Resolução de BC e CVM simplifica manutenção de investimentos no Brasil

A partir deste ano, pessoas físicas não residentes poderão fazer investimentos por meio de uma única conta

Em 1º de janeiro de 2025, entraram em vigor as novas regras referentes à manutenção de investimentos financeiros no Brasil por parte de não residentes fiscais. Este sempre foi, inclusive, um dos pontos de maior preocupação por parte de pessoas físicas que procedem com a saída definitiva do Brasil para fins fiscais.

Como se sabe, a pessoa física que deseja obter o status não residente fiscal no Brasil deve observar certas obrigações acessórias dispostas na Instrução Normativa da Receita Federal 208, de 10/10/2002. De acordo com o artigo 3º, parágrafo 2º, de tal diploma normativo, uma vez adquirido o status de não residente fiscal no Brasil, a pessoa física que recebe rendimentos de fonte situada no território nacional deve comunicar sua situação fiscal, por escrito, à fonte pagadora, para que esta proceda com a retenção na fonte da tributação aplicável.

Tendo em vista que instituições financeiras, como bancos e corretoras, são fontes pagadoras de rendimentos como dividendos, juros, entre outros, é necessário que sejam comunicadas do status da residência fiscal do então titular da conta nelas mantida, em cumprimento ao que determina a Instrução Normativa RFB 208/2002.

Ocorre que, em razão de regras estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), não residentes fiscais possuem condições próprias para a manutenção de recursos investidos no Brasil. Até 31/12/2024, havia dois diferentes tipos de contas para não que residentes fiscais brasileiros mantivessem recursos no país, a depender do tipo de investimento desejado:

  1. Conta de Não Residente (CNR, antiga Conta de Domiciliado no Exterior) e;
  2. Conta “4.373”, que recebe este nome por ter sido instituída pela Resolução 4.373, de 29/9/2014, do CMN.

Por meio da CNR, investidores não residentes no Brasil podiam receber e realizar pagamentos em moeda nacional, além de manter investimentos em poupança, Certificado de Depósito Bancário (CDB) da própria instituição financeira em que é mantida a conta, e produtos de previdência privada também disponibilizados por essa mesma instituição financeira.

Já no caso de investidores não residentes que desejassem manter outros investimentos financeiros, como ações em bolsa e cotas de fundos de investimento, era necessário abrir uma Conta 4.373.

Em razão de as instituições financeiras atuarem como representantes legais/fiscais de investidores não residentes detentores da Conta 4.373 perante o Banco Central, CVM e Receita Federal, o que atrai maiores custos de conformidade, sempre foi comum que cobrassem taxas mais altas para sua manutenção, quando não rejeitavam a abertura de tal conta.

Para os investidores não residentes, além da obrigação de constituição de representante legal/fiscal (no caso, instituição financeira ou pessoa autorizada pelo BC), havia, ainda, a necessidade de registro na CVM e, no caso de pessoas jurídicas, fundos ou outras entidades de investimento coletivo, a constituição de um agente custodiante autorizado pela CVM, já que esta obrigação às pessoas físicas foi dispensada com a publicação da Resolução CMN 4.852, de 27/8/2020.

Com a entrada em vigor da Resolução Conjunta 13, de 3/12/2024, o investimento no Brasil por parte de não residentes recebe novos contornos, que podem ser sintetizados da seguinte maneira:

  • Manutenção de apenas uma conta para não residentes: a partir de 2025, o investidor não residente poderá realizar todos os seus investimentos a partir de uma única conta, sendo esta a conta CNR, com as mesmas condições aplicáveis às contas de titularidade de residentes.
  • Necessidade de constituição de representante e registro na CVM para investir: o art. 6º da Resolução Conjunta 13 prevê a necessidade de o investidor não residente, previamente ao início de suas operações, constituir um ou mais representantes no país, bem como obter o registro na CVM, nos termos da regulamentação específica.
  • Os requisitos do art. 6 são, contudo, excepcionados no caso de pessoa jurídica não residente que investe em ativos financeiros a partir de conta CNR em reais mantida no país, de sua própria titularidade, conforme art. 14 da Resolução Conjunta 13.
  • Já nos casos de pessoa natural não residente, de acordo com o art. 16 da Resolução Conjunta 13, o requisito de constituição de representante(s) é afastado:
    • no caso de aplicação em ativos financeiros e valores mobiliários a partir de conta CNR em reais mantidas no país, de sua própria titularidade e com utilização de recursos próprios; e
    • no caso de aplicação em ativos financeiros não efetuadas a partir de CNR em reais mantida no país, de sua própria titularidade, quando o total de aportes mensais não ultrapassa R$ 2 milhões por meio de cada intermediário.
  • Quanto ao requisito de registro na CVM para pessoa natural não residente,
    este também poderá ser afastado, observados os requisitos cadastrais
    estabelecidos por tal comissão.
  • Diferenciação entre ativos financeiros e valores mobiliários: a Resolução Conjunta n. 13, em diversas oportunidades, faz menção a ativos financeiros e valores mobiliários, de modo a distingui-los. Isso fica ainda mais evidente quando observamos o teor dos art. 14 e 16, que conferem a pessoas jurídicas e pessoas naturais não residentes exceção à necessidade de constituir representante no país e registro na CVM para diferentes tipos de investimentos.
  • O próprio art. 14, em seu parágrafo único, determina que a exceção a pessoas jurídicas não residentes da obrigação de constituir representante e obter registro na CVM não se aplica a valores mobiliários sujeitos ao disposto na Lei n. 6.385, de 7.12.1976, como as ações listadas em bolsa, debêntures, bônus de subscrição, certificados de depósitos de valores mobiliários, notas comerciais, contratos derivativos, entre outros.
  • Os ativos financeiros, por sua vez, são os demais ativos que não compreendam valores mobiliários, como o CDB, poupança, letras de crédito etc.
  • Fim do RDE-Portfólio: o investimento realizado por não residentes no Brasil é controlado pelo Banco Central por meio de um sistema denominado Registro Declaratório Eletrônico (“RDE”). Atualmente, há 4 diferentes módulos do RDE, a depender do tipo de investimento realizado.

