O Projeto de Lei 03/2024 e a (in)eficiência do processo falimentar

Decorridos três anos da última reforma da legislação de insolvência de empresas (Lei 14.112/20), a comunidade jurídica foi surpreendida, logo no início do ano, com um novo projeto de lei cujo objetivo é, a princípio, aumentar a eficiência do processo falimentar. Salvo melhor juízo, esse também era um dos objetivos da reforma anterior e da própria Lei 11.101/05.

Dentre as inúmeras alterações sugeridas, as principais são a criação do gestor fiduciário e o plano de falência.

O primeiro seria, segundo se compreende do projeto de lei e das explicações que vem sendo trazidas a público, um administrador judicial, mas eleito pelos credores por maioria de votos na forma proposta. Segundo afirmado, terão a mesma função. Ou seja, a reforma parte do pressuposto, a nosso ver incorreto, que os juízes não sabem nomear o administrador judicial ou que o fazem com o objetivo de prejudicar os credores.

O segundo seria a elaboração e apresentação pelo administrador judicial ou pelo gestor fiduciário de um plano de realização dos ativos de modo a permitir que os credores recebam seus créditos ou o equivalente a eles no menor tempo possível. Salvo melhor juízo, já existe essa previsão na lei dentre as incumbências (artigo 99, parágrafo 3º, combinado com o artigo 22, I e III) e a distinção está no fato de que será aprovado tácita ou expressamente pelos credores.

Críticas
Tão logo veio a público, diversas críticas foram lançadas ao mesmo. Algumas questionando a oportunidade e utilidade da reforma, outras o próprio texto do projeto.

No tocante a oportunidade e utilidade, de fato, a questão chama a atenção. A legislação foi reformada em 2020, conforme já explanado, sendo que alguns dos dispositivos legais somente entraram em vigor no primeiro mês deste ano. Deve ser ressaltado que a reforma anterior se originou de amplo debate que envolveu os principais operadores da área que puderam opinar e apresentar sugestões por meio de inúmeras reuniões de trabalho por todo o território nacional.

Parece claro que uma lei que conta com três anos de vigência e alguns de seus mais importantes pontos somente se tornaram aplicáveis há menos de um mês não possa ser criticada, sendo prematura a afirmação de que não teria atingido seus objetivos. Do mesmo modo, apresentar dados estatístico a respeito da eficiência do processo falimentar coletados antes mesmo da entrada em vigor da reforma não nos parece cientificamente correto.

Aliás, os operadores são unânimes em afirmar que a reforma agilizou o processo falimentar e os obstáculos hoje enfrentados, sob a ótica processual, nos parecem relacionados ao sistema recursal geral e não a norma especializada. Dentre esses problemas destacam-se os efeitos suspensivos a recursos que em regra não o tem.

A verdade é que a lei depende de tempo de maturação para que o entendimento doutrinário e jurisprudencial se estabilize e três anos, pela experiência comum, não pode ser considerado tempo suficiente.  Prova disso é que pouquíssimos pontos acerca da recente reforma já foram debatidos e julgados no Superior Tribunal de Justiça e, para um sistema que almeja segurança jurídica, a constante alteração do texto legal não parece uma alternativa adequada.

Mais do que isso, existe no Brasil uma certa tendência a acreditar que reformas legislativas tem o condão de resolver todos os problemas, o que muitas vezes não é verdade.  As leis existem muitas vezes, mas não são adequadamente aplicadas ou alguns problemas simplesmente não possuem solução e nós temos que conviver com essa realidade.

De fato, é comum nos depararmos com a seguinte afirmação: o processo falimentar tem baixo índice de satisfação do crédito dos credores. E a partir daí inúmeras soluções e caminhos são apresentados. No entanto, na maior parte das hipóteses, com todo o respeito, isso ocorre não porque a lei não existe ou é mal aplicada, mas porque os credores fizeram maus negócios (forneceram ou emprestaram assumindo riscos não calculados adequadamente).

Ou seja, a primeira conclusão é que, de fato, os argumentos trazidos até este momento não são e convincentes em torno da real necessidade e eficácia de uma nova reforma e se ela terá o condão de alterar o patamar de eficácia do processo falimentar. Aliás, um dos argumentos é que o projeto trazido a luz trata de temas que não foram objeto da reforma anterior. Isso é parcialmente verdade, todavia, a insegurança que as reformas legislativas trazem ao mercado, devem ser sopesadas.

Em relação aos aspectos técnicos da nova lei, diversas são as críticas em torno da sua redação.

Como o texto do projeto, ao contrário do anterior, não foi objeto de debate prévio pela comunidade jurídica, este deverá se desenvolver no decorrer do processo legislativo, cabendo evidentemente as Casas Legislativas verificar se existe realmente necessidade de alterar a legislação e, superada essa fase, debater e corrigir eventuais distorções. Para isso, essencial a retirada do regime de urgência.

Reflexões
Algumas reflexões devem ser desde logo feitas de modo a provocar o debate.

Neste primeiro artigo sobre o tema trago duas questões que geram em nosso entender preocupação.

O primeiro gira em torno do papel do falido no processo falimentar e seus direitos.

É interessante notar que, desde a entrada vigor da lei 11.101/05, nos deparamos com afirmações no sentido de que o falido não pode ser tratado como um pária da sociedade.  Aliás, seja a lei original, seja a resultante da última reforma, buscam a reabilitação do falido no menor espaço de tempo, de modo a permitir que volte a empreender. Outra prova disso é o fato dos crimes falimentares, a nosso ver de forma absolutamente equivocada, tem sido relegado a um segundo plano, quase institutos em extinção.

Nesse sentido, embora não seja comum, o fato é que, após o pagamento de todos os credores, os ativos remanescentes devem ser devolvidos ao falido. Não existe no nosso sistema uma pena de perdimento no processo falimentar e o projeto expressamente não o prevê.

Todavia, chama a atenção no projeto de lei, o fato de que o falido é absolutamente afastado da discussão em torno do plano de falência e o texto não regula como ele poderá evitar que todos seus ativos sejam liquidados ou transferidos aos credores ainda que seu valor seja superior a integralidade dos débitos. Ao contrário, a lei não trata da possibilidade do falido impugnar o plano de falência (tem voz, a princípio, mas sem qualquer efeito prático).

