacionadas a quem vai receber prestações públicas e quem vai financiá-las. O Sistema Tributário Nacional foi, em larga medida, apropriado por quem deveria ser responsável pelo financiamento dos gastos públicos, e qualquer discussão sobre equilíbrio orçamentário deveria começar por uma revisão profunda dos gastos tributários que foram apropriados pelo topo da pirâmide de renda da sociedade brasileira.

Isonomia, generalidade da tributação e privilégios odiosos

Sabe-se que o princípio da isonomia é uma das pedras angulares do Sistema Tributário Nacional e estabelece que todos os que manifestem a mesma capacidade contributiva paguem o mesmo tributo. Contudo, como bem observava Ricardo Lobo Torres, a isonomia tem, em si, um paradoxo, em suas palavras, “o aspecto mais intrincado da igualdade se relaciona com a sua polaridade. Enquanto nos outros valores (justiça, segurança, liberdade) a polaridade significa o momento da sua negação (injustiça, insegurança, falta de liberdade), na igualdade o seu oposto não a nega, senão que muitas vezes a afirma. Aí está o paradoxo da igualdade”. [1]

Dessa forma, a questão mais complexa relacionada ao princípio da isonomia não está em afirmar que todos que manifestem igual capacidade contributiva devem pagar o mesmo tributo, mas em identificar as situações nas quais a desigualdade realiza os valores, princípios e finalidades constitucionais em maior medida do que a igualdade da tributação.

Mesmo que a igualdade conviva com a diferença, não é qualquer tratamento diferenciado que será compatível com a isonomia. Aquele somente se justificará por uma finalidade constitucional que a realize. Do contrário, teremos o que Ricardo Lobo Torres, de forma eloquente, chamava de privilégio odioso. Segundo nosso saudoso mestre “o privilégio odioso consiste na permissão, destituída de razoabilidade, para que alguém deixe de pagar os tributos que incidem genericamente sobre todos os contribuintes ou receba, com alguns poucos, benefícios inextensíveis aos demais”. [2]

Tamanho dos gastos tributários

Segundo o Relatório Nacional sobre Gastos Tributários elaborado por Paolo de Renzio, Manoel Pires, Natalia Rodrigues e Giosvaldo Teixeira Junior, disponibilizado em fevereiro de 2025 (aqui), “os gastos tributários no Brasil corresponderam a 4.78% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023, considerando somente o nível federal. Se os gastos tributários de nível estadual são incluídos, a proporção chega a 7.2% do PIB em 2023”. O gasto tributário da União Federal previsto para 2025 atingia exorbitantes R$ 544 bilhões (aqui).

É evidente que uma redução significativa do gasto tributário da União contribuiria significativamente para o tão falado equilíbrio fiscal. Nada obstante, mais problemático do que o tamanho do gasto tributário é a sua opacidade, a falta de políticas públicas claras e, principalmente, como apontamos, a sua conversão em privilégios para os mais ricos, à custa da pressão por corte de gastos que beneficiam os mais pobres.

Sugestões sobre o controle dos gastos tributários

Há diversas sugestões sobre como equacionar as distorções causadas pelos gastos tributários, desde a revisão dos regimes simplificados do IRPJ/CSLL, até a limitação de deduções com saúde (ver o Relatório Nacional sobre Gastos Tributários, aqui). Alternativas como estas certamente fazem sentido.

O Simples Nacional deveria ser apenas um regime de simplificação sem ser, necessariamente, corresponder a uma relevante desoneração fiscal. Nesse sentido, uma revisão da tabela do Simples seria certamente adequada. De outra parte, a previsão de limites às deduções de saúde, assim como as que vigoram para os gastos com educação, é outra medida que deve ser debatida abertamente com a sociedade.

Nada obstante, neste texto não queremos tratar deste aspecto “qualitativo” dos gastos tributários. Temos uma questão mais relevante, de natureza institucional, decorrente do fato de não haver uma efetiva gestão do gasto tributário da União Federal, utilizada, aqui, como paradigma.

Recentemente, na reforma tributária, tivemos uma experiência bem-sucedida com a criação da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda. A Sert exerceu um papel fundamental de desenvolvimento técnico, interlocução pública, transparência e debate congressual de questões relacionadas à reforma tributária, tornando-se essencial para o avanço e aprovação da Emenda Constitucional nº 132/2023 e da legislação infraconstitucional subsequente.

Cremos que precisamos de uma estrutura similar com foco no gasto tributário, com a criação da Secretaria Especial para Controle do Gasto Tributário (Secgat).

Necessitamos, urgentemente, de transparência sobre o gasto tributário da União, muito além do que encontramos no Demonstrativo dos Gastos Tributários que acompanha o Projeto de Lei Orçamentária Anual. Ter transparência [3] não é só revelar quanto é o gasto tributário e onde está alocado. Exige que a sociedade entenda a justificativa da renúncia fiscal para que possa controlá-la e que seja possível verificar a existência de fundamento constitucional que a legitime. [4]

Por exemplo, a renúncia fiscal decorrente do Simples está escorada em justificativas que vão da suposta relevância das pequenas empresas na geração de emprego até a sua capacidade de inovação. Contudo, estudos como o publicado por Leonel Cesarino Pessôa, Alexandre Evaristo Pinto e Daniel Zugman (aqui) negam a existência de base empírica para tais premissas.

