Delegado da PF diz que há indícios de ação coordenada em incêndios

O delegado da Policia Federal Humberto Freire de Barros disse que parte dos incêndios florestais no país pode ter ocorrido por meio de ações coordenadas.  A declaração do delegado foi dada em entrevista realizada nesta sexta-feira (13) pela Globo News.

Barros é diretor de Amazônia e Meio Ambiente da PF. Segundo ele, a investigação preliminar da polícia aponta para a realização de incêndios simultâneos.

“A gente vê que alguns incêndios começaram quase que ao mesmo tempo. Isso traz o indício de que podem ter acontecido ações coordenadas. É um ponto inicial da investigação”, afirmou na entrevista.

A hipótese de ação humana em parte das queimadas que assolam o país neste mês também já foi levantada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, que determinou medidas para o enfrentamento aos incêndios na Amazônia e no Pantanal.

Na terça-feira (10), durante audiência de conciliação realizada pela Corte, Dino defendeu a investigação e punição de quem provoca queimadas ilegais.

“Há ação humana. Por isso, o Supremo vem com essa ideia de diálogo, mas, ao mesmo tempo, de coerção, investigação e punição dessa ação humana”, disse o ministro. 

De acordo com levantamento mais recente do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, estão sendo usados para o combate às chamas no Pantanal 842 profissionais e 18 aviões. Há 116 incêndios registrados e 83 extintos.

Fonte:

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O que diferencia a litigância predatória das ações legítimas no Judiciário?

Nos últimos tempos, o termo “litigância predatória” tem aparecido com frequência nos tribunais e na mídia. Mas o que ele realmente significa? Em resumo, trata-se do uso abusivo do direito de entrar com ações judiciais, geralmente para obter vantagens indevidas, prejudicar a outra parte, ou sobrecarregar o poder judiciário. De outra forma, ações legítimas são aquelas movidas com fundamento e razões, buscando a proteção de direitos reais.

Papéis, processos, pilha de documentos, contratos, acordos, lentidão da Justiça, morosidade

A litigância predatória pode ser bem exemplificada: um advogado ou um cliente que decida processar alguém várias vezes, utilizando-se de documentos fraudulentos, fatiando ações, ou até mesmo ajuizando ações em que o cliente sequer sabe de sua existência, mesmo sabendo que o motivo é fraco ou inválido. O objetivo é forçar a outra parte a gastar tempo e recursos se defendendo, ou mesmo tentando obter um acordo, já que muitas vezes se torna mais fácil para a outra parte pagar a continuar lutando na Justiça. Esse tipo de comportamento é o que chamamos de litigância predatória.

Já as ações legítimas são muito diferentes. Pensemos em uma pessoa ou empresa que realmente teve seus direitos violados —seja porque não recebeu um pagamento devido, sofreu um dano ou teve algum prejuízo que mereça compensação. Neste caso, a ação judicial é movida com base em fatos e objetivos, buscando uma solução justa e proporcional. Essas demandas jamais serão consideradas “predatórias” e terão seu andamento regular perante o poder judiciário com um julgamento imparcial e legítimo.

Como identificar a litigância predatória?

Um sinal claro de litigância predatória é quando um advogado ou cliente entra com várias ações parecidas contra a mesma parte, mesmo depois de perder casos anteriores. O propósito é tentar “cansar” a outra parte, abarroar o Judiciário e obter uma vantagem indevida.

Em muitos casos, a litigância predatória tem como objetivo obter algum tipo de vantagem que não deveria existir, como uma indenização ou um acordo que favoreça a parte que está abusando do direito de ação.

O uso repetitivo de recursos judiciais sem fundamentos tem sido objeto de inúmeros estudos, levantamentos e notas técnicas pelo país. Consiste, normalmente, no ajuizamento ou provocação de lesões em massa.

Como já identificado pelo CNJ e também nas notas técnicas produzidas pelos centros de inteligência de diversos tribunais, tais como do TJ-MT, TJ-MS, TJ-BA, TJ-RN, alguns indicativos de demandas predatórias ou fraudulentas se relacionam com as seguintes características: iniciais acompanhadas de um mesmo comprovante de residência para ações diferentes; sem documentos comprobatórios mínimos ou documentos não relacionados com a causa de pedir, além de procurações genéricas e a distribuição de ações idênticas.

A litigância predatória sobrecarrega o sistema de Justiça, deixando-o mais lento e menos eficiente. Isso afeta todos que precisam da Justiça, desde cidadãos comuns até grandes empresas. Conforme dados do CNJ, entre 2016 e 2021 somente no estado de São Paulo houve a distribuição atípica de 330 mil processos, com impacto de mais de R$ 2,7 bilhões aos cofres públicos.

Grandes bolsos

Bancos e outras instituições financeiras são frequentemente alvos de ações predatórias, pois são percebidos como tendo “grandes bolsos” e propensos a acordos para evitar custos maiores. Isso aumenta as despesas com advogados e pode prejudicar a reputação da instituição.

Quando o sistema judicial é ocupado por processos abusivos, aqueles que têm demandas reais acabam esperando mais tempo para ver suas questões resolvidas, o que pode trazer prejuízos financeiros e emocionais.

O Código de Processo Civil permite que juízes apliquem multas contra quem age de má-fé no processo, tentando desestimular a litigância predatória. Ferramentas tecnológicas, como softwares de análise de dados, podem ajudar a identificar padrões de litigância predatória, facilitando a ação rápida dos tribunais e das partes envolvidas.

Distinguir litigância predatória de ações legítimas é fundamental para garantir a Justiça e o bom funcionamento do sistema judiciário. Saber diferenciar essas práticas permite que advogados, juízes e as próprias partes envolvidas tomem medidas mais eficazes contra litígios abusivos, protegendo aqueles que realmente precisam da Justiça.