Para investimentos em aplicações financeiras, o módulo utilizado até 31/12/2024 era o RDE-Portfólio, que será descontinuado, não sendo necessária qualquer providência por parte de investidores. Os registros já realizados, contudo, permanecerão disponíveis para consulta até 31/12/2025.

Para o caso específico de pessoas físicas que procedem com a saída definitiva do Brasil para fins fiscais, uma questão que se coloca diz respeito à tributação aplicável aos investimentos mantidos no Brasil.

De acordo com o art. 85 da Instrução Normativa RFB 1.585, de 31/8/2015, os residentes e domiciliados no exterior sujeitam-se às mesmas normas de tributação pelo imposto de renda previstas para os residentes e domiciliados no país com relação aos rendimentos de alguns investimentos financeiros, como os decorrentes de aplicações de renda fixa e em fundos de investimento.

Porém, nos arts. 88 e 89 do mesmo ato normativo, há previsão de um regime especial de tributação para investidores residentes ou domiciliados no exterior, conferindo tratamento tributário mais favorável do que aquele conferido aos residentes e domiciliados no país para determinados investimentos.

É o caso, por exemplo, da alíquota de imposto de renda aplicável aos rendimentos de aplicações nos fundos de investimento em ações que, para os residentes e domiciliados no país, é de 15%, ao passo que, para investidores residentes ou domiciliados no exterior, é de 10%.

De acordo com a redação vigente do art. 88 da Instrução Normativa RFB 1.585/2015, duas são as condições a serem cumulativamente atendidas por um residente ou domiciliado no exterior para que usufrua do regime especial de tributação:

  1. realizar operações financeiras no país de acordo com as normas e condições estabelecidas pelo CMN; e
  2. não ser residente ou domiciliado em país com tributação favorecida.

O item 1 se referia justamente à Conta 4.373, no sentido de ser necessário realizar operações financeiras no país por meio dela para que o investidor residente ou domiciliado no exterior pudesse aproveitar o regime especial de tributação, desde que também atendido o requisito do item 2.

Ocorre que, como visto, a Resolução Conjunta 13 propõe uma CNR única para que não-residentes possam investir no Brasil, não existindo mais a figura da Conta 4.373 para investimentos financeiros específicos.

Assim, para que seja possível ao não residente aproveitar o regime especial de tributação de investimentos financeiros, basta que não seja residente ou domiciliado em país com tributação favorecida e detenha uma CNR em reais por meio da qual são movimentados recursos próprios.

Fonte: Jota

A pauta do STF no começo de 2025: favelas, trabalho, ANP, anistia e funcionários públicos

Presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, definiu os processos que serão levados a plenário em fevereiro deste ano

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, definiu no último dia de 2024 a pauta de julgamentos que abrirá o ano da Corte, em fevereiro de 2025. 

Em 3 de fevereiro, uma segunda-feira, os trabalhos se iniciam com sessão solene de abertura do Ano Judiciário. Na quarta-feira daquela semana (5/2), os julgamentos recomeçam, com a ARE 959620, no primeiro item da pauta, na qual os ministros vão definir se é ilícita a prova obtida a partir de revista íntima de visitante em unidade prisional. 

Também está previsto para esta data o julgamento da ADPF 635, conhecida como ADPF das Favelas, que trata sobre as restrições impostas pela Corte durante a pandemia a operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro. Por fim, consta na pauta do dia 5 a ADPF 777, que versa sobre portarias publicadas no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, que anularam anistia concedidas entre 2002 e 2005. 

No dia 12 de fevereiro a Corte terá um dia voltado apenas para questões trabalhistas. Ao longo do mês, a Corte julga também pode julgar um processo tributário sobre ISS em operações de industrialização por encomenda, a abrangência dos poderes da  Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para decidir sobre a venda de blocos petrolíferos e diversas ações relacionadas a funcionários públicos. 

Confira a agenda de julgamentos do STF em fevereiro de 2025

3 de fevereiro

Sessão solene de abertura do Ano Judiciário

5 de fevereiro

ARE 959620 – Recurso Extraordinário com Agravo, de relatoria do ministro Edson Fachin, que trata sobre a ilicitude de prova obtida a partir de revista íntima de visitante em unidade prisional, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção ao direito à intimidade, à honra e à imagem.

ADPF 635 – Conhecida como ADPF das Favelas, a ação, com pedido de medida cautelar,  tem a finalidade “de que sejam reconhecidas e sanadas” as alegadas “lesões a preceitos fundamentais da Constituição praticadas pelo Estado do Rio de Janeiro na elaboração e implementação de sua política de segurança pública, notadamente no que tange à excessiva e crescente letalidade da atuação policial, voltada sobretudo contra a população pobre e negra de comunidades”.

ADPF 777 – Ação proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil “em face das Portarias 1.266 a 1.579 do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, publicadas no Diário Oficial da União em 5 de junho de 2020, que tratam da anulação de portarias declaratórias de anistiados políticos datadas entre 2002 e 2005”.

6 de fevereiro

ADI 7686 – Leitura do relatório e realização das sustentações orais na ADI, proposta pelo PSol que pede para que a Corte impeça repatriação de crianças quando houver suspeita de violência doméstica. A sessão também será composta por processos remanescentes da sessão de 5 de fevereiro de 2025.

12 de fevereiro

RE 1298647 – Recurso extraordinário em que se discute acórdão do Tribunal Superior do Trabalho, que definiu a legitimidade da transferência ao ente público tomador de serviço do ônus de comprovar a ausência de culpa na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas devidas aos trabalhadores terceirizados pela empresa contratada, para fins de definição da responsabilidade subsidiária do Poder Público.