Ou seja, ao que tudo indica, a legislação passa a adotar dois regramentos que, salvo melhor juízo, se contrapõe: o falido deve ser reabilitado rapidamente, mas deve se reerguer do nada.

O segundo refere-se ao gestor fiduciário que, segundo já esclarecido, nada mais é do que um administrador judicial eleito pelos credores.

Em sendo assim, algumas regras, em nosso entender, devem constar expressamente no texto de lei de modo a evitar futuras discussões.

Do mesmo modo que o administrador judicial, o limite de sua remuneração e de seus auxiliares deve ser 5%. Com efeito, se o objetivo da lei é aumentar a eficiência do processo falimentar, não nos parece lógico permitir que as despesas com a massa sangrem os ativos, questão aliás que, desde o decreto lei, é apresentada com uma das causas do não ressarcimento adequado dos credores. Se não for assim, por uma questão de igualdade, deve ser admitido que o administrador judicial (caso não seja eleito o gestor fiduciário) ao elaborar o plano de falência proponha que sua remuneração seja superior aos 5% previstos em lei e, se não houver impugnação na forma proposta pelo projeto ou for aprovado pela assembleia de credores, seja homologada pelo juiz.

Outro ponto que merece atenção nos parece a relação existente entre os sujeitos do processo e as regras que envolvem imparcialidade e transparência. Muitas regras foram criadas em torno dos critérios de nomeação dos administradores judiciais (número de nomeações, relações com os juízes, entre outras) e devem ser estendidas aos gestores fiduciários somente que agora a partir da relação deste com os credores.

A atuação dos gestores fiduciários deve se submeter a regras assemelhadas a dos administradores judiciais que envolvem a sua imparcialidade e o dever de revelação em respeito a transparência do processo falimentar. Assim, não poderão os gestores fiduciários, em nosso entender, prestar serviços por si ou por meio do grupo econômico ou jurídico de que fazem parte aos credores que o elegeram ainda que em outros processos ou áreas, como, por exemplo, consultoria.

De igual forma, acredito ser hipótese de suspeição, a atuação do gestor fiduciário nas habilitações e impugnações de crédito que envolvam os direitos dos credores que o elegeram. Assim, deverá a lei prever uma espécie de “administrador Judicial” ou “gestor ad hoc” para esses casos.

Outro ponto que merece maior reflexão para evitar discussões futuras é a seguinte sequência lógica. O credor elege o gestor fiduciário; o gestor faz o plano de trabalho; o plano de trabalho prevê a dação em pagamento de ativos para o credor que elegeu o gestor; e o credor que elegeu o gestor é que não impugna ou aprova seu plano de trabalho. Essa “simbiose” pode nos levar a crer que alguns credores poderão conduzir a escolha do gestor fiduciário para que este atue em benefício de quem o elege e não da coletividade de credores.

Aliás, desde a entrada em vigor da Lei 11.102/05, as atribuições do administrador judicial aumentaram substancialmente. Na prática, é um auxiliar do Juízo que substitui não somente parte da atividade cartorial, como emite pareceres em questões relevantes. O pressuposto desse aumento de funções é a confiança do Juízo no administrador judicial que ele nomeou. Parece difícil considerar produtivo e eficiente um sistema em que o Juízo seja obrigado a confiar nas atividades de quem ele sequer muitas vezes conhece. Neste ponto, o agente fiduciário, salvo melhor juízo, poderá provocar um retardamento do processo.

Responsabilidade
Outro ponto também que deve ficar claro é a questão da responsabilidade. Evidente que a atuação do gestor fiduciário, da mesma forma que o administrador judicial, pode causar danos. E, nos limites da legislação em vigor, os danos devem ser ressarcidos. No caso do administrador judicial, escolhido pelo magistrado, nos limites da legislação vigente, a responsabilidade subsidiária pode recair no próprio Estado.

Evidente também que essa regra não se aplica ao gestor fiduciário, não podendo o Estado responder pelos danos que aqueles causou, vez que sua indicação não partiu de seu agente, mas sim da vontade da maioria dos credores; neste caso, a responsabilidade subsidiária deverá ser daqueles que o elegeram, cabendo a legislação falimentar regular a matéria, caso contrário, deverão ser aplicadas as regras gerais do Código Civil, não podendo ser a mesma excluída pelo plano de falência, por razões óbvias.

A verdade é que, sem entrar, por enquanto, no mérito se deve ser levada adiante a reforma legislativa é imprescindível que os novos institutos sejam debatidos antes da aprovação do texto legislativo, pois, caso contrário, a insegurança jurídica somente prejudicará as partes do processo de insolvência e a eficiência almejada na venda ou dação dos ativos, seja abatida pela ineficiência no desenvolvimento do processo.

Fonte: Consultor Jurídico 

Projeto busca agilizar investigação de crime contra a vida de criança e adolescente

O Projeto de Lei 6234/23, do Poder Executivo, estabelece medidas para agilizar a investigação de crimes contra a vida de crianças e adolescentes. Pelo texto, inquéritos policiais de homicídio, feminicídio, roubo seguido de morte e outros crimes relacionados deverão ter identificada a tramitação diferenciada com a expressão “Prioridade – Vítima criança ou adolescente”.

A proposta garante à vítima, a partir de seu representante legal (pais ou responsáveis), e a familiares acesso à documentação para acompanhar o trabalho policial. Familiares da vítima, mesmo fora do processo, poderão ser ouvidos e apresentar informações e provas. Em todos os momentos do processo a criança ou o adolescente ou familiares deverão ser acompanhados de advogado ou defensor público.

A justificativa, assinada pelo agora ex-ministro da Justiça Flávio Dino, cita que o tempo médio de tramitação de inquérito em crimes letais contra crianças e adolescentes no Rio de Janeiro é de 7 anos e 5 meses. “O longo tempo de tramitação da investigação e do julgamento propiciam um quadro sistêmico de violação de direitos, há vitimização secundária da criança e de seus familiares pela ineficiência dos mecanismos de responsabilização”, afirma Dino.

