Juíza trabalhista proíbe Facebook e Instagram de veicular trabalho infantil artístico

A juíza Juliana Petenate Salles, da 7ª Vara do Trabalho de São Paulo, determinou nesta quarta-feira (27/8) que Facebook e Instagram deixem de veicular conteúdo com trabalho infantil artístico sem autorização judicial, sob pena de R$ 50 mil por criança ou adolescente encontrado em situação irregular. Foi estipulado o prazo de cinco dias para início do cumprimento da decisão, que fica em vigor até que o mérito da ação seja julgado. Cabe recurso.

Ao acolher a pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT), a magistrada argumentou que “manter crianças e adolescentes expostos em redes sociais para fins lucrativos, sem a devida avaliação das condições em que ocorre o trabalho artístico e sem autorização da Justiça, gera riscos sérios e imediatos”.

A ação foi apresentada pelo MPT na segunda-feira (25/8) contra Facebook e Instagram por “permitirem e se beneficiarem da exploração de trabalho artístico infantil”. De acordo com o órgão, as empresas desrespeitam o artigo 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o que acaba também por violar o artigo 7º, XXXIII, da constituição e a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil.

Na ação, o MPT pede a condenação da empresa e o pagamento de indenização de R$ 50 milhões em danos morais coletivos, além da adoção de medidas de prevenção e controle em suas plataformas como a implantação de filtros e sistemas capazes de identificar conteúdos com participação de crianças e adolescentes sem alvará judicial e exigi-los.

O órgão também requer que as plataformas coíbam o trabalho infantil artístico que cause prejuízo à formação da criança ou adolescente, como exploração sexual, presença de bebida alcoólica, erotização, adultização e jogos de azar. Solicita ainda a inclusão da proibição expressa ao trabalho infantil nos termos de uso das plataformas digitais.

No documento, o MPT apresentou cópia de inquérito civil em face do Facebook que aponta existência de perfis de crianças e adolescentes em atuação comercial em suas plataformas, o que configura trabalho infantil artístico. Segundo os procuradores do Trabalho, a iniciativa não busca impedir a participação artística de crianças, mas garantir que ela ocorra dentro dos limites legais e com a proteção devida.

“A exploração do trabalho infantil nas redes sociais não pode ser naturalizada. As plataformas digitais se beneficiam com a monetização resultante da atividade de influencer mirim e mantém conduta omissa ao não adotar o devido dever de diligência em sua zona de influência, fugindo de sua responsabilidade direta na prevenção e combate a essas violações”, diz trecho da peça do MPT.

Procurada, a Meta, empresa responsável pelo Facebook e pelo Instagram, disse que não iria se manifestar.

O processo tramita com o número 1001427-41.2025.5.02.0007 no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2).

Comissão aprova projeto que torna hediondo o crime de capacitismo praticado com violência

A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou projeto que altera a legislação para enquadrar o capacitismo (discriminação contra pessoas com deficiência) como crime hediondo quando praticado com violência ou grave ameaça.

A proposta, nesses casos, fixa pena de reclusão de 3 a 6 anos, além de multa. O texto insere a mudança tanto na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência quanto na Lei dos Crimes Hediondos.

Atualmente, a legislação já tipifica o capacitismo como crime, mas sem distinção para situações que envolvam violência ou grave ameaça.

O texto aprovado foi o substitutivo da relatora, deputada Dayany Bittencourt (União-CE), ao Projeto de Lei 2513/25, do deputado Duarte Jr. (PSB-MA). A versão original alterava apenas a Lei dos Crimes Hediondos. O substitutivo ampliou o alcance, prevendo também sua inserção na Lei Brasileira de Inclusão.

Dayany Bittencourt explicou que o objetivo é consolidar o regime jurídico-protetivo das pessoas com deficiência em um diploma especializado. “A proposta envia um sinal normativo ainda mais potente sobre a prioridade do tema”, disse.

Próximos passos
O projeto ainda vai ser analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ); e pelo Plenário. Para virar lei, precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

Políticas públicas e instrumentos de fomento à inovação portuária

Na coluna anterior, analisamos a evolução regulatória do setor portuário, da gestão estatal centralizada a um modelo mais competitivo e aberto à inovação. A legislação das décadas de 1990 e 2010, ao ampliar a participação privada e redefinir o papel das autoridades portuárias, criou condições favoráveis ao surgimento de ecossistemas inovadores.

Agora, o foco recai sobre os instrumentos de fomento disponíveis para impulsionar a inovação portuária. O objetivo é mostrar como incentivos tributários, crédito público, mecanismos regulatórios e cláusulas contratuais podem ser articulados em uma estratégia integrada que fortaleça a autonomia tecnológica, reduza a dependência externa e amplie a competitividade.

Ao deslocar o foco do panorama histórico-regulatório para os instrumentos jurídicos e econômicos específicos, pretende-se avaliar em que medida o Brasil dispõe de um arcabouço normativo e institucional sólido para sustentar uma política consistente de modernização portuária, alinhada às exigências globais de eficiência, sustentabilidade e segurança.

Medidas de incentivo atuais

Atualmente, o Brasil dispõe de um conjunto expressivo de políticas públicas que podem estimular o desenvolvimento de tecnologias portuárias. Entre os (i) incentivos tributários, destacam-se a Lei do Bem, a Lei da Informática, o Programa Mover e o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto), prorrogado até 2028, que suspende tributos sobre aquisição de equipamentos, facilitando a renovação de ativos.

