Na edição que vai ao ar nesta terça-feira (29), o programa STJ Notícias traz o entendimento firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que o sigilo sobre o nascimento e a entrega voluntária da criança para adoção – um direito garantido à genitora pela Lei 13.509/2017, que inseriu o artigo 19-A no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – pode ser aplicado também em relação ao suposto pai e à família extensa do recém-nascido.
Com essa conclusão, os ministros deram provimento ao recurso de uma mãe para permitir que seu filho seja encaminhado para adoção, conforme sua vontade, sem consulta prévia aos parentes que, eventualmente, poderiam manifestar interesse em ficar com ele.
A edição também aborda a decisão da Quarta Turma no sentido de que o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) não pode ser bloqueado para o pagamento de créditos relacionados a honorários advocatícios, sejam contratuais ou sucumbenciais, em razão da impenhorabilidade absoluta estabelecida pelo artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei 8.036/1990.
Outro destaque é o julgamento em que a Sexta Turma declarou nulas as provas decorrentes do acesso ao telefone celular de um homem condenado por tráfico de drogas. Para o colegiado, não houve comprovação adequada de que o acusado consentiu com o acesso ao celular pelos policiais que fizeram a prisão.
Produzido pela Coordenadoria de TV e Rádio do tribunal, o STJ Notícias será exibido na TV Justiça nesta terça-feira (29), às 13h30, com reprise no domingo, às 18h30. O programa também está disponível no YouTube.
A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou, de forma unânime, que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) deve seguir a regra da dupla visitação ao fiscalizar microempresas ou empresas de pequeno porte que trabalham com gás liquefeito de petróleo (GLP) – o gás de cozinha.
Na origem do processo, uma pequena empresa que vende GLP foi multada por armazenar recipientes de forma irregular. A empresa entrou com ação para anular a multa, alegando que a ANP não respeitou o procedimento exigido no artigo 55, parágrafo 1º, da Lei Complementar 123/2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. O dispositivo estabelece a necessidade de duas visitas: a primeira deve ser de orientação; a segunda, se ainda houver irregularidades, pode resultar em multa.
O pedido da empresa foi deferido em primeira e segunda instâncias. No recurso ao STJ, a ANP argumentou que o GLP é um produto inflamável e perigoso, razão pela qual seria aplicável ao caso o parágrafo 3º do artigo 55 da LC 123/2006, que dispensa a dupla visita na fiscalização de situações que envolvam alto grau de risco.
Dupla visita é compatível com empresas que trabalham com GLP
O ministro relator do caso, Gurgel de Faria, reconheceu haver decisões anteriores do STJ que afastaram a necessidade da dupla visitação no caso de empresas que trabalham com GLP, por se tratar de um produto perigoso. Esse entendimento foi confirmado pela Primeira e Segunda Turmas nos julgamentos do REsp 1.938.555 e do REsp 2.081.474, respectivamente.
No entanto, a interpretação foi revista no julgamento do REsp 1.952.610, de relatoria da ministra Regina Helena Costa. Nesse julgamento da Primeira Turma, apontou-se que a LC 123/2006 determina aos órgãos administrativos que listem, por meio de ato infralegal, as atividades nas quais poderia ser dispensado o procedimento padrão da visita dupla, por serem consideradas de alto risco.
A exigência foi cumprida pela ANP com a edição da Resolução 759/2018. A partir da análise desse ato normativo, no julgamento relatado pela ministra Regina Helena, o colegiado afastou a presunção de perigo em toda atividade com GLP e concluiu que a norma não relaciona como situação de risco o armazenamento, no mesmo ambiente, de recipientes de gás cheios e vazios, ainda que essa prática esteja em desacordo com regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e da própria ANP.
“Entendo que a controvérsia jurídica foi dirimida com a necessária profundidade nesse último julgado citado e, tratando o presente recurso da mesma discussão ali entabulada, saliento que as razões jurídicas expostas naquela ocasião são aqui reiteradas como fundamentos desta decisão”, declarou Gurgel de Faria.
A inadimplência e o endividamento de pessoas físicas e jurídicas são questões críticas para a economia, especialmente em contextos de alta inflação e juros elevados. Esse foi o tema do programa ‘Revista Maranhão’ desta segunda-feira (28), que também trouxe informações sobre alternativas para driblar essas situações.
Apresentado pela jornalista Keith Almeida, o programa recebeu o contador e educador financeiro André Veras. Na entrevista, o profissional falou sobre as principais causas que levam ao endividamento.
“A falta de planejamento é o que leva na maioria das vezes a esse endividamento exorbitante que vemos hoje, não apenas no Maranhão, mas em todo o país. Tanto o planejamento quanto a falta de conhecimento. Às vezes, os contribuintes não procuram um profissional mais capacitado e acabam se endividando”, destacou.
Ainda segundo o profissional, a falta desse planejamento pode acarretar consequências sérias para as pessoas físicas e jurídicas que vão desde as restrições até possíveis falências.
Controle de gastos
Para evitar o endividamento e a inadimplência, tanto pessoas físicas quanto jurídicas devem manter um controle rigoroso de suas finanças, criando orçamentos para acompanhar receitas e despesas. É importante reservar uma parte da renda para emergências e evitar compras por impulso, além de usar crédito de forma consciente, pagando sempre o valor integral das faturas e renegociando dívidas quando necessário. A educação financeira também é essencial para compreender a gestão do dinheiro e tomar decisões mais acertadas.
Para empresas, a gestão eficiente do fluxo de caixa e a manutenção de um capital de giro adequado são fundamentais para garantir a saúde financeira. Analisar o crédito dos clientes, planejar o endividamento de forma estratégica e rever constantemente os custos operacionais ajudam a evitar problemas financeiros. Investir na capacitação da equipe em práticas de gestão financeira também contribui para decisões mais sustentáveis e para manter a empresa longe da inadimplência.
O programa ‘Revista Maranhão’ é exibido toda segunda-feira, às 12h30, na TV Assembleia (canal aberto digital 9.2; Maxx TV, canal 17; e Sky, canal 309). A entrevista completa está disponível no Youtube.