AO 2417 – Trata-se de embargos de declaração na AO 2417, que versa sobre a possibilidade de cobrar honorários contratuais de trabalhadores beneficiados por demandas coletivas, em que já havia honorários assistenciais (correspondentes à assistência judiciária gratuita) estipulados pela Justiça do Trabalho.

RE 1387795 – O recurso extraordinário trata da possibilidade de inclusão no polo passivo da lide, na fase de execução trabalhista, de empresa integrante de grupo econômico que não participou do processo de conhecimento.

13 de fevereiro

ADI 3596 – Ação, ajuizada pelo PSol, questiona o poder da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para decidir sobre a venda de blocos petrolíferos.

RE 608588 – Recurso extraordinário, com repercussão geral, que trata sobre o limite da atuação legislativa dos municípios para fixar as atribuições de suas guardas municipais destinadas à proteção de bens, serviços e instalações do município.

19 de fevereiro

RE 1075412 – Embargos de declaração nos quais o Diário de Pernambuco busca reverter decisão do STF que possibilita a responsabilização de veículos de imprensa pela publicação de entrevistas que imputem de forma falsa crimes a terceiros. A tese estabelece que a “plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais”.

RE 1133118 – Recurso extraordinário em que se discute a constitucionalidade de norma que prevê a possibilidade de nomeação de cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante, para o exercício de cargo político.

MS 26156 – Mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado contra diversas decisões do Tribunal de Contas da União tomadas na análise do registro de aposentadoria e pensões relativas a docentes da Fundação Universidade de Brasília.

ADI 3228 – Ação do governo capixaba questiona a constitucionalidade dos artigos 6 e 13 da Lei Complementar 238/02, do Espírito Santo, que disciplina as gratificações que devem ser pagas aos membros do Ministério Público estadual (MPES), em razão do exercício de determinadas funções de confiança.

20 de fevereiro

ADI 6757 – Ação da PGR contra Lei de Roraima que prevê que nas promoções por merecimento e por antiguidade, precederá a remoção de magistrados. Para a PGR,  a matéria concerne ao Estatuto da Magistratura e deve ser disciplinada sob a forma de lei complementar de iniciativa do STF.

ADI 4055 – Ação movida pela PGR contra reserva de cargos em comissão para servidores efetivos previstas na Emenda 50 do Distrito Federal, de 17 de outubro de 2007, e na Resolução 232/2007, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF).

26 de fevereiro 

RE 882461 – Os ministros julgam o RE 882461 (Tema 816), que trata da incidência de ISS em operações de industrialização por encomenda e a limitação ao percentual de 20% da multa moratória, ou seja, a multa por atraso no recolhimento do tributo. O caso tem placar de 7X1 favorável aos contribuintes, e deve ser retomado com voto-vista do ministro André Mendonça.

AR 2876 – Questão de Ordem em Ação Rescisória para discutir se a expressão “cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal”, constante do § 15 do art. 525 e do § 8º do art. 535 do CPC, é inconstitucional.

ADPF 615 – Ação  proposta pelo Governador do Distrito Federal para impedir execuções de decisões que rejeitaram arguições de inexequibilidade de sentenças transitadas em julgado sob o fundamento de que “a decisão de inconstitucionalidade não possui o condão de esvaziar por inteiro o conteúdo da coisa julgada, sobretudo daquela materializada em situações jurídicas nas quais o trânsito em julgado da sentença condenatória ocorrera em momento anterior à inconstitucionalidade reconhecida”. Tais ações discutem a gratificação a docentes dedicados “exclusivamente” a alunos portadores de necessidades educativas ou em situações de risco e vulnerabilidade. Liminar proferida pelo ministro Luís Roberto Barroso suspendeu 

RE 586068 – Embargos contra acórdão do STF que assentou que poderão ser anuladas decisões definitivas de Juizados Especiais que tiverem sido fundamentadas em norma ou interpretação posteriormente considerada inconstitucional pela Suprema Corte.

27 de fevereiro

ADPF 338 – Ação requer a declaração de inconstitucionalidade do inciso II do art. 141 do Código Penal Brasileiro, que estabelece como causa de aumento de pena dos crimes contra a honra o fato de ter sido cometido contra servidor público, no exercício de suas funções. Processo incluído em pauta exclusivamente para leitura do relatório e realização das sustentações orais, com posterior agendamento de sessão para o início da votação e julgamento.

ADI 6238, ADI 6302, ADI 6266, ADI 6236, ADI 6239 – Ações questionam dispositivos que preveem crimes de abuso de autoridade praticados por funcionários públicos.

Fonte: Jota

Incide contribuição previdenciária sobre parcela de PLR paga como reajuste, decide Carf

Para colegiado, a parcela excedente, ainda que em valores reduzidos, descaracteriza a natureza do benefício

Por maioria, a 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) decidiu que deve incidir a contribuição previdenciária sobre a terceira parcela da Participação nos Lucros e Resultados (PLR) paga como complemento ao valor de parcela anterior. A Turma considerou que, embora o pagamento seja um resquício da segunda parcela, o descumprimento das normas do programa compromete a natureza jurídica do benefício.

A parcela em questão se tratava de uma complementação do valor anterior devido a uma convenção coletiva que pediu correção de 1,58% sobre a segunda parcela. O advogado representante do contribuinte, Matheus França, do Gaia Silva Gaede Advogados, argumentou que o valor reajustado foi insignificante para ser classificado como uma terceira parcela de PLR, e afirmou que cada funcionário recebeu, em média, R$ 50.

A relatora defendeu que a Lei 10.101/00, que trata da PLR, precisa ser cumprida em sua totalidade e, uma vez a periodicidade infringida, todo o programa tem sua conformidade comprometida. Além disso, destacou que a parcela excedente, ainda que em valores reduzidos, descaracteriza a natureza do benefício. Assim, votou pela tributação de todo o pagamento.