Referências

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/04102023-Entidades-temem-que-combate-a-litigancia-predatoria-prejudique-advocacia-e-defesa-de-interesses-coletivos.aspx

https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/artigos-discursos-e-entrevistas/artigos/2022/litigancia-predatoria-compromete-garantia-constitucional

https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/litigancia-predatoria/#:~:text=O%20fen%C3%B4meno%20da%20litig%C3%A2ncia%20predat%C3%B3ria,uso%20abusivo%20do%20Poder%20Judici%C3%A1rio.

https://www.tjmt.jus.br/noticias/69852#.ZBuka3bMKUk

https://consumidormoderno.com.br/litigancia-predatoria-consumo/#:~:text=Na%20ocasi%C3%A3o%2C%20foram%20expostos%20os,R%24%202%2C7%20bilh%C3%B5es.

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Projeto inclui gordofobia na lei que define crimes resultantes de preconceito de raça e cor

O Projeto de Lei 1786/22 inclui a discriminação ou preconceito em razão do peso corporal relacionado à obesidade – a gordofobia – na lei que define os crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (7.716/89). 

Em análise na Câmara dos Deputados, a proposta foi apresentada pelo deputado José Guimarães (PT-CE). 

Discussão e votação de propostas. Dep. José Guimarães (PT-CE)
José Guimarães: proteção legal é importante para mudar a sociedade – Mário Agra/Câmara dos Deputados

Na avaliação do parlamentar, “como a gordofobia é um preconceito entranhado na sociedade, encorajado por órgãos de saúde pública, campanhas publicitárias, programas de TV e filmes em que pessoas acima do peso viram alvo de piadas, a proteção legal é importante e necessária para que ocorram mudanças sociais significativas”. 

“A discriminação por excesso de peso pode ser vivenciada de maneiras diferentes, desde ofensas e ridicularização, falta de acessibilidade e atitudes preconceituosas em ambientes médico-hospitalares, instituições de ensino, meios de transporte, relacionamentos interpessoais e na mídia”, afirma o deputado. 

“Infelizmente, é grande o número de pessoas que não enxergam que atitudes, comentários ou piadas sobre a forma física do outro têm o poder de causar uma série de danos psíquicos para as vítimas, como depressão, ansiedade e até suicídio”, acrescenta. 

Penas previstas
Pela proposta, praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito em razão do peso corporal relacionado à obesidade terá pena de reclusão de um a três anos e multa.

Já impedir, por gordofobia, o acesso de alguém devidamente habilitado a qualquer cargo da administração direta, indireta ou em concessionárias de serviços públicos será punido com reclusão de dois a cinco anos. A mesma pena valerá para quem impedir a promoção funcional por esse motivo.

Ainda conforme o projeto, negar ou ou obstar emprego em empresa privada por discriminação em razão do peso corporal será punido com reclusão de dois a cinco anos.

A mesma pena valerá para quem, por motivo de gordofobia, deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os demais trabalhadores; impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional; ou  proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário. 

Tramitação
A proposta será analisada pelas comissões de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial; e de Constituição e Justiça e de Cidadania; e também pelo Plenário da Câmara. 

Para virar lei, o texto tem de ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

Comissão debate implementação da Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional

A Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados debate nesta quinta-feira (12) a Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional, regulamentado pelo Decreto 11.843/23. O debate atende a pedido do autor do projeto, deputado Airton Faleiro (PT-PA), e será realizado às 9h, no plenário 12.

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Debate deve trazer enfoque especial para as mulheres egressas do sistema – G.Dettmar/Ag.CNJ

Veja quem foi convidado para discutir a proposta

Para o deputado, o decreto representa um avanço do ponto de vista institucional. “É preciso, no entanto, discutir sua implementação, com especial enfoque na situação das mulheres egressas do sistema prisional, que enfrentam desafios e estigmas adicionais e cujo o destino, reintegração e reinserção social interessam a toda a sociedade”, afirma.

Na avaliação dele, para além das questões relacionadas à inserção no mercado de trabalho, o tema se entrelaça com questões de gênero e de direitos humanos.

“Como se sabe, as mulheres enfrentam desafios adicionais ao retornarem à sociedade, incluindo estigmas e dificuldades específicas relacionadas à sua condição de gênero. O acesso ao trabalho digno e livre de discriminação é essencial para promover sua autonomia econômica e sua reinserção efetiva na comunidade”, conclui o parlamentar.

Fonte: Câmara dos Deputados

Prisão no plenário do júri e o ‘fator Júlia Roberts’: quando o STF resvala

A decisão do STF no Tema 1.068

O Supremo Tribunal Federal decidiu, no regime de repercussão geral, o Tema 1.068, prevalecendo a tese:

“A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada.”

A decisão deve ser respeitada. O papel dos professores é o de indicar as incoerências e inconsistências da “razão forte” adotada no julgamento do RExt 1.235.340, contribuindo, quem sabe, para revisão futura do desfecho.

‘Fator Júlia Roberts’

O fator ou efeito Julia Roberts é o nome dado à necessidade de superação do argumento de autoridade da Corte Suprema, invocado a partir da festejada atriz de cinema que protagonizou o filme “Dossiê Pelicano” (de 1993, dirigido por Alan Pakula, do livro de John Grishan).

O filme explora os limites da privacidade e a criminalização da sodomia pelo estado da Geórgia, nos EUA (Bowers v. Hardwick), em que a Corte Suprema americana, em 30 de junho de 1986, por apertada votação (5 votos a 4), decidiu pela constitucionalidade da criminalização. Na película, em vez de explicar e debater os argumentos, o professor afirmou que o “precedente” estava dado, no que Darby Shaw, a aluna interpretada por Julia Roberts, diz que a Corte Suprema errou.

A paternidade ou maternidade da interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal é insuficiente à canonização ou o congelamento das discussões democráticas quanto ao “referente” e “significado” atribuídos aos termos jurídicos.