Dessa forma, este é um exemplo claro de um gasto tributário que demanda uma análise e discussão pública ampla e transparente, para que seja possível uma decisão política sobre a sua manutenção, readequação ou mesmo eliminação.

Um órgão federal inteiramente dedicado à questão do gasto tributário e da sua gestão, que gere informação técnica transparente de qualidade, certamente imporá ao Congresso a obrigação de se posicionar a favor da manutenção de privilégios — que no modelo atual certamente existem — ou da sociedade. Afinal, como destacaram Paolo de Renzio, Manoel Pires, Natalia Rodrigues e Giosvaldo Teixeira Junior, no citado Relatório Nacional sobre Gastos Tributários, “é possível afirmar que o Congresso Nacional é o principal ator na criação de gastos tributários, pois todos os novos incentivos precisam passar pelo Poder Legislativo”. (destaque nosso)

Tema recorrente nos debates contemporâneos sobre finanças públicas é o papel do Poder Legislativo na execução orçamentária. Contudo, o Legislativo buscou protagonismo no gasto público sem ter a mesma responsabilidade jurídica atribuída ao chefe do Poder Executivo.

Nesse contexto, uma medida salutar para que o Poder Legislativo passe a pensar a gestão fiscal de uma forma responsável é a criação de hipóteses legais de crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária, que possam ser cometidos por deputados(as) federais e senadores(as), notadamente os (as) presidentes dessas Casas Legislativas.

Conclusão

O desvio de finalidade dos gastos tributários é uma das maiores patologias do Sistema Tributário Nacional. Temos um modelo tributário que cria privilégios disfarçados de iniciativas de política pública e redistribui o custo do orçamento para quem, não raro, sequer deveria contribuir, tudo isso com base em argumentos retóricos na maioria das vezes sem qualquer base empírica.

Este cenário tem que mudar, e a mudança, segundo vemos, passa pela institucionalização do controle do gasto tributário. Nesse sentido, a criação da Secretaria Especial para Controle do Gasto Tributário, ou qualquer órgão equivalente, poderá ser um grande passo adiante de um Sistema Tributário mais justo, alinhado ao que impõe o § 3º do artigo 145 da Constituição.

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[1] TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: Valores e Princípios Constitucionais Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. v. II. p. 158.

[2] TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: Valores e Princípios Constitucionais Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. v. II. p. 319.

[3] Sobre o tema da transparência, ver nosso texto publicado na semana passada em coautoria com Carmen Silvia Lima de Arruda (aqui).

[4] Ver: ROCHA, Sergio André. Fundamentos do Direito Tributário Brasileiro. 3 ed. Belo Horizonte: Casa do Direito, 2024. p. 131-139.

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Negativa de acesso a livro da portaria de presídio não viola o direito de obter informações públicas

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a negativa de acesso ao livro de portaria de uma unidade prisional – documento classificado como sigiloso – não viola o direito líquido e certo de obter informações públicas.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso em mandado de segurança interposto por um cidadão que pretendia acessar e copiar trechos do livro de portaria da Unidade Prisional de Mariana (MG) sem ter de justificar seu interesse. O pedido havia sido negado pelas autoridades do sistema prisional, que classificaram o livro como sigiloso por conter informações relativas a terceiros, bem como dados sensíveis cuja divulgação poderia comprometer a segurança da unidade. A pretensão foi negada também pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Ao STJ, o cidadão argumentou que o indeferimento violou seu direito líquido e certo de obter informações públicas, o qual seria garantido pela Lei de Acesso à Informação (LAI). Ele alegou que apenas pretendia ter acesso aos registros de entrada e saída da unidade prisional, e não a dados sensíveis ou sigilosos.

Equilíbrio entre a transparência dos atos e a proteção do segredo informacional

O relator do caso na Primeira Turma, ministro Paulo Sérgio Domingues, explicou que a regra geral imposta ao poder público é a publicidade de seus atos, devendo o sigilo ser tratado como exceção (artigo 3º, I, da LAI) e admitido somente nos casos expressamente autorizados por lei.

“Diante da presunção de publicidade dos atos administrativos, não se admite, como regra, a negativa de acesso a informações, salvo nas hipóteses excepcionais legalmente previstas, especialmente quando relacionadas à proteção da segurança ou à privacidade e intimidade das pessoas”, disse.

O ministro ressaltou que o artigo 6º da LAI estabelece que os órgãos e as entidades da administração pública têm o dever de proteger informações classificadas como sigilosas e as de natureza pessoal, devendo assegurar não apenas a restrição de acesso, mas também a preservação da disponibilidade, da autenticidade e da integridade desses dados, para resguardar o interesse público envolvido.

