Divulgados os resultados da consulta pública sobre uso do fracking para exploração de óleo e gás

Divulgados os resultados da consulta pública sobre uso do fracking para exploração de óleo e gás

Metade das pessoas e entidades que participaram de uma consulta pública do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manifestaram opinião contrária à exploração de recursos energéticos de fontes não convencionais (óleo e gás de xisto ou folhelho) por meio da técnica conhecida como fraturamento hidráulico (fracking).

Realizada de 20 de maio a 20 de junho, a consulta vai servir de subsídio para uma audiência pública sobre o assunto, ainda sem data marcada. A controvérsia em torno do fracking é o tema de um incidente de assunção de competência (IAC 21) que será julgado pela Primeira Seção do STJ, sob a relatoria do ministro Afrânio Vilela.

A consulta pública, realizada por determinação do relator, recebeu 56 manifestações, sendo 48 de pessoas físicas e oito de entidades. Do total de manifestantes, 34% foram a favor do uso do fracking, enquanto 16% se mostraram favoráveis com restrições.

Risco ambiental ou segurança energética

O perfil dos respondentes incluiu técnicos da indústria de óleo e gás, profissionais da área jurídica e ambiental, acadêmicos e pesquisadores, cidadãos e representantes da sociedade civil, além de pessoas sem experiência declarada no assunto. Das entidades, a maior parte atua na área de energia, e as demais em ativismo ambiental.

O grupo contrário ao fracking alegou que a técnica é inaceitável devido aos seus impactos ambientais e sociais severos e irreversíveis. O principal temor é a contaminação de aquíferos e lençóis freáticos por produtos químicos tóxicos e radioativos, além do consumo excessivo de água.

Já os que defenderam a técnica sustentaram, entre outros pontos, que ela é uma ferramenta estratégica para garantir a segurança energética e o desenvolvimento econômico do país. Eles afirmaram também que uma regulação robusta, um licenciamento ambiental rigoroso e boas práticas de engenharia seriam medidas necessárias para mitigar os riscos.

Os resultados da consulta podem ser verificados aqui. O relatório integral será juntado aos autos, em apenso, e disponibilizado para as partes, excluídos apenas os dados pessoais (CPF, email e telefone) dos respondentes. 

Fonte: STJ

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Exclusão do polo passivo em exceção de pré-executividade autoriza honorários por equidade na execução fiscal

Em recurso repetitivo, a Primeira Seção entendeu que a fixação dos honorários de sucumbência por equidade se justifica porque não há como estimar o proveito econômico obtido com a decisão judicial.

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.265), fixou a seguinte tese: “Nos casos em que, da exceção de pré-executividade, resultar tão somente a exclusão do excipiente do polo passivo da execução fiscal, os honorários advocatícios deverão ser fixados por apreciação equitativa, nos moldes do artigo 85, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, porquanto não há como se estimar o proveito econômico obtido com o provimento jurisdicional”.

Com a definição da tese – adotada por maioria –, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera da fixação do precedente qualificado. O entendimento deverá ser observado pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.

O ministro Gurgel de Faria, cujo voto prevaleceu no julgamento, explicou que a controvérsia analisada difere daquela tratada no Tema 1.076 do STJ e no Tema 1.255 do Supremo Tribunal Federal (STF). Nos temas anteriores, a preocupação era sobre como fixar honorários em causas de elevado valor econômico. Já no caso atual, a fixação de honorários por equidade se justifica por circunstância diversa: o provimento judicial alcançado tem valor econômico inestimável e não mensurável.

Tempo ganho com a exclusão da execução fiscal é inestimável

O ministro apontou que, em tese, seria possível adotar duas formas objetivas para estimar o proveito econômico obtido com a exclusão do coexecutado, o que permitiria aplicar os parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do CPC/2015: a primeira seria a fixação dos honorários com base em percentual sobre o valor total da execução fiscal; a segunda consistiria na divisão proporcional do valor total da execução pelo número de coexecutados.

Ambas as soluções, no entanto, foram afastadas. Gurgel de Faria destacou que, mesmo com a exclusão do coexecutado, o crédito tributário permanece exigível dos demais devedores, o que inviabiliza a utilização do valor total da execução como parâmetro. Essa interpretação – acrescentou – poderia gerar um efeito multiplicador indevido, forçando a Fazenda Pública a arcar repetidamente com honorários sobre o valor integral da execução, sempre que houvesse exclusão de algum executado, o que elevaria excessivamente os custos da cobrança e caracterizaria bis in idem.

Quanto à proposta de cálculo proporcional por número de coexecutados, o ministro observou que essa metodologia também é inadequada, pois desconsidera a dinâmica própria da execução fiscal, em que podem ocorrer redirecionamentos posteriores a outras pessoas físicas ou jurídicas. Nessas situações – explicou –, o número de executados ao final da demanda dificilmente corresponderia ao número original, tornando impossível a mensuração precisa do benefício auferido.

Diante dessas dificuldades, o relator apontou que a Primeira Seção do STJ, ao julgar os EREsp 1.880.560, firmou o entendimento de que, quando a decisão apenas exclui o excipiente do polo passivo, sem extinguir o crédito tributário, os honorários devem ser fixados por equidade.

Ao reforçar essa conclusão, Gurgel de Faria enfatizou que, nessa hipótese, não há um proveito econômico imediato e mensurável, mas sim uma postergação do pagamento da dívida ativa. Para o relator, o tempo ganho com a exclusão da execução fiscal é, de fato, inestimável, já que o crédito remanescente permanece atualizado nos moldes legais e pode ser cobrado dos demais devedores – como já afirmado no AREsp 1.423.290.

Fonte: STJ

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Negativa de acesso a livro da portaria de presídio não viola o direito de obter informações públicas

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a negativa de acesso ao livro de portaria de uma unidade prisional – documento classificado como sigiloso – não viola o direito líquido e certo de obter informações públicas.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso em mandado de segurança interposto por um cidadão que pretendia acessar e copiar trechos do livro de portaria da Unidade Prisional de Mariana (MG) sem ter de justificar seu interesse. O pedido havia sido negado pelas autoridades do sistema prisional, que classificaram o livro como sigiloso por conter informações relativas a terceiros, bem como dados sensíveis cuja divulgação poderia comprometer a segurança da unidade. A pretensão foi negada também pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Ao STJ, o cidadão argumentou que o indeferimento violou seu direito líquido e certo de obter informações públicas, o qual seria garantido pela Lei de Acesso à Informação (LAI). Ele alegou que apenas pretendia ter acesso aos registros de entrada e saída da unidade prisional, e não a dados sensíveis ou sigilosos.

Equilíbrio entre a transparência dos atos e a proteção do segredo informacional

O relator do caso na Primeira Turma, ministro Paulo Sérgio Domingues, explicou que a regra geral imposta ao poder público é a publicidade de seus atos, devendo o sigilo ser tratado como exceção (artigo 3º, I, da LAI) e admitido somente nos casos expressamente autorizados por lei.

