A Quarta Turma reformou acórdão no qual o TJSP entendeu que, em leilões judiciais, a remuneração do leiloeiro poderia ser arbitrada sem a limitação de piso ou teto.
Ao reafirmar o caráter especial e cogente do Decreto 21.981/1932 – que regulamenta a profissão de leiloeiro e estabelece o mínimo de 5% para a sua comissão –, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para que seja feita a complementação do pagamento devido a um leiloeiro, até o mínimo legal.
Nos autos de uma falência, o tribunal paulista reduziu a comissão do leiloeiro de 5% para 2%, ao fundamento de que o artigo 884, parágrafo único, do Código de Processo Civil (CPC) viabiliza o arbitramento dessa remuneração nos leilões judiciais e não estipula piso ou teto.
Segundo a relatora na Quarta Turma, ministra Isabel Gallotti, o tratamento conferido à comissão do leiloeiro não sofreu alteração com a passagem para o regime do atual CPC, que, como o anterior, não estabelece o percentual devido a título de comissão, apenas o direito de recebê-la. Esse percentual mínimo, observou, é fixado pelo artigo 24, parágrafo único, do Decreto 21.981/1932, que regulamenta a profissão.
A ministra explicou que, com base nesse dispositivo legal, a Resolução 236/2016 do CNJ estabeleceu que o leiloeiro público terá direito, além da comissão fixada pelo juiz em no mínimo 5% sobre o valor da arrematação, ao ressarcimento das despesas comprovadas com remoção, guarda e conservação dos bens.
A relatora lembrou precedente do STJ segundo o qual a expressão “obrigatoriamente”, no parágrafo único do artigo 24 do Decreto 21.981/1932, revela que a intenção da norma foi estabelecer um valor mínimo, ou seja, pelo menos 5% sobre o bem arrematado. A ministra também destacou que o tribunal já se pronunciou sobre o caráter especial do decreto, em julgamento proferido pela Primeira Turma, em 2008.
Por fim, Isabel Gallotti ressaltou o julgamento de um procedimento administrativo no qual o CNJ, reafirmando a sua competência privativa para regulamentar a matéria, determinou à corregedoria do TJSP que se adequasse aos ditames legais quanto ao tema.
O excesso de judicialização é um problema que trava o desenvolvimento do setor aéreo e de sua infraestrutura, o que dificulta a diminuição dos valores cobrados pelas empresas de aviação. Essa é a análise de Fábio Campos, diretor de Assuntos Governamentais, Relações Aeroportuárias e Comunicação Corporativa da Azul Linhas Aéreas, feita durante o XI Fórum Jurídico de Lisboa.
De acordo com o executivo, o Brasil representa uma faixa de cerca de 2,7% dos voos de todo o mundo. Por outro lado, segundo ele, cerca de 90% das ações judiciais contra empresas aéreas de todo o mundo são movidas por consumidores brasileiros.
“De 2018 para 2019, a aviação adicionou 20% de viajantes, enquanto as ações judiciais cresceram em 109% nesse mesmo período. Em 2022, a gente já está coletando dados. Esses números triplicaram desde 2019. Temos um crescimento exponencial de uma indústria que se usa do sistema judiciário, que inclusive tem a ver muito com essa questão de digitalização, justamente porque muitas delas são plataformas digitais, aplicativos, que captam clientes no intuito da judicialização.”
Campos cita a Resolução 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que estabelece as condições gerais aplicáveis ao transporte aéreo regular de passageiros, seja ele doméstico ou internacional. “Ela é uma regulamentação, quando comparada com o resto do mundo, mais pró-consumidor que existe. Não estou questionando a resolução, mas acho que você já põe o consumidor numa situação extremamente positiva quando comparado ao resto do mundo.”
Fábio Campos participou da mesa “Turismo, infraestrutura, governança e perspectivas”, que foi mediada por Ticiano Figueiredo, presidente do Instituto de Garantias Penais e sócio-fundador do Figueiredo & Velloso Advogados Associados.
O presidente da Embratur, Marcelo Freixo, defendeu a necessidade de se colocar o turismo como um elemento central de modelo de desenvolvimento que dialogue com a sustentabilidade no Brasil. “O turismo, com toda a precariedade que a gente tem, representa historicamente 7,8% do PIB do país.”