Apesar de sua relevância, o Reporto foi objeto de críticas por sua lógica fragmentada e reativa, sem conexão com uma política industrial ou tecnológica de longo prazo e pelo debate em torno da retroatividade de seus efeitos. Isolado, torna-se mera renúncia fiscal sem garantir inovação estrutural. Como já advertimos em outras oportunidades, benefícios dispersos dificilmente se traduzem em ganhos sistêmicos se não estiverem inseridos em um projeto nacional consistente de infraestrutura e desenvolvimento.

No campo do (ii) financiamento, existem créditos reembolsáveis e não reembolsáveis oferecidos pela FinepPBNDESFundações de Amparo à Pesquisa (FAPs) e Embrapii. Também há mecanismos de (iii) compras públicas de inovação, como Encomendas TecnológicasContratação Pública de Solução Inovadora (CPSI) e a aplicação de Margens de Preferência para fabricantes nacionais em licitações.

Complementarmente, quanto: à (iv) cooperação institucional, a Lei de Inovação autoriza convênios entre órgãos públicos, empresas e universidades para P&D, prestação de serviços técnicos e compartilhamento de infraestrutura e recursos humanos; aos (v) ambientes promotores de inovação, a mesma legislação prevê a criação de Alianças Estratégicas, incentivo ao empreendedorismo e fortalecimento de parques tecnológicos, incubadoras e cidades inteligentes; e quanto à (vi) assistência técnica especializada, os programas do Sebrae e do Senai oferecem mentorias, serviços técnicos e acesso a laboratórios para testes e validações.

No âmbito contratual, destacam-se ainda: (vii) cláusulas de investimento obrigatório em P&D, a serem inseridas em contratos de concessão e permissão de terminais portuários, à semelhança de setores como energia e eletricidade; e (viii) cláusulas de compensação comercial (offset), aplicáveis a contratos de aquisição de maquinário de alto valor, obrigando fornecedores estrangeiros a transferir tecnologia ou produzir parte dos equipamentos no Brasil, como já ocorre no setor de Defesa, e.g. no caso da aquisição de caças pelo governo brasileiro junto a uma fabricante sueca que previa transferência de conhecimento à Embraer e produção parcial em território nacional (Ipea, 2019).

Estratégias internacionais

Em 2024, os Estados Unidos anunciaram um investimento de US$ 20 bilhões para retomar, após três décadas, a produção doméstica de guindastes ship-to-shore gantry crane (STS), essenciais às operações portuárias. A iniciativa busca reduzir a dependência de fornecedores externos, hoje dominada por fabricantes chineses, e integrar política industrial e de defesa, reforçando a autonomia tecnológica e a segurança da cadeia logística.

Aplicado ao setor portuário, esse tipo de estratégia poderia acelerar o amadurecimento tecnológico e reduzir a dependência de equipamentos e sistemas importados de alto valor. Afinal, inovação não se limita à aquisição de novas máquinas, mas envolve também a capacidade de criar, adaptar e customizar soluções conforme as necessidades organizacionais.

Primeiro sandbox regulatório portuário

No campo regulatório, destaca-se o sandbox regulatório, mecanismo que permite que empresas testem inovações em um ambiente controlado, com supervisão do órgão público responsável (Antaq, no contexto portuário, e ANTT, nos transportes). Nele, empresas credenciadas podem testar inovações sem o risco de punição por descumprimento de normas infralegais, desde que respeitadas regras previamente estabelecidas. O objetivo é permitir testes controlados que apoiem a modernização das normas e a adoção de soluções inovadoras (Ariente, 2025).

Em 18/08/2025, a Antaq aprovou seu primeiro sandbox regulatório portuário, no âmbito do projeto “Outorga Verde”. A iniciativa permitirá que áreas ociosas em portos públicos sejam temporariamente concedidas para projetos sustentáveis, como geração de energia limpa, descarbonização e uso de tecnologias inovadoras de baixo impacto ambiental. Segundo a Agência, a medida busca reduzir a burocracia, ampliar a segurança jurídica e atrair investimentos verdes, alinhando a regulação portuária brasileira às tendências globais de transição energética e logística sustentável (Antaq, 2025).

Políticas institucionais e papel das autoridades portuárias

Neste contexto, as Autoridades Portuárias podem avançar no desenvolvimento de objetivos, estratégias e políticas internas de inovação, consolidando uma cultura organizacional alinhada às oportunidades previstas na Lei de Inovação. Essas políticas podem disciplinar temas como gestão da propriedade intelectual, critérios para aprovação de convênios com ICTs e empresas, participação em ambientes promotores de inovação (parques tecnológicos e incubadoras), incentivo ao empreendedorismo (fundos de investimento, capital social, compartilhamento de laboratórios) e a institucionalização de Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs).

A criação de uma Instituição de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT) pelos portos ampliaria ainda mais essas possibilidades, podendo captar recursos federais (via Finep), firmar Alianças Estratégicas (AEs) e prestar serviços técnicos com dispensa de licitação. Além disso, desempenharia papel central na profissionalização da gestão da propriedade intelectual, incluindo negociação e transferência de tecnologias, precificação de ativos, ofertas ativas a potenciais interessados e repasse de royalties a inventores. O NIT poderia coordenar iniciativas de empreendedorismo e integrar incubadoras e parques tecnológicos aos portos, aproximando pesquisa aplicada de seus desafios logísticos.

Atentos a essa nova realidade, alguns portos e autoridades do setor vêm implementando iniciativas para tornar a inovação parte estruturante de suas atividades:

Porto do Itaqui (Emap — Programa Porto do Futuro) (aqui e aqui)

Política de Inovação que busca transformar o porto em polo de conhecimento e tecnologia, em parceria com universidades, startups e órgãos de fomento. O programa organiza projetos em eixos como formação de capital humano, apoio à pesquisa aplicada, residência portuária e capacitação tecnológica, com foco em sustentabilidade, eficiência operacional e impacto socioeconômico regional.