Em 1989, o petroleiro Exxon Valdez protagonizou um dos maiores vazamentos de petróleo na costa do Alasca. Estima-se que o equivalente entre 257 mil a 750 mil barris de petróleo foram derramados quando no navio encalho na enseada do Príncipe Guilherme. Neste acidente, morreram cerca de 260 mil pássaros marinhos, 2,8 mil lontras, 250 águias e 22 orcas, para ficar nos exemplos mais expressivos.
Esta tragédia gerou a busca por aprimoramento no serviço de transporte de óleo e, entre eles, a edição de uma série de leis. Estas leis reforçavam a responsabilidade dos transportadores de petróleo e, evidentemente, seu objetivo era criar maior responsabilidade para evitar que novas tragédias ambientais se repetissem.
No entanto, esta lei gerou uma consequência não intencional [1]: o Grupo Royal Dutch/Shell, uma das maiores empresas de petróleo do mundo, passou a contratar navios independentes para a entrega de petróleo em vez de usar sua própria frota de 46 petroleiros. Com isso, a probabilidade de derramamento de óleo aumentou dado o uso de petroleiros de qualidade duvidosa.
Uma lei que originalmente fora elaborada para aumentar a proteção contra vazamentos de petróleo normal tornou mais frágil o transporte aumentando os riscos quando tais leis não existiam.
Este é um exemplo da lei das consequências não intencionais: uma lei que é projetada com finalidade específica, por conta de situações não previstas pelo legislador acaba gerando o oposto do que pretendia.
Lei das consequências não intencionais e o processo penal
No direito processual penal temos vários exemplos, e gostaria de me focar na indenização cível para a vítima.
Até 2008, o sistema era relativamente simples. A sentença penal condenatória transitada em julgado era título executivo judicial. A vítima deveria buscar a liquidação do valor na esfera cível. Não se discutia mais se o réu era responsável pelo dano mas apenas seu valor. É dizer, não se discutia mais o an debeatur, mas apenas o quantum debeatur.
Em 2008, a Lei 11.719, buscando aprimorar a proteção das vítimas, promoveu duas alterações importantes no Código de Processo Penal:
1) O artigo 387, IV estabeleceu que o juiz deveria fixar o valor mínimo da indenização considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido e 2) O artigo 63, parágrafo único estabeleceu que a vítima poderá executar o valor mínimo sem prejuízo de liquidação do restante do valor.
A partir de 2008, passaríamos a ter então dois mecanismos conjuntos:
a) o juiz poderia fixar um valor indenizatório mínimo e b) a vítima, além de executar este valor, poderia fazer a liquidação da sentença buscando a satisfação do valor justo.
Passados quase 16 anos desta mudança, temos ainda insegurança na jurisprudência quanto ao trato desta questão da indenização e a jurisprudência oscilou muito ao longo dos anos.
Logo após editada a lei, surgiram três posições sobre o tema:
a) o juiz poderia fixar de ofício o valor da indenização; b) haveria necessidade de pedido para a imposição deste valor e c) haveria necessidade de pedido deste valor que somente poderia ser feito pelo ofendido. Também se discute se, havendo pedido, este precisa ser com o valor específico da indenização ou pode ser genérico.
Violência contra a mulher
O STJ definiu parte deste tema relativamente aos casos envolvendo a Lei Maria da Penha e fixou o Tema 983: nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória.
Este acórdão foi afetado em 4 de outubro de 2017, julgado em 28 de fevereiro 2018 e transitado em julgado em 19 e abril de 2018. Ou seja, passados 12 anos da mudança da lei foi pacificado o tema, mas apenas e unicamente nas questões envolvendo a Lei Maria da Penha.
A questão acaba adquirindo preocupação, pois nas demais situações o entendimento do STJ não é esse. Vejamos esse julgado abaixo:
“A interpretação do artigo 387, inciso IV, do CPP consentânea com as garantias constitucionais do devido processo legal e do contraditório e da ampla defesa orienta que a fixação, na sentença condenatória, de valor mínimo para reparação de danos materiais causados pela infração depende de pedido expresso na inicial, com a indicação do valor a ser indenizado, bem como da realização de instrução probatória específica. Precedentes”. (STJ, T5, AgRg no AREsp 2108809/SP, Rel. Messod Azulay Neto, DJe 04.10.2024).
Este julgado segue a orientação definida pela 3ª Seção que estabelece que “1. À exceção da reparação dos danos morais decorrentes de crimes relativos à violência doméstica (Tema Repetitivo 983/STJ), a fixação de valor mínimo indenizatório na sentença — seja por danos materiais, seja por danos morais — “[…] exige o atendimento a três requisitos cumulativos: (I) o pedido expresso na inicial; (II) a indicação do montante pretendido; e (III) a realização de instrução específica a fim de viabilizar ao réu o exercício da ampla defesa e do contraditório” (REsp 1986672/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Terceira Seção, julgado em 08/11/2023, DJe 21/11/2023)” (STJ, T6, AgRg no REsp 2008575/RS, Rel. Min. Teodoro Silva Santos, DJe 07.03.2024).
Ou seja, para entendermos adequadamente como está a questão da indenização precisamos nos perguntar se está ou não no âmbito de crimes relativos à violência doméstica. Em caso positivo, há necessidade de pedido e não há necessidade de indicação do valor concreto nem de instrução probatória específica. Se não for no âmbito da violência doméstica, então há necessidade de pedido, indicação de valor concreto e instrução específica.
Indenização da vítima
A preocupação com a vítima é valor relevante em nossa sociedade. No entanto, quando esta preocupação é feita pelo legislador unicamente com o objetivo de populismo penal, a lei das consequências indesejáveis assume o papel: a proteção da vítima com as mudanças operadas pela lei deixa de ter segurança e torna-se terreno inseguro.
Tantos e tamanhos são os riscos envolvidos no uso do direito processual penal para obtenção de indenização da vítima que a conduta segura da parte é valer-se de ação cível autônoma. David Garland nos alerta sobre o risco que existe no sistema ao se colocar a vítima como protagonista do sistema criminal.
Além dos tradicionais riscos relativos à limitação de direitos e garantias fundamentais, temos os riscos gerados pela própria lei das consequências indesejadas. Há o risco de a vítima ser utilizada apenas como um totem a justificar nossas punções punitivas.