O conselheiro Leonam Rocha de Medeiros abriu divergência ao considerar que a parcela corresponde a uma diferença pequena e de uma tratativa negocial junto ao sindicato. Para ele, se tratou de uma extensão da segunda parcela em função do acordo. Ele foi acompanhado pela julgadora Ludmila Mara Monteiro de Oliveira. A votação terminou em 6×2 para negar provimento ao recurso do contribuinte.

O processo tramita com o número 10980.727803/2012-14.

Fonte: Jota

A (in) justiça tributária no mundo digital

IA propõe política fiscal ideal, mas desafios surgem na justiça tributária e na tributação da economia digital

Um sistema de aprendizagem profunda, nomeado por The AI Economist[1], elaborou, através de simulações econômicas, o que os idealizadores, baseados em teóricos da economia, chamaram de politica fiscal ideal, equitativa, justa que encoraja a igualdade, aumenta a produtividade e proporciona maior bem estar social.

Segundo os pesquisadores envolvidos no projeto, é possível que haja um trabalho conjunto entre o AI Economist e os humanos de modo que a inteligência artificial possa ajudar, principalmente os governantes, na concepção de políticas fiscais ideais que beneficiem o maior número de pessoas.

Dessa afirmação, cabe a crítica: Qual seria a configuração de um sistema tributário justo e o quão tendenciosos podem ser os dados que moldarão os algoritmos de aprendizado desse sistema?

O imposto sobre os rendimentos do trabalho e do capital apresenta, idealmente, a melhor qualidade de justiça, pois consegue concretizar a medida da capacidade contributiva através da imposição de alíquotas progressivas. No entanto, existe um desequilíbrio no tratamento tributário entre o capital e o trabalho.

Além das alíquotas progressivas, um sistema tributário progressivo deve ser estruturado em harmonia com a concessão de créditos, deduções e incentivos; com a incidência criteriosa dos impostos sobre propriedades e patrimônio; com políticas que proporcionem a redução da carga sobre os mais pobres nos impostos sobre o consumo e com uma efetiva progressividade das pessoas jurídicas.

De acordo com estimativas recentes[2], a alíquota média efetiva global do imposto de renda das pessoas jurídicas diminuiu de aproximadamente 30% na década de 1960, para cerca de 25% na década de 1980, e 18% em 2020. Esta redução impacta diretamente nas receitas públicas e compromete a progressividade do sistema tributário, além de exercer pressão sobre a tributação do rendimento das pessoas físicas, essencialmente sobre os rendimentos do trabalho.

Entretanto, apesar da imprecisão dos números sobre o futuro do trabalho, não podemos ignorar o aperfeiçoamento constante na dinâmica da substituição (total ou parcial) dos trabalhadores provocada pelas tecnologias inteligentes.

Se, por um lado, surgirão novas profissões tecnológicas e a necessidade de trabalhadores qualificados e bem remunerados, por outro, estão a diminuir os empregos tradicionalmente “do meio” e a aumentar o trabalho de menor complexidade, instável, desgastante, sem vínculo laboral, disfarçado de flexível, mas que, na verdade, trata-se de trabalho precarizado com uma pressão descendente sobre os seus salários. Esta situação reforça a responsabilidade das novas tecnologias no alargamento da desigualdade salarial entre trabalhadores qualificados e os demais.

São alterações profundas na natureza do trabalho que provavelmente terão um impacto negativo sobre a arrecadação do IRPF incidente sobre os rendimentos do trabalho e das contribuições da seguridade social e, ao mesmo tempo exigirão do Estado aumento das despesas, inclusive com subsídios sociais.

Em contrapartida, o sistema de produção, distribuição e concentração de riqueza está sofrendo mudanças significativas. A inteligência artificial apresenta vantagem em relação à inteligência humana em um pequeno, mas crescente número de domínios limitados, daí decorre o risco de extinção de algumas profissões e o esvaziamento de outras.

À medida que essa tecnologia é incorporada por mais e mais empresas, a tendência é observarmos uma diminuição dos custos, com consequente aumento dos lucros e o enfraquecimento do poder de reivindicar uma parte dos lucros que o próprio trabalho possibilita[3].

Os dados de cidadãos, empresas e governos, passaram a ser um ativo dos mais relevantes para a geração de riqueza nas economias globais. A depender do modelo de negócio, os dados, fornecidos gratuitamente, são otimizados e utilizados como fonte de receita, incremento dos lucros e maximização dos resultados de empresas privadas. Seja com a criação de novos produtos e funcionalidades, personalização do cliente ou como fonte para treinar padrões – prever comportamentos, intenções e desejos – em sistemas de Inteligência Artificial, inclusive com o intuito de substituir a força de trabalho humana.

Em vista deste cenário, os critérios de repartição dos impostos, pensados em outros contextos históricos e econômicos, precisam ser readequados à contemporaneidade. A presença do Estado, através da atividade arrecadatória, se justifica em função da caracterização de uma atividade lucrativa, cuja tendência é ser ainda mais valiosa no futuro, e da necessidade de eliminar, ou pelo menos reduzir, as externalidades negativas decorrentes desse mercado digital, entre as quais, a redução das receitas tributárias.

Com a identificação e consequente tributação dessas novas fontes de rendimentos não se pretende negar os benefícios da robótica, penalizar as empresas automatizadas ou desencorajá-las a aderirem às novas tecnologias. A questão que se coloca é como poderemos nos certificar que os benefícios advindos da presença de robôs e da inteligência artificial serão compartilhados por toda a coletividade.

Manter o sistema tributário baseado no regime de apropriação e acumulação do passado, é reconhecer sua ineficácia futura. É fundamental que o legislador identifique as fontes de riqueza geradas nas empresas pela adoção de tecnologias inteligentes e, em consonância com a aplicação da capacidade contributiva, garanta uma distribuição equitativa da carga tributária. O reconhecimento de uma nova base tributável, que não seja a atividade laboral, pode ser um caminho que deve ser explorado e será crucial na promoção da justiça tributária em um mundo digital.