Caravanas da Inovação Portuária (2025) (aqui)

Programa do MPOR em parceria com a Antq e o Hub Brasil Export, percorre seis portos brasileiros promovendo cultura de inovação, PD&I e fortalecimento institucional. Na edição de Salvador (maio/2025), reuniu representantes do setor para debater soluções de eficiência e sustentabilidade.

Política Nacional de Sustentabilidade (2025) (aqui)

Lançada pelo Ministério de Portos e Aeroportos, estabelece uma Agenda Anual para o setor público e o Pacto pela Sustentabilidade para o setor privado, estimulando práticas ESG, transparência e inclusão social.

Manifesto pela Inovação (2024) (aqui)

Documento lançado por Hidrovias do Brasil, Porto do Açu e Wilson Sons, que aponta quatro desafios estruturais do setor (baixa articulação, pouco incentivo ao risco, falta de planejamento estratégico e processos de contratação defasados) e propõe medidas em prol da modernização.

Norma da Autoridade Portuária (NAP Inovação — Porto de Santos) (aqui)

Publicada em setembro de 2023 pela Autoridade Portuária de Santos (APS), estabelece regras para parcerias com desenvolvedores, instituições de pesquisa e startups na criação de novos serviços e produtos. A medida integra a agenda de digitalização iniciada em 2019 e direciona o porto para o modelo de Porto 4.0. Seu objetivo é racionalizar investimentos, compartilhar soluções tecnológicas e ampliar a eficiência operacional, sob coordenação do recém-criado Comitê de Inovação da APS.

Inova Portos (aqui)

Criado em 2022 pela Portos do Paraná em parceria com a Antaq e o Ministério de Portos e Aeroportos, tornou-se o maior evento nacional dedicado à inovação portuária. Desde então, já foi realizado em diferentes portos (Itaqui, Santos, Itajaí e Paranaguá), sob gestão das respectivas autoridades e com apoio de governos estaduais, Universidades e startups. O evento reúne lideranças do setor, empresas, pesquisadores e estudantes para debater transformação digital, inteligência artificial, sustentabilidade e integração com ecossistemas de inovação, fortalecendo o diálogo entre atores públicos e privados na modernização da logística portuária.

Grupo de Trabalho de Políticas de Inovação (2025) (aqui)

Constituído em 2025 pela Geplo (Gerência de Planejamento Logístico da APS), com apoio técnico da Fundação Centro de Excelência Portuária (Cenep), o GT tem como missão identificar diretrizes e boas práticas para a política de inovação da APS, dialogando com especialistas do setor. Atua no contexto de dois programas estratégicos: o Programa de Inovação Aberta, que fomenta cooperação entre empresas, pesquisadores e instituições de ensino para acelerar a transformação digital; e o Programa de Incentivo à Pesquisa Aplicada, que oferece até 70 bolsas de pesquisa por 24 meses em áreas como logística, sustentabilidade e segurança portuária, garantindo acesso direto ao ambiente do porto e suporte acadêmico especializado.

Cultura de inovação perene

Essas experiências mostram que políticas internas bem estruturadas consolidam uma cultura de inovação estável, preservando avanços institucionais ao longo do tempo e de diferentes gestões. Como já analisado nesta coluna ao tratar da “BR do Mar”, incentivos isolados tendem a ter efeitos limitados quando não articulados a um projeto nacional consistente de infraestrutura e desenvolvimento (aqui).

As inovações podem surgir tanto da prática cotidiana quanto da pesquisa acadêmica; por isso, é essencial estimular a criatividade em todos os níveis. A legislação já permite conceder benefícios salariais adicionais (de 5% a ⅓ do valor obtido em caso de licenciamento), mecanismo que poderia ser incorporado pelas autoridades portuárias como incentivo aos melhoramentos contínuos.

A divulgação prévia dessas políticas, por sua vez, reforça a segurança dos gestores diante de órgãos de controle e favorece decisões mais ousadas em investimentos e projetos estratégicos. A busca constante por melhorias, além de proteger contra a obsolescência, cria uma dinâmica competitiva que impede os portos brasileiros de perder espaço para concorrentes nacionais e internacionais

Lições para o futuro

À luz desses exemplos e das experiências já em curso, é possível extrair algumas lições e recomendações gerais para fortalecer a inovação portuária no Brasil.

A competitividade comercial de qualquer país, seja na exportação de commodities, seja na de produtos de maior valor agregado, depende de uma infraestrutura portuária moderna e eficiente. Quando os portos são ineficientes, os custos aumentam para consumidores e empresas, prazos se alongam, a resiliência frente a choques ambientais diminui e o desenvolvimento econômico e social é retardado.

Por isso, o uso efetivo dos instrumentos jurídicos e econômicos disponíveis deve ser visto como indispensável para os terminais públicos e privados brasileiros. ecursos não reembolsáveis, assistência técnica e cooperação com universidades e empresas. Contudo, embora o setor portuário dialogue com missões da política industrial (transformação digital, bioeconomia e defesa), resta avaliar se os editais e programas contemplam adequadamente as especificidades do setor.

Cabe também às Autoridades Portuárias e órgãos reguladores reforçar sua atuação, incorporando cláusulas de investimento em P&D e compensação tecnológica (offset) nos contratos, além de políticas internas de inovação, propriedade intelectual, compras públicas e incentivo ao empreendedorismo. Essas medidas podem agilizar convênios, fortalecer práticas de inovação aberta e ampliar a cooperação com universidades, startups, órgãos governamentais e associações do setor.