“Diante da presunção de publicidade dos atos administrativos, não se admite, como regra, a negativa de acesso a informações, salvo nas hipóteses excepcionais legalmente previstas, especialmente quando relacionadas à proteção da segurança ou à privacidade e intimidade das pessoas”, disse.

O ministro ressaltou que o artigo 6º da LAI estabelece que os órgãos e as entidades da administração pública têm o dever de proteger informações classificadas como sigilosas e as de natureza pessoal, devendo assegurar não apenas a restrição de acesso, mas também a preservação da disponibilidade, da autenticidade e da integridade desses dados, para resguardar o interesse público envolvido.

Segundo o relator, a própria LAI estabelece três categorias distintas de restrição ao acesso informacional: dados cujo sigilo decorre de imposição legal, conforme disposto no artigo 22; informações de natureza pessoal, nos termos do artigo 31; e informações classificadas como sigilosas segundo o procedimento formal previsto no artigo 23.

A administração pública – complementou o ministro –, ao classificar informações como sigilosas, deve observar estritamente os critérios legais, assegurando o equilíbrio entre a necessária transparência dos atos administrativos e a proteção legítima do segredo informacional.

Livro de portaria contém informações sigilosas e sensíveis do presídio

Paulo Sérgio Domingues esclareceu que o livro de portaria de unidade prisional é um documento em que são registradas informações sobre pessoas, rotinas e ocorrências no setor, o qual, por sua vez, “é notoriamente um local sensível e estratégico para a segurança de cada unidade prisional e da população em geral”.

O relator concluiu que não houve ilegalidade na negativa de acesso a páginas do livro de portaria, uma vez que ela se fundamentou na presença de dados sigilosos e sensíveis, bem como no fato de a divulgação dessas informações ser potencialmente prejudicial às atividades e à estrutura de segurança da unidade prisional. Além disso – finalizou o ministro –, a classificação do livro como documento de acesso restrito foi feita de acordo com os procedimentos legais.

Leia o acórdão no RMS 67.965.

Fonte: STJ

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Empresas que integram conglomerado societário podem responder solidariamente por crimes da Lei Anticorrupção

Ao interpretar as disposições da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso no qual a empresa Sul Concessões pedia para ser excluída do polo passivo de ação civil pública proposta contra uma concessionária de serviço público da qual faz parte.

Na ação, o Ministério Público Federal (MPF) questiona a legalidade de aditamentos em contrato de concessão firmado entre a União, o Ministério dos Transportes, o governo do Paraná, o extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, o DER/PR e a concessionária Rodovias Integradas do Paraná S/A (Viapar), que é integrada pela Sul Concessões.

Segundo o MPF, os aditivos impugnados teriam sido feitos com o propósito de desequilibrar financeiramente a concessão em favor da Viapar, mediante supressão de obras, majoração de tarifas, postergação de investimentos e alteração de locais de implantação dos trabalhos, com suposta contrapartida de pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos – crimes investigados na Operação Integração.

Entre outros pontos, o órgão ministerial pediu a anulação dos atos, o reconhecimento da caducidade da concessão e a condenação da concessionária e de suas controladoras ao pagamento de indenizações.

Ao STJ, a defesa da Sul Concessões argumentou que o MPF teria incluído na ação empresas que detiveram no passado participação societária na Viapar, sem descrever qualquer envolvimento delas ou das atuais integrantes da sociedade empresária nas supostas irregularidades.

Lei Anticorrupção busca coibir práticas ilícitas contra o interesse público

Segundo o relator do recurso, ministro Paulo Sérgio Domingues, são necessários três requisitos para a configuração da responsabilidade civil objetiva: conduta comissiva ou omissiva, resultado danoso e nexo de causalidade entre a conduta e o dano. Além disso, ele lembrou que o artigo 265 do Código Civil estabelece que “a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”.

O ministro explicou que o parágrafo 2º do artigo 4º da Lei 12.846/2013 fixa expressamente a responsabilidade solidária entre as sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, consorciadas. Na avaliação do relator, esse dispositivo “tem a finalidade de abranger o maior número de situações possíveis no âmbito da criação, da transformação, do agrupamento e da dissolução de empresas, impedindo, dessa forma, a ausência de responsabilização em decorrência de lacuna legislativa”.

Já o caput do artigo 4º da 12.846/2013, ressaltou, determina que a responsabilidade da pessoa jurídica subsistirá, ainda que ocorra alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária. “Desse modo, não há uma condição para a responsabilidade da pessoa jurídica, e sim uma ordem para que essa responsabilidade perdure, mesmo que ocorra alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária”, afirmou.

Para o ministro, interpretar de modo diverso os dispositivos legais tornaria inócuo o objetivo da Lei Anticorrupção, que é coibir ilicitudes cometidas em detrimento do interesse público.

Leia o acórdão no REsp 2.209.077.

Fonte: STJ

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Crime de falsa identidade não exige obtenção de vantagem e se consuma no ato de fornecer dado incorreto

Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.255), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o delito de falsa identidade, previsto no artigo 307 do Código Penal, é crime de natureza formal, que se consuma quando o agente fornece, consciente e voluntariamente, dados inexatos sobre sua real identidade. Sendo assim, a caracterização da conduta independe da obtenção de vantagem para si ou para outrem, bem como de prejuízo a terceiros.

O relator do repetitivo, ministro Joel Ilan Paciornik, explicou que o crime de falsa identidade tutela a fé pública na individuação pessoal, ou seja, a confiança que se tem, nas relações públicas ou privadas, quanto à identidade, à essência, ao estado civil ou outra qualidade juridicamente relevante da pessoa.

Segundo o magistrado, esse tipo penal exige a prática de uma conduta comissiva somada a uma vontade consciente de atribuir a falsa identidade a si mesmo ou a outra pessoa. Além disso, prosseguiu, é necessário verificar se o delito está associado à finalidade de obter algum tipo de vantagem ou causar dano a alguém.

Retratação do agente e alegação de autodefesa

No entanto, o relator lembrou que já existe entendimento doutrinário e posição consolidada da jurisprudência do STJ no sentido de que a efetiva obtenção do fim pretendido pelo agente é irrelevante para a configuração do crime, devido à sua natureza formal.

“Portanto, a consumação delitiva ocorre assim que o agente inculca a si ou a outrem a falsa identidade, sendo irrelevantes a causação de prejuízo ou a obtenção de efetiva vantagem pelo agente. É indiferente, para a consumação típica, o fato de o destinatário da declaração falsa verificar, em sequência, a real identidade do indivíduo, ou mesmo ter o próprio agente se identificado corretamente em momento posterior”, destacou Paciornik.

O ministro esclareceu que a eventual retratação do agente não afasta a tipicidade da conduta, nem justifica a aplicação do instituto do arrependimento eficaz, pois o crime de falsa identidade já se encontra consumado.

Outro ponto destacado por Paciornik quanto à tipicidade se refere à hipótese de atribuição da falsa identidade perante autoridade policial com base no princípio constitucional da autodefesa. Nesse caso, ele mencionou a Súmula 522 do STJ, além de precedentes da corte (Tema 646) e do Supremo Tribunal Federal (Tema 478) que rejeitam essa possibilidade. 