O exemplo acima mostra o porquê precisamos ser melhores na elaboração e na aplicação das leis. A ideia original do legislador era aumentar a proteção da vítima e, no entanto, gerou tamanha insegurança que reduziu a sua proteção.
O processo criminal tradicional não tem se mostrado o local mais adequado para a proteção da vítima. O processo criminal transformativo, no entanto, apresenta múltiplas possibilidades de mudança e de solução de problemas. Mas este é tema para outro artigo.
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Referências
ALVES, Leonardo Barredo Moreira. Manual dos Direitos da Vítima e de Vitimologia. Editora Juspodivm, 2024. GARLAND, David. A cultura do controle: crime e ordem social na sociedade contemporânea. Editora Revan, 2008. ROSA, Cristina Schmitt. Reflexões sobre o papel da vítima no sistema de justiça criminal. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, v1 (95), 2024. Link para acesso: https://revistadomprs.org.br/index.php/amprs/article/view/375/236
São Paulo, maior metrópole brasileira com 11,4 milhões de habitantes, amanheceu nesta quarta-feira (11) com a pior qualidade do ar em todo o mundo, em seu terceiro dia consecutivo. O monitoramento do site suíço IQAir para as principais 120 cidades do planeta apontava o índice da capital paulistana como insalubre, ou seja, muito ruim e prejudicial à saúde.
O problema não é localizado. Em boa parte do Brasil, a péssima situação do ar, há muito deteriorada pela combustão de indústrias e automóveis e pela destruição do meio ambiente, está sendo ainda mais prejudicada pela quantidade de focos de incêndios que avermelham o mapa brasileiro.
De janeiro até essa terça-feira (10), o país registrou 167.452 focos de queimadas, mais que o dobro do mesmo período no ano passado. Mato Grosso, Pará e Amazonas — estados onde estão os biomas Pantanal, Amazônico e uma parte do Cerrado — dominam as piores estatísticas, conforme os índices do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Mas os impactos não são sentidos apenas nessas regiões. No último fim de semana, a previsão é de que a fumaça tenha tomado conta de 60% do país.
Direito fundamental
A preocupação com o agravamento dessa situação, que não é de agora, vem estimulando debates, estudos e proposições no Senado.
A Constituição Federal define em seu artigo 225 o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que pressupõe uma boa qualidade do ar disponível. Uma das proposições em tramitação no Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 7/2021, torna explícito o direito à qualidade do ar entre os direitos e as garantias fundamentais, inclusive em ambientes internos públicos e privados de uso coletivo.
Primeira signatária da proposta, a senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) foi enfática ao dizer que a qualidade do ar é um dos principais fatores para a manutenção da saúde da população. A proposta foi pensada em meio a pandemia da covid-19, mas mantém-se atual com a situação preocupante do ar que se respira no país.
“Propomos que o direito à qualidade do ar seja elevado ao patamar constitucional, para conferir maior segurança jurídica ao marco regulatório vigente, eis que se trata, inegavelmente, de um direito humano fundamental. A poluição atmosférica tem causado violações de outros direitos fundamentais, como o direito à vida e à saúde e o direito de viver em um meio ambiente sadio, saudável e sustentável”, justificou a senadora.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), nove em cada 10 pessoas no planeta respiram ar com altos níveis de poluentes. Essa realidade leva à estimativa de milhões de mortes em todo o mundo associadas à poluição do ar ambiente.
Política Nacional
Em março deste ano, o Senado aprovou o PL 3.027/2022 para instituir a Política Nacional de Qualidade do Ar. A matéria normatizou-se na Lei 14.850, de 2024, definindo princípios, objetivos e instrumentos. O relator do projeto, senador Fabiano Contarato (PT-ES), enfatizou que o Brasil estava bastante atrasado na regulamentação consolidada dessa matéria.
Entre os objetivos da lei estão o de assegurar a preservação da saúde pública, do bem-estar e da qualidade ambiental para as presentes e futuras gerações e realizar o adequado monitoramento da qualidade do ar. A lei também estabeleceu a criação do Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitoAr) e determinou que a União, por meio do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), estabeleça padrões nacionais de qualidade do ar que integrarão o Programa Nacional de Controle da Qualidade do Ar (Pronar).
Pelo texto, os estados e o Distrito Federal podem definir, em regulamentos próprios, padrões de qualidade do ar em seus territórios, desde que sejam mais restritivos que os padrões nacionais em vigência.
Consultor legislativo do Senado na área de meio ambiente, Habib Fraxe destacou a importância de a lei buscar uma articulação federativa.
— Um sistema de monitoramento depende muito da capacidade institucional dos municípios. Por exemplo, São Paulo é uma cidade conhecida por ter muitas estações de monitoramento, consegue estimar qual o nível dos gases presentes e qual o problema a ser enfrentado. Mas a grande maioria dos municípios brasileiros não tem essa condição e não monitora a qualidade do seu ar. Essa lei tem essa característica de incentivar a articulação federativa, inclusive tem uma regra sobre financiamento, por conta que muitos estados e a maioria dos municípios não têm capacidade institucional de implementar as regras que estão propostas ali — explicou Fraxe.
Em maio deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) também determinou que o Conama faça uma nova resolução sobre os padrões de qualidade do ar. Foi estabelecido o prazo de 24 meses para atualizar as regras em relação aos padrões atuais da Organização Mundial da Saúde (OMS), estabelecidos em 2021.
Extremos climáticos
Para o consultor do Senado, pode-se fazer uma analogia com o extremo climático que viveu o Rio Grande do Sul, devastado em muitas áreas pelas fortes enchentes registradas no primeiro semestre deste ano, com a atual situação de queima e consequente deterioração da qualidade do ar no país.
— O que está acontecendo é simplesmente a concretização das previsões que a ciência vem fazendo há muito tempo. O aquecimento do planeta Terra, por meio da maior presença na atmosfera de gases de efeito estufa, causa extremos climáticos, como eventos de extrema chuva, extrema seca, e no caso que estamos vivenciando, extremo de escassez hídrica, com calor e estiagem. Isso na Amazônia é combustível perfeita para as queimadas.