[1]Stephan Zheng, Alexander Trott, Sunil Srinivasa, Nikhil Naik, Melvin Gruesbeck, David C. Parkes, Richard Socher. The AI Economist: Improving Equality and Productivity with AI-Driven Tax Policies. 2020. Harvard University. Disponível em:https://arxiv.org/pdf/2004.13332.pdf.

[2]World Inequality Report (2022). Disponível em: https://wir2022.wid.world/ .

[3]PORTO, Lilia. Capitalismo digital: enfraquecimento do trabalho, novos conflitos e oportunidades. O futuro das coisas. Disponível em:https://ofuturodascoisas.com/capitalismo-digital-enfraquecimento-do-trabalho-novos-conflitos-e-oportunidades/

Fonte: Jota

Para STJ, relação entre motorista e Uber é de natureza civil

Corte remeteu processo que discute indenização de motorista descredenciado pela Uber para a Justiça comum

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (3/12), de forma unânime, remeter um processo que discute indenização de motorista descredenciado pela Uber para a Justiça comum.

Na ação, o motorista alega que a Uber não teria apresentado justificativa válida para o seu descredenciamento, ao passo que a plataforma alegou que o descredenciamento ocorreu porque o motorista era reincidente no cancelamento de viagens e provocava clientes a desistirem da chamada de viagem, o que lhe garantia o recebimento de uma taxa de cancelamento.

O motorista recorreu ao STJ depois de o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) afirmar que a competência para o julgamento do caso seria da Justiça do Trabalho, tendo em vista a possível relação de trabalho entre as partes. No recurso, o motorista alega que a relação entre as partes é de contrato civil, não um vínculo de trabalho.

O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, deu provimento ao recurso do motorista e foi acompanhado pelos demais ministros. De acordo com Villas Cuêva, a relação entre o motorista e a plataforma digital é de natureza civil. “Os elementos demonstrativos da relação de emprego não estão configurados nessa modalidade de contratação, pois os requisitos de eventualidade e subordinação estão ausentes”.

Ele ainda acrescentou que a plataforma digital atua como intermediária do contrato digital entre o motorista e o consumidor, caracterizando uma relação de autoatendimento. “A natureza jurídica da reivindicação está diretamente relacionada à demanda e à causa da demanda, que, no entanto, são eminentemente civis e conduzem à competência da justiça comum”, disse.

Fonte: Jota

Riscos e cuidados na utilização das câmaras virtuais de arbitragem

Há algum tempo tem-se observado um movimento de criação de formas arbitrais mais informais e menos onerosas

Passados quase 30 anos da normatização da Arbitragem no Brasil (Lei 9.307/96), o método alternativo para resolução de conflitos (ADRs) tem passado por uma nova fase cheia de desafios, inclusive no âmbito judicial, decorrentes da onda de massificação do procedimento utilizado em grande escala para litígios envolvendo as mais variadas espécies de relações comerciais e segmentos de mercado.

A arbitragem, como sabido, é, originalmente, um meio extrajudicial para solução de conflitos que preza pela (e igualmente) se beneficia da celeridade, sigilosidade, autonomia das partes e acurada técnica empregada com a participação de árbitro(s), imparcial(is), que após o devido procedimento, proferirá(ão) sentença arbitral, que possui a mesma força executiva daquela proferida pelos juízes estatais. É, contudo, um procedimento, em geral, de significativo custo, o que acaba por torná-la mais seletiva.

A partir de tais características, e impulsionado pelas novas diretrizes do Código de Processo Civil de 2015, ao determinar que, entre outros, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por todos aqueles que compõe a cadeia de litígios no país, há algum tempo tem-se observado um movimento de criação de formas arbitrais mais informais e menos onerosas como forma de torná-la mais acessível àqueles que não conseguiriam, como regra, se valer dos procedimentos ofertados pelas tradicionais câmaras arbitrais, nem mesmo na modalidade de “arbitragem expedita”, que, por sua vez, é uma arbitragem mais simplificada e com menores custos envolvidos.

Com a criação e expansão de canais arbitrais virtuais para a solução de conflitos, que possuem regulamentos e dinâmicas mais simples, limitações aos desdobramentos admitidos, concentração de matéria tratada, árbitro único, observa-se um crescimento e surgimento de verdadeira indústria de câmaras arbitrais digitais capazes de absorver um alto número de procedimentos, mediante utilização de fluxos automatizados. Porém, no mais das vezes, sem a observação de normas internas ou externas de regulamentação ou da devida governança/compliance.

Vislumbra-se, portanto, a entrega de resultados céleres e menos custosos se comparado aos desdobramentos inerentes do processo judicial – o que, muitas vezes, é priorizado pelas empresas –, contudo, com um risco agregado que não pode ser descartado: a judicialização e potencial anulação das sentenças arbitrais por vícios procedimentais.

Na medida em que se populariza nas relações contratuais formalizadas por grandes empresas, a inserção da cláusula arbitral em seus contratos, em especial de consumo com os clientes finais, percebe-se que, muitas vezes, não são observadas regras como a necessidade legal desta cláusula estar destacada e ser assinada separadamente – o que, por si só, já é considerado vício procedimental passível de anulação e acesso direto ao Judiciário.

Com isso, embora tenha se notado uma crescente de utilização dessas câmaras com a tentativa de redução de custos e suposta agilização no encerramento de demandas, temos que essa prática acende um alerta no meio jurídico e nas empresas que estão se valendo de tais procedimentos, pois, apesar dos aparentes benefícios trazidos por essa “nova modalidade”, tem-se percebido brechas para anulações das sentenças arbitrais, o que pode gerar prejuízos temporais e financeiros às partes envolvidas pela indevida observação do procedimento arbitral, ou seja, sacrificando integralmente a celeridade desejada e colocando em cheque a suposta economia que se pensava obter.