Réu informou nome falso a policiais durante abordagem

Interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais, o recurso representativo da controvérsia (REsp 2.083.968) diz respeito a um homem acusado de fornecer nome falso a policiais durante uma abordagem. Contudo, antes do registro do boletim de ocorrência e do interrogatório na delegacia, ele revelou sua verdadeira identidade.

Em primeiro grau, o réu foi condenado pelo crime de falsa identidade, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu absolvê-lo por entender que a conduta não teve nenhuma repercussão administrativa ou penal.

“A retratação posterior do agente quanto à sua identidade, ainda que antes do registro do boletim de ocorrência, não tem o condão de tornar atípica a sua conduta, nem mesmo sob o pálio do instituto do arrependimento eficaz. Isso porque o delito já se encontra consumado com a simples atribuição de falsa identidade pelo agente, independentemente da verificação de ulteriores consequências”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial.

Leia o acórdão no REsp 2.083.968.

Fonte: STJ

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Um agente, vários delitos: o STJ diante dos crimes em concurso

O motorista que, em uma única ação imprudente, causa acidente com várias vítimas pode vir a ser condenado em concurso formal – uma das modalidades de concurso de crimes previstas no Código Penal.

Responsável pela interpretação, em última instância, do direito federal infraconstitucional, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem consolidado uma ampla jurisprudência sobre o concurso de crimes – instituto que regula a aplicação da pena nas hipóteses em que o agente comete mais de um delito. As três modalidades desse instituto descritas no Código Penal – o concurso material, o concurso formal e a continuidade delitiva – impactam diretamente no cálculo da pena, e o enquadramento do caso concreto em uma delas pode motivar intensas discussões jurídicas.

Nessas controvérsias, o STJ busca um equilíbrio entre a necessária repressão à criminalidade e o respeito aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. Esta matéria apresenta julgamentos da corte que analisaram hipóteses de concurso formal e concurso material, destacando distinções entre as duas modalidades em meio a debates que frequentemente também envolveram o conceito de crime único e a ideia de consunção.

No dia 29 de junho, a segunda matéria da série sobre crimes em concurso vai tratar da continuidade delitiva (ou crime continuado).

Limites para o benefício da suspensão do processo

No ano 2000, a publicação da Súmula 243 consolidou na jurisprudência do STJ o entendimento de que o benefício da suspensão condicional do processo não se aplica às infrações penais praticadas em concurso material, concurso formal ou sob a forma de continuidade delitiva, quando a pena mínima, resultante do somatório ou do aumento decorrente de majorante, ultrapassar o limite de um ano.

Um dos precedentes que fundamentaram a súmula foi o RHC 7.779. No caso, a defesa questionava decisão do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo que havia negado a suspensão condicional do processo com base no entendimento de que, para efeito de aplicação do benefício, deveria ser considerado o acréscimo de pena decorrente do concurso de crimes. O ministro Felix Fischer (aposentado), relator, confirmou essa linha de raciocínio, ao afirmar que, para a análise dos requisitos do artigo 89 da Lei 9.099/1995, é necessário computar as majorantes que incidem na pena mínima, inclusive aquelas oriundas de continuidade delitiva.

Segundo o ministro, o fato de a pena mínima ultrapassar um ano – ainda que por força de acréscimos legais do concurso de crimes – impede a concessão do benefício. Em seu voto, Fischer refutou o argumento de que, para fins de suspensão do processo, as penas deveriam ser analisadas isoladamente, como se faz no cálculo da prescrição. Para ele, aplicar esse raciocínio ao benefício previsto na Lei dos Juizados Especiais resultaria em distorções graves, como equiparar situações jurídicas substancialmente distintas e permitir o mesmo tratamento a quem responde por um ou por vários delitos.

O relator também alertou para os riscos de subjetivismo na concessão do benefício, caso se ignorassem a gravidade da conduta e o número de infrações. Ele afirmou que a suspensão do processo pressupõe critérios objetivos, e que permitir sua concessão sem considerar a pena total – incluindo os aumentos legais – seria dar tratamento igual ao que é evidentemente desigual.

Posse e distribuição de pornografia infantil são crimes autônomos

Em 2023, a Terceira Seção, no Tema 1.168 dos recursos repetitivos, firmou o entendimento de que os crimes previstos nos artigos 241-A e 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são tipos penais autônomos, com núcleos verbais e condutas distintas, de modo que o armazenamento de material pornográfico infantil (241-B) não configura fase normal nem meio de execução para o crime de transmissão do conteúdo (241-A), o que autoriza o reconhecimento do concurso material.

Para o relator do recurso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, é perfeitamente possível que alguém compartilhe conteúdo pornográfico infantojuvenil sem armazená-lo, assim como é viável que se armazene esse tipo de material sem necessariamente transmiti-lo. “São efetivamente verbos e condutas distintas, que têm aplicação autônoma”, declarou.

Em seu voto, o ministro reforçou que é “plenamente admissível” a hipótese de uma pessoa localizar conteúdo ilícito na internet e repassá-lo a terceiros – caracterizando o verbo “disponibilizar” do artigo 241-A – sem que esse material fique registrado em seu dispositivo.

Da mesma forma, destacou que o conteúdo pode ser apenas armazenado, seja em um computador, seja em nuvem, sem que ocorra qualquer forma de compartilhamento ou divulgação, o que configuraria unicamente o crime do artigo 241-B. “Não há se falar em consunção, estando devidamente demonstrada a autonomia de cada conduta, apta a configurar o concurso material de crimes”, disse.

Concurso formal não autoriza estender perdão judicial concedido a um dos crimes

Sob relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz, a Sexta Turma decidiu que o fato de os delitos haverem sido cometidos em concurso formal não autoriza a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido para um dos crimes, se não ficou comprovada, quanto ao outro, a existência de vínculo subjetivo entre o infrator e a outra vítima.

No julgamento do REsp 1.444.699, discutiu-se a validade do perdão judicial concedido a réu denunciado por homicídio culposo no trânsito, praticado em concurso formal contra seu namorado e um amigo. A defesa alegou ausência de violação ao dever de cuidado e, alternativamente, pleiteou o perdão judicial com base no sofrimento emocional do acusado, que mantinha vínculos afetivos com as vítimas. A sentença acolheu parcialmente a tese defensiva e extinguiu a punibilidade.

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afastou o perdão em relação ao amigo do réu, determinando o retorno dos autos para fixação da pena. Ao STJ, a defesa sustentou que, em casos de concurso formal, o perdão judicial não poderia ser aplicado de modo fracionado, pois o sofrimento do agente decorreria do evento como um todo. Pleiteou, assim, a restauração do perdão judicial integralmente.