A batalha de argumentos precisa convencer com fundamentos democráticos, isto é, “boas razões” que autorizem crenças justificadas (válidas e sólidas), com garantias epistêmicas. Aceitar o contrário impediria as discussões posteriores, típicas do espaço democrático. O tema foi trabalhado por Lenio Streck aqui e Alexandre Morais da Rosa aqui.

Objeções antecedentes

Em artigo publicado na ConJur em 11/11/2022, sob o título “O erro lógico da prisão automática no júri: Tema 1.068 do STF”, sublinhamos (Aury e Alexandre) que:

A análise crítica a seguir aborda duas perspectivas: (a) lógica: das inferências realizadas com o suporte normativo da Constituição; e, (b) funcional: o pano de fundo do lugar e da função do STF no que se denomina de Medidas Estruturantes.

Cezar A. Mortari define: “Lógica é a ciência que estuda princípios e métodos de inferência tendo o objetivo principal de determinar em que condições certas coisas se seguem (são consequência), ou não, de outras” [1]. Por isso, a análise primeira consiste em determinar se os argumentos (premissas) invocados na Tese suportam as conclusões apresentadas.

Do ponto de vista topológico do ordenamento jurídico, as normas invocadas são do mesmo patamar constitucional, situadas no artigo 5º, sob o domínio dos “Direitos e Garantias Fundamentais”:

(a) Soberania dos veredictos (artigo 5º, XXXVIII, “c”: é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida); e,

(b) Presunção de inocência (artigo 5º, LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória).

A análise deve se orientar pelo pressuposto de que os incisos declaram “Direitos e Garantias Fundamentais” que devem ser correlacionados de modo coerente e consistente, isto é, sem contradição e de modo a compor unidade lógica da diretriz constitucional.

Aliás, J. J. Gomes Canotilho é claro sobre o dever de: “considerar a Constituição na sua globalidade e procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar“. (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998).

No julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade 43, 44 e 54, em longo acórdão (489 páginas), proferido em 7/11/2019, os ministros deliberaram pela prevalência da “Presunção de Inocência” [2], ainda que equivocadamente igualado ao da não-culpabilidade, em ementa da lavra do ministro Marco Aurélio:

“PENA – EXECUÇÃO PROVISÓRIA – IMPOSSIBILIDADE – PRINCÍPIO DA NÃO CULPABILIDADE. Surge constitucional o artigo 283 do Código de Processo Penal, a condicionar o início do cumprimento da pena ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória, considerado o alcance da garantia versada no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, no que direciona a apurar para, selada a culpa em virtude de título precluso na via da recorribilidade, prender, em execução da sanção, a qual não admite forma provisória.”

A decisão reverteu o julgamento operado no Habeas Corpus 126.292, ministro Teori Zavaski, julgado em 17/2/2016, em que as razões então prevalecentes, assumiram a possibilidade de que a cognição sobre a premissa fática se exaure no regime recursal ordinário, restringindo a eficácia suspensiva do recurso especial e do recurso extraordinário.

A consequência foi a eficácia imediata da decisão condenatória, denominada genericamente de “prisão em segunda instância”.

Entretanto, a partir da constitucionalidade do artigo 283 do CPP (Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva), retomou-se o padrão estabelecido quando do julgamento do Habeas Corpus 84.078, da lavra do ministro Eros Grau, operado em 5/2/2009:

“a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar.”

Pode-se concluir a orientação de que a prisão cautelar no domínio do Processo Penal ocorre nas modalidades (a) cautelar (flagrante, preventiva ou temporária); e, (b) sentença condenatória transitada em julgado.

O ponto crucial é o do “estado do acusado”. Do ponto de vista lógico o acusado somente pode assumir dois estados: (a) inocente; ou, (b) culpado. É que a lógica clássica rejeita o “terceiro excluído”, como, aliás, sublinhou o ministro Marco Aurélio:

“Repito: o princípio constitucional da não culpabilidade pressupõe, para ter-se o início do cumprimento da sanção, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória — a revelar a existência de pronunciamento precluso na via da recorribilidade. Ante o princípio do terceiro excluído — uma coisa é ou não é, não havendo espaço para o meio termo —, ou bem se tem título alcançado pela preclusão maior a autorizar a execução da pena, ou não se tem, sendo forçoso reconhecer a natureza provisória da execução daí decorrente — quadro discrepante, a mais não poder, do versado no preceito cuja redação não vai além de reproduzir o previsto no texto constitucional. Revela-se impróprio, presente a garantia estampada no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, cogitar da existência de terceiro grupo a partir de argumentos metajurídicos, os quais não seduzem a ponto de suplantar, no controle objetivo de constitucionalidade, a literalidade da norma.” (p. 37-38)

Diante dos valores de verdade logicamente assumidos pela Constituição, o acusado preserva o “estado de inocência” até o ponto de inflexão, ou seja, a causa da alteração do estado de inocente para culpado, demarcado pelo “trânsito em julgado” descrito na Lindb “Art. 6º, § 3º — Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso” (Lenio Streck e Alexandre Morais da Rosa — aqui).

É que se o fluxo processual ainda não se finalizou, com a possibilidade de interposição de recursos (ordinários — CPP, artigo 593 —, especial ou extraordinário), do ponto de vista lógico, ausentes atributos constitutivos do conceito vigente de trânsito em julgado.

Segue-se a ausência de solidez, a partir das normas constitucionais e do conceito de “coisa julgada”, da atribuição do valor de verdade à premissa de que a “autonomia dos veredictos” declarada pelo artigo 5º, XXXVIII, “c”, exclui a incidência do artigo 5º, LVII (ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória).