O Brasil registrou 3.717 mortes violentas intencionais de crianças e adolescentes, entre homicídios, feminicídios e latrocínio, segundo dados de 2019 a 2021 do Anuário Brasileiro da Segurança Pública.

O projeto insere as novas regras na Lei 13.431/17, que estabelece o sistema de garantias de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, e na Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (Lei 13.675/18).

Fonte: Agência da Câmara dos Deputados

O que o advogado precisa saber para participar das sessões presenciais e virtuais

Com a reabertura do ano forense, nesta semana, as turmas, as seções e a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomam os julgamentos dos processos. Voltam, também, as dúvidas – comuns a muitos operadores do direito – sobre como pedir preferência ou fazer sustentação oral nas sessões do tribunal, que se dividem em presenciais e virtuais.

Como fazer sustentação oral nas sessões virtuais

No plenário virtual do STJ, são julgados apenas os chamados recursos internos, ou incidentais: embargos de declaração, agravos internos e agravos regimentais.

Implementado em 2018, o plenário virtual ainda gera muitos questionamentos por parte dos advogados que têm processos tramitando na corte. Nesse tipo de julgamento, os ministros não se encontram pessoalmente; a sessão dura sete dias corridos, prazo que os magistrados têm para analisar a matéria em discussão e apresentar seus votos por escrito em um sistema eletrônico. Só depois do término da sessão, que ocorre às 23h59 do último dia, o resultado do julgamento é divulgado. A fase correspondente é lançada no andamento processual no primeiro dia útil seguinte ao encerramento da sessão.

Não há como as partes e seus patronos acompanharem as sessões virtuais pela plataforma eletrônica, podendo ser observada apenas a fase em que se encontra o processo. Também não há previsão de pedido de preferência de julgamento, porque, salvo os retirados de pauta, todos os processos serão julgados.

Por outro lado, é permitida a sustentação oral, em vídeo ou áudio, nos agravos internos e agravos regimentais, nas hipóteses previstas no artigo 7º, parágrafo 2º-B, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia). Diferentemente do que acontece nas sessões presenciais, a sustentação oral na sessão virtual deve ser gravada e enviada com antecedência.

Ao gravar o arquivo de sustentação oral (não é possível fazê-lo na própria plataforma da sessão virtual), o profissional deve respeitar o formato e o tamanho máximo permitido, conforme a modalidade: para áudio, MP3 com no máximo 10MB; para vídeo, MP4 com no máximo 250MB. Uma vez gravado, o arquivo deve ser enviado por meio deste link, até 48 horas antes do início do julgamento. Após o prazo, o sistema é fechado para a remessa de sustentações orais.

Como pedir sustentação oral ou preferência nas sessões presenciais

Nas sessões presenciais, são julgadas todas as classes processuais. As fases com os resultados dos julgamentos ficam disponíveis, geralmente, no mesmo dia ou no dia seguinte. As sessões são transmitidas pelo canal do STJ no YouTube.

Durante a pandemia da Covid-19, o tribunal teve de suspender as sessões presenciais e adotar os julgamentos colegiados telepresenciais, por meio de videoconferência. As sessões por vídeo funcionaram praticamente como as presenciais, só que à distância, e os representantes das partes também podiam fazer sustentação oral de forma remota.

Com o fim da pandemia, o STJ retomou as sessões presenciais, mas foi mantida a possibilidade de participação dos advogados por videoconferência. Diferentemente das sessões virtuais, em que o arquivo da sustentação oral gravada deve ser enviado previamente, nas presenciais o advogado pode fazer sua sustentação na tribuna ou por vídeo, mas sempre ao vivo.

As solicitações de sustentação oral (para participação presencial na hora do julgamento) ou de preferência, com ou sem esclarecimento de fato, podem ser feitas por meio do formulário disponível no portal do STJ e devem ser confirmadas na sala de sessões com pelo menos 30 minutos de antecedência do início da sessão. Também é possível fazer o pedido presencialmente na sala de sessões, até 30 minutos antes do início dos julgamentos (as sessões começam normalmente às 14h, mas os horários estão sujeitos a alteração e devem ser conferidos no Calendário de Sessões).

Pedido de sustentação por vídeo deve ser feito até 24 horas antes da sessão presencial

Já os advogados que optarem por fazer sustentação oral ou esclarecimento de fato por videoconferência devem formalizar o pedido pelo mesmo link de inscrição, até 24 horas antes da sessão presencial. A participação é pelo aplicativo Zoom, e o link de acesso é enviado ao e-mail fornecido no pedido de manifestação.

Para fazer sustentação oral ou esclarecimento de fato por vídeo na sessão presencial, os advogados não são obrigados a usar beca, mas é exigido terno completo com gravata. Já os patronos que vierem à sede do STJ para sustentar presencialmente deverão usar beca sempre que ocuparem a tribuna. Todos os colegiados do tribunal colocam becas à disposição dos operadores do direito.

Requisitos de tecnologia para sustentar oralmente

Se a opção for pela sustentação oral por videoconferência na sessão presencial, é recomendado que seja utilizada uma rede cabeada em vez do Wi-Fi, pois a conexão por cabos é menos sujeita a interferências.

Caso o advogado precise participar da sessão por dispositivo móvel, é necessário que a rede Wi-Fi seja segura, privada e não pública. O advogado pode ainda utilizar o sinal de 4G ou 5G de sua operadora de celular, contudo, o sinal deve ter alta estabilidade.

Com relação ao sistema operacional, os computadores devem possuir Windows 10 (genuíno) ou superior; ou MacOS 10.10 ou superior. Já dispositivos móveis devem ter sistemas Android versão 6 ou superior; ou Apple com IOS versão 10 ou superior.

Fonte: STJ

Natureza e objeto das convenções processuais

O processo judicial reclama, em homenagem a um elementar postulado de segurança jurídica, respeito a uma série de garantias das partes (due process of law em senso processual), cuja observância se faz incompatível com a precipitação.