Por fim, a adoção de sandboxes regulatórios desponta como importante ferramenta para testar soluções inovadoras em ambiente controlado e acelerar a modernização normativa. Somada à inclusão de cláusulas contratuais que assegurem investimentos em tecnologia e eficiência logística, essa agenda pode posicionar os portos brasileiros de forma mais competitiva e reduzir a dependência de soluções estrangeiras em um setor vital para a soberania e o desenvolvimento nacional.

A necessidade de integração entre instrumentos de fomento e políticas setoriais não é inédita. Como já observamos nesta coluna, medidas isoladas, ainda que bem-intencionadas, tendem a produzir efeitos limitados quando não articuladas a um projeto nacional consistente de infraestrutura e desenvolvimento.

Conclusão

Consolidar uma política portuária de inovação exige mais do que programas pontuais: requer o uso coordenado dos instrumentos jurídicos e econômicos já disponíveis, associado a cláusulas contratuais de P&D e mecanismos regulatórios modernos. A recente iniciativa da Antaq, com o sandbox da “Outorga Verde”, mostra que a regulação pode ir além da mera fiscalização e se tornar indutora de projetos sustentáveis e de investimentos estratégicos.

Se integradas a uma agenda consistente de competitividade, sustentabilidade e soberania tecnológica, essas medidas têm potencial para transformar os portos brasileiros de gargalos logísticos em vetores de desenvolvimento nacional.

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Justiça Penal precisa focar na macrocriminalidade

As estatísticas referentes à Justiça Criminal reforçam a ideia de que o melhor caminho a ser tomado é o da despenalização (substituição, legislativa ou judicial, da pena de prisão por sanções de outra natureza), sobretudo dos delitos de menor potencial ofensivo, para que o Poder Judiciário possa cuidar daquilo que realmente interessa, que é o combate aos crimes de grande repercussão social.

Essa foi a análise feita pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça, em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito, na qual a revista eletrônica Consultor Jurídico ouve alguns dos nomes mais importantes do Direito sobre as questões mais relevantes da atualidade.

Na visão do ministro, o Poder Judiciário tem processado um volume impressionante de casos criminais, dos quais uma parte significativa corresponde a processos de menor importância, o que acaba tornando o trabalho dos magistrados inviável.

“Nós chegamos a ter 109 milhões de processos no território brasileiro, numa população de 210, 215 milhões. Desse percentual, uma parte assustadora corre na esfera penal, o que, evidentemente, nos leva a ‘enxugar gelo’ ou trabalhar com aquilo que não é tão importante. Daí porque essas estatísticas reforçam que o caminho é a Justiça Penal negociada”, diz Fonseca.

Segundo o ministro, a aplicação dos institutos despenalizadores — como a transação penal, a suspensão condicional do processo e a composição civil — aos casos de menor gravidade ajuda a reduzir a superlotação dos presídios, ao evitar condenações ao regime fechado.

Além disso, diz o ministro, permite que casos de grande impacto na sociedade possam ser solucionados com mais rapidez.

“Nós temos o fenômeno da macrocriminalidade, que não pode ser esquecido, pois se não tratarmos disso, vai campear a impunidade”, disse Fonseca. “Temos que estimular a Justiça Penal negociada para evitar, inclusive, a prescrição dos processos na fase da investigação”, disse ele em conversa sobre o painel “Desafios atuais da Justiça Criminal”, durante o XIII Fórum de Lisboa, promovido em julho na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Clique aqui ou assista abaixo a entrevista:

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Comissão aprova projeto que impede liberar de punição crimes com violência doméstica

A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que proíbe aplicar regra do Código Penal que permite livrar da punição quem comete crimes com violência doméstica e familiar.

Essa regra, chamada escusa absolutória, impede que uma pessoa seja punida por crimes como furto ou estelionato quando comete o ato contra familiares próximos, como pais, filhos ou cônjuges — desde que não haja violência.

Conforme o Projeto de Lei 1000/23, do deputado Guilherme Uchoa (PSB-PE), a escusa não poderá ser aplicada quando o crime for cometido com violência ou grave ameaça, inclusive contra mulheres grávidas ou pessoas com deficiência intelectual, visual, auditiva ou com grave moléstia física.

O texto prevê ainda que as escusas absolutórias serão inaplicáveis no caso de crimes cometidos contra mulher grávida ou contra pessoa com deficiência intelectual, visual, auditiva ou com grave moléstia física.

Conforme o autor, a Lei Maria da Penha já estabelece que não poderá existir qualquer tipo de escusa quando o crime é praticado em situação de violência doméstica e familiar. O Código Penal, no entanto, ainda não é explícito e claro nesse sentido.

O relator, deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), afirmou que o projeto representa um avanço relevante na efetivação da igualdade de proteção legal e no “fortalecimento da rede de prevenção e responsabilização de abusos cometidos” contra pessoas com deficiência.

Próximos passos
A proposta ainda será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, e em seguida, pelo Plenário.

Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado.

Saiba mais sobre a tramitação de projetos de lei

Fonte: Câmara dos Deputados

Terceira Turma valida adoção póstuma e reconhece união estável incidentalmente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a possibilidade de adoção póstuma e validou, de forma incidental, a existência de união estável entre os adotantes exclusivamente para fins da ação de adoção. A decisão se deu em processo envolvendo uma criança entregue voluntariamente pela mãe biológica a um casal que, quando do pedido de adoção, declarou conviver em união estável por mais de três décadas.