Freixo acredita que nenhum outro setor tem a capacidade que o turismo tem de oferecer retorno à economia. “É preciso mudar a mentalidade política brasileira. Eu não estou falando nem com a direita, nem com a esquerda. Estou falando com todos. É preciso mudar a mentalidade política e colocar o turismo no lugar central do modelo de desenvolvimento.”
A ex-ministra Daniela Carneiro participou da mesa antes de deixar o comando do Ministério do Turismo. Ela lembrou que o turismo “é a arte de vender felicidade”. Para que o setor se fortaleça, é preciso dar maior atenção à infraestrutura e qualificação de profissionais que atuam na área. “Somente de contratos que já temos ativos no Brasil, são R$ 2,4 bilhões em investimentos em obras.”
Ex-presidente do Turismo de Portugal, Luis Araújo destacou que um dos principais problemas do setor no país europeu é a sazonalidade, quando a movimentação de turistas se concentra em um único período do ano. Além disso, lembrou a baixa qualificação dos profissionais. “60% das pessoas que trabalham no turismo, quase 300 mil pessoas, têm apenas um ensino básico. Isto é inadmissível.”
Diretor da Agência Nacional dos Transportes Terrestre (ANTT), Guilherme Theo Sampaio destacou que o Brasil é um país que movimenta grande parte do seu turismo em rodovias. “Podemos dizer que, hoje, 90% das pessoas se conectam através do transporte rodoviário de passageiros. Paralelo a isso, todo nosso transporte efetivo de cargas e pessoas é feito através de rodovias. Nesse aspecto do âmbito de atuação da agência, nossa competência é fomentar e desenvolver os projetos de infraestrutura de concessões de rodovias e ferrovias.”
Secretário de Turismo da Bahia, Luís Maurício Bacellar Batista disse que o estado possui uma estratégia turística baseada em um farol de ações do governo local. “São dois pilares: a inovação e a sustentabilidade. Em cima deles, nós trabalhamos em quatro eixos: biossegurança sanitária, capacitação e qualificação de mão de obra, obras de infraestrutura e a promoção do ‘destino Bahia’. O desenvolvimento destas ações colocaram o estado em um espaço privilegiado.”
Deputado federal por Pernambuco, Felipe Carreras disse que o básico de infraestrutura turística é a capacitação dos profissionais que atuam na área. “Sem sombra de dúvidas, a principal indústria geradora de empregos é o turismo. Para a gente ter uma política de Estado, de gestão com resultado, é importante ter continuidade de políticas públicas voltadas para o turismo para a gente poder promover, capacitar, gerar emprego e renda.”
11ª Edição Especial do Informativo de Jurisprudência traz julgados de direito público
A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) divulgou a 11ª edição extra do Informativo de Jurisprudência, com decisões sobre o ramo do direito público. A equipe de publicação destacou três dos diversos julgamentos da edição.
No primeiro caso, a Primeira Seção decidiu, por unanimidade, que se admite o distinguishing quanto ao Tema 839/STF, para aplicar o prazo decadencial do artigo 54, caput, da Lei 9.784/1999, na hipótese em que a anulação da concessão de anistia tem como fundamento a irregular acumulação de dois pagamentos, benefícios ou indenizações, com idêntico fato gerador. O processo está registrado no MS 17.874, de relatoria da ministra Regina Helena Costa.
No segundo destaque, a Primeira Turma julgou, por unanimidade, que diante da decisão do STF na ADI 6.096/DF, não é possível inviabilizar o próprio pedido de concessão do benefício previdenciário (ou de seu restabelecimento) em razão do transcurso de quaisquer lapsos temporais – seja decadencial ou prescricional, de modo que a prescrição se limita apenas às parcelas pretéritas vencidas no quinquênio que precedeu à propositura da ação. O AgInt no REsp 1.590.354 é de relatoria do ministro Paulo Sérgio Domingues.