O ministro Schietti esclareceu que o sofrimento psíquico capaz de tornar a pena desnecessária – justificativa para o perdão judicial – deve ser analisado a partir do estado emocional do autor do crime culposo. Segundo o relator, a doutrina exige, para aplicação do perdão previsto no parágrafo 5º do artigo 121 do Código Penal (CP), um vínculo afetivo prévio entre o réu e a vítima, já que a dor profunda costuma ocorrer quando há laços pessoais. Como o TJSP entendeu não haver prova clara de ligação afetiva com ambas as vítimas, o ministro considerou correta a negativa de dupla aplicação do perdão judicial.

Schietti alertou que aceitar a alegação de sofrimento intenso sem a exigência de vínculo abriria brecha perigosa na lei, banalizando a tese em casos de homicídios culposos no trânsito. Para o ministro, rever a conclusão das instâncias ordinárias, como pretendia o recorrente ao alegar forte vínculo com o amigo, exigiria reexame de provas, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7. O relator ressaltou que o concurso formal não permite a extensão do perdão judicial a todos os delitos, pois, embora concentre a pena, não afasta a responsabilização por cada um dos crimes cometidos.

Arma ilegal na posse de traficante pode ser crime autônomo

Se não ficar demonstrado no processo que a arma de fogo era usada no contexto do tráfico de drogas, ou seja, para assegurar o sucesso deste segundo delito, ambos os crimes serão punidos de forma autônoma – situação pior para o réu, pois as penas serão somadas, como manda a regra do concurso material. Por outro lado, caso seja provado que a posse ou o porte ilegal da arma servia para a prática do tráfico, a pena deste último será aumentada na fração de um sexto a dois terços, conforme prevê o artigo 40, inciso IV, da Lei de Drogas.

O entendimento foi fixado pela Terceira Seção ao julgar o Tema 1.259 dos recursos repetitivos, sob a relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Na ocasião, o colegiado considerou que o princípio da consunção resolve o conflito aparente de normas penais quando um delito se revela meio necessário ou normal na fase de preparação ou execução de outro crime. “Nessas situações, o agente apenas será responsabilizado pelo último crime. Para tanto, porém, é imprescindível a constatação do nexo de dependência entre as condutas, a fim de que uma seja absorvida pela outra”, apontou o relator.

O ministro salientou que as turmas criminais do STJ já haviam consolidado o entendimento de que, quando o uso da arma de fogo está diretamente ligado ao sucesso dos crimes previstos nos artigos 33 a 37 da Lei de Drogas, ocorre a absorção do delito de porte ou posse ilegal de arma. Caso contrário, deve ser reconhecido o concurso material, hipótese em que as penas dos dois crimes são somadas.

Apreensão de mais de uma arma no mesmo contexto fático caracteriza delito único

Em 2017, a Quinta Turma, ao julgar o HC 362.157, reafirmou o entendimento de que a apreensão de mais de um exemplar de arma de fogo, acessório ou munição, em um mesmo contexto fático, não caracteriza concurso formal ou material de crimes, mas delito único.

O caso analisado envolveu um homem condenado em primeiro grau à pena de seis anos em regime inicial fechado, pela prática, em concurso material, dos crimes de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito e de artefato explosivo, previstos no caput e no parágrafo único, inciso III, do artigo 16 da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento). Inconformada com a sentença, a defesa interpôs apelação, mas o tribunal de segundo grau manteve integralmente a condenação.

No recurso ao STJ, a defesa argumentou que os dois delitos decorreram de um único contexto fático: o réu foi surpreendido com ambos os objetos ilícitos – a arma e o explosivo – ao mesmo tempo, sem que houvesse pluralidade de ações ou objetivos distintos. Para a defesa, trata-se de crime único, o que afastaria o concurso material e implicaria a redução da pena e a readequação do regime prisional.

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator do habeas corpus, explicou que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de reconhecer a existência de crime único quando são apreendidos, com o mesmo agente e no mesmo contexto fático, mais de um item em situação irregular (arma, munição, acessório ou explosivo). Nesses casos, segundo o ministro, não se aplica o concurso material ou formal, pois há apenas uma lesão ao bem jurídico tutelado – a segurança pública.

No caso analisado, o relator observou que o réu foi condenado por dois crimes distintos – posse de pistola 9 mm e de granada – com base no artigo 16, caput e parágrafo único, inciso III, da Lei 10.826/2003, o que levou à aplicação do concurso material pelas instâncias ordinárias. No entanto, para o magistrado, essa interpretação configura constrangimento ilegal, uma vez que, como reiterado pela corte, deve-se reconhecer a existência de delito único quando as condutas se inserem no mesmo contexto e se referem ao mesmo tipo penal.

Corrupção de dois adolescentes configura dois crimes autônomos

Ao julgar o REsp 1.680.114, a Sexta Turma definiu que a prática de crimes em concurso com dois adolescentes dá ensejo à condenação por dois crimes de corrupção de menores. Na decisão, o colegiado considerou que, sendo a formação moral da criança e do adolescente o bem jurídico protegido pelo tipo penal, a corrupção simultânea de dois menores, cujo amadurecimento é comprometido por estímulo à prática criminosa ou à permanência no meio delituoso, configura a violação autônoma de dois bens jurídicos, o que justifica a dupla condenação.

No caso, os réus foram condenados em primeira instância pela prática de roubo qualificado e de corrupção de menores, esta última em duas ocasiões distintas, em concurso formal. Mesmo diante da participação de dois adolescentes, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), entendendo que se tratava de crime único, afastou o concurso formal entre os delitos de corrupção de menores e reduziu a pena.

No recurso ao STJ, o Ministério Público estadual alegou que a prática criminosa com a participação de dois adolescentes configura dois crimes autônomos de corrupção de menores, não um único delito, e por isso o concurso formal deveria ser mantido.

O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do recurso, afirmou que essa interpretação está em harmonia com os princípios da prioridade absoluta e do melhor interesse da criança e do adolescente, ao reconhecer cada um como sujeito de direitos.

Afastado o concurso formal entre embriaguez ao volante e direção sem habilitação

Sob relatoria do desembargador convocado Jesuíno Rissato, a Quinta Turma entendeu, ao julgar o HC 749.440, que não se aplicaria o concurso formal no caso de um homem condenado pelos crimes de embriaguez ao volante (artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro – CTB) e de direção sem habilitação (artigo 309 do CTB). Em primeira instância, a sentença determinou a condenação do réu por ambos os crimes em concurso material, resultando na soma das penas.

No STJ, o relator do caso destacou que os crimes têm objetividades jurídicas diferentes e momentos consumativos próprios: enquanto a embriaguez ao volante é um crime de mera conduta e perigo abstrato, a direção sem habilitação exige demonstração de perigo concreto. Assim, não há como reconhecer uma única ação ou intenção que una os dois delitos.

A Defensoria Pública de Santa Catarina sustentava que o acusado teria praticado uma só conduta – dirigir um veículo –, mesmo que estivesse simultaneamente alcoolizado e sem habilitação, o que, segundo a tese, atrairia a aplicação do concurso formal e uma pena menor.

No entanto, Rissato rejeitou as alegações, considerando que o caso envolveu condutas distintas, com desígnios autônomos e consequências independentes.