Ao ajuizar ação com pedidos de adoção e desconstituição do poder familiar, o casal afirmou que a genitora entregou diretamente a criança aos seus cuidados quando tinha poucos meses de vida. O juízo negou os pedidos, levando em conta a retratação da mãe biológica e a burla ao cadastro de adoção, mas o casal recorreu.

Antes do julgamento do recurso, um dos pretensos adotantes faleceu. Ao final, o tribunal de segunda instância decretou a perda do poder familiar da mãe biológica, que novamente desistiu da criança, e deferiu o pedido de adoção ao casal. No STJ, herdeiros do adotante falecido interpuseram recursos sustentando, entre outras questões, a falta de demonstração de união estável para autorizar a adoção conjunta e o desrespeito ao cadastro nacional.

Adoção por conviventes demanda declaração da união estável e prova de estabilidade

Um dos principais pontos controvertidos foi a ausência de reconhecimento judicial formal da união estável entre os adotantes, levantada, em fase de apelação, por herdeiros do pretenso adotante após o seu falecimento.

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator, observou que, para a adoção conjunta, o artigo 42, parágrafo 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) exige casamento civil ou união estável dos adotantes e, ainda, a demonstração de estabilidade familiar – requisitos que são verificados por meio de documentação, entrevistas e estudo psicossocial durante o curso do processo de adoção. Segundo ele, a finalidade do referido dispositivo legal é garantir que o adotando seja inserido em um ambiente afetivo, estável e adequado à formação familiar – o que se confirmou no caso analisado.

O relator ponderou que, embora a ação de reconhecimento de união estável dos adotantes ainda estivesse pendente de julgamento, tal reconhecimento é possível de forma incidental na ação de adoção, apenas para os fins dessa demanda. De acordo com Cueva, a declaração de união estável feita pelos adotantes é presumida verdadeira e, com respaldo do estudo social e dos depoimentos das testemunhas, atende ao requisito da estabilidade familiar, autorizando a adoção conjunta.

Adoção póstuma exige manifestação inequívoca do falecido

Quanto à adoção póstuma, Villas Bôas Cueva considerou que havia manifestação inequívoca de vontade do falecido em adotar a criança, o que permite o deferimento da chamada adoção póstuma, conforme o artigo 42, parágrafo 6º, do ECA.

O ministro lembrou que o STJ já admitiu a adoção póstuma até mesmo em casos nos quais a ação de adoção nem havia sido iniciada, mas foi demonstrado de forma inequívoca que o falecido só não ajuizou o pedido por impedimento legal posteriormente revogado. Para Cueva, o artigo 42, parágrafo 6º, do ECA tem por finalidade destacar que a ausência da constituição do direito em vida não afasta sua procedência quando atendidos os demais requisitos legais.

Interesse do menor justifica deferimento de adoção que não observou ordem do cadastro

No caso dos autos, o relator explicou que, antes de receber a guarda da criança, o casal já havia iniciado o processo de habilitação no Cadastro Nacional de Adoção; contudo, a ordem dos casais que tinham precedência não foi respeitada.

Apesar de reconhecer a inobservância à ordem de precedência, o relator salientou que retirar a criança daquela família, após mais de 13 anos de convivência, causaria um grande prejuízo, principalmente a ela. “A ofensa ao procedimento ordinário de adoção representa violação de menor significância quando considerado o princípio do melhor interesse da criança”, declarou.

Com isso, os ministros negaram provimento aos recursos especiais interpostos por herdeiros do adotante, mantendo válida a adoção em favor do casal, inclusive em relação ao adotante falecido.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.  

Fonte: STJ

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Relicitação obrigatória de bens, serviços e obras

No dinâmico cenário das contratações públicas, com relativa frequência, ocorre a paralisia de processos licitatórios ou de contratos já celebrados, que se arrastam por anos, submergindo a expectativa inicial da contratação em incertezas.

Nesse contexto, a relicitação obrigatória emerge não como uma faculdade, mas como um imperativo legal inafastável, diante das circunstâncias fáticas e temporais que tornam a contratação original desvantajosa, desnecessária ou tecnicamente inviável.

Perda da vantajosidade e questões relacionadas ao decurso do tempo

Um processo licitatório ou contrato que permanece paralisado por período significativo, dependendo do objeto, um ano, dois anos ou mais, em grande parte dos casos, perde a sua aderência à realidade que o motivou. O decurso do tempo, por si só, é um fator corrosivo da vantajosidade inicial, alterando as condições de mercado, a evolução tecnológica, as diretrizes orçamentárias e as próprias necessidades da Administração Pública.

A atual Lei de Licitações e Contratos enfatiza a importância do planejamento estratégico e da gestão por resultados. Nota-se que o artigo 5º da lei, ao elencar tantos princípios, estabelece a busca pela vantajosidade, pela eficiência, pela economicidade e pelo interesse público como pilares inegociáveis. Se a contratação original, após longa paralisação, já não atende a esses princípios, sua manutenção ou o prosseguimento sob as condições pretéritas configura um desvirtuamento do mandamento legal, inviabilizando a via da contratação de remanescente com outra licitante.

O artigo 11, inciso I, da Lei nº 14.133/2021, estabelece como um dos objetivos do processo licitatório o de assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo de vida do objeto.

Quando o objeto originalmente licitado, por fatores supervenientes, não mais se alinha com o que seria mais vantajoso, a finalidade da licitação resta comprometida. O parágrafo único do artigo 11 ainda impõe à alta administração do órgão ou entidade a responsabilidade pela governança das contratações, exigindo a implementação de processos e estruturas, incluindo gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos, promover um ambiente íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações. Uma paralisação prolongada exige, portanto, uma reavaliação sob a ótica da governança.