É que a “autonomia dos veredictos” se orienta à intangibilidade da reavaliação dos critérios utilizados pelos jurados, isto é, o tribunal, ao analisar o recurso, está limitado quanto à cognição vertical adotada pelos jurados. Nem mais, nem menos. Em consequência, o lugar e a função da “autonomia dos veredictos” é a de limitar a função “substitutiva” do órgão recursal, impedindo que o tribunal reverta o “conteúdo do veredicto”.

A validade da premissa (prisão imediata) somente poderia ser aceita com a extrapolação dos limites do espaço demarcado pelo art. 5º, XXXVIII, da CR, porque ao “reconhecer” a instituição do júri, o constituinte declarou também que a regulamentação seria objeto de lei, “assegurados”: (a) a plenitude de defesa; (b) o sigilo das votações; (c) a soberania dos veredictos; (d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Em nenhum momento, embora pudesse, o Constituinte estabeleceu regra especial quanto à eficácia imediata das sentenças condenatórias. no subdomínio do Tribunal do Júri. Se não o fez, o disposto no artigo 5º, LVII da CR (ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória) prevalece.

Até porque, do ponto de vista da coerência e da consistência, necessariamente ao final do artigo 5º, LVII, deveria existir uma vírgula, seguida da declaração “salvo nos casos dos crimes dolosos contra a vida”. A ausência de qualquer exceção, por definição, exige a incidência da norma geral e abstrata de maior proteção ao acusado.

Quando as definições estipulativas destoam

Se o Direito opera “na” e “pela” Linguagem, os “conceitos” (gerais) e as “definições” (específicas) são importantes porque estabelecem a conexão (vínculo; relacionamento) entre os termos/nomes, os “referentes” e os “significados” aceitos e reconhecidos pelo domínio do processo criminal.

Os conceitos e definições situam-se no plano semântico (conjunto de referentes e significados possíveis) e no plano pragmático (referente e significado empregado/utilizado em concreto), porque determinam o “conteúdo” do termo/expressão/rótulo atribuído.

No plano da linguagem as definições podem ser de quatro tipos:

(1) Concretas/reais (objetos tangíveis; orientação descritiva: cadeira, carro, maça etc.);
(2) Abstratas/conceitos (objetos intangíveis; orientação propositiva: igualdade, justiça; teoria do crime; proporcionalidade etc.;
(3) Lógicas (estruturas; sistemas; métodos; hipóteses; relação de causalidade etc.); e,
(4) Estipulativas (objetos tangíveis ou intangíveis; orientação inovadora ou distinta do padrão aceito e reconhecido pela tradição, paradigma científico ou do “status quo”).

As três primeiras (concretas; abstratas e lógicas) estabilizam os padrões da representação dos objetos, criando as condições para eficácia comunicativa, justamente por estabelecerem o conjunto de referentes e significados aceitos e reconhecidos pelo paradigma jurídico dominante.

O lugar e a função da “definição estipulativa” é o de apresentar “novo conteúdo˜, submetido à validação dos membros da comunidade jurídica, com a possibilidade de aceitação ou rejeição.

No entanto, os julgadores, em geral, apresentam “definições estipulativas” fora da curva, de surpresa, extrapolando os limites semânticos e pragmáticos construídos pela tradição, desprovidos de coerência e consistência com o ordenamento jurídico visto como um todo, impondo-se “novos” referentes e/ou significados exclusivamente em face do exercício do Poder Jurisdicional.

Embora se aceite, não sem críticas, por exemplo, a mutação constitucional (novo significado normativo para o mesmo texto), o emprego da técnica atrai o ônus da motivação e fundamentação adequadas (válidas e sólidas), sob pena de transferir a produção normativa do Poder Legislativo para o Poder Judiciário.

Mas o ponto que merece ser sublinhado é o de que as “definições estipulativas” (novo referente e/ou significado) promovem o descolamento da premissa democrática de ampliação do espaço de proteção do acusado, com a adoção de orientações limitadoras da presunção de inocência.

Ainda que a Suprema Corte disponha de certo espaço de atribuição quanto ao “referente” e ao “significado” do texto normativo, o espaço decisório faz com que assuma o dever argumentativo de superação das ratio decidendi antecedente (overruling), atividade jurisdicional provida de regras, metodologia e procedimentos restritivos.

A lógica do “stare decisires” parte do pressuposto de que as questões já decididas servem de orientação (previsibilidade) ao comportamento dos submetidos ao Poder Estatal, exigindo, por consequência, “boas razões” à superação, consideradas, necessariamente as anteriores (a nova decisão deve apontar o erro ou insuficiência da anterior).

‘Fator Julia Roberts’ comparece mais uma vez

Em resumo, a Constituição estabelece a garantia da presunção de inocência (artigo 5º, LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”) sem qualquer exceção (STF, ADCs 42; 43 e 45).

O acusado pode assumir somente dois estados durante os procedimentos penais:

(a) Inocente (status inicial; hipótese nula); ou
(b) Condenado (verificação da hipótese acusatória/alternativa; se absolvido preserva o status inicial de “inocente).

A existência de prisão cautelar preserva o estado de inocente porque orienta-se por critérios específicos e relacionados ao resultado útil do procedimento, vedada a antecipação da pena (CPP, artigo 283).

Logo, o acusado somente pode ser preso por força de: (a) prisão cautelar (anterior, concomitante ou posterior à sentença condenatória); ou, (2) condenação transitada em julgado. Não há no artigo 5º, LVII, a exceção “salvo nos crimes dolosos contra a vida”.

O argumento prevalecente, entretanto, assume a dominância da “soberania dos veredictos”, também do artigo 5º, da CR, sobre a “presunção de inocência”.

De fato, o artigo 5º, XXXVIII, ao “reconhecer” a instituição do júri, com a “organização” que lhe der a lei, “assegurou”: (a) Plenitude de defesa; (2) Sigilo das votações; (3) Soberania dos veredictos; e, (4) Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

A norma é de mesma hierarquia e topologia constitucional da presunção de inocência, devendo-se lê-las em conjunto. Do ponto de vista constitucional, o “Tribunal do Júri” é regulado por normas processuais de hierarquia inferior (CPP; Legislação Ordinária), observados os quatro atributos constitutivos.