Pluralidade de vítimas, por si só, não impede o reconhecimento de crime único de latrocínio

A Terceira Seção decidiu, ao julgar o AREsp 2.119.185, que, sendo subtraído um só patrimônio, a pluralidade de vítimas da violência não impede o reconhecimento de crime único em caso de latrocínio. O entendimento representou uma inflexão na posição tradicional da corte, que até então admitia a possibilidade de concurso formal impróprio nessas situações, com base na quantidade de vítimas.

De acordo com os autos, o réu integrava organização criminosa altamente estruturada, composta inclusive por policiais militares da ativa, voltada à prática de assaltos a bancos no interior do Rio Grande do Sul. Durante a tentativa de fuga após um dos crimes, o veículo capotou, e o réu atirou contra os policiais que perseguiam o grupo.

Nas instâncias ordinárias, ele foi condenado à pena de 37 anos e dez meses, em regime inicial fechado, pela prática de três tentativas de latrocínio, em concurso formal impróprio (situação na qual os crimes ocorrem em um mesmo contexto, mas com dolo distinto em relação a cada vítima, e as penas são somadas como no concurso material).

Ao STJ, a defesa pediu a desclassificação da conduta para roubo tentado e resistência, o afastamento do concurso formal impróprio para reconhecimento de crime único e a redução da pena-base.

A relatora, ministra Laurita Vaz (aposentada), reconheceu que o entendimento das instâncias ordinárias estava alinhado à jurisprudência tradicional do STJ, segundo a qual o número de latrocínios deveria ser apurado com base na quantidade de vítimas da violência, independentemente do número de patrimônios subtraídos. A ministra sublinhou, porém, que essa posição colidia com a orientação consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF), que considera haver crime único quando há apenas uma subtração patrimonial, ainda que o animus necandi (intenção de matar) tenha sido dirigido a mais de uma pessoa.

Diante disso, Laurita Vaz votou pela superação do entendimento anterior do STJ (overruling), para adequá-lo à posição do STF. No caso em julgamento, embora tenha sido reconhecida a intenção autônoma de matar mais de uma vítima, a ministra concluiu que o concurso formal impróprio não se aplicaria, consoante ao entendimento do STF.

“No entanto, é inviável o reconhecimento de crime único, porque foram atingidos dois patrimônios distintos. Nesse contexto, deve ser reconhecida a prática de dois delitos de latrocínio, na forma tentada, em concurso formal próprio, pois não foi mencionado pela corte de origem que também teria havido autonomia de desígnios em relação às subtrações patrimoniais, mas tão somente no tocante ao animus necandi“, completou.

Desígnios autônomos do concurso formal impróprio abrangem dolo direto e eventual

Em 2024, a Quinta Turma, ao julgar o AREsp 2.521.343, consolidou o entendimento de que os desígnios autônomos que caracterizam o concurso formal impróprio podem decorrer de qualquer forma de dolo, direto ou eventual. A decisão teve como pano de fundo um caso envolvendo um motorista que, ao dirigir em alta velocidade por uma das principais avenidas de Sorocaba (SP), causou um acidente do qual resultaram a morte do condutor de outro veículo e lesões graves em sua passageira.

Condenado inicialmente a sete anos de reclusão, o motorista teve sua pena elevada para dez anos pelo TJSP. A corte reconheceu a existência de desígnios autônomos, ou seja, a intenção de produzir resultados distintos em relação às duas vítimas, ainda que por meio de uma única ação. Com base na parte final do artigo 70 do Código Penal, determinou-se a soma das penas pelos crimes de homicídio consumado e tentado.

No recurso ao STJ, a defesa alegou que o acórdão do TJSP incorreu em presunção ao concluir pela existência de desígnios autônomos, baseando-se apenas na pluralidade de vítimas. Argumentou não haver provas de que o réu tenha direcionado dolosamente sua conduta para cada uma das vítimas de forma individualizada, especialmente por se tratar de dolo eventual. Assim, sustentou que seria inaplicável a regra do concurso formal impróprio.

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator, ressaltou que, embora tenha sido reconhecido o dolo eventual em relação às duas vítimas, havia desígnios autônomos na conduta do réu. No caso, ele assumiu conscientemente o risco de causar morte ou lesão grave à passageira, e, ao mesmo tempo, aceitou a possibilidade de produzir resultado idêntico em relação a terceiros.

O relator explicou que, embora parte da doutrina sustente ser possível o concurso formal próprio entre crimes dolosos quando ao menos um deles for praticado com dolo eventual – sob o argumento de que apenas o dolo direto revelaria desígnio autônomo e justificaria o cúmulo de penas –, o STJ mantém posição mais restritiva. Como esclareceu o ministro, prevalece na corte o entendimento de que o concurso formal próprio, ou perfeito, só é admissível quando ambos os crimes forem culposos ou quando houver combinação entre crime doloso e culposo.


Fonte: STJ

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Imóvel de espólio não perde proteção como bem de família e não pode ser penhorado por dívidas do falecido

Para a Quarta Turma, a transmissão hereditária, por si, não tem o efeito de desconfigurar o bem de família, se mantidas as características de imóvel residencial próprio da entidade familiar.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o único imóvel residencial do espólio, ocupado por herdeiros do falecido, continua protegido como bem de família e, por isso, não pode ser penhorado para garantir dívida deixada pelo autor da herança. Segundo o colegiado, a transmissão hereditária, por si, não tem o efeito de desconfigurar ou afastar a natureza do bem de família, se mantidas as características de imóvel residencial próprio da entidade familiar.

Uma família entrou com ação cautelar de arresto contra o espólio do ex-sócio majoritário de uma empresa falida, para assegurar o pagamento de dívida de R$ 66.383,22. O pedido visava o bloqueio do único imóvel do espólio, sob o argumento de que havia o risco de ser vendido pelos herdeiros antes da conclusão da execução.

O juízo de primeiro grau concedeu liminar para o arresto do imóvel e, na sentença, reconheceu a responsabilidade do espólio, mantendo o bloqueio por entender que, enquanto não há partilha, o espólio responde integralmente pelas dívidas do falecido.

O espólio alegou a impenhorabilidade do imóvel, por ser bem de família, utilizado por dois herdeiros do falecido – um deles interditado e sem renda –, mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a sentença. A corte considerou que o imóvel ainda estava em nome do falecido e, enquanto não houvesse partilha, não se aplicaria a proteção legal do bem de família. Nesse estágio – prosseguiu o tribunal –, o patrimônio hereditário deveria continuar respondendo pelas dívidas deixadas.

Herdeiros se sub-rogam na posição jurídica do falecido

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso especial no STJ, observou que o único imóvel utilizado como residência permanente da família é impenhorável, independentemente da natureza da dívida ou da execução. Para o ministro, essa proteção, prevista nos artigos 1º, 3º e 5º da Lei 8.009/1990, tem caráter de norma de ordem pública e só pode ser afastada nas hipóteses excepcionais previstas no artigo 3º da mesma lei, as quais devem ser interpretadas restritivamente.