Integrando tal perspectiva, o artigo 18 da mesma lei detalha minuciosamente a fase preparatória da licitação, caracterizada pelo planejamento. Exige-se compatibilidade com o plano de contratações anual (isso por força do artigo 12, inciso VII, da lei) e com as leis orçamentárias, bem como a abordagem de todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação.

No contexto dessa fase de planejamento, entre outras, essas balizas são essenciais:

1) a descrição da necessidade da contratação fundamentada em estudo técnico preliminar (ETP), que deve caracterizar o interesse público envolvido e a sua melhor solução, evidenciando o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação, o que inclui um levantamento de mercado e a justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar;
2) a definição do objeto por meio de termo de referência, anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo;
3) o orçamento estimado, com as composições de preços; e
4) a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual.

Assim, quando um projeto licitatório é concebido sob determinadas premissas e, por um hiato de um ou dois anos ou mais, as condições mercadológicas, técnicas ou operacionais se alteram drasticamente, a premissa fundamental do artigo 18 é violada.

O ETP original não mais reflete o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, e o levantamento de mercado está defasado, tornando o projeto original obsoleto e potencialmente prejudicial ao erário e ao interesse coletivo. O valor estimado da contratação, que deve ser compatível com os valores praticados pelo mercado e considerar contratações similares recentes (período de até um ano, em face do artigo 23, § 1º, inciso II), torna-se inexato, o que impacta a economicidade e a viabilidade econômico-financeira daquela futura contratação.

Obsolescência e inviabilidade em casos reais que levam à relicitação

A imposição da relicitação obrigatória decorre de uma avaliação pragmática e jurídica das consequências da inércia administrativa, de fatores externos incontroláveis ou da própria natureza de certos objetos contratuais.

Certos cenários emblemáticos exemplificam a necessidade de um novo certame.

A tecnologia da informação e comunicação, pois a dinâmica do setor de TIC é de constante e veloz inovação, sendo que os produtos de telecomunicações, por exemplo, podem se tornar obsoletos ou ter sua fabricação descontinuada em prazos curtos como de dois a três anos, equipamentos de TI (hardware), sistemas e softwares de segurança são constantemente atualizados, e a adesão a uma tecnologia defasada representa não só um risco à segurança dos dados e das operações, mas também uma evidente ineficiência e desvantagem tecnológica para a Administração, de modo que a relicitação será o caminho para o ente público buscar as soluções mais modernas, eficazes e seguras disponíveis no mercado, garantindo a seleção da proposta mais vantajosa para o ciclo de vida do objeto, dentro das diretrizes do artigo 11, inciso I, da Lei nº 14.133/21.

Obras de engenharia e infraestrutura, pois projetos de obras são muito suscetíveis a mudanças ao longo do tempo, sendo que uma obra que leve um ano para ser planejada e, em seguida, tenha dois anos de paralisação, pode ter suas necessidades estruturais completamente alteradas:

1) edificações podem ter significativos impactos, pois a capacidade de um prédio para comportar servidores públicos pode ser modificada por um novo concurso público, pela adoção generalizada do trabalho remoto, ou pela reestruturação de órgãos, equipamentos específicos de um projeto original podem se tornar incompatíveis com novas normas técnicas ou com a finalidade atual do empreendimento, ou mesmo serem descontinuados pelo mercado, o mesmo acontecendo com escolas e outras instalações públicas nas quais as situações de mudanças de demandas vão evidenciar que nem com eventuais alterações contratuais quantitativas e qualitativas se consegue resolver desafios supervenientes; e
2) infraestrutura, como as que envolvem aeroportos e rodovias, enfim, projetos de grande vulto, baseados em complexos estudos de demanda e viabilidade, que, pelo decurso de tempo com certas paralisações fazem com que demandas, como as de transporte possam não mais concretizar ou possam se elevar, prejudicando o que se tinha nas origens, do mesmo modo que certa rodovia planejada para determinado volume de tráfego pode se tornar superdimensionada ou subdimensionada, tornando o projeto original prejudicado, ineficaz ou economicamente inviável (embora esse tema tenha relação com sua legislação específica, de concessões e permissões, o “racional” será o mesmo).

Existem ainda bens e serviços específicos comuns a se exemplificar:

1) na área médico-hospitalar, equipamentos tendem a se tornarem defasados e alteração de protocolos pode tornar desnecessários certos itens, em razão da demanda de certo local, com alteração de unidades e quantidades de algo diferente, que venha a exigir uma relicitação, porque a avaliação de consumo e utilização prováveis (artigo 40, inciso III, da lei), podem mostrar ser inviável a convocação de remanescente ou a alteração contratual;
2) em segurança pública, equipamentos para as forças policiais podem se tornar obsoletos em poucos anos, comprometendo a eficácia das operações e a segurança da população e dos agentes;
3) frotas de veículos podem sofrer com mudanças de modelos do mercado, com transições de modais de transporte, mudanças na quantidade de servidores em atuação presencial ou novas demandas decorrentes de políticas de trabalho remoto ou de novas plataformas de serviço, de modo que, em certos casos, não adiantará sequer pensar nas condições que estavam consideradas ainda na licitação de origem;
4) serviços contínuos, mesmo quando se tem repactuação de preços admitida (nos termos do artigo 135 da lei), se a necessidade fundamental do serviço se altera ou o mercado se transforma radicalmente, a relicitação pode ser a única via para assegurar a vantajosidade.

Nessas e em outras situações, a insistência em manter as bases da licitação ou do contrato paralisado não apenas gera prejuízos financeiros, pela contratação de bens ou serviços inadequados ou mais caros que as opções atuais, também compromete a qualidade dos serviços públicos e a consecução do interesse coletivo.