Entretanto, o referente e o significado da “soberania dos veredictos”, na tradição, referem-se à impossibilidade de o órgão recursal “substituir”, como é próprio do regime recursal, o conteúdo do “veredicto” proferido pelos jurados (resultado; votação dos quesitos), sem qualquer vínculo (nexo; relação; implicação lógica) com a garantia individual autônoma “presunção de inocência”.

Em geral, as instâncias recursais ordinárias estão autorizadas a “reformar” ou “substituir” a decisão recorrida (condenando ou absolvendo), salvo nas hipóteses de julgamento pelo Tribunal do Júri (CPP, artigo 593), em que a “soberania dos veredictos” do corpo de jurados somente poderá ser “anulada”, uma única vez, submetendo-se o caso a novo júri “soberano” quanto ao desfecho (ainda que com controvérsias sobre a incidência da reformatio in pejus indireta).

Em consequência, a preservação da “soberania dos veredictos” limita-se a assegurar a eficácia do conteúdo da deliberação dos jurados (resultado da votação dos quesitos), sem qualquer vínculo/conexão com a garantia da presunção de inocência.

Por decorrência lógica, prevalece a norma do art. 5º, LVII (presumido inocente até o trânsito em julgado), em todo e qualquer procedimento, inclusive do júri, por ausência de exceção constitucional, sem prejuízo da decretação da prisão cautelar, desde que preenchidos os requisitos legais (CPP, artigo 312). Aliás, vale ler os votos dos ministros vencidos e o artigo de Bruno César Gonçalves da Silva (aqui).

Em acréscimo, três argumentos sistemáticos:

(a) se a “soberania dos veredictos” já existia na Constituição desde 1988, então, quando do julgamento das ADC 42, 43 e 45, o STF, ao deixar de excepcionar a possibilidade de relativização da presunção de inocência no domínio do tribunal do júri, operou “coisa julgada” (precedente vinculante);

(b) a constitucionalidade da prisão decorrente de decisão do tribunal do júri passa pelo reconhecimento da existência da “antinomia real”, entre normas constitucionais de garantia explícita (artigo 5º, LVII: presunção de inocência) com implícita (artigo 5º, XXXVIII: soberania dos veredictos), subvertendo-se o padrão de controle de constitucionalidade e, principalmente, com o erro lógico: a “norma explicita” é derrotada pela “norma implícita”. Tratar-se, no máximo, de “antinomia” do tipo “aparente”; e,

[c] a tese da constitucionalidade da prisão em decorrência de condenação no tribunal do júri, cria um inovador “estado do acusado” (definição estipulativa), para além dos dois previstos na Constituição (inocente ou culpado), isto é, o do “condenado pelo tribunal do júri sem trânsito em julgado”, submetido à ressuscitada “execução provisória”, em caso de recurso.

No caso do julgamento da constitucionalidade do tema 1068, a Suprema Corte redefiniu os contornos da “soberania dos vereditos” (referente e significado) construídos pela tradição, por meio de nova “definição estipulativa, com a imposição de restrição ao âmbito de proteção da garantia individual de presunção de inocência, criando o efeito prático de ressuscitar a “execução provisória” porque, sem trânsito em julgado, na hipótese de recurso, o acusado cumprirá a pena provisória (ou se trata de prisão cautelar obrigatória?).

Eis porque fazemos coro à objeção apresentada por Júlia Roberts.

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Comissão debate implementação da Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional

A Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados debate nesta quinta-feira (12) a Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional, regulamentado pelo Decreto 11.843/23. O debate atende a pedido do autor do projeto, deputado Airton Faleiro (PT-PA), e será realizado às 9h, no plenário 12.

Segurança pública - presídio - penitenciária feminina - mães presas - detentas - sistema carcerário - presas grávidas e com bebês
Debate deve trazer enfoque especial para as mulheres egressas do sistema – G.Dettmar/Ag.CNJ

Veja quem foi convidado para discutir a proposta

Para o deputado, o decreto representa um avanço do ponto de vista institucional. “É preciso, no entanto, discutir sua implementação, com especial enfoque na situação das mulheres egressas do sistema prisional, que enfrentam desafios e estigmas adicionais e cujo o destino, reintegração e reinserção social interessam a toda a sociedade”, afirma.

Na avaliação dele, para além das questões relacionadas à inserção no mercado de trabalho, o tema se entrelaça com questões de gênero e de direitos humanos.

“Como se sabe, as mulheres enfrentam desafios adicionais ao retornarem à sociedade, incluindo estigmas e dificuldades específicas relacionadas à sua condição de gênero. O acesso ao trabalho digno e livre de discriminação é essencial para promover sua autonomia econômica e sua reinserção efetiva na comunidade”, conclui o parlamentar.

Fonte: Câmara dos Deputados

TRF-6 confirma suspensão de relatório sobre transparência salarial

A Justiça Federal esclareceu nesta quarta-feira (11) que segue suspensa a exigência legal de que empresas com 100 ou mais funcionários divulguem em seus sites ou redes sociais cópias dos relatórios ministeriais sobre transparência salarial e critérios remuneratórios corporativos.

“Permanece válida a tutela [provisória] deferida pelo desembargador. Ou seja, continuam suspensos os deveres das empresas e do ministério”, informou o Tribunal Regional Federal (TRF) da 6ª Região, em nota enviada à Agência Brasil.

A decisão liminar do TRF-6 foi de 17 de julho, atendendo a um pedido da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que solicitou a anulação dos efeitos do Decreto nº 11.795/2023 e da Portaria nº 3.714/2023, que regulamentam a Lei da Igualdade Salarial. O acórdão do julgamento, contudo, só foi publicado no dia 3.