Para tanto, afirma-se correntemente que os direitos subjetivos dos cidadãos devem ser providos da máxima garantia social, com o mínimo sacrifício da liberdade individual, e, ainda, com o menor dispêndio de tempo e energia.

Respeito amplo ao contraditório
Ressalta, nessa ordem de ideias, Teresa Sapiro Anselmo Vaz, que a grande equação que se impõe nos dias atuais ao processualista reside, essencialmente, em conciliar esses valores e todas as consequências que deles advêm, com a obtenção de decisão que represente uma composição do litígio consonante com a verdade, e em que se respeite amplamente o regramento do contraditório e todas as garantias de defesa, pois só assim se logrará uma decisão acertada nos lindes de um processo justo (Novas Tendências do Processo Civil no Âmbito do Processo Declarativo Comum (alguns aspectos), Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, 55, 1995 :925).

Desse modo, o esforço para harmonizar as garantias processuais com boa técnica de tutela substancial tem desafiado as leis dos mais diferentes sistemas jurídicos.

Tradicionalmente, a legislação processual desenha um determinado procedimento, cujas regras, em princípio, sempre foram concebidas como cogentes, não podendo ser alteradas pelos protagonistas do processo, vale dizer, nem pelo juiz e muito menos pelos litigantes.

Possibilidade de autocomposição
Esta premissa, contudo, jamais impediu que, no plano do direito material, as partes pudessem (como podem) por fim à controvérsia, mesmo depois de judicializada a pendência entre elas existente, por meio de inúmeros expedientes, entre eles, e. g., a transação judicial ou, mesmo, extrajudicial.

Nesse sentido, procurando infundir a cultura da pacificação entre os protagonistas do processo, o vigente Código de Processo Civil, em inúmeros preceitos, sugere a autocomposição. Dispõe, com efeito, o parágrafo 2º do artigo 3º que: “O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos”. Dada a evidente relevância social da administração da justiça, os Poderes constituídos devem mesmo empenhar-se na organização de instituições capacitadas a mediar conflitos entre os cidadãos. No Brasil, o Ministério da Justiça preocupa-se em fornecer os meios necessários a várias organizações não-governamentais, que têm como missão precípua a instalação e gestão de sistemas alternativos de administração de controvérsias.

Aduza-se que o próprio diploma processual em vigor, comprometido com o sistema “multiportas” de solução dos litígios, de forma muito original, fomenta, no artigo 174, a criação, pela União, estados, Distrito Federal e pelos municípios, de câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo.

Além destas importantes iniciativas, que seguem tendência mundial, o parágrafo 3º do artigo 3º recomenda de modo expresso a solução amigável (autocomposição), que deverá ser implementada, na medida do possível e inclusive no curso do processo, “por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público”.

Assim, uma vez passível de composição suasória o direito questionado, as partes, transigindo, podem celebrar acordos acerca do objeto litigioso, circunstância implicativa da extinção do processo, pela sua inarredável inutilidade superveniente.

Efeito processual e homologação
Encerrada a desavença no plano do direito substancial em decorrência do negócio jurídico consubstanciado na transação (efeito material), aflora, de forma inexorável, o seu efeito processual, que é, consequentemente, o de determinar a prolação de sentença homologatória, como se o próprio mérito tivesse sido examinado pelo órgão jurisdicional.

Bem é de ver que, judicial ou extrajudicial a transação, a sua eficácia se subordina à homologação judicial. É, pois, pela homologação que “o negócio jurídico se processualiza”.

Deve ter-se presente, nesse particular, que as convenções sobre os atos procedimentais têm natureza estritamente processual, não se confundindo com os negócios propriamente ditos, que ocorrem incidentalmente no âmbito do processo e que têm por objeto o próprio direito litigioso.

As duas espécies de negócio jurídico processual
Essa faculdade de as partes celebrarem tais convenções, em particular, durante a tramitação do processo, tem sido destacada na atual literatura processual europeia, sobretudo, em dois livros que foram recentemente publicados: Guillermo Schumann Barragán, Derecho a la Tutela Judicial Efectiva y Autonomia de la Voluntad: los Contratos Procesales (Madrid, Marcial Pons, 2022); e a coletânea coordenada por Anna Nylund e Antonio Cabral, Contractualisation of Civil Litigation (Cambridge, Intersentia, 2023).

Diante de tais premissas, sob o aspecto dogmático, o gênero negócio jurídico processual pode ser classificado nas seguintes espécies: a) negócio jurídico processual (stricto sensu), aquele que tem por objeto o direito substancial; e b) convenção processual, que concerne a acordos entre as partes sobre matéria estritamente processual.

As convenções almejam, pois, alterar a sequência programada dos atos processuais prevista pela lei, mas desde que não interfiram em seus efeitos. Enquanto há disponibilidade no modo de aperfeiçoamento dos atos do procedimento, a sua eficácia descortina-se indisponível, ainda que o objeto do litígio admita autocomposição.

Trilhando esse mesmo raciocínio, frisa Cândido Dinamarco que a escolha voluntária para regrar o procedimento não vai além de se direcionar em um ou outro sentido, sem liberdade, contudo, para construir o conteúdo específico de cada um dos atos. Os seus respectivos efeitos são sempre os que resultam da lei e não da vontade das partes (Instituições de direito processual civil, vol. 2, 4ª ed., São Paulo, Malheiros, 2004, pág. 471).

Daí porque é vetado às partes, por exemplo, estabelecerem que não se aplica a presunção de veracidade se algum fato não for contestado pelo réu, ou, ainda, atribuir peso/valor a determinada prova em relação a outro meio probatório.

O artigo 190 do CPC
Pois bem, dentre as novidades inseridas no vigente Código de Processo Civil brasileiro destaca-se aquela contemplada no caput do artigo 190, que tem a seguinte redação: “Versando o processo sobre direitos que admitem autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo”.

Ademais, o subsequente artigo 191, dispõe sobre a possibilidade de o juiz em conjunto com as partes fixarem, de comum acordo, calendário para a prática dos atos do procedimento.