Atualmente, a prolação de decisões afastando a aplicação da arbitragem em relações de consumo ou a ela comparadas já estão se tornando – a exemplo de relações locatícias com atuação das plataformas digitais – comuns no Poder Judiciário.

Os entendimentos trazem à tona a necessidade de adequação das empresas às peculiaridades trazidas pelo procedimento de arbitragem, caso desejem a utilizar como forma de resolução de conflitos. As referidas decisões reforçam a necessidade de celebração de contratos cristalinos e de fácil entendimento do consumidor, com destaque à cláusula arbitral, que deve ser clara e compreensível para todas as partes envolvidas, fazendo prevalecer o direito e facilitação da informação ao consumidor.

É interessante pensar, inclusive, na possibilidade de confecção de termo aditivo específico sobre a escolha arbitral, na medida que, inequivocamente, ter-se-á o destaque necessário à cláusula, conforme determina a lei, sendo, ainda, um documento apartado no qual é possível destrinchar e tornar o mais cristalina possível a arbitragem e o seu significado, cumprindo-se, portanto, os deveres legais de clareza e direito de informação das partes, em especial quando se trata de relações de consumo.

Sob a perspectiva jurídico-econômica, entendemos que os efeitos e aplicação da matéria devem ser analisados de acordo com a realidade de cada empresa e, ainda assim, caso a caso.

Fonte: Jota

As fases de análise do recurso especial no STJ: um tribunal em transformação

2025 pode (e deve) ser transformador para o tribunal, com a regulamentação da exigência constitucional da relevância para o recurso especial 

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou, passa e ainda passará por transformações em relação ao iter processual do seu recurso especial. O passeio verbal é proposital. 

Passou, em relação aos recursos especiais repetitivos, criado em 2008 e com a sua sistematização no Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Passa, com a expansão das classes que serão julgadas no plenário virtual, aprovada pela Emenda Regimental 45 de 2024, ainda não implementada. E ainda passará, com a regulamentação legal da exigência constitucional da relevância para o recurso especial, aprovada em 2022 por emenda à Constituição. 

Mas antes da implementação do novo plenário virtual e da exigência da relevância, é preciso entender o iter processual atual do recurso especial no STJ: sistematizo a análise em cinco fases. 

A primeira fase é a de conhecimento, é a que notoriamente diferencia os recursos de natureza ordinária dos recursos de natureza extraordinária. 

É a fase da incidência das conhecidas súmulas obstativas de conhecimento de recurso, podem sem citadas as conhecidas Súmulas 5 e 7 do STJ (de impossibilidade de reexame da matéria fática e contratual), as Súmulas 283 e 284 do STF (de impugnação insuficiente e de deficiência de fundamentação recursal), e as Súmulas 182 e 211 do STJ (de dialeticidade recursal e de exigência de prévia manifestação do tribunal de origem).  

Esta fase pode ser analisada tanto pela presidência do STJ, por força da previsão do art. 21-E, inciso V, do RISTJ, o que implica na decisão de não conhecimento do recurso antes da própria distribuição, ou mesmo pelo próprio relator após a distribuição do processo. 

Como é possível imaginar, a fase de não conhecimento é a de maior incidência no tribunal, como ilustrado na estatística da classe agravo em recurso especial, que é a classe mais distribuída anualmente no tribunal (representou 58,70% do total do acervo para 2023), sendo que o percentual de não conhecimento da classe para o mesmo ano, segundo o boletim estatístico do tribunal, foi de 59,6%. 

Há inúmeros motivos para esse alto percentual de não conhecimento, mas entendo que o principal é a falta de conhecimento prático e especializado dos advogados de origem que pensam no recurso especial apenas quando o tribunal já negou provimento ao seu principal recurso. 

A oposição de embargos de declaração contra o acórdão do tribunal de origem, por si só, não viabiliza processualmente o recurso especial. 

Esse é um dos vários mitos que ainda pairam sobre a atuação perante o STJ e que alimentam de maneira infundada a ideia da jurisprudência defensiva, como se a exigência de prequestionamento não estivesse prevista constitucionalmente: causa decidida. 

Se a questão jurídica tem potencial para ser direcionada para o STJ, isso deve ser projetado desde logo na ação e principalmente no início da fase recursal ordinária, momento em que se deve (i) pensar na objetivação do recurso especial, com a indicação clara e suficiente do dispositivo legal pretensamente violado, bem como na (ii) a demonstração da relevância da questão federal para a unidade do direito. 

Assim, caso proferida a decisão de não conhecimento pela presidência, o eventual agravo interposto será distribuído a um relator competente, que pode incluir o recuso no plenário virtual (art. 184-A do RISTJ), juntos com os demais agravos internos ou regimentais interpostos contra as suas decisões monocráticas. 

A segunda fase é a de incidência dos precedentes de observância obrigatória, prevista no art. 927, que foi sistematizada pelo CPC de 2015 com um rol de julgados vinculantes para juízes e tribunais. 

É nesta fase que a garantia do livre convencimento motivado do julgador foi mitigada pelo legislador, conforme a exposição de motivos do código:

Se todos têm que agir em conformidade com a lei, ter-se-ia, ipso facto, respeitada a isonomia. Essa relação de causalidade, todavia, fica comprometida como decorrência do desvirtuamento da liberdade que tem o juiz de decidir com base em seu entendimento sobre o sentido real da norma.

Esse entendido desvirtuamento da liberdade foi objeto de preocupação por parte do legislador quando inaugurou o Livro III dos CPC para dizer que: “os tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência e mantê-la integra, estável e coerente” (art. 926). 

É a integralidade, a coerência e a estabilidade que o nosso sistema jurídico exige para que a lei federal seja federal também na sua aplicação pelos juízes e tribunais espalhados por todas as unidades da federação. 