No processo, a Fiemg argumentou que a exigência legal de que as companhias deem publicidade aos relatórios ministeriais expõe informações pessoais dos funcionários e dados estratégicos das empresas. Além disso, a entidade sustenta que os primeiros relatórios ministeriais apresentados contém dados antigos e distorcidos que refletem a atual política de isonomia salarial das empresas.

Apesar da decisão judicial, o ministério divulgou, entre o começo de agosto e o início de setembro, ao menos quatro notas nas quais informa que as empresas com 100 ou mais funcionários devem preencher, até 31 de agosto, o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, disponível no portal Emprega Brasil.

“A partir das informações disponibilizadas, o MTE produzirá outro relatório, que será disponibilizado às empresas até o dia 16 de setembro”, acrescentou a pasta, advertindo que “de posse deste relatório do MTE, as empresas devem promover a visibilidade das informações até o dia 30 de setembro, publicando em site, redes sociais ou em instrumentos similares, sempre em local visível”, sob risco de serem multadas em até 3% do total dos salários pagos aos seus funcionários. 

“O Ministério do Trabalho e Emprego está intensificando a fiscalização sobre a publicação do Relatório de Transparência Salarial. Além disso, empresas serão fiscalizadas com base em indícios de desigualdades identificados nos relatórios, visando verificar se essas disparidades configuram discriminação real”, acrecenta a pasta.

Na sexta-feira (6), a Fiemg enviou um ofício ao MTE, solicitando que as notícias fossem corrigidas no site do ministério e em todos os canais oficiais do governo. 

“As publicações ignoraram a liminar expedida pelo TRF-6, que suspende a obrigatoriedade da entrega do relatório de transparência salarial pelas empresas de todo o país”, diz a federação em nota enviada à Agência Brasil. “A entrega compulsória do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas empresas permanece suspensa por decisão da justiça”, complementa.

Consultado, o ministério confirmou que recebeu o documento da Fiemg, mas assegurou que ainda não foi oficialmente notificado da decisão do TRF-6, de julho. “Ainda não fomos notificados oficialmente pela Justiça. Portanto, não vamos tirar nossa notícia do ar”, respondeu a pasta, destacando que a Lei da Igualdade Salarial está em vigor e determina que as empresas enquadradas republiquem o relatório ministerial, sob pena de multa administrativa.

Ainda de acordo com o MTE, das cerca de 52 mil empresas com 100 ou mais funcionários identificadas na Relação Anual de Informações Sociais (Rais), 31.936 enviaram o Relatório de Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios até o dia 31 de agosto. As informações fornecidas, como, por exemplo, planos de cargos e salários, critérios de remuneração baseados em experiência profissional e políticas de promoção de mulheres para cargos de chefia, vão complementar os dados extraídos da Rais de 2023.

Fonte: 

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Morte de segurado causada pelo contratante do seguro impede indenização para todos os beneficiários

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial julgado pela Terceira Turma, a ausência de interesse do contratante na preservação da vida do segurado gera a nulidade do contrato.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que, no contrato de seguro sobre a vida de terceiro, a morte do segurado causada por ato ilícito do contratante impede o recebimento da indenização securitária pelos demais beneficiários do seguro.

“O indivíduo que contrata um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado e, por conseguinte, obter a indenização securitária, além de buscar a garantia de interesse ilegítimo, age, de forma deliberada, com a intenção de prejudicar outrem. A ausência de interesse na preservação da vida do segurado acarreta a nulidade do contrato de seguro por violação ao disposto nos artigos 757762 e 790 do Código Civil (CC)”, afirmou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

Para o TJPR, nulidade alcançaria apenas o beneficiário que praticou a conduta ilícita

Uma mulher contratou um seguro cujo objeto era a vida do seu marido, tendo como beneficiários ela própria e os filhos. Cerca de seis meses após a contratação, o segurado foi morto. Acusada de ser a mandante do crime, a esposa foi condenada pela prática de homicídio duplamente qualificado. Constatou-se no processo penal que o crime foi motivado pela intenção de obter a indenização securitária.

Os filhos do segurado, então, ajuizaram ação de cobrança contra a seguradora, com o objetivo de receber o pagamento do seguro. O pedido foi negado em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) entendeu que o contrato deveria ser considerado nulo apenas em relação ao beneficiário que praticou a conduta ilícita, permanecendo válido quanto aos demais, de acordo com o artigo 792 do CC.

No recurso ao STJ, a seguradora alegou que a nulidade prevista no artigo 762 do CC é absoluta e torna o contrato inválido para todos os fins.

Contrato deve ter por objeto a garantia de um interesse legítimo do segurado

A ministra Nancy Andrighi observou que, no seguro sobre a vida de outra pessoa, o segurado é o portador do risco de morte, mas não participa da contratação, enquanto o contratante é quem celebra o contrato, assumindo todas as obrigações e adquirindo a qualidade de beneficiário do seguro, por ser titular do interesse garantido.

Segundo a relatora, esse tipo de contrato de seguro tem por objeto a garantia de um interesse legítimo do segurado, de modo que será nulo o contrato quando o contratante tiver a intenção de prejudicar o segurado por meio de ação ou omissão.

“Com o propósito de evitar a contratação dessa modalidade de seguro para fins espúrios, o artigo 790 do CC estabelece que, no seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado, sendo presumido tal interesse, até prova em contrário, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente”, declarou.

É nulo o negócio jurídico quando a lei proíbe sua prática sem lhe cominar sanção

Nancy Andrighi destacou que, embora a legislação seja omissa quanto à consequência da ausência de interesse na preservação da vida do segurado, deve ser aplicado o disposto no artigo 166, inciso VII, do CC, o qual estabelece ser nulo o negócio jurídico quando a lei proibir a sua prática sem lhe cominar sanção.