Segundo o relator, a própria LAI estabelece três categorias distintas de restrição ao acesso informacional: dados cujo sigilo decorre de imposição legal, conforme disposto no artigo 22; informações de natureza pessoal, nos termos do artigo 31; e informações classificadas como sigilosas segundo o procedimento formal previsto no artigo 23.

A administração pública – complementou o ministro –, ao classificar informações como sigilosas, deve observar estritamente os critérios legais, assegurando o equilíbrio entre a necessária transparência dos atos administrativos e a proteção legítima do segredo informacional.

Livro de portaria contém informações sigilosas e sensíveis do presídio

Paulo Sérgio Domingues esclareceu que o livro de portaria de unidade prisional é um documento em que são registradas informações sobre pessoas, rotinas e ocorrências no setor, o qual, por sua vez, “é notoriamente um local sensível e estratégico para a segurança de cada unidade prisional e da população em geral”.

O relator concluiu que não houve ilegalidade na negativa de acesso a páginas do livro de portaria, uma vez que ela se fundamentou na presença de dados sigilosos e sensíveis, bem como no fato de a divulgação dessas informações ser potencialmente prejudicial às atividades e à estrutura de segurança da unidade prisional. Além disso – finalizou o ministro –, a classificação do livro como documento de acesso restrito foi feita de acordo com os procedimentos legais.

Leia o acórdão no RMS 67.965.

Fonte: STJ

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Comissão aprova criação de carteira nacional de identificação da pessoa com deficiência

A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou um projeto que cria a Carteira Nacional de Identificação da Pessoa com Deficiência (e-CNIPCD). O objetivo é identificar as pessoas com deficiência e garantir a elas atenção integral e prioridade no acesso a serviços públicos e privados em todo o país.

O texto aprovado é um substitutivo, ou seja, uma nova versão elaborada pelo relator, deputado Weliton Prado (Solidariedade-MG), para o Projeto de Lei 3373/24, do deputado Dr. Fernando Máximo (União-RO).

Originalmente, o projeto previa a criação de carteiras de identidade digitais apenas para pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) e com síndrome de Down. No entanto, Weliton Prado lembrou que a Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência tem a orientação de não limitar as ações legislativas a grupos específicos.

“A legislação brasileira adota o modelo social de deficiência como interação entre impedimentos de longo prazo e barreiras, sem hierarquizar ou segmentar as deficiências por condições específicas”, explicou o relator.

Prado acrescentou que a lei consagra o princípio da não discriminação, assegurando a todas as pessoas com deficiência acesso igualitário a direitos, serviços e oportunidades, sem levar em conta a natureza de seu impedimento.

Emissão do documento
De acordo com o substitutivo, a carteira de identificação será expedida gratuitamente, tanto em formato físico quanto digital. Para solicitá-la, a pessoa interessada ou seu representante legal deverá apresentar um requerimento junto com a documentação necessária.

As informações contidas no documento devem seguir observar as normas previstas na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

O Poder Executivo regulamentará o modelo, a expedição, a validade e a gestão da e-CNIPCD.

Próximos passos
A proposta tramita em caráter conclusivo e ainda será analisada pelas comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara dos Deputados

Liberdade de expressão, antissemitismo e humor

Afinal, as músicas do MC Poze do Rodo e do gênero NSBM (Nazi Black Metal) estão no contexto legítimo da garantia constitucional da liberdade de expressão?

A última coluna [1] terminou com essa pergunta, que agora retomo. Passeando também pela condenação do humorista Léo Lins.

A livre manifestação do pensamento e da atividade artística são garantias constitucionais (artigo 5°, IV e IX). Não são garantias absolutas. Creio que, até aqui, estamos de acordo, não? Pois bem, parece, então, que o problema reside no limite dessas garantias.

Vamos falar de preconceito e discriminação. Existem diversos modos de aproximação teórica a esses valores. Eu irei usar o conceito de poder simbólico proposto por Pierre Bourdieu [2]. Ele entende a ideologia como um instrumento de dominação por meio de produções simbólicas hegemônicas assimétricas. A característica necessária do exercício de todo poder simbólico é a sua invisibilidade, ou seja, só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem [3].

Este juízo de valor acerca da clandestinidade do poder simbólico, dito por Bourdieu, permite denominar a relação de sujeição oriunda de seu exercício como violência simbólica, ou seja, a imposição da apreensão de uma ordem estabelecida como natural (ortodoxia) por meio da imposição mascarada de sistemas de classificação e de estruturas mentais objetivamente ajustadas às estruturas sociais.

Bourdieu considera o sistema jurídico como um sistema simbólico de regulação e transformação social: a coação formal oriunda do direito possui uma eficácia simbólica capaz de levar ao reconhecimento social da vigência de algumas normas [4]. Nesse sentido, o direito, instrumento de normalização por excelência, enquanto discurso intrinsecamente poderoso e provido dos meios físicos com que se faz respeitar, acha-se em condições de passar, ‘com o tempo’, do estado de ortodoxia, crença correta explicitamente enunciada como dever-ser, ao estado de doxa, adesão imediata ao que é evidente, ao normal, como realização da norma que se anula enquanto tal na sua realização [5].