Fraxe lembrou que a agricultura brasileira ainda pratica o uso do fogo para a limpeza de terrenos e renovação de pastagens.
— O manejo integrado do fogo é importante de ser feito. Existe a ecologia do fogo, em que os cientistas estudam a melhor época para se utilizar o fogo. Na agricultura, por exemplo, para não acumular combustível, para não utilizar o fogo num momento de maior vulnerabilidade, como agora, quando há extremo de seca, vento muito forte, como observado em São Paulo nas queimadas dos canaviais, com clima muito árido, falta de chuva. Isso também está sendo combustível para as queimadas na Amazônia.
Diante dessa situação, o consultor ressaltou que o Brasil precisa estar engajado num esforço mundial para a redução da emissão de gases de efeito estufa.
— Nós temos uma parcela de contribuição, sim. Mas é importante que se diga que em torno de 80% das emissões de gases de efeito estufa no mundo vêm de combustíveis fósseis. Isso é um problema que não é só do Brasil, que tem sofrido efeitos, tanto nesse evento do Rio Grande do Sul quanto agora, e que estão sendo causados pelo modelo econômico que nós temos sobretudo para a geração de energia — afirmou o consultor.
Muito o que precisa ser feito para enfrentar esse grave problema também requer articulação dos parlamentares, segundo Fraxe. É o caso de atuar em prol de ações como o fortalecimento de estratégias de combate ao desmatamento, de proibição do uso de fogo em determinadas épocas do ano, de exigir o manejo integrado do fogo para quem tem autorização de supressão da vegetação nativa, de garantir recursos para o fortalecimento de instituições ligadas à proteção ambiental e ao combate às queimadas e aos incêndios, além de sensibilizar a população sobre as alternativas disponíveis para a prevenção dessas queimas.
Devido à mudança na jurisprudência do STJ, a nova tese só valerá para os leilões com editais divulgados após a publicação da ata de julgamento, salvo os casos ainda pendentes de apreciação.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a tese de que, “diante do disposto no artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN), é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação”.
Devido à mudança na jurisprudência do tribunal, o colegiado acompanhou a proposta do relator do Tema 1.134, ministro Teodoro Silva Santos, para modular os efeitos da decisão, determinando que a tese fixada só valerá para os leilões cujos editais sejam divulgados após a publicação da ata de julgamento do repetitivo, ressalvados pedidos administrativos e ações judiciais pendentes de apreciação, para os quais a tese se aplica de imediato.
Segundo o ministro, ainda que o parágrafo único do artigo 130 do CTN diga que, na alienação em hasta pública, o crédito tributário se sub-roga no preço, tornou-se praxe nos leilões realizados pelo Poder Judiciário a previsão editalícia atribuindo ao arrematante o ônus pela quitação das dívidas fiscais pendentes.
CTN diz que o arrematante recebe o imóvel livre de ônus
O ministro lembrou que a disciplina das normas gerais em matéria tributária está condensada no CTN, que foi recepcionado pela Constituição de 1988 com status de lei complementar. O código, explicou, estabelece normas que estruturam todo o sistema tributário nacional.
De acordo com o relator, nos casos de alienação comum, o artigo 130 do CTN prevê que o terceiro que adquire imóvel passa a ter responsabilidade pelo pagamento dos impostos, taxas ou contribuições de melhorias cujos fatos geradores tenham ocorrido antes da transmissão da propriedade. Contudo, o parágrafo único desse dispositivo excepciona a arrematação em hasta pública, hipótese em que a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.
“Significa dizer que, quando a aquisição do imóvel ocorrer mediante alienação judicial, a sub-rogação se operará sobre o preço ofertado, e não sobre o arrematante, que receberá o bem livre de quaisquer ônus. Nesse específico caso, a aquisição da propriedade dar-se-á na sua forma originária, visto que não há relação de causalidade entre o antigo proprietário do bem e o seu adquirente”, afirmou.
Teodoro Silva Santos destacou que essa circunstância não deixa a dívida fiscal sem proteção, pois o crédito poderá ser satisfeito com o valor depositado em juízo pelo arrematante (sub-rogação da dívida no preço). Nessa situação, ressaltou o relator, o ente público concorrerá com outros credores, inclusive com titulares de créditos trabalhistas, que terão preferência. Na impossibilidade de satisfação integral da dívida, a Fazenda Pública deverá acionar o antigo proprietário para a recuperação do valor remanescente.
Edital não pode trazer regra diferente da prevista no CTN
O relator observou que a partir da previsão do artigo 686, inciso V, do Código de Processo Civil de 1973 e do artigo 886, inciso VI, do CPC/2015, foi adotada a tese de que a menção, no edital do leilão, dos ônus tributários que recaem sobre o imóvel afastaria o comando do artigo 130, parágrafo único, do CTN para permitir a responsabilização pessoal do arrematante pelo pagamento, dada sua prévia e inequívoca ciência da dívida.
No entanto, segundo o ministro, não é possível admitir que uma norma geral sobre responsabilidade tributária constante do próprio CTN – cujo status normativo é de lei complementar – seja afastada por simples previsão em sentido diverso no edital. Para ele, os dispositivos processuais que ampararam a orientação adotada pelo STJ não possuem esse alcance.
Teodoro Silva Santos comentou que são irrelevantes a ciência e a eventual concordância do participante do leilão em assumir o ônus pelo pagamento dos tributos sobre o imóvel arrematado. Em conclusão, alertou que é vedado exigir do arrematante, com base em previsão editalícia, o recolhimento dos créditos tributários incidentes sobre o bem arrematado cujos fatos geradores sejam anteriores à arrematação.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) complementou a tese firmada no Tema 692 dos recursos repetitivos para incluir a possibilidade de devolução nos próprios autos de benefícios previdenciários recebidos por força de decisão precária revogada.
A tese passou a ter a seguinte redação: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do artigo 520, II, do Código de Processo Civil de 2015 (artigo 475-O, II, do CPC/1973)”.
O colegiado acolheu parcialmente os embargos de declaração nos quais o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre outros pontos, alegava ter havido omissão na tese jurídica fixada no repetitivo, pois o acórdão questionado em um dos recursos representativos da controvérsia reconheceu a possibilidade de execução do valor dos benefícios nos próprios autos, quando fosse reformada a decisão provisória.