O relator destacou que os herdeiros respondem pelas dívidas do falecido apenas dentro dos limites de suas partes na herança, conforme o artigo 1.997 do Código Civil (CC), mas isso não afasta a proteção do bem de família. De acordo com o magistrado, se o imóvel era protegido em vida, continua protegido após a sucessão, desde que mantidas as condições legais.

Antonio Carlos Ferreira também ressaltou que o princípio da saisine, previsto no artigo 1.784 do CC, estabelece que a herança é automaticamente transmitida aos herdeiros com a abertura da sucessão, fazendo com que eles assumam o patrimônio nas mesmas condições jurídicas que o falecido possuía: “Se os herdeiros se sub-rogam na posição jurídica do falecido, naturalmente também recebem as proteções legais que amparavam o autor da herança, entre elas a impenhorabilidade do bem de família”.

Reconhecimento da impenhorabilidade não implica extinção da dívida

O ministro ainda esclareceu que o reconhecimento da impenhorabilidade não extingue a dívida nem exime o espólio da responsabilidade patrimonial. Segundo afirmou, a obrigação permanece íntegra e plenamente exigível, sendo apenas vedada a sua satisfação por meio da constrição do imóvel.

No entendimento do relator, a impenhorabilidade atua como limitação ao meio de execução, mas não interfere na existência do crédito judicialmente reconhecido. Ele ponderou que o credor, portanto, mantém o direito de buscar a satisfação da dívida por outras vias legalmente admitidas, como a penhora de bens do espólio que não estejam resguardados por proteção legal.

Leia o acórdão no REsp 2.111.839.

Fonte: STJ

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Primeira Turma define critérios objetivos para reconhecer dano moral coletivo em casos de lesão ambiental

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou sete critérios objetivos para a análise de situações de lesão ao meio ambiente que possam justificar a condenação por danos morais coletivos. Os parâmetros são os seguintes:

1) Os danos morais coletivos não advêm do simples descumprimento da legislação ambiental, exigindo constatação de injusta conduta ofensiva à natureza.

2) Os danos decorrem da prática de ações e omissões lesivas, devendo ser aferidos de maneira objetiva e in re ipsa, não estando atrelados a análises subjetivas de dor, sofrimento ou abalo psíquico da coletividade ou de um grupo social.

3) Constatada a existência de degradação ambiental, mediante alteração adversa das características ecológicas, presume-se a lesão intolerável ao meio ambiente e a ocorrência de danos morais coletivos, cabendo ao infrator o ônus de informar sua constatação com base em critérios extraídos da legislação ambiental.

4) A possibilidade de recomposição material do meio ambiente degradado, de maneira natural ou por intervenção antrópica, não afasta a existência de danos extrapatrimoniais causados à coletividade.

5) A avaliação de lesão imaterial ao meio ambiente deve tomar por parâmetro exame conjuntural e o aspecto cumulativo de ações praticadas por agentes distintos, impondo-se a todos os corresponsáveis pela macrolesão ambiental o dever de reparar os prejuízos morais causados, na medida de suas respectivas culpabilidades.

6) Reconhecido o dever de indenizar os danos morais coletivos em matéria ambiental (an debeatur), a gradação do montante reparatório (quantum debeatur) deve ser efetuada à vista das peculiaridades de cada caso e tendo por parâmetro a contribuição causal do infrator e sua respectiva situação socioeconômica; a extensão e a perenidade do dano; a gravidade da culpa; e o proveito obtido com o ilícito.

7) Nos biomas arrolados como patrimônio nacional pelo artigo 225, parágrafo 4º, da Constituição Federal, o dever coletivo de proteção da biota detém contornos jurídicos mais robustos, havendo dano imaterial difuso sempre que evidenciada a prática de ações ou omissões que os descaracterizem ou afetem sua integridade ecológica ou territorial, independentemente da extensão da área afetada.

Com base nesses critérios, no caso concreto analisado, o colegiado restabeleceu condenação por danos morais coletivos em caso de supressão de vegetação nativa na Amazônia Legal sem autorização dos órgãos competentes e em violação à legislação ambiental.

Apesar do parcial provimento do recurso do Ministério Público de Mato Grosso, o caso deverá retornar ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso – que havia afastado a ocorrência dos danos morais coletivos – para análise de pedido subsidiário de redução do valor da indenização, fixada em R$ 10 mil em primeiro grau. 

Leia também: 
Dano moral coletivo: como o STJ interpreta a ofensa que atinge valores de toda a comunidade

Segunda Turma reconhece dano moral coletivo por desmatamento em área amazônica de Mato Grosso

Extensão da área degradada, por si só, não afasta a ocorrência de dano extrapatrimonial

Relatora do recurso, a ministra Regina Helena Costa destacou que o artigo 225, parágrafo 4º, da Constituição Federal confere proteção jurídica especial à Floresta Amazônica, à Mata Atlântica, à Serra do Mar, ao Pantanal e à Zona Costeira, ao reconhecê-los como patrimônio nacional. Para a ministra, os danos ambientais nessas áreas configuram ilícito contra bem jurídico coletivo, exigindo reparação ampla, inclusive em sua dimensão imaterial.

A magistrada ressaltou que, além da responsabilização por danos materiais, o princípio da reparação integral impõe a recomposição completa do dano ecológico, o que inclui a indenização por danos morais difusos. A ministra apontou que esses danos são presumidos (in re ipsa) e independem de prova de sofrimento subjetivo, conforme estabelecido nos artigos 1º, inciso I, da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública) e 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente).

“A constatação de danos imateriais ao meio ambiente não deflui, por si só, da atuação do agressor em descompasso com as regras protetivas do meio ambiente, reclamando, em verdade, a intolerabilidade da lesão à natureza e cuja ocorrência é presumida, cabendo ao réu afastar sua caracterização com base em critérios extraídos da legislação ambiental, diante da distribuição pro natura do ônus probatório, nos moldes da Súmula 618″, disse a ministra.

Ainda segundo Regina Helena Costa, não é possível afastar a ocorrência de danos extrapatrimoniais com base apenas na extensão da área degradada. A ministra defendeu uma análise que considere o efeito cumulativo de múltiplas ações degradantes, praticadas por diferentes agentes.

“A ilícita supressão de vegetação nativa situada na Floresta Amazônica contribui, de maneira inexorável, para a macrolesão ecológica à maior floresta tropical do planeta, cujos históricos índices de desmatamento põem em risco a integridade de ecossistema especialmente protegido pela ordem jurídica, razão pela qual todos aqueles que, direta ou indiretamente, praticam condutas deflagradoras de uma única, intolerável e injusta lesão ao bioma são corresponsáveis pelos danos ecológicos de cariz extrapatrimonial, modulando-se, no entanto, o quantum indenizatório na medida de suas respectivas culpabilidades”, concluiu.

Leia o acórdão no REsp 2.200.069.