Desse modo, caso conhecido o recurso especial, o relator deve verificar se já há uma reposta vinculante do Poder Judiciário prevista no art. 927 do CPC:

  1. decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade;
  2. enunciados de súmula vinculante;
  3. acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
  4. enunciados das súmulas do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional; e
  5. a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Assim, ultrapassada fase de conhecimento do recurso, o julgador pode aplicar monocraticamente (art. 932 do CPC) a resposta vinculante, de acordo com o disposto no art. 10 e 489 do CPC (§ 1º do art. 927), sendo que a decisão pode ser objeto de agravo, que igualmente pode ser incluído no julgamento virtual. 

A terceira fase é a de incidência do “entendimento dominante”, conforme o enunciado da Súmula 568 do STJ, assim redigido: “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”. 

É a fase que resgatou o poder do relator previsto no art. 557 do CPC de 1973, que autorizava o relator a decidir de forma monocrática quando o recurso estivesse “em confronto com a jurisprudência dominante do Tribunal”. 

Mas o que caracteriza “entendimento dominante”, de modo a autorizar o julgamento monocrático pelo relator ?  

De fato, é um conceito ainda em aberto tanto na doutrina quanto no tribunal, é algo que acontece de modo prático na realidade do tribunal, até com poucas citações no dispositivo da decisão monocrática do relator. 

Aqui a justificativa para o ainda do parágrafo anterior é que: embora a ideia de entendimento dominante não tenha sido recepcionada pelo art. 932 do CPC de 2015, o legislador resolveu “promovê-la” em 2022 ao patamar constitucional quando a considerou como hipótese de relevância presumida: “quando o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça” (EC 125 de 2022). 

Assim, ainda de que de conceito aberto, observo que a ideia de entendimento dominante é utilizada na prática do tribunal quando o órgão julgador a que está vinculado o relator já decidiu aquele mérito (não vinculante), de modo a afastar a exigência de nova pauta para o órgão colegiado decidir a mesma questão. 

De igual modo, a decisão monocrática do relator que aplica o entendimento dominante pode ser objeto de agravo e ser incluído no ambiente virtual para julgamento. 

A quarta fase é a de julgamento originalmente colegiado, momento em que o relator inclui o recurso especial em pauta presencial (não pode ser virtual) para análise e votação pelo órgão julgador com a possibilidade de sustentação oral pelos advogados. 

É a fase que representa menos de 1% dos processos que são julgados pelo tribunal, isto é, mais de 99% dos processos decididos no STJ são de forma monocrática, nas três fases passadas, com a possível confirmação da decisão no plenário virtual. 

A quinta fase é a da majoração dos honorários recursais, caso o recurso não seja conhecido ou provido na sua totalidade, conforme decidido pelo STJ no Tema 1.059, diante da leitura do § 11 do art. 85 do CPC. 

É uma novidade do CPC de 2015 a majoração dos honorários na fase recursal, pois antes a despesa acabava invariavelmente na sentença e não havia desestímulo legal para não recorrer. 

Essas são, portanto, as cinco fases de análise do recurso especial no STJ hoje, com o consequente uso do plenário virtual, antes da implementação da Emenda Regimental 45 de 2024 (que vai permitir a inclusão da fase quatro no plenário virtual), e da regulamentação da Emenda Constitucional 125 de 2002, que vai exigir a relevância para o apelo especial (uma nova fase ?)

O ano de 2025 pode (e deve) ser transformador para o STJ. 

Fonte: Jota

Plataformas deverão informar operações de comércio eletrônico antecipadamente

MP 1.271/24 também reduz a zero a alíquota incidente sobre medicamentos importados por pessoa física

O governo federal criou uma nova obrigação acessória para as plataformas de comércio eletrônico que fazem remessas internacionais. Agora, as empresas deverão prestar informações à Receita Federal do Brasil, através do registro da declaração de importação, sobre essas mercadorias antes da chegada delas ao Brasil.

As alterações constam na Medida Provisória 1.271/2024, publicada no Diário Oficial da União da última sexta-feira (25/10). Serão atingidas as empresas de comércio eletrônico que adotam o regime de tributação simplificada.

A MP prevê a obrigação de repasse aos cofres públicos, direta ou indiretamente, dos tributos devidos pelo consumidor nessas operações. De acordo com o texto, os valores serão repassados “para o responsável pelo registro da declaração de importação de remessa no sistema informatizado da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil destinado ao controle das remessas internacionais”.

Atualmente, as plataformas que já aderiram ao programa de conformidade da Receita Federal fazem a retenção, e o valor é repassado ao transportador. O Programa Remessa Conforme foi estabelecido na Portaria Coana 130/2023.

“A MP introduz ajustes para facilitar e agilizar as importações por empresas de comércio eletrônico no âmbito do Regime de Tributação Simplificada, passando a exigir informações antecipadas para o registro da declaração de importação e o repasse dos tributos para a empresa responsável pela sua formalização no Siscomex”, entende o advogado Eduardo Kiralyhegy, do escritório NMK Advogados.

Para a advogada Thais Veiga Shingai, sócia do Mannrich e Vasconcelos Advogados, a MP reforça a estratégia do governo de tributar as importações de baixo valor feitas por meio de plataformas de comércio eletrônico. “Para tanto, cria um regime de cobrança antecipada de tributos no momento da venda, exigindo que as plataformas recolham o imposto antes mesmo do produto entrar no país. Mitiga as oportunidades de subfaturamento e facilita a fiscalização, numa tentativa de frear a evasão fiscal e melhorar a competitividade com empresas nacionais”, diz a tributarista.

Outro aspecto da MP apontado pela advogada é a criação de um ônus para as plataformas, que agora vão precisar adaptar seus sistemas para fazer essas antecipações.

O texto dispõe que a regulamentação poderá ser feita por ato da Secretaria da Receita Federal, que pode, inclusive, estabelecer um prazo de adaptação para as empresas não admitidas em programas de conformidade na data de publicação da MP.