Em um terceiro julgado, a Segunda Turma, por unanimidade, decidiu que nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a aplicação sucessiva das diversas faixas de alíquotas de honorários advocatícios dá-se quando o benefício econômico obtido pelo vencedor superar a primeira faixa do escalonamento contido no artigo 85, parágrafo 3º, do CPC/2015, não havendo distinção se vencedora a Fazenda Pública ou a parte contrária. A tese está fixada no REsp 1.769.017, de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques.
As instâncias ordinárias haviam decidido que o dinheiro – R$ 1,8 mil – deveria ficar em conta judicial e só poderia ser sacado depois que os filhos atingissem a maioridade.
Com base nos princípios do melhor interesse da criança e da razoabilidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou que duas crianças, representadas pela mãe, levantem saldo residual previdenciário de aproximadamente R$ 1,8 mil depositado judicialmente em conta poupança do pai falecido. O levantamento havia sido negado pelas instâncias ordinárias sob o argumento de que a operação só seria possível quando as crianças atingissem a maioridade.
“A negativa injustificada de levantamento de valores depositados em juízo a título de herança devida a beneficiários menores representados por sua genitora ofende o disposto no artigo 1.689, I e II, do CC/2002, especialmente quando a quantia, ainda que módica, possa favorecer as condições de alimentação, educação e desenvolvimento das crianças (artigo 227, caput, da CF/1988)”, afirmou o relator do recurso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
No pedido de expedição de alvará, a Defensoria Pública alegou que os filhos viviam em estado de pobreza, de forma que os valores seriam imediatamente revestidos em benefício deles, especialmente para gastos com educação.
Em primeiro grau, o juiz determinou a expedição de alvará para levantamento do valor residual, mas indeferiu o pedido de liberação imediata dos valores, por entender não ter sido comprovada nenhuma das hipóteses dos artigos 1.753 e 1.754 do Código Civil, motivo pelo qual definiu que o montante deveria ficar depositado em conta judicial até que as crianças atingissem a maioridade.
A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o qual considerou que, como os filhos já recebiam pensão por morte, não ficou demonstrada situação excepcional que permitisse a liberação imediata do saldo previdenciário.
Rendimento de valores em poupança é menor do que benefício social em favor dos menores
Ricardo Villas Bôas Cueva apontou que os pais são administradores e usufrutuários dos bens dos filhos menores e, salvo motivo justificado, têm legitimidade para levantar valores depositados em prol das crianças.
Segundo o ministro, considerando que o dinheiro está depositado em caderneta de poupança – aplicação conservadora e extremamente suscetível à corrosão inflacionária –, os valores aplicados têm “rendimento inferior à sua importância social”, que é a destinação em benefício das crianças.
“Ora, a morte do genitor já impõe, naturalmente, uma reestruturação das condições financeiras do núcleo familiar, não havendo motivo para se exigir, além das razões já postas em juízo, outras justificativas para o levantamento do valor depositado em caderneta de poupança”, disse.
Em seu voto, o relator destacou, ainda, que não há notícia de conflito de interesses entre os filhos e a mãe, tampouco discussão sobre o exercício do poder familiar.
“Com efeito, estando a genitora no exercício responsável do poder familiar, o que a habilita a administrar livremente os bens dos filhos, não há motivo para se restringir a movimentação de valores pecuniários que podem beneficiá-los antes da maioridade”, concluiu o ministro ao autorizar o levantamento da quantia.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Com o objetivo de registrar manifestações que possam contribuir com esclarecimentos técnicos e jurídicos, metodologias, indicadores e boas práticas para fixação e quantificação dos danos ambientais, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizará no dia 27 de julho, das 9h às 18h, audiência pública sobre quantificação de dano ambiental. A participação será presencial e haverá transmissão pelo canal do CNJ, no YouTube.
Os participantes inscritos vão se manifestar, prioritariamente, sobre os seguintes pontos: possibilidade do uso de ferramentas de geoprocessamento em auxílio à quantificação de dano ambiental; levantamento de indicadores, métricas e parâmetros (nacionais ou internacionais) para quantificação do dano ambiental que altera a condição de flora existente e uso potencial de métricas baseadas em emissões de gases de efeito estufa ou supressão de sumidouros por hectare afetado pela conduta lesiva, a exemplo da utilização de instrumentos do mercado voluntário de carbono e sua adequação à realidade brasileira.