Fonte: STJ

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Prazo de 30 dias para reparo de produto defeituoso não afeta direito ao ressarcimento integral de danos materiais

O carro do autor da ação ficou 54 dias parado na oficina à espera de peças, e a Quarta Turma decidiu que ele tem o direito de ser indenizado pelos danos comprovadamente sofridos desde o primeiro dia.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o prazo de 30 dias do artigo 18, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) não limita a obrigação do fornecedor de indenizar o consumidor, o qual deve ser ressarcido integralmente por todo o período em que sofreu danos materiais.

Na ação de danos materiais e morais ajuizada contra uma montadora e uma concessionária, o autor afirmou que comprou um carro com cinco anos de garantia e que, em menos de 12 meses, ele apresentou problemas mecânicos e ficou 54 dias parado nas dependências da segunda empresa ré, devido à falta de peças para reposição.

O caso chegou ao STJ após o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidir que, além da indenização por dano moral, o consumidor tinha o direito de ser indenizado pelos danos materiais apenas em relação ao período que excedeu os primeiros 30 dias em que o carro permaneceu à espera de reparo. A corte local se baseou no parágrafo 1º do artigo 18 do CDC.

CDC não afasta responsabilidade integral do fornecedor

O relator na Quarta Turma, ministro Antonio Carlos Ferreira, disse que o CDC não exclui a responsabilidade do fornecedor durante o período de 30 dias mencionado no dispositivo, mas apenas dá esse prazo para que ele solucione o defeito antes que o consumidor possa escolher a alternativa legal que melhor lhe atenda: substituição do produto, restituição do valor ou abatimento do preço.

O ministro destacou que o prazo legal “não representa uma franquia ou tolerância para que o fornecedor cause prejuízos ao consumidor nesse período sem responsabilidade alguma”.

De acordo com o relator, uma interpretação sistemática do CDC, especialmente em relação ao artigo 6º, inciso VI – que trata do princípio da reparação integral –, impõe que o consumidor seja ressarcido por todos os prejuízos materiais decorrentes do vício do produto, sem limitação temporal.

“Se o consumidor sofreu prejuízos em razão do vício do produto, fato reconhecido por decisão judicial, deve ser integralmente ressarcido, independentemente de estar dentro ou fora do prazo”, completou.

Consumidor não pode assumir risco em lugar da empresa

Antonio Carlos Ferreira comentou que uma interpretação diversa transferiria os riscos da atividade empresarial para o comprador, contrariando a lógica do sistema de proteção ao consumidor. Conforme apontou, o CDC busca evitar que a parte mais fraca arque com os prejuízos decorrente de defeitos dos produtos.

O ministro ressaltou, por fim, que “este entendimento não deve ser interpretado como uma obrigação genérica dos fornecedores de disponibilizarem produto substituto durante o período de reparo na garantia. O que se estabelece é que, uma vez judicialmente reconhecida a existência do vício do produto, a indenização deverá abranger todos os prejuízos comprovadamente sofridos pelo consumidor, inclusive aqueles ocorridos durante o prazo do artigo 18, parágrafo 1º, do CDC”.

Leia o acórdão no REsp 1.935.157.

Fonte: STJ

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Respeito aos precedentes, um ponto de convergência no debate sobre o futuro do habeas corpus

Especialistas de diferentes esferas do Sistema de Justiça concordam em que a inobservância dos precedentes do STJ e do STF é uma das causas do aumento explosivo de habeas corpus nos tribunais.



Esta terceira e última parte da série de reportagens HC 1 milhão: mais ou menos justiça? propõe uma reflexão sobre como enfrentar o uso excessivo do habeas corpus sem prejudicar seu papel de garantia constitucional na proteção da liberdade. O desafio é complexo e sensível. Trata-se de equilibrar o peso das garantias fundamentais com a necessidade de racionalidade e eficiência no Sistema de Justiça penal.

No centro do debate, o que está em discussão é se é possível – e até que ponto – limitar o uso do habeas corpus em processos criminais. Várias propostas de mudanças jurisprudenciais e legislativas – como a criação de filtros de admissibilidade – estão na mesa, em um esforço para prestigiar o uso dos recursos e a própria função constitucional do HC.

Apesar de atuarem em diferentes esferas do Sistema de Justiça, os especialistas ouvidos convergem em um ponto fundamental: os operadores do direito devem seguir os precedentes fixados tanto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Para muitos, a inobservância das balizas estabelecidas pelas cortes superiores – especialmente por parte de magistrados de primeiro grau, tribunais estaduais ou regionais federais, além de integrantes do Ministério Público (MP) – é um dos principais fatores que alimentam o excesso de habeas corpus.

Precedentes criam unidade nacional na interpretação de questões jurídicas

O ministro Rogerio Schietti Cruz, integrante da Sexta Turma do STJ, diz que o julgamento pelo rito dos recursos repetitivos e a afetação de casos de direito penal para a Terceira Seção ou para a Corte Especial, bem como a edição de súmulas, são alguns mecanismos do tribunal para lidar com o congestionamento de processos: “Com isso, tentamos mostrar, não só à sociedade, mas a todos os tribunais, como pensa o STJ e como deve ser a interpretação das leis federais”.

Segundo o ministro, é importante sensibilizar toda a magistratura e o MP quanto à importância de seguir os precedentes.

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Na medida em que fixamos determinadas teses em julgamentos qualificados, com a composição ampla, em temas já pacificados, elas deveriam ser observadas por todos, de modo a criar uma unidade nacional na interpretação de questões jurídicas, evitando uma série de impetrações de habeas corpus que só ocorrem porque não há a observância dessas decisões.

Ministro Rogerio Schietti Cruz

O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Guilherme de Souza Nucci também acredita que, se fossem seguidos os entendimentos consolidados pelos tribunais superiores – especialmente os que são favoráveis ao réu –, muitos processos seriam resolvidos logo no primeiro grau de jurisdição, não havendo necessidade de habeas corpus ou recursos às demais instâncias por parte da defesa.


Um olhar específico sobre a real utilidade do habeas corpus

A promotora Fabiana Costa, chefe da Coordenação de Recursos Constitucionais do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), pondera que um olhar específico sobre a real utilidade do HC para a sua admissão pode ser uma medida eficaz no combate ao uso indiscriminado do instrumento, fora de suas finalidades constitucionais.

Fabiana observa que, diferentemente dos recursos no processo penal, que devem cumprir uma série de requisitos legais e formais para serem admitidos, o habeas corpus chega mais rápido para a análise do ministro relator, mesmo quando não guarda relação direta com a liberdade do paciente, nem com nulidades graves ou afrontas à jurisprudência consolidada. “Não é à toa que a maioria dos habeas corpus nem sequer são conhecidos”, enfatiza.

Outro ponto sensível destacado pela promotora refere-se à limitação da atuação do Ministério Público durante o processamento do habeas corpus: “O MP é ouvido como custos legis, mas o membro que conhece todas as peças do processo, conhece todas as cautelares, toda a tramitação daquele feito – que às vezes é extremamente complexo –, nem sequer é ouvido no momento em que o HC está sendo processado”.