Distinção relevante entre relicitação e contratação de remanescente

Os cenários de relicitação e de contratação de remanescente possuem nítidas diferenças.

A contratação de remanescente, prevista no artigo 90, § 7º, da Lei nº 14.133/2021, é uma ferramenta útil e eficiente para concluir uma obra, serviço ou fornecimento quando o contratado original falha ou o contrato é rescindido, desde que as condições originais permaneçam vantajosas e adequadas à Administração. A norma permite a convocação dos demais “licitantes classificados” para dar continuidade ao objeto.

No entanto, quando as condições técnicas, mercadológicas e de necessidade da administração se alteram fundamentalmente ao longo de certo período de tempo por uma suspensão específica, a contratação de remanescente, sob premissas desatualizadas e um projeto obsoleto, torna-se uma solução paliativa e, em muitos casos, economicamente irracional e juridicamente insustentável. Nesses casos, a Administração não estaria buscando a proposta de resultado mais vantajoso, do artigo 11, inciso I, da lei, nem agindo com eficiência e economicidade, também da mesma lei

A própria Lei nº 14.133/21 prevê cenários que levam à necessidade de uma nova licitação. O artigo 90, § 9º, da lei prevê que, se frustradas as providências para a contratação dos remanescentes (parágrafos 2º e 4º do mesmo artigo), o saldo de que trata o parágrafo oitavo poderá ser computado como efetiva disponibilidade para nova licitação, desde que identificada vantajosidade para a administração pública e mantido o objeto programado.

O dispositivo legal, ainda que condicione a manutenção do “objeto programado”, abre a porta para uma nova licitação (relicitação) quando as opções de continuidade se mostram inviáveis ou desvantajosas, reforçando que a aferição da vantajosidade é premissa para a decisão. A vantajosidade aqui não se restringe ao preço, mas engloba todas as dimensões do interesse público e do ciclo de vida do objeto.

De outro lado, o artigo 147 da lei oferece um arcabouço jurídico para a decisão sobre a continuidade ou a declaração de nulidade/suspensão de um contrato em caso de irregularidade, quando o saneamento não for possível. O legislador, ciente dos custos associados à paralisação e à eventual necessidade de reiniciar um processo, exige uma avaliação ponderada do interesse público, considerando diversos aspectos, entre os quais, os impactos econômicos e financeiros decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato, os riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato, o custo da deterioração ou da perda das parcelas executadas, a despesa inerente à desmobilização e ao posterior retorno às atividades, o custo para realização de nova licitação ou celebração de novo contrato e o custo de oportunidade do capital durante o período de paralisação.

Convém notar que, segundo o parágrafo único do artigo 147 da lei, esse conjunto de balizas não deve ser avaliado apenas em situações de anulação de contrato, mas paralisação, também, o que atrai a matéria para a discussão ora tratada. Será feito o questionamento, enfim, sobre ser a manutenção do contrato original ou a relicitação.

Por fim, uma hipótese bem peculiar de relicitação está plantada no artigo 148, § 2º, da lei, que se reporta a alguma nulidade no contrato, havendo, então, permissão de que se mantenha um contrato anterior pelo tempo suficiente para efetuar nova contratação, o que deve ser resolvido no prazo de até seis meses, prorrogável uma única vez.

Conclusão

A relicitação obrigatória tende a ser mecanismo essencial de salvaguarda do interesse público, da economicidade e da correta aplicação dos recursos públicos, conforme a sistemática da Lei nº 14.133/2021. Em face de paralisações prolongadas que resultem na perda da vantajosidade técnica, mercadológica, econômica ou operacional do objeto originalmente licitado, a Administração tem o inafastável dever de reavaliar as condições e, constatada a obsolescência ou a inviabilidade superveniente, proceder à realização de um novo certame.

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Cláusula de não-concorrência sem limite de tempo é anulável, diz STJ

A cláusula de não-concorrência sem limitação temporal é inválida e anulável. Isso implica na existência de um pedido expresso e de uma sentença, o que afasta que seja feita de ofício pelo juiz da causa.

A conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial de uma particular para reformar sentença que reconheceu, de ofício, a nulidade da cláusula.

O caso é de duas ex-sócias que tinham lojas de roupas infantis no mesmo prédio, uma de frente para a outra. Quando a sociedade foi encerrada, elas decidiram que cada loja ficaria para uma delas, com determinações específicas.

Essas regras foram definidas por meio de cláusula de não-concorrência em um instrumento particular assinado por ambas. Uma das lojas só venderia roupas para crianças até quatro anos e a outra, a partir dessa idade.

Quando uma delas descumpriu o combinado, a outra ajuizou a ação para cobrar indenização por perdas e danos. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina afastou a punição por entender que a cláusula é nula por não ter qualquer limitação temporal.

Cláusula de não-concorrência eterna

Relatora do recurso especial, a ministra Nancy Andrighi explicou que, de fato, cláusulas de não-concorrência não podem ser estabelecidas de forma ilimitada, sem restrições. Quando são feitas assim, não podem produzir efeitos.

O caso, no entanto, é de anulabilidade e não de nulidade. A diferenciação existe porque a invalidade do negócio afeta interesses privados e pode ser sanada. Portanto, a cláusula pode ser anulada a pedido das partes.

Já a nulidade poderia ser reconhecida se houvesse violação de normas de ordem pública. Nesses casos, o vício não pode ser corrigido ou confirmado. O juiz tem o poder de definir a nulidade de ofício, sem pedido expresso.