Segundo a ministra, ante a gravidade do vício de nulidade existente no contrato, ele não pode produzir qualquer efeito jurídico. “Logo, ainda que haja outros beneficiários do seguro além do autor do ato ilícito, eles não receberão a indenização securitária”, concluiu.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

STF rejeita recursos de redes sociais contra bloqueios de perfis

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta sexta-feira (6) rejeitar recursos de empresas que operam as redes sociais contra decisões do ministro Alexandre de Moraes que determinaram o bloqueio de perfis que propagam mensagens de desinformação e ataques à democracia.

Por unanimidade, a decisão foi tomada pela Primeira Turma da Corte durante julgamento virtual, modalidade na qual os ministros inserem os votos em um sistema eletrônico e não há deliberação presencial.

O colegiado seguiu o voto proferido por Moraes. Para o ministro, as redes sociais X (antigo Twitter), Discord e Rumble não podem se opor juridicamente às decisões envolvendo usuários das plataformas.  

“É incabível ao recorrente opor-se ao cumprimento do bloqueio dos canais, perfis e contas, nos termos da decisão proferida nestes autos, eis que se trata de direito de terceiros investigados, e por não comportar recorribilidade pela via eleita”, afirmou.

O voto foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Na semana passada, Alexandre de Moraes determinou a suspensão da rede X. A medida foi tomada após o bilionário Elon Musk, dono da rede social, descumprir o prazo de 24 horas dado pelo ministro para indicar um representante legal do X no país.

Musk fechou o escritório no Brasil e não cumpriu a determinação de retirar do ar perfis de investigados pela Corte pela publicação de mensagens consideradas antidemocráticas e com conteúdo ofensivo aos membros do STF.

Fonte: EBC

O crime de sonegação à luz da jurisprudência do STJ

É fato típico “suprimir ou reduzir tributo” mediante o emprego de um dos expedientes fraudulentos descritos no artigo 1º da Lei 8.137/1990. Os verbos utilizados no dispositivo legal revelam que a escolha política do legislador foi proteger a ordem tributária, sancionando criminalmente o comportamento do qual resulte concreto prejuízo à arrecadação.

Como ensina Hugo de Brito Machado, nesse sentido, “todas as condutas descritas nos nº I a V do artigo. 1º da Lei 8.137/1990 pressupõe que, por meio delas, haja efetiva supressão ou redução do tributo devido aos cofres públicos” [1], classificando-se os tipos ali dispostos como crimes materiais, isto é, aqueles cuja ação ou omissão estão relacionadas a um resultado naturalístico indispensável à configuração do delito.

Por decorrência dessa opção legislativa, para que a exação possa ser sonegada, ela deve ser tida por devida antes de tudo, o que quer significar que não parece possível caracterizar a supressão ou redução de tributo se, em primeiro lugar, não se reputar obrigatório o cumprimento da obrigação fiscal correspondente, o que está em consonância com o entendimento bastante consolidado pela jurisprudência. [2]

Pagamento

A legislação penal, nessa trilha, determina a extinção da pretensão punitiva quando verificado o pagamento antes do recebimento da denúncia (Lei nº 9.249/1995, artigo 34 [3]), além da suspensão no caso de parcelamento (Lei nº 11.941/2009, artigo 68), tendo o Superior Tribunal de Justiça, fundado no dogma da autonomia da instância penal, construído interpretação no sentido de que essas seriam hipóteses taxativas aptas a impactar a persecução penal (AgRg no RHC nº 173.258/PB, relator: ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Julgado em 14/2/2023).

Na linha dessa interpretação e à míngua de disciplina legal específica, a apresentação de garantia na execução fiscal não repercute sobre a esfera penal, ficando apenas recomendada a paralisação do processo penal nos casos de suspensão da exigibilidade do crédito. [4]

Esse entendimento deve sofrer justas críticas, já que, entre outras razões, suspensa a exigibilidade ou resguardada a exigência por garantia idônea, resta esvaziada a possibilidade de dano ao bem jurídico tutelado pela norma penal, pois ausente o prejuízo à arrecadação.

Assim, com intuito de aprimorar o sistema jurídico, seria de se sustentar a necessidade de modificação da lei penal para determinar a suspensão da pretensão punitiva nessas hipóteses, medida que, embora inegavelmente útil na dimensão prática, alerta sobre a necessidade de questionamento acerca da compatibilidade da posição jurisprudencial restritiva com a unicidade do ordenamento jurídico.

Isso porque, mesmo não havendo dúvidas de que deixar de pagar tributo valendo-se dos expedientes maliciosos elencados no artigo 1º da Lei 8.137/1990 é conduta típica, tal não necessariamente significa que se trate de fato penalmente punível.

É que a tipicidade é elemento necessário, mas não suficiente para a configuração de um crime, impondo-se a verificação da antijuridicidade, que “corresponde determinar se a conduta típica é contrária ao Direito, isto é, ilícita, e constitui um injusto. O termo antijuridicidade expressa, portanto, um juízo de contradição entre a conduta típica praticada e as normas do ordenamento jurídico”. [5]

Sistema jurídico

Quer dizer: para haver crime, não basta que a ação se amolde à descrição de um tipo penal específico. Ela deve, também, contrariar o sistema jurídico, cabendo-se perquirir “se o fato típico é realmente desaprovado pelo ordenamento jurídico ou se, no caso, existe alguma circunstância que o autorize”, isto é, a antijuridicidade é uma “contradição da realização do tipo de uma norma proibitiva com o ordenamento jurídico em seu conjunto (não somente com uma norma isolada)”. [6]

A norma penal, porque é parte integrante de um ordenamento jurídico amplo, toma, entre os comportamentos socialmente inaceitáveis, aqueles considerados mais graves e que, por isso, merecem a cominação de pena como contrapartida.