Questão de ordem admitiu liquidação nos próprios autos
O relator dos embargos, ministro Afrânio Vilela, lembrou que, em junho de 2022, o relator do Tema 692, ministro Og Fernandes, acolheu questão de ordem para reafirmar a tese fixada, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação sobre a matéria (artigo 115, II, da Lei 8.213/1991).
Segundo o relator, na ocasião daquele julgamento, foi feita uma análise da evolução legislativa e jurisprudencial sobre o assunto, que levou à conclusão da possibilidade de liquidação nos próprios autos, quando reformada a decisão que lastreava a execução provisória. Contudo, o ministro observou que a tese fixada não fez referência a esse posicionamento.
Complementação da tese vai evitar controvérsias desnecessárias
Para Vilela, embora a vinculação dos juízes e tribunais esteja atrelada à tese jurídica e também aos fundamentos determinantes (ratio decidendi) do acórdão repetitivo, o texto da tese tende a ser o principal mecanismo de difusão da orientação a ser observada pelos órgãos aplicadores do precedente qualificado.
“Especificamente quanto ao Tema 692, tenho notado a distribuição, no STJ, de inúmeros processos que discutem a possibilidade de liquidação, nos próprios autos, dos valores indevidamente pagos pelo INSS em antecipação de tutela, muito embora a matéria já tenha sido pacificada pela Primeira Seção na sistemática dos recursos repetitivos”, comentou.
O relator disse ainda que, muitas vezes, no exame de admissibilidade do recurso especial, os tribunais de origem têm deixado de aplicar o Tema 692 devido à identificação de um suposto distinguish, o que os leva a determinar a subida do recurso para análise do STJ.
Na sua avaliação, a complementação da tese terá o efeito de evitar controvérsias secundárias desnecessárias ou derivadas do julgamento da questão de ordem.
O Projeto de Lei 3077/241, que altera a Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 6.605/98), almeja tipificar como crime a manutenção de animais presos com correntes ou objetos assemelhados.
Assim, o art. 32 da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passaria a vigorar acrescido do seguinte § 1º-B:
“Art. 32......................................................................
§ 1º-B Incorre nas mesmas penas quem mantém animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos presos, permanentemente, com correntes, cordas ou objetos assemelhados, que prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar dos animais.” (NR)
Justificativa do Projeto
O projeto destaca que manter animais presos em correntes, cordas ou objetos semelhantes representa um tratamento cruel e desumano aos animais, notadamente quando se trata de um animal permanentemente acorrentado.
A proibição tem o objetivo de minimizar danos físicos e mentais aos animais. Isso porque os animais presos permanentemente em correntes poderão apresentar feridas no pescoço, bem como problemas comportamentais, a exemplo de estresse e ansiedade.
Como se não bastasse, manter o animal acorrentado – em uma posição ainda maior vulnerabilidade – poderá culminar em maior risco de morte em casos de emergência, a exemplo incêndios, desastres naturais e desabamentos. Infelizmente, são comuns os casos de animais acorrentados sofrendo abusos e maus-tratos, permanecendo sem água e comida.
Precedentes
Alguns entes federativos já adotaram a iniciativa de proibir a manutenção de animais acorrentados. O Distrito Federal instituiu a Lei nº 6.787, de 2021. Municípios como São Paulo e Presidente Prudente já adotaram medidas semelhantes. Com o presente projeto, busca-se suprir um hiato legislativo para proibir a prática em todo território nacional.
Fundamentação Jurídica
Direitos fundamentais a animais não humanos
Existe uma tendência no debate contemporâneo de conferir direitos fundamentais aos animaisnão humanos. Em nosso curso de Direito Constitucional do Estratégia Carreiras Jurídicas (Defensorias), defendemos que os animais não humanos também seriam titulares de direitos fundamentais. Nesse ponto, diferentemente dos direitos fundamentais de terceira dimensão, estamos falando de direitos fundamentais inerentes à natureza (incluindo os animais não humanos) e não de direitos inerentes ao indivíduo ou à coletividade de pessoas. Esse entendimento possui um viés pós-humanista, pautando-se na ideia do biocentrismo.
Matéria na Doutrina – O jurista Noberto Bobbio já comentou a referida tendência (BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier. 2004, página 31): “olhando para o futuro, já podemos entrever a extensão da esfera do direito à vida das gerações futuras, cuja sobrevivência é ameaçada pelo crescimento desmesurado de armas cada vez mais destrutivas, assim como a novos sujeitos, como os animais, que a moralidade comum sempre considerou apenas como objetos, ou, no máximo, como sujeitos passivos, sem direitos”.
No âmbito internacional de proteção dos Direitos Humanos, a Declaração Universal dos Direitos dos Animais – Unesco – ONU (Bruxelas – Bélgica, de 27 de janeiro de 1978), de forma expressa, reconhece direitos aos animais, ressaltando que “todos os animais nascem iguais diante da vida, e têm o mesmo direito à existência”. A opinião consultiva n. 22 da Corte Interamericana de Direitos Humanos reconheceu direitos à natureza (sujeito de direitos).
Matéria na Doutrina – Marcos Gomes já discorreu que (GOMES, Marcos Vinícius Manso Lopes. Direitos Humanos e Princípios Institucionais da Defensoria pública. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto. São Paulo: Saraiva Educação. 2ª Edição, 2019): “Na Alemanha, na década de 90, introduziu-se previsão no Código Civil acerca da ideia de que animais não são coisas. No Direito Civil Austríaco, temos o Estatuto Jurídico dos Animais. Por seu turno, a Constituição Equatoriana, de forma inovadora, define a natureza – incluindo-se os animais – como sujeitos de direitos, estremecendo as estruturas de um direito patrimonial e individualista, com bases no Direito Romano, e emergindo uma estrutura biocêntrica para a interpretação jurídica, reequilibrando a relação entre homem e natureza”.
Como se não bastasse, já temos precedentes de Tribunais Estrangeiros reconhecendo direitos fundamentais para a natureza. Destacamos dois exemplos paradigmáticos:
Caso do Rio Atrato (reconheceu direito fundamental a um rio – Rio Atrato).