É certo que as convenções de natureza processual já existiam em nosso sistema processual (dispensa de audiência, suspensão do processo, distribuição do ônus da prova, critério para a entrega de memoriais, adiamento de julgamento em segundo grau), embora sem a amplitude que vem prevista no Código de 2015.

Não é preciso registrar que, à luz desse novo horizonte que se descortina sob a égide do vigente diploma processual, a efetivação de convenções processuais, no plano do procedimento, ganha inegável relevo.

CPC/15 concedeu mais poderes às partes
Com efeito, como restou assentado no julgamento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial n. 1.738.656/RJ, da relatoria da ministra Nancy Andrighi:

“Embora existissem negócios jurídicos processuais típicos no CPC/73, é correto afirmar que inova o CPC/15 ao prever uma cláusula geral de negociação por meio da qual se concedem às partes mais poderes para convencionar sobre matéria processual, modificando substancialmente a disciplina legal sobre o tema, especialmente porque se passa a admitir a celebração de negócios processuais não especificados na legislação, isto é, atípicos”.

Convenções processuais x Mérito da controvérsia
Vale salientar que esta prerrogativa concedida às partes não pode ser identificada com os modos de solução consensual da controvérsia, que decorrem, como acima frisado, de verdadeiros negócios jurídicos, atinentes ao mérito da controvérsia.

As convenções processuais propiciadas pela regra do artigo 190 encerram a possibilidade de as partes acordarem sobre a realização de atos procedimentais e, ainda, acerca de ônus, faculdades e deveres processuais, que vinculam o juiz e que não estão sujeitos à homologação (artigo 200 do CPC), mas apenas ao controle de sua respectiva higidez, sobretudo no que se refere às garantias processuais, que não admitem preterição em hipótese alguma.

Antes e depois 
Tais pactos, à exemplo do que se verifica no terreno da arbitragem, podem ser projetados antes mesmo da eclosão da lide ou celebrados incidentalmente já no curso do processo judicial. Não se afasta, pois, a possibilidade da ocorrência de mais de uma convenção processual entre as partes num mesmo processo (v., a propósito, Robson Godinho, Negócios processuais sobre o ônus da prova no novo Código de Processo Civil, São Paulo. Ed. RT, 2015).

Importa acrescentar, em conclusão, a evitar qualquer dúvida, que as convenções processuais, amplamente admitidas pelo artigo 190 do Código de Processo Civil, que ostentam natureza e conteúdo estritamente processual, não têm qualquer identidade dogmática com os negócios jurídicos processuais, de cunho substancial e que têm por objeto o direito controvertido.

Fonte: Consultor Jurídico

Professor é condenado por causa de ofensas racistas contra aluna

Por entender que o delito de injúria racial foi fartamente comprovado por meio dos depoimentos de testemunhas, o juiz Leonardo Prazeres da Silva, da 9ª Vara Criminal do Foro Central Criminal da Barra Funda, em São Paulo, condenou um professor universitário por causa de ofensas contra uma aluna negra.

Conforme está relatado nos autos, a autora da ação abordou o professor para oferecer café que era vendido por outra aluna, e o réu respondeu: “Não quero porque já tomei café e também não quero ficar da sua cor. Já causo polêmica sendo branco, imagina ficando da sua cor”. Em sua defesa, o professor alegou que não teve a intenção de ofender a aluna e que fez uma “brincadeira absolutamente inocente”.

Ao analisar o caso, porém, o juiz destacou que a versão do professor não foi corroborada por ninguém, enquanto a da autora foi confirmada por testemunhas.

“O acusado era, na data dos fatos, imputável, tinha plena consciência da ilicitude de sua conduta, não havendo quaisquer excludentes de ilicitude ou de culpabilidade que possam beneficiá-lo. A prova é certa, segura e não deixa dúvidas de que o acusado praticou o delito descrito na denúncia, devendo responder penalmente pelo praticado”, resumiu o julgador.

Inicialmente, o professor foi condenado a um ano de reclusão em regime semiaberto. Em seguida, foram apresentados embargos de declaração contra a decisão pela parte autora. Ao julgar o recurso, a juíza Mariana Parmezan Annibal considerou que o crime foi praticado na presença de terceiros e, por isso, aumentou a pena para um ano, seis meses e 20 dias de reclusão, além de 14 dias-multa. Por fim, a magistrada substituiu a pena privativa de liberdade por multa no valor de dois salários mínimos.

Fonte: Consultor Jurídico

Terceira Turma valida distrato e nega regresso baseado em solidariedade reconhecida em sentença condenatória

Dois médicos, ex-sócios, foram condenados a indenizar uma paciente após problemas em cirurgia na qual atuaram juntos. Um deles pagou sozinho e entrou com ação de regresso contra o outro.

Em razão de divisão de responsabilidades definida em instrumento de distrato, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso especial interposto por médico que, após pagar integralmente indenização a paciente por dano sofrido durante cirurgia, buscava ser ressarcido da metade do valor por meio de ação de regresso ajuizada contra o antigo sócio. Para justificar o pedido de regresso, o médico havia apontado que a própria sentença reconheceu a solidariedade ao estabelecer a condenação.

De acordo com o colegiado, contudo, o distrato previa que cada médico assumisse responsabilidade civil, criminal, técnica e ética pelos seus atos e pacientes – no caso, a paciente estava sob os cuidados do recorrente, tendo o antigo sócio, também médico, apenas prestado auxílio na cirurgia.

Na origem do processo, os dois médicos foram condenados solidariamente a ressarcir os danos causados à paciente em cirurgia na qual atuaram, tendo a sentença transitado em julgado. Na fase de execução, o recorrente arcou integralmente com a condenação, mas propôs ação de regresso contra o colega de profissão, por entender que ele deveria ressarci-lo em 50% do valor indenizatório.

O juízo de primeiro grau negou o pedido sob a alegação de que o distrato estabelecido entre autor e réu visava exatamente separar obrigações e direitos que os sócios tivessem compartilhado no período em que atuaram juntos. Ao manter a sentença, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) reforçou que a vítima era paciente do recorrente.

Em recurso especial, o médico argumentou, entre outros pontos, que o distrato não poderia ser utilizado para alterar a relação de responsabilidade solidária definida na sentença.