Isso é bem amplo. Interessa-me apenas a tomada de posição no sentido de que o direito (norma e/ou pena?) comunica. É um sistema simbólico de reafirmação de valores culturalmente consagrados. Na minha visão pessoal, uma comunicação voltada ao passado [6] que assume uma função de desmascarar a invisibilidade do poder simbólico assimétrico que pode ser desempenhado por uma conduta criminosa.

A maior parte dos crimes possui uma representação de desvalor bem visível (um roubo ou um estupro, por exemplo). Mas os valores que o direito penal seleciona como bens jurídicos carentes de proteção possuem uma dinâmica cultural peculiar. Variam com o tempo. Amoldam-se às necessidades de uma dada sociedade. Por isso é que o direito penal possui legitimidade, sim, para criar bens jurídicos que não necessariamente contam com um desvalor ético-social de amplo reconhecimento. É que sustentava Max Ernst Mayer em 1903 [7].

Preconceito e discriminação talvez sejam dois ótimos exemplos dessa invisibilidade que vem sendo cultural e gradualmente descortinada. Minorias ou grupos carentes de proteção institucional – sob as rubricas de raça, cor, etnia, nacionalidade, procedência nacional, deficiências físicas ou psíquicas, orientação sexual e idade – vêm, há muitas décadas, recebendo atenção criminal especializada. Apenas para citar alguns exemplos: Leis n° 7.716/89, 10.741/03, 13.146/15, 14.532/23 etc. Isso sem falar-se na (questionável quanto ao meio; legítima quanto ao fim) decisão do STF na ADO n° 26 e MI n° 4.733, reconhecendo que a homofobia e a transfobia também são alcançadas pela Lei n° 7.716/89.

Há, portanto, um claro movimento legislativo e judicial transmitindo o recado à sociedade de que o preconceito e a discriminação não serão mais tolerados. As coisas mudaram. A violência simbólica que decorre do preconceito, outrora invisível, é posta sob um holofote. Uma sociedade que pretenda ser democrática tem de se adaptar a isso, queira ou não queira. Não há mais espaço para o “mas” que antecede a fala de um racista qualquer. Portanto, um dos limites da livre manifestação do pensamento e da produção artística reside naquela área onde se inicia a tutela contra a discriminação.

Antissemitismo

Antissemitismo é o preconceito contra povos de línguas semíticas, de raiz afro-asiáticas, como o hebraico, o árabe, o maltês etc. São línguas faladas por qualquer pessoa de origem semita (árabes, etíopes, assírios, judeus etc.).

A narrativa do século 20, especialmente fomentada pela Segunda Guerra Mundial, apropriou-se da expressão para representar apenas o preconceito contra o povo que segue a religião judaica, excluindo do seu alcance outros povos. E pior: transformou a religião judaica automaticamente na nacionalidade israelense.

Seja a rubrica que for, certo é que, no Brasil e em boa parte do mundo, qualquer etnia, nacionalidade ou religião estão juridicamente protegidas contra a discriminação. Não há espaço para distinção entre preconceito contra judeus ou árabes, inclusive palestinos.

Siegfried Ellwanger escreveu um livro (Holocausto: Judeu ou Alemão?) em que sustentava que as atrocidades contra judeus eram legítimas. Os alemães é que estariam se defendendo de uma violência pretérita (impossível não pensar numa analogia, né?!). Ele tentou sustentar que isso seria uma opinião. Não é. É uma fala preconceituosa porque nega um evento histórico. Há quem diga que não existem fatos; apenas versões. Sim, mas isso tem um limite. E a humanidade conheceu esse limite quando o exército russo libertou Auschwitz-Birkenau. Negar isso publicamente é incitar o preconceito. Por isso é que o autor do livro foi corretamente condenado pela prática do crime definido no artigo 20 da Lei n° 7.716/89 (v. HC n° 82.424-STF).

É o mesmo que ocorre quando o Nokturnal Mortum, grupo de NSBM, canta Heiled be the Heroes:

“White race would be the highest goal

The warriors of Galychina

Is an? Avaging? Blade in strong Slavonic hands

You were stoped one step before the victory

Now it’s our turn to realize your dreams

Betrayal stood upon your way

Red butchers destroyed our land

And now Jewisk pest dominates”

Não está no alcance da liberdade de expressão cantarolar uma música enaltecendo a raça branca e a peste judaica. São versos que incrementam assimetrias. O conceito kantiano de liberdade interna, descrito no Metafísica dos Costumes, até permite aceitar que alguém possa pensar isso. Mas não é livre para falar o que pensa. Aqui inicia algo chamado liberdade externa, uma manifestação concreta de poder simbólico outrora assimétrico invisível que, atualmente, não tem mais espaço democrático. Daí a legitimidade da operação policial ocorrida em Almirante Tamandaré (PR), em 2023, contra quem disseminava material (inclusive discos) de conteúdo nazista [8].