Caso Floresta Amazônica na Colômbia (reconheceu direito fundamental à Floresta Amazônica).
Estamos falando de uma teoria que possui fundamento no Constitucionalismo Latino-Americano, a exemplo da Constituição do Equador. Nesse sentido, a ideia de “Pacha Mama” prevista nessa constituição refere-se ao ecossistema, a mãe natureza, como sujeito de direito.
Direitos fundamentais a animais não humanos no Brasil
No Brasil, existe um precedente do STJ sobre o tema, envolvendo direitos fundamentais a um papagaio. Ademais, existe a Lei Estadual de Santa Catarina n. 17.485/2018, que reconhece direitos fundamentais aos animais.
De fato, a Constituição de 1988, diferentemente das Constituições anteriores, constitucionalizou a proteção do meio ambiente. A elevação das normas de Direito Ambiental à nível constitucional deu ensejo à melhor e mais adequada proteção e promoção do meio ambiente.
Ainda predomina na doutrina que o meio ambiente está relacionado à um direito difuso de terceira dimensão, ou seja, um direito do ser humano de terceira dimensão. Nesse sentido, destacamos o texto constitucional com nossos apontamentos:
Art. 225. Todos (os homens) têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (do homem), impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (do homem).
O art. 225 da Constituição Federal é o coração da proteção do meio ambiente no ordenamento jurídico pátrio. A ideia de que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado” irá permear todo texto constitucional. Porém, grande parte da doutrina ainda defende uma visão antropocêntrica como sendo a concepção que permeia o art. 225, CF, com o homem no centro das relações.
Entrementes, conforme expomos acima, caminhamos para o reconhecimento de um valor intrínseco à natureza, abrangendo os animais não humanos. Seguindo essa linha de raciocínio, destacamos uma tendência de muitos doutrinadores em pregarem uma visão biocêntrica do art. 225, com os seres vivos e a ecologia passando a ocupar o centro das relações. Assim, poderíamos adequar a leitura do art. 225, CF:
Art. 225. Todos (seres vivos) têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (dos seres vivos), impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (dos seres vivos).
O biocentrismo no país poderá ser fundamentado no art. 225, §1º, VII, CF, o qual dispõe que para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.
Por meio do Tema 69, conhecido como ‘tese do século’, Supremo excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins
Sessão plenária do STF. | Crédito: Rosinei Coutinho/STF
Por unanimidade, os ministros do SupremoTribunal Federal (STF) votaram para definir, com repercussão geral, que cabe o ajuizamento de ação rescisória contra decisão transitada em julgado em desacordo com a modulação de efeitos do Tema 69. O STF fixou a seguinte tese: “Cabe ação rescisória para adequação de julgado à modulação temporal dos efeitos da tese de repercussão geral fixada no julgamento do RE 574.706 (Tema 69/RG)”.
Com os ministros favoráveis ao entendimento, a decisão do Supremo prevalece sobre a do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que já fixou tema repetitivo sobre o assunto. Porém, não há mudança prática, já que as posições não são conflitantes.
Na prática, a decisão permite que a Fazenda proponha ações visando a anulação de decisões favoráveis aos contribuintes relacionadas à exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins. É o caso, por exemplo, de decisões judiciais que permitiram a restituição de valores, porém foram proferidas em desacordo com a modulação do STF na “tese do século”.
Por meio do Tema 69, conhecido como “tese do século”, o Supremo excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. O STF ainda determinou que a decisão, favorável aos contribuintes, produza efeitos somente a partir da data de julgamento de mérito, de 15 de março de 2017, ressalvando-se as ações judiciais e os pedidos administrativos protocolados até a mesma data.
No dia 13 de setembro, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou os (REsps) 2054759/RS e 2066696/RS (Tema 1245), com a mesma discussão. O colegiado entendeu pelo cabimento da ação rescisória e fixou a tese de que “é admissível o ajuizamento de ação rescisória para adequar julgado de antes de 13 de maio de 2021 à modulação do Tema 69 do STF”.
No voto favorável à repercussão geral e ao cabimento da ação rescisória, o relator no STF, ministro Luís Roberto Barroso, observou que as duas turmas do Supremo já admitiram a possibilidade da ação rescisória contra julgados que não observaram a modulação de efeitos do Tema 69. O magistrado afirmou ainda que o debate diz respeito “à autoridade da jurisdição constitucional exercida pelo Supremo” e que esta é uma questão constitucional relevante.
O caso foi definido no RE 1489562 (Tema 1338) e envolve a empresa R. Milet Comércio de Calçados Ltda.
A questão racial tem sido objeto de debates acalorados e, muitas vezes, radicais. Em um contexto político polarizado entre ideologias cegas, para as quais o mais importante é o domínio do poder pelo uso das massas e não o enfrentamento sério dos problemas sociais, o debate sobre racismo reverso é um banquete para lideranças odiosas, totalitaristas e revanchistas.
Afinal, é possível que minorias políticas sejam racistas e discriminem outras pessoas (de minoria ou de maioria)?
Bem, o racismo, enquanto gênero, engloba toda e qualquer manifestação preconceituosa, discriminatória, excludente, restritiva ou preferencial contra pessoa ou grupo em razão de raça, cor, religião, etnia ou outros fatores discriminatórios, podendo essas manifestações serem diretas, ou indiretas, comissivas ou omissivas, individuais, sistêmicas e/ou estruturais.
As leis sobre racismo, a começar pela Constituição, ao tratarem de racismo, assim como de preconceito e discriminação, não afirmam que o ele só ocorra quando praticado por maiorias políticas contra minorias políticas. Não há dispositivo normativo que afirme que racismo é discriminação de branco contra preto, ou de cristãos contra umbandistas etc. As leis definem racismo como a discriminação em razão da raça, da cor (não importa a cor do autor, nem da vítima), da religião (não importa a religião do autor, nem da vítima) e da etnia (não importa a etnia do autor, nem da vítima).