Um exemplo de racionalização criado pela jurisprudência 

Em 2020, a Terceira Seção do STJ fixou um marco importante para conter a utilização excessiva do habeas corpus em situações já cobertas por recursos processuais próprios. No julgamento do HC 482.549, o colegiado entendeu que, uma vez interposto recurso cabível contra a mesma decisão judicial, o habeas corpus só poderá ser examinado se visar diretamente à tutela da liberdade de locomoção, ou se apresentar pedido distinto do recurso que reflita no direito de ir e vir.

O relator, ministro Rogerio Schietti, ressaltou que “é preciso respeitar a racionalidade do sistema recursal e evitar que o emprego concomitante de dois meios de impugnação com a mesma pretensão comprometa a capacidade da Justiça criminal de julgar de modo organizado, acurado e correto – o que traz prejuízos para a sociedade e os jurisdicionados em geral”.

Para o advogado criminalista Caio César Domingues de Almeida, no entanto, o habeas corpus é o instrumento mais eficaz para corrigir prisões ilegais e outros constrangimentos, e não pode sofrer restrições. “Um ponto crucial é a excessiva formalidade dos recursos. Se houvesse alguma alteração legislativa ou jurisprudencial para flexibilizar essas exigências nos recursos especial e extraordinário, isso poderia reduzir significativamente o número de habeas corpus impetrados”, opina.

Alteração do Código de Processo Penal divide opiniões

Uma oportunidade para a adoção dos aperfeiçoamentos em debate poderia ser a reforma do Código de Processo Penal (CPP), decretado por Getúlio Vargas em 1941. Diversas propostas já foram apresentadas ao Congresso Nacional nesse sentido, sendo uma delas o Projeto de Lei do Senado 156/2009, atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados (PL 8.045/2010). A proposta original, elaborada por uma comissão presidida pelo ministro do STJ Hamilton Carvalhido (falecido), buscava evitar a utilização do HC como substituto recursal, restringindo as hipóteses de seu cabimento.

De acordo com o ministro Ribeiro Dantas, membro da Quinta Turma, essa proposta poderia melhorar a estrutura recursal do processo penal e direcionar muitas questões para serem resolvidas por outros meios processuais mais adequados. Na avaliação do ministro, essa é uma discussão relevante, que deve envolver não apenas os operadores do Sistema de Justiça, mas também administradores públicos e representantes políticos.

Contudo, Ribeiro Dantas alerta que qualquer eventual modificação legislativa deve ser feita com extremo cuidado, já que o habeas corpus vai além de uma mera peça processual: trata-se de uma garantia constitucional fundamental. “Essa garantia é algo que muitos países não possuem, mas que no Brasil está expressamente consagrada na Constituição. Portanto, é necessário ter cautela ao tratar desse tema”, afirma.

Por sua vez, o defensor público Marcos Paulo Dutra sustenta que o CPP em vigor já contém mecanismos adequados para coibir o uso abusivo do habeas corpus. Para ele, o problema não está na ausência de regras, mas na forma como elas são aplicadas. Segundo Dutra, é preciso adotar uma análise mais rigorosa dos critérios legais existentes e, sobretudo, respeitar as balizas interpretativas consolidadas pelos tribunais superiores ao longo dos anos.

Dutra explica que, quando uma nova lei surge, há todo um processo de criação de jurisprudências, doutrinas e interpretações, que gera inseguranças e “coloca em xeque” tudo o que já foi construído sobre o assunto.

“Acredito que é adequado o caminho trilhado pelo STJ e pelo STF de construir balizas, via interpretação do próprio CPP, que permitam uma racionalização do emprego do habeas corpus. Ainda mais diante de um ordenamento jurídico que, nos últimos anos, tem se preocupado tanto em prestigiar os precedentes judiciais. Se isso for prestigiado, não tenho dúvidas de que o próprio número de habeas corpus será reduzido”, expõe o defensor.

Tutela de urgência requerida na petição do recurso especial

O advogado Caio César Domingues de Almeida, que também defende a preservação do habeas corpus nos moldes atuais, propõe uma alternativa voltada à estrutura recursal: a criação, no próprio recurso especial, de um espaço específico para que a defesa possa formular pedidos de tutela de urgência.

“Isso daria mais segurança aos advogados, que hoje temem interpor apenas o recurso e ver a matéria de direito simplesmente não ser apreciada. Atualmente, não há um mecanismo que permita à defesa fazer esse pedido diretamente na peça recursal. Instituir essa possibilidade de forma clara e regulamentada poderia reduzir a quantidade de habeas corpus e tornar o sistema mais eficiente”, argumenta.

Para o advogado, se houver uma mitigação das formalidades processuais nos recursos às cortes superiores, haverá uma redução significativa do número de habeas corpus impetrados: “O que precisa ser repensado é o funcionamento do sistema recursal, especialmente no que diz respeito aos recursos especial e extraordinário”.

Nessa mesma perspectiva, o ministro Ribeiro Dantas defende um sistema de agravos no processo penal, os quais seriam interpostos diretamente nos tribunais, com a possibilidade de concessão de tutelas penais de urgência.


Atualização da Lei de Drogas poderia reduzir o número de impetrações

Na opinião do desembargador Guilherme Nucci, outra medida que pode levar à redução do número de habeas corpus é a reforma de leis já defasadas ou carentes de regulamentação mais precisa – a exemplo da Lei de Drogas, que, segundo ele, responde pelo maior número de habeas corpus analisados atualmente nos tribunais. Para o magistrado, mais do que criar restrições, é necessário corrigir uma grande falha: a ausência de parâmetros objetivos que orientem os juízes de todo o país na aplicação da norma penal.

“Está na hora do legislador entrar em campo e definir definitivamente o que é natureza de drogas, quais são as drogas mais perigosas à saúde, quais não são ou são menos perigosas e qual é a quantidade ideal para se presumir quem é usuário e traficante – como o Supremo fez com a maconha”, avalia o desembargador.

A falta dessas definições, conclui, reflete-se inclusive no aumento de prisões, o que gera mais pedidos de habeas corpus e o aumento desnecessário da população carcerária.

Salvo-conduto para Cannabis medicinal garante direito à saúde e à liberdade

Em meio a toda essa discussão, o habeas corpus segue desempenhando um papel essencial na defesa de direitos fundamentais, até para tutelar, de forma indireta, o direito à saúde. É o que tem acontecido com pessoas que recorrem ao Poder Judiciário em busca da garantia de não serem presas nem submetidas a quaisquer medidas repressivas em razão do uso medicinal da Cannabis sativa.

Em várias decisões, o STJ já deu habeas corpus preventivos para pacientes ou familiares de pacientes que se valem do óleo de canabidiol (CBD), um composto químico da Cannabis sativa que não tem efeitos psicotrópicos, para o tratamento de diversas doenças.

O vídeo abaixo mostra um desses casos em que o salvo-conduto do tribunal permitiu que o cidadão não fosse alvo de sanções penais por cultivar a planta para fins terapêuticos: uma história sobre como os direitos à saúde, à dignidade e à liberdade foram preservados pelo instituto do habeas corpus. 

Fonte: STJ

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