Humor

Eu comecei a lecionar em 1997. Minhas aulas eram bastante divertidas, segundo lembram alguns alunos da época. Aos poucos, foram ficando sérias. Essa mudança de postura é o resultado de um processo inacabado de constante revisão do humor como instrumento de adesão. Algumas brincadeiras, algumas piadas que antigamente seriam tratadas como “normais” perderam gradualmente espaço à medida em que o riso foi percebido como uma forma de violência simbólica. Há quem use os dedinhos em forma de aspas para reclamar que isso é politicamente correto. Não, meu caro. Só quem está sempre alerta para se desgarrar dos grilhões do preconceito que permeou nossa educação é que se dá conta de como é difícil tomar cuidado-com-o-outro. Esse processo muitas vezes falha inclusive para quem está comprometido com alteridade. Daí a necessidade de estarmos sempre atentos à comunicação de nossas ações e falas.

Numa cena antiga dos Trapalhões, Dedé Santana e Zacarias consertavam a suspensão de um carro quando gritam procurando o macaco. Mussum saiu de baixo do veículo dizendo que ele estaria ali, mas “macaco é a tua mãe” [9].

Quem tem cabelo branco deve lembrar do clássico Banzé no Oeste (1974), de Mel Brooks. Uma sátira do velho oeste que se passa numa cidade atordoada porque um negro assumiu como xerife. “Você não vê que ele é crioulo?”, pergunta um dos personagens.

Temos aí dois bons exemplos de um humor datado. Obras artísticas épicas que usavam o humor como adesão a um processo de violência simbólica (por isso, assimétrica) pelo preconceito então invisível. A diferença entre o riso de antigamente e o de hoje é que agora ele tem de trazer consigo algum constrangimento. Estamos passando por um processo cultural de faxina escravagista, que é sofrido, gradual e que merece constante atenção.

Léo Lins foi condenado a mais de oito anos [10] por dizer em apresentações de stand up frases como: nordestinos tem “aparência primitiva” e parecem “caranguejo”“velho gordo, gay e negro!”; “Sou gordo, adoro comer e não gosto de fazer exercício. Como vou emagrecer? Pegando AIDS! (…) Essa piada pode parecer um pouco preconceituosa. Porque é“O negro não consegue arrumar emprego!. Mas na época da escravidão já nascia empregado e também achava ruim! Aí difícil ajudar!. Aliás, se o Dia da Consciência Negra é feriado pelos negros, Quarta-Feira de Cinzas devia ser judeu!” Uma metralhadora giratória que vomita preconceito por todos os lados. O público ri? Sim. Muitos vão lá para ouvir isso. Porque desejam que Léo Lins fale exatamente aquilo que eles pensam e, às vezes, até repetem. Pode ser engraçado? Para quem se dá conta dessa cultura preconceituosa que assombra nosso crescimento, a resposta é não. Mesmo que nosso constrangimento muitas vezes não seja automático. E assim o é porque não estamos prontos.

A imensa maioria dos humoristas criticou a condenação. Feriria a liberdade de expressão, dizem.

Hélio de la Peña fez um vídeo dizendo ser um absurdo prender Leo Lins enquanto os fraudadores do INSS estão livres. O que uma coisa tem a ver com outra?

Rodrigo Marques publicou no Instagram um corte do seu show em que diz que a fala de Leo Lins é arte. Quem não quiser ouvir, não vá ao show. Ele, o comediante, estaria livre para fazer qualquer tipo de humor, mas o público, não. O público não pode dizer qualquer coisa.

Só quem deseja um alvará de soltura em branco pode pensar assim. Qual a diferença entre uma piada contada num show de stand up e outra numa sala de aula ou num grupo de WhatsApp? Só no primeiro caso a arte é livre? Então arte pressupõe remuneração? Bem, se é assim, então eu posso vender uma revista em quadrinhos com imagens de abuso sexual contra crianças, não? Ou então vender fotos de estupro. Seria o mesmo que dizer: não gostou do que Siegfried Ellwanger escreveu? Não compre o livro.

Ora, esse crachá de liberdade irrestrita que a galera do stand up pretende obter tem o objetivo de não os obrigar a (re)pensar o seu trabalho dentro dos limites de nossa cultura atual. Especialmente quando avançam naquelas áreas sensíveis em que minorias ou grupos de pessoas seguem violentadas pelo preconceito. Essas pessoas muitas vezes riem sem se dar conta de que estão sendo agredidas ou de que estão agredindo. Sim, é isso que quer dizer poder simbólico, de que nos fala Bordieu.

É certo que o humor muitas vezes flerta com o preconceito. Mas é possível que esse flerte esteja no limite do aceitável. Uma dica: se gerar dúvida sobre a repercussão da fala, talvez a corda esteja esticada demais. Conheço muitos humoristas que fazem um humor inteligente sem precisar violentar parte de seu público. Vejam as piadas de Marcito Castro no Instagram: ele brinca com pobres, velhos, gaúchos etc. sem ser preconceituoso.