Como se sabe, a lei não tem palavras inúteis, logo se escreveu-se cor e não negro, é porque o legislador não restringiu o polo passivo do racismo aos negros, se escreveu-se religião e não religião de matriz africana, é porque o legislador não restringiu o polo passivo do racismo às pessoas e religiões de matriz africana. Mas, por qual razão a lei não restringiu o racismo aos negros ou as minorias? Ora, a lei busca combater o racismo em todas as suas formas e contra qualquer pessoa, ainda que, na prática, algumas minorias políticas sofram muito mais racismo do que as maiorias jamais experimentaram em suas vidas. Porém, o que a lei busca não é implementar uma revanche proibindo o racismo contra as minorias e permitindo contra as maiorias, ou se preferirem em outros termos, a lei não busca proibir discriminações contra pretos e pardos e permitir contra brancos; a lei busca pôr um fim em toda e qualquer forma de preconceito, discriminação e racismo. Como bem afirmam William Douglas e Irapuã Santana, “o racismo pode ser praticado por qualquer pessoa contra qualquer pessoa”.
Nesse sentido, o art. 1º, da lei de crimes resultantes de preconceito (Lei 7.716/1989), também chamada de Lei de Racismo, define os crimes raciaiscomo aqueles tipificados em lei (somente os definidos em lei expressa, em respeito ao princípio constitucional da legalidade penal),resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Veja que a lei não diz os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de brancos contra pretos, ou de cristãos contra umbandistas etc. A lei é clara: são os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, não importando a raça, a cor, a etnia, a religião ou a procedência nacional do autor, nem da vítima!
O artigo 20-C, da Lei 7.716/89 e a má-fé hermenêutica dos neorracistas
Embora a CF/88 seja clara em conceber que todo racismo é racismo e, portanto, deve ser repudiado, os defensores do identitarismo pós-moderno revanchista têm usado, de má-fé, o artigo 20-C, da Lei 7.716/89, para sustentar a falácia de que os crimes de discriminação, preconceito e racismo só poderiam ser praticados por maiorias contra minorias. O referido artigo afirma: “Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência”.
Perceba que o dispositivo unicamente institui uma norma hermenêutica que reforça a identificação e tipificação dos crimes de preconceito, discriminação e racismo, sempre que identificados atos e tratamentos contra minorias que causem constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, que usualmente não são dispensados a grupos majoritários. É uma norma hermenêutica de identificação e reforço e não uma norma de definição. Ou seja, o legislador reconheceu que há certas formas de discriminação, preconceito e racismo que ocorrem predominantemente (ou exclusivamente) contra minorias, mas não todas. E isso, obviamente, não exclui a ocorrência desses crimes contra maiorias, nem a prática desses crimes por minorias, isto é: a lei não tutela um direito das minorias de serem preconceituosas, discriminar e serem racistas!
Assim, essa norma jamais pode ser interpretada no sentido de excluir a punição do preconceito, da discriminação e do racismo contra pessoas pertencentes a grupos majoritários, pois não é essa a teleologia da Constituição, nem mesmo da Lei de Racismo, que buscam punir o racismo de qualquer pessoa contra qualquer pessoa, sob pena de se dizer que uma pessoa pode ser diretamente discriminada pela cor da sua pele, pois ela é branca, ou pela cor do seu cabelo, pois é loira, ou pela sua religião, pois é cristã, ou pela sua origem, pois é europeu, o que implicaria ofensa direta ao princípio da igualdade, que não admite discriminações negativas, e, em especial, à dignidade da pessoa humana, que veda a reificação de qualquer pessoa por qualquer pessoa.
Ora, o artigo 20-C, da Lei 7.716/89 não exclui em nenhum momento a prática de crimes de discriminação, preconceito e racismo por minorias políticas. A própria estrutura da norma não permite esse raciocínio, pois ela não afirma que “o juiz só deve considerar como racismo a discriminação contra grupos minoritários”. Se o legislador quisesse restringir a aplicação da lei de racismo ao racismo contra minorias ou aderir à tese do racismo estrutural, ele deveria ter feito uso de expressões que assim o fizessem, como “só”, “somente”, “apenas” etc. Mas, não foi essa a sua intenção. A lei em nenhum momento usa qualquer expressão que leve a essa conclusão. Contudo, caso o legislador assim o fizesse, essa pretensa norma seria claramente inconstitucional por ofensa direta aos princípios da igualdade, da não discriminação e da dignidade da pessoa humana.
Racismo reverso? Só o racismo estrutural é racismo?
Em que pese a CF/88 vede expressamente toda e qualquer forma de preconceito, discriminação e racismo contra qualquer pessoa ou grupo, os radicais do identitarismo pós-moderno tem defendido que só o racismo estrutural é racismo, sustentando que não há racismo de minoria contra maioria (de preto contra branco, de umbandista contra cristão etc.). Assim, pretos estariam juridicamente liberados para serem preconceituosos, para discriminar e terem atitudes racistas contra brancos. Do mesmo modo, umbandistas teriam essa mesma licença jurídica contra os cristãos, e assim por diante. Ora,não é só o racismo estrutural que é racismo. A Constituição protege todas as pessoas contra qualquer forma de preconceito, discriminação e racismo e não só as minorias. Por um lado, ninguém precisa ter sido escravizado ou ter tido os direitos negados por décadas ou séculos para ser vítima de racismo. Por outro lado, ser racista não é um direito fundamental das minorias!
Então, existe racismo reverso? Não! A Constituição veda toda e qualquer forma de preconceito, discriminação e racismo de qualquer pessoa ou grupo contra qualquer pessoa ou grupo, logo todo racismo é racismo. Não existe racismo reverso porque todo racismo é racismo, não se podendo graduar o racismo, como pretendem os identitaristas ao rotularem de racismo reverso os atos preconceituosos, discriminatórios e racistas praticados por minorias contra maiorias, numa tentativa de legitimar condutas criminosas revanchistas.
Ora, ninguém precisa ter poder ou pertencer a um grupo político dominante para ser racista, qualquer um pode ser racista. Da mesma forma, ninguém precisa pertencer a uma minoria política para ser vítima de atos e tratamentos preconceituosos, discriminatórios ou racistas. O discurso supremacista negro que eclodiu nos Estados Unidos na segunda metade do séc. XX, ressurge agora no Brasil, em alas radicais do movimento negro, sendo abraçado pela esquerda progressista, que promove um neorracismo identitário como projeto de (manutenção de) poder: é o famoso “nós contra eles”.