As manifestações visam auxiliar na padronização de referências técnicas para consideração, pelos magistrados(as), das provas produzidas exclusivamente por sensoriamento remoto ou obtidas por satélite no acervo probatório das ações judiciais ambientais e na elaboração de parâmetros adequados à quantificação do impacto de dano ambiental na mudança climática global.
TS, com informações do CNJ
FONTE: Assessoria de Comunicação Social Tribunal Regional Federal da 1ª Região
O Supremo Tribunal Federal, no último dia 30 de junho, ao julgar o Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 848.107, afetado ao Tema 788 da repercussão geral, pacificou o entendimento de que “o prazo para a prescrição da execução da pena concretamente aplicada somente começa a correr do dia em que a sentença condenatória transita em julgado para ambas as partes”.
Significa dizer que a pretensão executória não começa mais com o simples trânsito em julgado para a acusação, situação em que normalmente há recurso da defesa pendente de julgamento.
O artigo 112, inciso I, do Código Penal, prevê que a prescrição começa a correr do dia em que a sentença condenatória transita em julgado “para a acusação”. Porém, o dispositivo foi dado pelo STF como incompatível com a Constituição, devendo ser interpretado em harmonia com o novo entendimento.
Até então, embora a matéria não se assentasse em terra firme, predominava a literalidade do Código Penal, tendo inclusive sido salientado no acórdão revisto pelo STF que “não [é] cabível considerar como termo inicial do prazo prescricional a data do trânsito em julgado definitivo [para a acusação e para a defesa], sob pena de eleger termo interruptivo não previsto em lei”.
O próprio Supremo já decidira, diversas vezes, que “cuidando-se de execução da pena, o lapso prescricional flui do dia em que transitado em julgado para a acusação, conforme previsto no artigo 112 combinado com o artigo 110 do Código Penal” (STF, ARE 764.385/DF-AgR, relator ministro Luiz Fux, T1, DJe 2/5/2014 — vide também HC 113.715, relatora ministra Cármen Lúcia, T2, DJe 28/5/2013; HC 110.133, relator ministro Luiz Fux, T1, DJe 19/4/2012; ARE 758.903, relatora ministra Cármen Lúcia, T2, DJe 24/9/2013; RE 771.598/DF-AgR, relatora ministra Cármen Lúcia, T2, DJe de 14/2/2014).
Ocorre que em 2020, ao julgar as Ações Diretas de Constitucionalidade (ADC) 43, 44 e 54, o Supremo conferiu nova interpretação aos princípios constitucionais da estrita legalidade e da presunção de inocência para reconhecer a inconstitucionalidade da execução antecipada da pena, tendo esse julgamento servido de parâmetro à nova tese firmada sobre o termo inicial da prescrição da pretensão executória.
O raciocínio é simples: de um lado, se a legalidade penal e a presunção de inocência valem para obstar a formação definitiva da culpa por ausência de trânsito em julgado da condenação, sendo que de acordo com o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição, “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, então, de outro lado, os mesmos princípios devem valer também para o nascimento da pretensão executória, à luz do princípio da actio nata (STF, ARE 682.013/SP-AgR, T1, relatora ministra Rosa Weber, DJe 6/2/2013), segundo o qual, em linhas gerais, o termo inicial do prazo prescricional é a data do nascimento da pretensão resistida.
Ou seja, a pretensão executória somente surgirá quando a culpa do acusado estiver definitivamente formada por sentença penal condenatória transitada em julgado não para a acusação, não para a defesa, mas para ambas as partes, pois esse é o primeiro e único momento em que se é conhecida, de fato e de direito, a culpa indene de dúvidas em todos os seus aspectos.
Como afirmou o STF, “não podendo o Ministério Público executar o título condenatório, descabe cogitar do início do prazo prescricional”.