“Na vedação à cláusula de não-concorrência sem limitação temporal, embora se reconheça haver interesse social na preservação da livre concorrência e da livre iniciativa, o que se protege é a ordem privada”, disse a ministra.

Sendo anulável, a ausência de limitação da cláusula de não-concorrência pode ser sanada, não tem efeito antes de ser alvo de sentença, deve ser alegada pelos interessados e não pode ser reconhecida de ofício

Dentre as normas do Código Civil que sustentam essa interpretação está a do artigo 177, que diz que “a anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício”.

“Portanto, diante da ausência de pedido e contraditório acerca da ausência de limitação temporal na cláusula de não-concorrência, deve ser afastada a nulidade decretada de ofício”, concluiu a relatora.

Clique aqui para ler o acórdão
REsp 2.185.015

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Juiz multa construtora por litigância de má-fé em ação de execução

O juiz Rodrigo de Melo Brustolin, da 30ª Vara Cível de Goiânia, multou uma construtora em 10% do valor da causa de uma ação de execução por litigância de má-fé. 

Magistrado reconheceu má-fé de construtora em ação de execução e multou a empresa em 10% do valor atualizado da causa

Conforme os autos, a construtora sofreu ação de execução de título executivo e foi deferida penhora em favor do credor dos créditos de um contrato firmado entre a devedora e a prefeitura de Petrolina de Goiás. 

A construtora interpôs agravo de instrumento contra a penhora. O recurso foi conhecido parcialmente e limitou o desconto em favor do credor a 30% das parcelas pagas do contrato firmado com a prefeitura. 

O primeiro pagamento ocorreu com a penhora de 30% como previsto. A segunda parcela, contudo, foi paga integralmente à construtora por erro administrativo da prefeitura. 

A devedora se recusou a fazer o depósito dos 30% previstos. O credor solicitou então nova penhora via Sisbajud, a expedição de novas cartas de citação e a inclusão do nome da empresa executada no Serasajud. 

Posteriormente, os representantes do credor constataram que o contrato dado como garantia na execução havia sido abandonado e as obras paralisadas. Diante disso, pediu a condenação da construtora por litigância de má-fé. 

Ao analisar o pedido, o magistrado acolheu os argumentos dos credores e multou a construtora em 10% sobre o valor atualizado da causa. “Em vistas das reiteradas insurgências da executada e visando evitar futuros embaraços, advirto-a que a tentativa de rediscutir matérias já decididas de maneira fundamentada por este Juízo poderão ensejar a aplicação de nova penalidade”, resumiu o juiz. 

Atuou em favor do credor o escritório STG Advogados

Clique aqui para ler a decisão
Processo 5095320-07.2023.8.09.0051

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Prazo de cinco dias para pagar dívida fiduciária começa na execução da liminar de busca e apreensão

Para o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, o entendimento fixado em recurso repetitivo – que já vinha sendo aplicado pelo STJ – confere mais segurança jurídica e rapidez ao procedimento.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.279), definiu que, “nas ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, o prazo de cinco dias para pagamento da integralidade da dívida, previsto no artigo 3º, parágrafo 1º, do Decreto-Lei 911/1969, começa a fluir a partir da data da execução da medida liminar”.

Com a fixação da tese, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera do precedente qualificado. O entendimento deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.

Participaram do julgamento, como amicus curiae, o Centro de Estudos Avançados de Processo (Ceapro) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

A tese coloca fim às divergências sobre o marco inicial do prazo para a purgação da mora após a apreensão. O relator dos recursos repetitivos, ministro Antonio Carlos Ferreira, ressaltou que o STJ já vem adotando o entendimento de que a contagem do prazo deve começar na data da execução da liminar. Ele destacou que essa leitura do dispositivo legal confere mais segurança jurídica e rapidez ao procedimento.

Solução da aparente antinomia normativa está no princípio da especialidade

O ministro ressaltou que a redação original do parágrafo 1º do artigo 3º do Decreto-Lei 911/1969 estabelecia que, “despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já tiver pago 40% do preço financiado, requerer a purgação da mora”. Para o relator, esse modelo deixava claro que a citação ocorria apenas após a execução da liminar, e o prazo de defesa era regido pela regra geral do Código de Processo Civil (CPC), com início a partir da juntada do mandado de citação aos autos.

Entretanto, segundo Antonio Carlos Ferreira, a Lei 10.931/2004 estabeleceu que, no prazo de cinco dias após a execução da liminar, a propriedade e a posse do bem seriam consolidadas em favor do credor. “O rito atualmente previsto pela lei, visando conferir efetividade à garantia fiduciária, determina que haverá possibilidade de o devedor pagar a integralidade do débito nos cinco dias que se seguirem à execução da liminar, com apreensão do bem e entrega ao credor. Em assim procedendo, o bem lhe será restituído livre de ônus, como determina o parágrafo 2º do mesmo dispositivo legal”, afirmou.

De acordo com o magistrado, esse regime jurídico configura norma especial em relação ao artigo 230 do CPC, prevalecendo em razão do princípio da especialidade. O ministro ressaltou que essa interpretação é reforçada pela determinação expressa de aplicação apenas supletiva das normas gerais do CPC, prevista no artigo 231, e somente quando houver compatibilidade.

O relator acrescentou que a norma especial se sobrepõe justamente por conter elementos mais específicos, afastando a incidência da regra geral nos pontos de incompatibilidade. “A aparente incompatibilidade normativa soluciona-se pela aplicação da norma que contém elementos especializantes, subtraindo do espectro normativo da norma geral a aplicação em virtude de determinados critérios que são especiais”, registrou.

Fonte: STJ

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