Também é possível que o humor passeie por temas sensíveis, porém exercendo uma crítica legítima. Uma piada debochando de padres pedófilos ou de nazistas certamente não causará indignação, pois estará instrumentalizando o humor para redução de assimetrias. No fundo, o humor estará transmitindo uma mensagem contra o preconceito.

Eu sei que esses limites estão num terreno pantanoso a ser explorado. Adensar corretamente a legitimidade de manifestações públicas (artísticas ou não) é um processo complexo e ainda a ser explorado. Mas se alguém deseja comunicar-se nessa área sensível, é melhor tomar cuidado redobrado para que sua fala não vire discriminação. Tatá Werneck contratou uma consultoria especializada “para não errar mais” [11]. Uma solução simples e viável para esse pessoal que fatura bem com seus shows. A questão é que isso depende de alguém querer não escorregar. Quem deseja seguir sendo preconceituoso relutará em tomar uma precaução. Por tudo isso, é sempre bom lembrar que os crimes de preconceito, assim como qualquer outro delito, muitas vezes são praticados dolosamente, ainda que possam ser um inopino tropeço de seu autor.


[1] https://www.conjur.com.br/2025-jun-10/prisao-de-mc-poze-do-rodo-e-as-novas-presepadas-do-poder-punitivo/

[2] BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 5 ed. Trad. por Fernando Tomaz. Rio : Bertrand Brasil, 2002.

[3] BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico, cit., pp. 7-8.

[4] BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico, cit., pp. 239-240.

[5] BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico, cit., p. 249.

[6] Tratei disso em: Direito Penal Econômico – Parte Geral. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, cap. 2.3.1 e 5.2.

[7] Também tratei desse assunto em: Direito Penal Econômico, cit., cap. 2.3.3.

[8] https://www.gov.br/pf/pt-br/assuntos/noticias/2024/12/pf-combate-disseminacao-de-ideologias-nazistas

[9] https://www.youtube.com/watch?v=6IbMszBC6r8

[10] V. https://www.conjur.com.br/2025-jun-03/humorista-leo-lins-e-condenado-a-prisao-por-discriminar-minorias-em-show-de-stand-up/

[11] https://f5.folha.uol.com.br/celebridades/2025/06/internautas-resgatam-declaracao-e-atitude-de-tata-werneck-contra-piadas-preconceituosas.shtml

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Comissão aprova responsabilidade civil por danos a pessoas idosas ou com deficiência

A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que determina a responsabilidade civil de quem causar qualquer tipo de dano – por ação ou omissão – a pessoas com deficiência ou idosas. A medida prevê ressarcimento integral dos prejuízos, incluindo despesas com atendimento à saúde das vítimas.

A responsabilização abrange danos físicos, sexuais, psicológicos e de qualquer outra natureza. Essa previsão será incorporada tanto ao Estatuto da Pessoa com Deficiência quanto ao Estatuto da Pessoa Idosa.

O texto aprovado foi o substitutivo da relatora, deputada Silvia Cristina (PP-RO), ao Projeto de Lei 1385/22 e seu apensado, PL 1386/22, ambos de autoria do deputado Luciano Ducci (PSB-PR). Ela afirmou que o texto representa um “significativo reforço” nos direitos da pessoa com deficiência e da pessoa idosa.

“Ainda que o ordenamento jurídico já contemple a responsabilidade civil por atos ilícitos, a inclusão de dispositivo específico nos dois estatutos reforça o compromisso do Estado com a proteção desses grupos vulneráveis”, disse Silvia Cristina.

Próximos passos
O projeto será analisado agora, de forma conclusiva, pelas comissões de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa; e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ).

Fonte: Câmara dos Deputados 

Conciliação no STF mantém marco temporal para terras indígenas

O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou nesta segunda-feira (23) a última reunião da comissão de conciliação convocada pelo ministro Gilmar Mendes sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Após nove meses de trabalho, foi elaborada uma minuta com sugestões de um anteprojeto que será enviado ao Congresso Nacional para alteração na Lei 14.701 de 2023, norma que, apesar de tratar direitos dos povos indígenas, inseriu o marco temporal para as demarcações.

Pela tese do marco temporal, os indígenas somente têm direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época.

A questão do marco temporal não foi alterada porque não houve consenso.

Além disso, no ano passado, Gilmar Mendes negou uma liminar contra a suspensão da regra e enviou o caso para conciliação. 

Também não há consenso sobre o procedimento de indenização dos proprietários de terras após o reconhecimento de que eles ocupam uma terra indígena.

As regras estão sendo elaboradas pela Advocacia-Geral da União (AGU) e deverão ser protocoladas no STF até quinta-feira (26).

Minuta 

A minuta apresenta pontos de consenso entre os representantes do Senado, da Câmara dos Deputados, do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e de estados e municípios.

A aprovação não contou com a participação ampla dos povos indígenas.

Em agosto do ano passado, representantes da Articulação dos Povos Indígenas (Apib) se retiraram da conciliação. A entidade entendeu que os direitos dos indígenas são inegociáveis e não há paridade no debate.