Divisão de responsabilidades de codevedores é regulada pelo Código Civil

Segundo o relator do processo, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o devedor que pagar dívida comum por inteiro tem o direito de exigir dos demais codevedores a sua quota-parte, conforme previsto no artigo 283 do Código Civil. Caso a dívida se refira exclusivamente a um dos envolvidos, ressaltou, ele responderá pela integralidade do montante.

O ministro acrescentou que, mesmo quando a solidariedade decorre da reparação de danos analisados sob a ótica da responsabilidade objetiva, a regra do artigo 283 – caracterizada pelo contexto negocial – pode ser afastada para que seja analisada a contribuição de cada devedor para o prejuízo.

Villas Bôas Cueva observou que, no entendimento do TJMS, as partes estabeleceram a forma como a responsabilidade iria ser dividida, além de reconhecer, com fundamento no artigo 285 do Código Civil, que a dívida interessava apenas ao recorrente. Entretanto, de acordo com Cueva, para que a corte estadual pudesse confirmar que o proveito financeiro seria apenas do recorrente, haveria a necessidade de verificar como os médicos dividiam os honorários entre si quando auxiliavam na realização das cirurgias, o que não foi examinado pelo tribunal local.   

Distrato é o instrumento adequado para verificar atribuições de cada sócio

Por outro lado, o ministro Cueva apontou que as partes, no momento da dissolução da sociedade, firmaram o distrato e definiram a divisão das responsabilidades entre eles. O instrumento foi pactuado em agosto de 2000, e a cirurgia, datada de março de 1999, foi realizada ainda durante a vigência da sociedade, sendo incabível, para o relator, afastar a incidência do ajuste firmado entre as partes.

Quanto à alegação do recorrente de que o distrato não poderia ser usado para regular as relações pessoais entre os médicos, Villas Bôas Cueva salientou que o instrumento trata exatamente das atribuições assumidas por cada sócio a partir da dissolução da sociedade.

“Assim, tendo o recorrente assumido a responsabilidade ‘civil, criminal, técnica e ética por seus atos e pacientes’, deve responder pela integralidade da dívida decorrente de ação indenizatória movida por paciente sua”, concluiu o relator.

Fonte: STJ

STF retoma hoje julgamento sobre revisão da vida toda do INSS

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quinta-feira (1°) o julgamento sobre a revisão da vida toda de aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A sessão está prevista para começar às 14h.

Os ministros vão decidir se haverá alterações na decisão da própria Corte, que, em 2022, reconheceu a revisão da vida toda e permitiu que aposentados que entraram na Justiça possam pedir o recálculo do benefício com base em todas as contribuições feitas ao longo da vida.

Apesar da decisão, a revisão ainda não é aplicada devido a um recurso do INSS. O órgão entrou o recurso para restringir os efeitos da validade da revisão.

O INSS quer excluir a aplicação da revisão a benefícios previdenciários já extintos, decisões judiciais que negaram direito à revisão conforme a jurisprudência da época e proibição de pagamento de diferenças antes de 13 de abril de 2023, data na qual o acórdão do julgamento do STF foi publicado.

Placar

O último andamento do processo ocorreu no dia 1° de dezembro do ano passado, quando o ministro Alexandre de Moraes interrompeu o julgamento do recurso no plenário virtual da Corte. Com a decisão, o julgamento foi suspenso e terá continuidade na modalidade presencial nesta quinta-feira.

Até o momento, os ministros Fachin, Rosa Weber (votou antes da aposentadoria) e Cármen Lúcia votaram para estabelecer como marco para o recálculo o dia 17 de dezembro de 2019, data na qual o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o mesmo direito de revisão a um segurado do INSS.

Os ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso votaram pela anulação da decisão do STJ.

Entenda

O processo julgado pelo STF trata de um recurso do INSS contra decisão do STJ que garantiu a um segurado do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) a possibilidade de revisão do benefício com base nas contribuições sobre o período anterior ao ano de 1994.

Durante a tramitação do processo, associações que defendem os aposentados pediram que as contribuições previdenciárias realizadas antes de julho de 1994 sejam consideradas no cálculo dos benefícios. Essas contribuições pararam de ser consideradas em decorrência da reforma da previdência de 1999, cujas regras de transição excluíam da conta os pagamentos antes do Plano Real.

Segundo as entidades, segurados do INSS tiveram redução do benefício em função da desconsideração dessas contribuições.

Fonte:

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STJ determina que médicos peritos mantenham de 70% a 85% do serviço durante a greve desta quarta (31)

O trabalho dos médicos que fazem perícia na Previdência Social – necessário, por exemplo, para a concessão do auxílio-doença e do BCP – é reconhecido como essencial pela Lei 13.846/2019.

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, deferiu parcialmente o pedido da União para limitar a greve dos peritos médicos federais prevista para esta quarta-feira (31) em todo o país.

Pela decisão do STJ, a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP), organizadora do movimento grevista, deve garantir o funcionamento das atividades de perícia médica de análise inicial de benefícios e direitos previdenciários e assistenciais, mantendo um percentual de 85% de peritos atuantes nos seguintes estados: Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe e Tocantins.

Além disso, deve garantir o funcionamento do mesmo serviço com 70% dos peritos nos estados do Acre, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.

O ministro fixou em R$ 500 mil o valor da multa diária para o caso de descumprimento da decisão. A adoção de percentuais diferentes para os dois grupos de estados levou em conta informações do governo sobre o tempo médio de espera para agendamento das perícias médicas – que tem sido superior a 45 dias, sobretudo nas Regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

Perícia é considerada atividade essencial

Segundo Og Fernandes, os médicos peritos exercem uma atividade de “natureza especialíssima”, reconhecida como essencial pela Lei 13.846/2019, pois se relaciona a uma etapa indispensável para a concessão de benefícios previdenciários e assistenciais, a exemplo do auxílio-doença e do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

“De fato, as atividades médico-periciais estão afetas a benefícios de subsistência da população, cuja paralisação pode colocar em perigo iminente a sobrevivência e a saúde da comunidade envolvida”, justificou.