Com as vênias devidas, não podemos olvidar que a prescrição penal se fundamenta na “inconveniência da aplicação da pena muito tempo após a prática da infração” (CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 614), pois quando o fato é constatado e as provas são certas, o castigo “deve ser seguido de perto o crime, se se quiser que o mesmo seja um freio útil contra os celerados” (BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Edipro, 2018. p. 74), não podendo o acusado estar sujeito a sobressaltos e intempéries decorrentes da letargia estatal sistêmica e extremada para julgar os seus recursos, sobretudo quando as instâncias revisionais proverem tais recursos de qualquer modo.
Isso porque o tempo demasiado para a formação da culpa é fator de insegurança e de injustiça, motivo pelo qual defendemos que a demora excessiva há de assumir sempre maior importância em matéria de direito sancionador, justamente pela maior gravidade da coerção estatal que “intervém nos direitos fundamentais da pessoa humana, individualmente considerados, da maneira mais terrível, concreta, direta e ‘inesperada'” (FEITOZA, Denílson. Direito processual penal: teoria, crítica e práxis. Niterói: Impetus, 2010. p. 48).
Não há como negar coerência lógica do STF nos julgamentos do Tema 788 e das ADCs 43, 44 e 54. Cabe lembrar, porém, o aforismo popular de que “tudo na vida é faca de dois gumes”, não sendo diferente no processo penal, de modo que a vantagem atual poder ser a desvantagem futura, especialmente quando atingir direitos fundamentais.
Por: Willer Tomaz é sócio do escritório Aragão & Tomaz Advogados Associados.
A doação inoficiosa, que ultrapassa a metade do patrimônio do doador, invadindo a parte dos herdeiros necessários, não pode ser caracterizada apenas no momento da abertura da sucessão.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou que é na data da liberalidade que se determina se a doação realizada avançou sobre o patrimônio correspondente à legítima dos herdeiros necessários – o que a tornaria nula.
Para o colegiado, o excesso caracterizador da doação inoficiosa – que ultrapassa a metade do patrimônio do doador, incidindo na parte dos herdeiros necessários – não pode ser considerado no momento da morte do doador e da abertura da sucessão, conforme precedentes da corte.
Na origem do caso, os herdeiros do falecido ajuizaram ação de nulidade de doação de imóvel contra a donatária. O juiz considerou a ação procedente e decretou a nulidade integral da doação, sob o fundamento de que o falecido, ao dispor de seu patrimônio, não observou o valor que deveria ser reservado aos herdeiros necessários.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu parcial provimento ao recurso da donatária para limitar a nulidade à parte que teria excedido a porção disponível do patrimônio.
Ao interpor recurso especial, a beneficiária da doação sustentou que, seja ao tempo da liberalidade, seja ao tempo do falecimento, o bem doado pelo falecido era muito inferior aos ativos financeiros que ele possuía no exterior, os quais seriam capazes de garantir a legítima dos herdeiros.
É irrelevante se os outros bens foram revertidos em favor dos herdeiros
A relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que o tema deve ser analisado conforme o disposto no artigo 549 do Código Civil (CC), ressaltando que há entendimento consolidado da corte no sentido de que o excesso caracterizador desse tipo de doação deve ser considerado no momento da liberalidade, e não no momento do falecimento do doador.
A ministra apontou, como fatos incontroversos no processo, que a doação ocorreu na época em que o falecido possuía mais de 2 milhões de dólares em ativos financeiros no exterior, e que o imóvel em discussão não valia mais do que 50% de tais ativos.
A relatora ressaltou que “é irrelevante saber se os demais bens existentes ao tempo do ato de liberalidade foram, ou não, efetivamente revertidos em favor dos herdeiros necessários após o falecimento do doador ou se os referidos bens compuseram, ou não, o acervo hereditário”.
Para Nancy Andrighi, o destino dos demais bens nada tem a ver com a controvérsia sobre a doação. “Importa, no contexto em exame, apenas definir se em 2004, ano da doação, o bem imóvel doado à recorrente era representativo de mais de 50% do patrimônio total do doador – e isso, conforme se viu, não ocorreu”, concluiu a ministra.