O documento trata de pontos consensuais que, em alguns casos, já constam na Lei 14.701/2323 e foram explicitados, como permissão para turismo em áreas indígenas, desde que seja autorizado pelos indígenas, além da obrigatoriedade de participação de estados e municípios no processo de demarcação.

A minuta também prevê que o processo demarcatório, que é realizado pela Funai, deverá ser público, e os atos deverão ser amplamente divulgados.

Em dezembro de 2022, o Congresso Nacional derrubou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei que validou o marco.

Em setembro, antes da decisão dos parlamentares, o Supremo decidiu contra o marco. A decisão da Corte foi levada em conta pela equipe jurídica do Palácio do Planalto para justificar o veto presidencial. 

Fonte: EBC

Parte da Justiça do Trabalho vê CLT como única forma de proteção, diz ministra

Por manter uma visão mais tradicional das relações laborais, uma parcela dos magistrados nem sempre aplica os precedentes fixados pelo Supremo Tribunal Federal, postura que acaba se refletindo no número de reclamações constitucionais propostas no STF contra decisões da Justiça do Trabalho.

 

Essa análise é da ministra Maria Cristina Peduzzi, do Tribunal Superior do Trabalho. Ela falou sobre o assunto em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito, na qual a revista eletrônica Consultor Jurídico ouve alguns dos principais nomes do Direito e da política sobre os temas mais relevantes da atualidade.

“A Justiça do Trabalho tem uma visão mais conservadora, no sentido de preponderantemente entender que a única forma de proteção é a CLT. E essa divergência de entendimentos, por parte da Justiça do Trabalho — não de toda, mas de algumas turmas —, é motivo para não produzir o efeito que o precedente (do STF) pretende, que é estancar o número de reclamações”, disse a ministra.

Como STF e Justiça do Trabalho têm adotado entendimentos diferentes sobre relações diversas daquelas previstas na CLT, causas trabalhistas hoje são o principal tema entre as reclamações que ingressam na cúpula do Poder Judiciário, conforme mostrou o Anuário da Justiça Brasil 2025.

Para Maria Cristina Peduzzi, os pedidos de revisão das decisões proferidas por cortes e magistrados trabalhistas de fato atingiram um volume significativo.

“É uma realidade que tem sido muito expressivo o número de reclamações que são propostas perante o Supremo Tribunal Federal contra decisões da Justiça do Trabalho — não só, claro, do Tribunal Superior do Trabalho, mas de muitos Tribunais Regionais do Trabalho”, disse a ministra.

Segundo ela, as reclamações têm sido propostas porque, embora o STF tenha fixado muitos precedentes obrigatórios, nem sempre a Justiça do Trabalho aplica essas teses.

“Em algumas situações, ela aplica o chamado distinguish, a distinção, para não aplicar (determinado precedente) naquele caso concreto. E isso tem gerado, sem dúvida, um número expressivo de reclamações constitucionais para o Supremo Tribunal Federal, objetivando que se aplique o precedente”, explicou a ministra.

Clique aqui para assistir à entrevista ou veja abaixo:

https://youtube.com/watch?v=xI7sPavj24I%3Flist%3DPLxdjZTZVpkEaPo6nnDjEZircwCOjMxjLA

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Efeitos colaterais do cumprimento de mandados de prisão e a defesa social

Recentemente, a Polícia Civil de São Paulo realizou uma das maiores operações integradas de sua história, que resultou na captura de 675 pessoas foragidas da Justiça. Por trás desse número impressionante, há mais do que estatística: há um forte recado à criminalidade e uma resposta concreta à sociedade.

O cumprimento de mandados de prisão não é apenas um ato processual. Ele representa uma série de efeitos colaterais — todos positivos — que se refletem diretamente na segurança pública, na percepção social de justiça e no enfraquecimento das estruturas criminosas.

A prisão, quando legal e motivada por ordem judicial, continua sendo um dos instrumentos mais eficazes de contenção e dissuasão da criminalidade. Abaixo, elencamos os principais impactos dessa medida, tão criticada por alguns setores, mas absolutamente essencial em realidades como a brasileira:

Retirada do criminoso do convívio social

O preso, ao ser retirado das ruas, deixa de representar ameaça direta à sociedade. Muitas vezes reincidente, ele deixa de praticar novos crimes, interrompendo um ciclo de violência.

Desarticulação da cadeia de logística do crime organizado

Foragidos não estão apenas “escondidos”; estão ativos, ocupando posições dentro da engrenagem criminosa. Seja como olheiro, transportador, arrecadador ou executor, o criminoso tem função no crime. A sua prisão quebra essa cadeia.

Combate efetivo à impunidade

O mandado cumprido mostra que o Estado funciona. Que uma sentença judicial tem consequência. E que a fuga não é garantia de liberdade.

Prevenção geral e específica

Criminosos presos não voltam a delinquir enquanto custodiados (prevenção específica). E a operação de grande porte serve como alerta a outros foragidos e criminosos em potencial (prevenção geral).

Redução imediata de indicadores criminais

Cada criminoso retirado das ruas representa menos furtos, roubos, homicídios, estelionatos, tráfico, entre outros delitos. O impacto é mensurável na queda dos índices.