Se a Constituição vedasse só o chamado racismo estrutural (como tentam impor alguns, inclusive, para fins de aplicação das leis de crimes resultantes de discriminação ou preconceito) e permitisse as demais formas de preconceito, discriminação e racismo, em especial, contra maiorias políticas, então a tese do racismo reverso passaria a existir como um pseudo-contraponto ao único racismo existente identificado pelos identitaristas, unicamente, para tentar conferir razão, autoridade e unanimidade a uma tese furada.
Perceba: tanto a teses do racismo reverso quanto a tese do racismo estrutural foram criadas pelos neorracistas identitários, pois a sobrevivência de uma depende da sobrevivência da outra. Então, ambos os discursos são repetidos exaustivamente, um em tom intelectual e acadêmico, para lhe conferir razão, e outro em tom de chacota, para ridicularizar qualquer um que pense diferente. Porém, um não vive sem o outro, os dois conceitos são interdependentes, de modo que para defender que o racismo reverso não existe é indispensável defender a existência (unicamente) do racismo estrutural.
Aqui, vale lembrar que a tese do racismo estrutural foi proposta em estudos raciais de autores adeptos do movimento supremacista negro americano a partir dos anos 1960, sendo popularizada no Brasil porSilvio Almeida, para quem o racismo decorre da estrutura social em si, da forma como se constituem as relações políticas, econômicas, culturais, jurídicas e familiares de uma sociedade. Assim, o racismo seria estrutural, de modo que as ações individuais e os processos institucionais derivam de uma sociedade racista, ou seja, para essa teoria, a sociedade é estruturalmente racista e tudo que as pessoas e instituições praticam é feito de forma racista, em razão da estrutura social que foram formadas. Nas palavras do autor, o racismo é parte de um processo social que ocorre pelas costas dos indivíduos e lhes parece legado pela tradição, de modo que a validade da reprodução sistêmica de práticas racistas está na organização política, econômica e jurídica da sociedade, sendo que o racismo se expressa concretamente como desigualdade política, econômica e jurídica, uma vez que o racismo, enquanto processo histórico e político, cria condições sociais para que, direta ou indiretamente, grupos racialmente identificados sejam discriminados de forma sistêmica. Assim, para os defensores desta tese, ainda que indivíduos que cometam atos racistas sejam responsabilizados, a responsabilização jurídica seria insuficiente para que a sociedade deixe de ser uma máquina produtora de desigualdade racial.
Ora, a tese do racismo estrutural tem caráter homogêneo e totalizador.Sendo homogêneo, somos todos culpados por esse racismo, não havendo presunção de inocência. Nesse contexto, o movimento supremacista identitário tenta imputar à sociedade atual uma “dívida histórica” por atos da sociedade dos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX, que deveria, então, ser reparada. Ora, em qualquer sistema jurídico republicano, a responsabilidade é individual (a pessoa responde por seus próprios atos e não pelos atos de outrem), sendo criminoso falar em “reparação histórica”, pois essa ideia busca responsabilizar brancos do presente por atos de brancos do passado, favorecendo pretos do presente pelo sofrimento de pretos do passado. Sendo totalizador, o conceito acaba por perder o seu poder explicativo, pois se todo racismo é estrutural (como afirma Silvio Almeida), não se esclarecem os fenômenos sociais. Nesse contexto, o movimento supremacista identitarista tenta impor o conceito de racismo estrutural como o único possível de caracterizar o racismo (monopólio do racismo).
Assim, de um lado, tenta legitimar atos preconceituosos, discriminatórios e racistas contra outros grupos, criando uma licença para que minorias sejam racistas. De outro lado, usam o racismo, de forma abusiva e banal, como um escudo para qualquer situação da vida dessas pessoas. Consequentemente, não importam mais as razões pelas quais um negro foi preso, expulso de um lugar ou demitido do trabalho, não importa se matou alguém, se assediou as colegas ou se furtou algo da empresa, o que é importa é que ele é negro, logo sua prisão foi racista, sua expulsão foi racista, sua demissão foi racista ou fruto de perseguição porque a branquitude não consegue ver negros em lugar de destaque ou de poder. Os fatos não importam mais, agora o que importa é a cor da pele.
O próprio Silvio Almeida, principal autor e defensor da tese do racismo estrutural no Brasil, quando era Ministro de Direitos Humanos, após serdenunciado por dezenas de mulheres, incluindo a Ministra da Igualdade Racial, por importunação sexual, assédio sexual e moral,afirmouque estava sendo perseguido por um grupo de pessoas que queriam diminuir sua luta e afetar sua imagem por ser um homem negro e que com isso o combate ao racismo no Brasil perderia muito. Afirmou, ainda, que esse grupo de pessoas não suportava ver negros em lugares de poder e de destaque, colocando-se como uma vítima do racismo estrutural.
Ademais, a tese do racismo estrutural não possui qualquer base científica, até por ser irracional, assim como não possui qualquer base normativa, vez que não há qualquer lei, democraticamente elaborada pelos representantes do povo, que reconheça que um ato ou tratamento preconceituoso, discriminatório ou racista para ser considerado racismo (e crime de racismo) deve encaixar-se na tese do racismo estrutural.
Obviamente que, com isso, não se quer dizer que brancos ou cristãos sofram, constantemente, preconceito, discriminação e racismo na sociedade brasileira, longe disso. O que se quer é dizer que, também, existem atos racistas, discriminatórios e preconceituosos que são praticados por pessoas pertencentes a minorias políticas contra pessoas pertencentes a maiorias políticas, e, até mesmo, alas radicais e revanchistas de alguns movimentos que difundem preconceito, discriminação, exclusão e preferências contra pessoas brancas, contra cristãos etc. E esses atos e tratamentos, bem como esses movimentos, devem ser punidos da mesma forma que se pune atos racistas e movimentos racistas contra minorias. Afinal, a Constituição vedou a discriminação de qualquer natureza contra todas as pessoas e não apenas contra as minorias.
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