“Pobre, carente, negra, subordinada a um homem, condenada pelo crime de tráfico de drogas e mãe irresponsável”. É assim que são descritas, por membros do Judiciário e do Ministério Público, as mulheres gestantes, lactantes e com filhos de até 6 anos de idade que chegam ao sistema penal no Brasil, revela estudo feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Segundo o estudo, mesmo após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que concede a prisão domiciliar a todas as gestantes e mães de crianças menores de 12 anos presas preventivamente, de três a cada dez acusadas grávidas ainda são presas no país.
“O que os resultados, seja no âmbito quantitativo ou qualitativo, nos retratam é que, a despeito de conquistas normativas, ainda temos muitos desafios para a implementação de fato do Marco Legal da Primeira Infância”, diz a pesquisadora do Pnud Paola Stuker. Segundo ela, o que ocorre, na prática é o que consta no título na pesquisa, a invisibilização desses casos.
Mesmo após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que concede a prisão domiciliar a todas as gestantes e mães de crianças menores de 12 anos presas preventivamente, de três a cada dez acusadas grávidas ainda são presas no Brasil – Arquivo/Agência Brasil
O Marco Legal da Primeira Infância estabelece diretrizes para políticas públicas e garantias específicas para crianças de até 6 anos de idade, incluindo políticas de saúde, que abrangem cuidados desde a gravidez e de educação e assistência social, entre outras.
De acordo com Paola, diante desse normativo, as ações devem também chegar tanto às adolescentes em regime de internação quanto a mulheres presas grávidas ou mães. “É muito importante olhar para esse público, porque é importante olhar para todos os públicos que estão relacionados com a criação de seres humanos na primeira infância. Olhar para todas as famílias, todos os profissionais que são responsáveis pelos cuidados e proteção de crianças na primeira infância. A gente tem que olhar também para todas as gestantes, todas as mães, independente das condições em que se encontram”, diz Paola.
Queda no encarceramento
O relatório mostra que houve queda no percentual de encarceramento após o Marco Legal da Primeira Infância. Enquanto, em 2016, o percentual de decisões por encarceramento para mulheres gestantes e não gestantes nas audiências de custódia era praticamente equivalente, de 49,5% e 49,6%, respectivamente, a proporção passou, em 2020, para 31,6% e 42,4%, respectivamente. Isso mostra que uma a cada três gestantes ainda é encarcerada.
“Precisamos, sim, melhorar muito”, diz a juíza auxiliar da presidência do CNJ, Karen Luise de Souza. “Vemos que esses julgamentos não observam tudo que se vem dizendo sobre os impactos no desenvolvimento das crianças, que acabam sendo privadas do convívio com seus pais e responsáveis ou acabam se desenvolvendo dentro de um ambiente de privação de liberdade.”
Um dos trechos de entrevista com integrante da Defensoria Pública, que não é identificado, publicado no estudo, bate com o que diz Karen Souza e mostra que os resultados dos julgamentos dependem muito do juiz. “Depende muito da pessoa que está ali julgando. Tem juízes que, sim, que atendem nesse sentido. Entendem a infância como prioridade absoluta e falam: ‘apesar do que aconteceu, agora vamos pensar nessa criança que está chegando, ou que já chegou e que está precisando da mãe’. Tem juízes que não. Aí, a gente tem que recorrer. Tem casos que chegam ao tribunal. No tribunal, dependendo da turma, a gente também não tem sucesso. Às vezes, tem que levar para cima, tem que levar para o STJ [Superior Tribunal de Justiça]. Então, é muito relativo. É como eu disse: ‘esbarra-se muito na questão do ato infracional’”.
Outro trecho do relatório ressalta que, entre as mulheres adultas, muitas são vistas, sobretudo por membros do Judiciário e do Ministério Público, como “irrecuperáveis”, de modo que a relação materno-infantil pareceu ser mobilizada, em muitos momentos, como mecanismo adicional de punição.
Ações do CNJ
Segundo Karen Souza, o CNJ busca orientar os magistrados para que consideram prioritária a questão da primeira infância nas decisões. O Manual Resolução nº 369, disponível na página do CNJ, traz um capítulo inteiro com o tema Elementos para facilitar a tomada de decisão.