6. Interrupção de práticas delituosas em andamento

Muitos presos estavam associados a crimes em curso, como golpes digitais, fraudes bancárias, organização de crimes violentos ou coação de testemunhas.

Reforço à autoridade do Poder Judiciário

Cumprir mandado de prisão é dar eficácia à decisão judicial. A ausência dessa resposta compromete a credibilidade do sistema de justiça como um todo.

Integração entre forças e estados da federação

A operação demonstrou que São Paulo não é esconderijo para foragidos de outros estados. O cruzamento de dados com o Banco Nacional de Mandados de Prisão e a cooperação interestadual são ferramentas fundamentais nesse processo.

Melhoria na sensação de segurança da população

A sociedade acompanha e reconhece as ações da polícia. Saber que foragidos estão sendo presos restaura a confiança nas instituições e alivia o sentimento de abandono.

Reforço da inteligência policial e da capacidade de investigação

As prisões em larga escala são resultado direto do uso de tecnologia, análise de dados, cruzamento de informações e atuação coordenada. Isso fortalece a Polícia Judiciária e comprova sua capacidade estratégica.

Resposta direta ao crime reincidente e violento

Grande parte dos presos possui histórico criminal extenso. Muitos atuavam há anos com liberdade, graças à morosidade ou fuga. A prisão interrompe trajetórias que se consolidariam em carreiras criminosas.

Preservação de provas e proteção de vítimas

Em muitos casos, a prisão do foragido é necessária para garantir a integridade da investigação, impedir que ele destrua provas, ameace vítimas ou influencie testemunhas.

Conclusão

O Estado que prende com base legal, prende para proteger. A prisão não é, e nunca deve ser, o único pilar do sistema penal. Mas negá-la em contextos como o brasileiro é fechar os olhos para a realidade das ruas. Operações como essa mostram que São Paulo está vigilante. Que a Polícia Civil está atuante. E que a Justiça, ainda que lenta para alguns, alcança todos.

A quem pensa em se esconder em nosso estado, fica o aviso: São Paulo não é refúgio para o crime.

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Previsão de pecúlio não afasta impossibilidade de pagar pena de multa, diz STJ

O fato de o condenado ter previsão de receber pecúlio não basta para afastar sua hipossuficiência e a impossibilidade de pagar a pena de multa. Logo, não deve impedir a extinção de sua punibilidade.

A conclusão é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento a recurso especial para autorizar que um homem que já cumpriu a pena privativa de liberdade e não tem como pagar a pena de multa.

Trata-se de aplicação da tese do próprio STJ segundo a qual a declaração de pobreza do condenado é suficiente para extinguir a punibilidade, mesmo se a multa não tiver sido ainda quitada. Isso não impede que ela seja cobrada na esfera administrativa.

A extinção da punibilidade marca o momento em que o Estado não pode mais continuar punindo a pessoa que cometeu um crime. Sem ela, o condenado continua com graves restrições a seus direitos de cidadão.

Provas de hipossuficiência

No caso concreto, a extinção da punibilidade foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça do Maranhão porque o condenado não apresentou provas de hipossuficiência ao juízo da Execução Penal.

Na apelação, a Defensoria Pública do Maranhão apresentou relatório de assistente social vinculada ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen). O documento não foi aceito porque não foi analisado pelo juízo da Execução Penal.

Já no STJ, a relatora, ministra Daniela Teixeira, votou por dar provimento ao recurso especial para extinguir a punibilidade do réu. Ela considerou parecer favorável tanto do Ministério Público do Maranhão, na origem, como do Ministério Público Federal, no STJ.

Abriu a divergência o ministro Messod Azulay, que referendou o acórdão do TJ-MA e disse que, ainda que fosse o caso de admitir o uso do relatório social apenas após a apelação, a extinção da punibilidade não seria recomendável porque o réu vai receber o pecúlio.

Esse é o valor que pode ser recebido pelo preso durante o período de cumprimento da pena, por meio de trabalho executado dentro ou fora do presídio. Ele é colocado à disposição quando o condenado é colocado em liberdade.

jurisprudência da própria 5ª Turma indica a possibilidade de que ele seja parcialmente penhorado para quitar a pena de multa determinada na sentença condenatória.

E o pecúlio?

Em voto-vista nesta terça-feira (17/6), o ministro Reynaldo Soares da Fonseca ofereceu uma solução diferente. Disse que há indícios de hipossuficiência — incluindo o fato de o réu ser representado pela Defensoria Pública — e ausência de indicativo de que pode pagar a multa.

Além disso, afastou a argumentação relacionada ao pecúlio. Para ele, o valor deve ser utilizado pelo réu para manter sua família pelo primeiro período após seu desencarceramento, até que encontre ocupação lícita e meio de vida adequado.

O voto-vista fez o ministro Messod Azulay reconsiderar a divergência e aderir à posição da relatora. Com os votos dos ministros Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik, o resultado na 5ª Turma do STJ acabou unânime.

AREsp 2.736.197

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