Sem entrar no mérito da legalidade ou não do movimento dos médicos, o ministro assinalou que o exercício do direito de greve deve observar a manutenção dos serviços essenciais, como determina o artigo 11, caput, da Lei 7.783/1989.

Governo alega que greve impediu realização de mais de 10 mil perícias

No pedido de tutela cautelar, a União afirmou que as paralisações organizadas pela ANMP nos dias 17 e 24 de janeiro impediram a realização de mais de 10 mil perícias presenciais agendadas para aquelas datas, causando inúmeros prejuízos à população, principalmente aos mais necessitados.

Por sua vez, a ANMP alegou que o governo descumpriu o acordo firmado com a categoria e não abriu um novo canal de negociação, mesmo após sucessivas tentativas da entidade classista.

Ao analisar o pedido da União, o vice-presidente do STJ comentou que o direito de greve dos servidores públicos, previsto na Constituição Federal e reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), deve ser exercido com respeito a determinados requisitos, em especial o princípio da continuidade do serviço público.

“A manutenção da regularidade na prestação de serviços deve ser assegurada, levando-se em consideração, sobretudo, as particularidades das atividades envolvidas e as necessidades do setor público relacionado, bem como da população afetada. O descumprimento desse princípio pode caracterizar abuso de direito”, afirmou.

A decisão tomada pelo ministro Og Fernandes nesta terça-feira (30), em regime de plantão judiciário, é limitada aos percentuais de médicos que devem manter o serviço de perícia funcionando. Outros pedidos formulados pela União serão analisados posteriormente pelo relator do caso, ministro Mauro Campbell Marques, no âmbito da Primeira Seção.

Fonte: STJ

Brasil fica atrás de países do G20 no quesito segurança pública

Atual ocupante da presidência temporária do G20, grupo formado pelas principais economias do mundo, o Brasil fica para trás quando o assunto é segurança pública. O estudo Panorama da competitividade dos países do G20 Brasil 2024, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), coloca o país na 25ª posição em uma lista de 27 nações, superando apenas México e África do Sul.

No levantamento, a Firjan analisa dados de 18 países que formam o G20 ao lado do Brasil (África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia) e de oito convidados para participar de diálogos e discussões: Angola, Egito, Emirados Árabes, Espanha, Nigéria, Noruega, Portugal e Singapura.

O estudo tem como referência metas estabelecidas pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) referentes a oito temas que fazem parte da agenda do G20 Brasil 2024: clima; crédito; economia e emprego; infraestrutura; mulheres, diversidade e inclusão nos negócios; segurança pública; sistemas alimentares sustentáveis e agricultura; e transição energética.

(In)segurança

No campo da segurança pública, foram considerados os indicadores de porcentagem da população que se sente segura ao andar à noite sozinha na região em que mora e o número de homicídios por 100 mil habitantes.

Em 2022, O Brasil apresentou percentual de 48% e taxa de 22,38 homicídios por 100 mil pessoas. De acordo com a Firjan, isso significa alcançar 34% na evolução das metas de segurança estipuladas pela ONU. O conjunto dos 27 países apresenta patamar de 79%.

De acordo com o gerente de Infraestrutura da Firjan, Isaque Ouverney, o indicador une dados objetivos de criminalidade, no caso dos homicídios, com a sensação subjetiva percebida pelas pessoas. “São dois aspectos que se complementam. A ideia, de fato, da redução do número de homicídio no Brasil como uma necessidade, mas também a necessidade de melhoria da própria sensação de segurança da população.”

O ranking de segurança pública é liderado por Singapura, com 100% de alcance das metas. Em seguida, figuram Emirados Árabes Unidos, China, Noruega e Arábia Saudita, todos com mais de 99% de atingimento.

Impacto em investimentos

Segundo Ouverney, além da questão social, a segurança pública – e a falta dela – reflete-se na geração de emprego e renda em determinadas localidades. “Segurança pública é, sem dúvida alguma, fator de competitividade para atração e retenção de indústrias. Assim como regiões seguras tendem a atrair mais investimentos, regiões que não apresentam boas condições de segurança tendem a repelir, a ter mais dificuldade de atrair investimentos e de retê-los. Indústrias localizadas em áreas de risco tendem a não fazer ampliações e, eventualmente, até avaliar sair de determinada localidade por questões de segurança”, explica.

Na avaliação da Firjan, o desafio da segurança pública deve ser enfrentado com ações amplas, planejadas e integradas entre todas as esferas de governo. “Não é exclusivamente uma questão do governo federal, nem do estadual, diz Ouverney. Os municípios têm também papel importante, quando se fala, por exemplo, da sensação de segurança, da questão do combate ao mercado ilegal. “Existe uma ilegalidade de comércio de produtos contrabandeados, frutos de roubo ou furto, que depende de uma ação efetiva dos municípios no combate a esse tipo de criminalidade.”

Para Ouverney, são necessárias ainda ações de conscientização da própria população. “Por exemplo, em relação ao mercado ilegal, as consequências da compra de produtos contrabandeados, como eles retroalimentam o crime organizado e a insegurança.” Ele defende a adoção de iniciativas pelo Poder Legislativo, como regulações, “no sentido de inibir a ampliação no mercado ilegal e de favorecer o mercado formal”.

Transição energética

Em contrapartida ao desempenho ruim do Brasil no tema segurança pública, o país se destaca positivamente no ranking de oportunidades de transição energética, ficando apenas atrás da Noruega. Para a Firjan, o Brasil está na “vanguarda mundial”, com obtenção de 90,6% das metas dos objetivos do milênio da ONU.

Além de ter 87% de sua capacidade de geração elétrica composta por fontes renováveis, o Brasil tem matriz energética diversificada, na qual biocombustíveis como o etanol contribuem fortemente para a redução da emissão dos gases de efeito estufa, diz o estudo.

“O desafio que a economia brasileira ainda precisa superar em relação ao tema refere-se às questões de modernização e ao aperfeiçoamento do arcabouço legal do setor energético, para expansão de novas fontes energéticas, como o hidrogênio verde e as eólicas offshore [geração de energia com a força dos ventos em alto mar]”, completa.