Assim, por representar ofensa aos bens jurídicos mais relevantes, um ilícito penal não pode ser reputado lícito em outras áreas do direito e “um ato lícito no plano jurídico-civil não pode ser ao mesmo tempo um ilícito penal.” [7]

A conduta, portanto, apenas pode ser punida criminalmente se estiver em descompasso, também, com as regras extrapenais, o que inclui as de natureza tributária. Nesse caminho, aduz Francisco de Assis Toledo que “o que é civilmente lícito, permitido, autorizado, não pode estar, ao mesmo tempo, proibido e punido na esfera penal, mais concentrada de exigências quanto à ilicitude”. [8]

Desse modo, não seria estritamente necessário, embora possa representar um caminho mais fácil, que a lei penal seja modificada para proteger de aplicação da pena prevista no artigo 1º da Lei 8.137/1990 o contribuinte que apresenta garantia na execução fiscal ou obtém decisão judicial suspensiva da exigibilidade do crédito. Basta, para tanto, que a conduta dele, embora típica, não seja classificada como antijurídica, isto é, seja reputada amparada pela lei tributária.

Conduta típica

Vale dizer, a influência de uma norma permissiva, ainda que de cunho extrapenal, impede que a norma penal geral e abstrata se traduza em dever jurídico concreto para o contribuinte. É uma autorização do sistema jurídico para a prática de uma conduta típica, já que, como lembra Cezar Roberto Bitencourt, “qualquer direito, público ou privado, penal ou extrapenal, regularmente exercido, afasta a antijuridicidade.” [9]

E o sistema jurídico é farto em exemplos de comportamentos que, abstratamente previstos na lei penal, estão justificados por normas de outra natureza, que resguardam interesses valiosos e igualmente merecedores de proteção. Esse é o caso, por exemplo, do artigo 1.210 do Código Civil, que permite o uso da força para proteção da posse, o que, desde que realizado nos limites da lei civil, afasta a possibilidade de punição criminal.

Do mesmo modo, embora “fazer justiça pelas próprias mãos” seja fato tipificado no artigo 345 do Código Penal, a lei extrapenal, atendidas determinadas condições, faculta ao hospedeiro a reter bens dos consumidores sem intervenção judicial, descaracterizando a configuração do crime nessa situação.

Garantia

Possível sustentar, com base nessas mesmas premissas, que todos os contribuintes que apresentam garantia idônea em execução fiscal agem de acordo com a norma extrapenal, que acolhe essa conduta como legítima alternativa ao pagamento, sem qualquer restrição quanto a eventual acusação de prática de crime anterior.

A apresentação de garantia, com a aceitação pela fazenda credora e a certificação pela autoridade judicial, por conseguinte, funcionam como norma de assimilação do fato típico ao sistema jurídico, o que autoriza o reconhecimento de que o contribuinte que assim age (apresentando garantia, reitere-se), tal qual o possuidor que usa violência legítima, tem a conduta protegida pelo ordenamento e não pode mais ser considerado criminoso.

A decisão judicial que suspende a exigibilidade do crédito supostamente sonegado, do mesmo modo, é calcada em autorização legal (CTN, artigo 151), e, enquanto perdurar, afasta a antijuridicidade da conduta, o que equivale a dizer: se o contribuinte, ainda que provisoriamente, não está obrigado a efetivar o pagamento, porque a norma tributária assim admite, não há materialmente supressão ou redução de tributo exigida no artigo 1º da Lei 8.137/1990.

Trata-se de um argumento de natureza material, que prestigia a unicidade do sistema jurídico e que oficia como autorizador da conduta do contribuinte, mantida a proclamada independência entre as esferas penal e cível, que se dá no plano processual.

Desse modo, o que podemos inferir, em arremate, é que a jurisprudência do STJ sobre o tema, além de todas as críticas que sofre da doutrina, não parece estar em linha com a opção política do legislador ao criminalizar o contribuinte que, goste-se ou não, atua no exercício de uma posição juridicamente legitimada pelo sistema normativo.

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[1] MACHADO, Hugo de Brito. Crimes contra a ordem tributária. 4ª ed. São Paulo: Gen/Atlas, 2015, p. 23 citado por STOCO, Rui; STOCO, Tatiana de Oliveira. Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 91.

[2] Súmula Vinculante nº 24 – Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

[3]  Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.

[4] AgRg no RHC n. 66.007/CE, Relator Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 28/4/2020

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME TRIBUTÁRIO. MEDIDA LIMINAR DEFERIDA NA AÇÃO CÍVEL ANULATÓRIA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ART. 151 DO CTN. PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DA TESE. MATERIALIDADE DELITIVA PREJUDICADA. AGRAVO NÃO PROVIDO.

  1. A orientação desta Corte Superior disciplina que o simples ajuizamento de ação anulatória na esfera cível não configura óbice à persecução penal. Contudo, a procedência da ação anulatória, ou mesmo o deferimento de tutela provisória com suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151, V, do CTN, prejudica o exame da materialidade do delito tributário. (RHC 113.294/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 30/08/2019).
  2. Nesse sentido, constatando-se dúvida razoável sobre a própria materialidade do delito, materializada com o deferimento da medida liminar na ação anulatória, é aconselhável aguardar a definição da controvérsia no juízo cível, determinando-se a suspensão do inquérito policial.
  3. Agravo regimental não provido.

[5] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – v. 1: parte geral (arts. 1 a 120). 17ª ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2012. P. 147.

[6] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – v. 1: parte geral (arts. 1 a 120). 17ª ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2012. P. 147.

[7] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – v. 1: parte geral (arts. 1 a 120). 17ª ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2012. P. 149.

[8] TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal, 5ª ed., São Paulo, Saraiva, 1994, p. 166.

[9] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – v. 1: parte geral (arts. 1 a 120). 17ª ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2012. P. 161.

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