“A [Resolução] 369 vem exatamente para oferecer essas ferramentas, auxiliar os colegas na tomada de decisões, estabelecer procedimentos. A partir dela, sem interferir na independência funcional, a gente pretende modificar o que está aí e que impacta diretamente a vida de crianças e adolescentes”, diz a juíza.
Irregularidades encontradas em transações e valoração de bens ressaltam o compromisso do Tribunal com suas competências constitucionais
Resumo:
Em auditoria sobre o Balanço-Geral da União (BGU), o TCU identificou duas distorções de valor: em transações intraorçamentárias e na valorização de bens imóveis classificados incorretamente.
O relatório da fiscalização é baseado nas auditorias financeiras realizadas pelo TCU e pela Controladoria-Geral da União (CGU) sobre os componentes significativos do BGU.
Considerando apenas o trabalho das equipes do TCU, foram fiscalizados R$ 14,9 trilhões no aspecto patrimonial e R$ 4,1 trilhões na perspectiva orçamentária.
Na sessão do último dia 12 de julho, o Plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) analisou relatório de auditoria financeira sobre as Demonstrações Contábeis Consolidadas da União, conhecidas como Balanço-Geral da União (BGU), do exercício de 2022. A fiscalização buscou avaliar a adequação das demonstrações contábeis em relação à posição patrimonial e financeira da União em 31 de dezembro de 2022 e à execução orçamentária.
O relatório da fiscalização é baseado nas auditorias financeiras realizadas pelo TCU e pela Controladoria-Geral da União (CGU) sobre os componentes significativos do BGU. Essa seleção foi feita com base na representatividade do orçamento e dos ativos de cada componente. As auditorias abarcaram oito ministérios com maior relevância financeira e o Fundo do Regime Geral da Previdência Social, que representam mais de 90% da despesa orçamentária e dos ativos da União.
Considerando apenas o trabalho das equipes do TCU, foram fiscalizados R$ 14,9 trilhões no aspecto patrimonial (bens e direitos, obrigações e patrimônio líquido) e R$ 4,1 trilhões na perspectiva orçamentária (despesas empenhadas e receitas arrecadadas).
O relatório subsidiou a elaboração do Capítulo 5 do Relatório sobre as Contas do Presidente da República relativas ao exercício de 2022 e a emissão do Parecer Prévio correspondente. O Tribunal emitiu opinião com ressalva sobre as demonstrações contábeis consolidadas da União devido à relevância das distorções detectadas.
“Esta auditoria propicia o aprimoramento dos controles internos e dos procedimentos contábeis dos órgãos da administração pública federal, alinhando-os aos padrões internacionais e contribuindo para o aumento da transparência, da credibilidade e da utilidade das informações financeiras apresentadas nas demonstrações contábeis consolidadas da União e nas demonstrações contábeis dos órgãos e entidades”, afirma o relator do processo, ministro Jorge Oliveira, em seu voto.
Na auditoria foram identificadas duas distorções de valor, notadamente:
distorção no montante de R$ 23,56 bilhões referente a transações intraorçamentárias que deveriam ter sido excluídas na elaboração das demonstrações consolidadas;
distorção no montante de R$ 95,95 bilhões concernente a valorização de bens imóveis classificados erroneamente.
Decisão do Plenário
Os ministros do TCU decidiram recomendar que a Secretaria do Tesouro Nacional revise e ajuste os procedimentos de consolidação das demonstrações contábeis da União. O objetivo é eliminar as operações intragrupo até o limite em que o equilíbrio dessas demonstrações não seja comprometido. Além disso, as operações que não forem excluídas devem ser consideradas imateriais em termos de classes de transações e saldos das demonstrações contábeis.
Também será informado à Secretaria do Tesouro Nacional e à Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União que a inadequação dos procedimentos contábeis relacionados à valorização e desvalorização de bens imóveis resultou em distorções significativas nos saldos e elementos dos demonstrativos contábeis de órgãos e entidades da administração pública federal, e nos demonstrativos contábeis consolidados da União.
A decisão do Plenário do TCU deverá ser comunicada aos Ministérios da Fazenda e da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e à Controladoria-Geral da União, e incluída no processo de apreciação das Contas do Presidente da República referentes ao exercício de 2022.