Ouverney ressalta que o poder público tem a responsabilidade de elaborar aspectos regulatórios dessas novas fontes para que o Brasil possa seguir avançando no tema de transição energética. “Continuar à frente daquilo que é a vantagem comparativa do país em relação ao conjunto de países do G20”, destaca.

Reuniões do grupo

A pesquisa da Firjan teve o intuito de elaborar diagnósticos de oportunidades e desafios para serem abordados em reuniões de entidades participantes do G20 sob a presidência brasileira.

Diversos eventos de diálogos serão realizados ao longo deste ano. Serão discutidos também assuntos prioritários do governo brasileiro, como o combate à fome, à pobreza e à desigualdade, as três dimensões do desenvolvimento sustentável (econômica, social e ambiental) e a reforma da governança global.

Nos dias 18 e 19 de novembro será realizada reunião de cúpula dos chefes de Estado e de governo no Rio de Janeiro. Segundo Isaque Ouverney, as reuniões desse conjunto de economias que compõem o G20 e os convidados vão propor alternativas e compartilhar experiências de sucesso.

“O objetivo do estudo [da Firjan] é apresentar um panorama, nessas oito vertentes, de onde o Brasil tem, de fato, se destacado e sido bem-sucedido nas suas políticas e onde são necessários uma reflexão e avanços importantes, como é o caso da segurança pública”, completa.

Fonte:

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Proibir juiz de condenar após MP pedir absolvição elevaria imparcialidade de decisões

Uma vez que o Brasil adota o sistema processual penal acusatório, o juiz não pode condenar o réu em uma ação penal se o Ministério Público opina pela absolvição. Assim sendo, a extinção dessa possibilidade tornará os julgamentos mais imparciais e democráticos.

Essa é a opinião dos advogados ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico sobre o tema. Eles apoiam a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1.122, por meio da qual a Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim) pede que o Supremo Tribunal Federal reconheça a não recepção do artigo 385 do Código de Processo Penal pela Constituição de 1988. A ação foi distribuída ao ministro Edson Fachin.

O artigo 385 do CPP tem a seguinte redação: “Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada”.

Esse dispositivo viola os princípios do devido processo legal e do contraditório, sustenta a Anacrim na ADPF, protocolada na segunda-feira (29/1). A petição foi assinada pelos advogados Lenio StreckJacinto CoutinhoJames Walker (presidente da Anacrim), Marcio Berti e Victor Quintiere.

O criminalista Luís Guilherme Vieira, ex-membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, diz ser óbvio que o artigo 385 do CPP não foi recepcionado pela Constituição de 1988. “Ulysses Guimarães está rouco de tanto de gritar. Não lhe dão ouvidos!”.

“O Judiciário tem de se conformar que o sistema acusatório vige desde 1988. E os ministros têm de parar de se queixar aqui e no exterior de que o número de ações ajuizadas anualmente é extremado, expondo o Brasil ao ridículo. A solução: cumpram o estatuído há 35 anos. O Estado democrático de Direito agradece”, fala Vieira.

A ADPF da Anacrim busca corrigir um “resto anacrônico do autoritarismo do CPP de 1941”, que já deveria ter sido expurgado do processo penal brasileiro desde a Constituição de 1988, avalia Aury Lopes Jr., professor de Direito Processual Penal da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Por causa da cultura inquisitória, “ainda temos esse absurdo de permitir ao juiz condenar sem pedido”, o que viola a base do princípio da correlação, aponta o advogado. Além disso, ressalta ele, o artigo 385 do CPP contraria a estrutura do objeto do processo penal, que é a pretensão acusatória do Ministério Público, titular exclusivo da acusação pública, e a regra mais elementar do sistema acusatório, da separação de funções e do ne procedat iudex ex officio (que impede o juiz de agir de ofício). O dispositivo, segundo Lopes Jr., também desrespeita o “princípio supremo do processo penal”, que é a imparcialidade do juiz.

“Inacreditavelmente, ainda tem gente que defende, com base em absurdos como a ‘busca da verdade real’ (quem fala isso não sabe o que é verdade e menos ainda o que seja o ‘real’) e o ativismo judicial inquisitório (juiz-ator-inquisidor), que um juiz condene de ofício. Mais apavorante ainda é ver membros do Ministério Público sustentarem que o juiz pode condenar sem acusação, ou seja, relegando o MP a uma função secundária, e decorativa até, no processo penal”, opina o professor.

No sistema acusatório, o juiz é o destinatário das alegações do MP e da defesa. Então não faz sentido o julgador condenar ou decretar medidas cautelares se não há pedido ou manifestação favorável da acusação, destaca Pierpaolo Cruz Bottini, professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo.

“É um processo de partes. O processo não é do juiz. Então o nosso sistema penal, previsto na Constituição de 1988, não recepcionou o artigo 385 do CPP”, argumenta o criminalista.

O ex-professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro Geraldo Prado, hoje investigador integrado ao Instituto Ratio Legis da Universidade Autônoma de Lisboa e consultor sênior do Justicia Latinoamérica (Chile), sustenta no livro Sistema Acusatório: A Conformidade Constitucional das Leis Processuais Penais (Lumen Juris) que, caso o Ministério Público peça a absolvição do réu, o juiz não está autorizado a condená-lo.

“Pelo contrário. Como o contraditório é imperativo para a validade da sentença que o juiz venha a proferir, ou, dito de outra maneira, como o juiz não pode fundamentar sua decisão condenatória em provas ou argumentos que não tenham sido objeto de contraditório, é nula a sentença condenatória proferida quando a acusação opina pela absolvição”, afirma Prado.

O fundamento da nulidade é a violação do contraditório, destaca ele. Afinal, quando o MP, em alegações finais, opina pela absolvição do acusado, “o que ocorre em concreto, no processo, é que o acusador subtrai do debate contraditório a matéria referente à análise das provas que foram produzidas na etapa anterior e que possam ser consideradas desfavoráveis ao réu”. “Como a defesa poderá reagir a argumentos que não lhe foram apresentados?”, questiona o processualista.

Fonte: Consultor Jurídico