O relator do processo é o ministro Jorge Oliveira. A unidade técnica do TCU responsável pela fiscalização foi a Unidade de Auditoria Especializada em Certificação de Contas (AudFinanceira).
A maior parte do conteúdo de desinformação, as famigeradas fake news, que chega ao Poder Judiciário do Brasil está relacionada a disputas políticas, em especial as de natureza eleitoral.
Essa foi a constatação de uma pesquisa feita pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV Conhecimento, que teve seus resultados apresentados durante a mesa de discussões “Um novo tempo de pesquisas judiciais — Dados sobre como decide a magistratura brasileira”, que fez parte do XI Fórum Jurídico de Lisboa, evento que reuniu no fim de junho vários dos mais importantes nomes do Direito do Brasil e da Europa.
O debate foi mediado pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, que também é o corregedor nacional do Conselho Nacional de Justiça. Além disso, Salomão é o coordenador geral do Centro de Inovação da FGV Conhecimento, unidade que trabalha com levantamentos do tipo há cerca de cinco anos.
Coordenadora acadêmica do Centro, a juíza federal Caroline Tauk, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), destacou que o levantamento encontrou, inicialmente, mais de três mil ações judiciais sobre desinformação entre 2019 a 2022. Diante desse volume de processos, o grupo fez um recorte sobre as decisões tomadas por tribunais superiores.
No Supremo Tribunal Federal, de acordo com os pesquisadores, pessoas físicas, políticos e empresas são os que mais acionam a corte para questionar conteúdo de desinformação. No STJ, o perfil é semelhante, mas restrito a pessoas físicas e empresas. E o Tribunal Superior Eleitoral concentra a maior parte dos casos, motivados principalmente por políticos e partidos.
As classes processuais são variadas. No STJ, por exemplo, são observados casos no âmbito civil e até Habeas Corpus.
“A gente tem no Brasil um cenário de desinformação eminentemente eleitoral. No TSE, as ações que discutiram fake news e desinformação aumentaram mais de 300% nas últimas eleições. Em 2021, foram 31 ações em que políticos diziam que havia conteúdo falso sendo propagado contra eles. Esse número aumentou para 127 em 2022. A maior parte da desinformação está relacionada ao conteúdo eleitoral.”
Justiça em Números Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e coordenador adjunto do Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV Conhecimento, Elton Leme destacou o avanço das pesquisas na área e lembrou a implantação do levantamento “Justiça em Números”, do CNJ. “É um grande instrumento para conduzir e controlar a qualidade e a produção do Poder Judiciário.”
O magistrado afirmou que o desafio atual do Judiciário é entender e enfrentar as novas demandas da sociedade. “Um dos temas sobre os quais nós temos uma pesquisa é a questão da moderação de conteúdo de plataformas sociais. Como é uma pesquisa ainda preliminar, houve um foco centrado no STJ para saber como a questão da moderação de conteúdo, à luz do Marco Civil da Internet, é enfrentada.”
Juízes do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), Daniela Pereira Madeira e Marcus Livio Gomes trabalham em conjunto em análises sobre crimes e decisões sobre questões ambientais.
Gomes destacou o uso de ferramentas e de pesquisas que ajudam magistrados a tomar decisões mais precisas sobre o tema, como é o caso do Datajud. “Estamos fazendo política pública baseada em evidências. O Poder Judiciário sempre foi intuitivo ao lidar com provimento de resoluções. A partir de agora, nós temos a real fotografia, sabemos exatamente o que está acontecendo. A pesquisa baseada em evidências, em dados, possibilita essas abordagens.”
O evento Esta edição do Fórum Jurídico de Lisboa, que aconteceu entre 26 e 28 de junho, teve como mote principal “Governança e Constitucionalismo Digital”. O evento foi organizado pelo IDP, pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (ICJP) e pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV Conhecimento (CIAPJ/FGV)
Ao longo de três dias, a programação contou com 12 painéis e 22 mesas de discussão sobre temas da maior relevância para os estudos atuais do Direito — entre eles debates sobre mudanças climáticas, desafios da inteligência artificial, eficácia da recuperação judicial no Brasil e meios alternativos de resolução de conflitos.
Fonte: Conjur
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