De acordo com Shingai, a tributação das importações de pequeno valor “não necessariamente terá o impacto desejado sobre a indústria e o comércio locais, pois há vários outros fatores, além dos tributos, que tornam muitos fabricantes estrangeiros mais competitivos”. Ela cita como exemplo “leis trabalhistas mais brandas e, portanto, menos onerosas”.

“Por isso é importante monitorar os efeitos dessa nova legislação envolvendo as compras internacionais de pequeno valor, para avaliar, daqui algum tempo, seu custo-benefício. Existe sempre um tradeoff [uma escolha] entre a criação de novas medidas de controle e os benefícios por elas gerados. Essa balança precisa ser equilibrada com muito cuidado para que a fiscalização não seja mais onerosa do que os benefícios”, pondera a advogada.

Medicamentos

O texto também reduz a zero a alíquota do Imposto de Importação incidente sobre medicamentos importados por pessoa física, para uso próprio ou individual, no regime de tributação simplificada. O limite estabelecido abarca medicamentos que não ultrapassem o valor de US$ 10 mil ou o equivalente a esse valor em outra moeda estrangeira, “desde que cumpridos todos os requisitos estabelecidos pelos órgãos de controle administrativo”. A redução de alíquota é válida até 31 de março de 2025.

O advogado João Vitor Kanufre Xavier, sócio do Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella Advogados, aponta como positiva a criação desta nova hipótese, “pois facilita a aquisição de medicamentos de difícil acesso, pela população, no mercado nacional”. “A nova MP, do ponto de vista técnico, está em linha com o objetivo extrafiscal do Imposto de Importação”, afirma.

Fonte: Jota

Possíveis impactos econômicos e sociais da não renovação do Convênio 100/97

O Brasil sedia neste mês a 19ª reunião de cúpula do G20, o grupo das 20 maiores economias do planeta. Entre as três prioridades principais na agenda para o diálogo estão, em primeiro lugar, a inclusão social e o combate à fome.

Não há preocupação maior, em nível global, tanto que está inserida no contexto dos marcos globais de biodiversidade e clima. Assim como não há como falar de combate à fome sem falar de tecnologia, pois somente ela ajudará a produzir mais alimentos, sem expandir terras, usar mais recursos naturais e a custos menores.

Até a década de 1970 o Brasil importava alimentos básicos como arroz e feijão, alimentos que chegavam ao prato com preços mais elevados, em dólar e com o custo do frete internacional. Com o desenvolvimento do agronegócio, o Brasil saiu do patamar de país importador de alimentos básicos, alçando-se ao patamar de um dos maiores países produtores e exportadores de produtos agropecuários no mundo.

Nesse sentido, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.553, proposta pelo PSOL, em 2016, resultará no aumento do custo de defensivos agrícolas, uma das principais tecnologias que contribuem para a produtividade do agronegócio e a consequente oferta e preço dos alimentos.

Ela questiona a constitucionalidade de cláusulas do Convênio ICMS 100/97, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), e de dispositivos estabelecidos no Decreto 7.660/2011, referentes a Tabela de Incidência de Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI), que concedem benefícios fiscais a defensivos agrícolas. Uma audiência pública será realizada no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (5/11).

O Convênio 100/97 permite que os estados brasileiros concedam redução da base de cálculo e isenções de ICMS em operações internas. Esses benefícios têm papel crucial na redução dos custos de produção, permitindo que os agricultores mantenham a competitividade em um mercado onde os preços dos insumos variam significativamente. Caso o STF julgue procedente a ADI que questiona esses benefícios, a carga tributária sobre os defensivos aumentaria substancialmente.

Segundo cálculos da indústria, estima-se um aumento de, em média, 25% nos preços dos defensivos agrícolas, impacto que se refletiria diretamente nos custos de produção das culturas. Essa elevação levaria a um repasse integral nos preços finais dos alimentos, gerando aumento de inflação e afetando a renda das famílias, especialmente as de baixa renda. Para diversos produtos, o impacto nos preços poderia ser superior à inflação registrada em todo o ano de 2023.

A defesa vegetal impacta diretamente nos custos de produção de produtos fundamentais na cesta de consumo das famílias brasileiras, como arroz, feijão, cebola e tomate. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq-USP, o preço dos alimentos hoje representa apenas 40% no valor praticado na década de 1970, quando a agricultura brasileira passou a se tornar tecnológica.

Além dos efeitos diretos sobre os preços dos alimentos, a não renovação do convênio pode desestimular investimentos no setor. A redução da rentabilidade dos produtores pode comprometer a capacidade de investimento em novas tecnologias, essenciais para aumentar a produtividade e a competitividade do agronegócio brasileiro. A possível retração pode levar até mesmo ao fechamento de propriedades rurais.

Os defensivos agrícolas são fundamentais para a proteção das lavouras contra pragas e doenças. Um estudo da Embrapa mostra que a ausência de controle pode resultar em perdas de até 30% da produção agrícola, afetando a segurança alimentar e a renda dos produtores. De acordo com o Cepea/Esalq-USP, sem a utilização de fungicidas para o controle da ferrugem da soja, as perdas resultariam em R$ 11,7 bilhões.

Outro ponto a ser considerado é o impacto nas exportações. O Brasil é um dos maiores exportadores de commodities agrícolas do mundo. Em 2023, as exportações de soja, milho, algodão e café somaram cerca de US$ 77,3 bilhões, representando 23% das exportações totais do país. O aumento do preço dos defensivos agrícolas pode levar produtores a reduzirem a área plantada, comprometendo a oferta desses produtos no mercado, com redução das exportações em mais de R$ 8 bilhões.

Apenas três países no globo, que não tem relevância na produção agrícola mundial, não oferecem algum tipo de incentivo para insumos.

O impacto econômico da não renovação do Convênio 100/97 também se estende a outros setores interligados à agricultura. Indústrias como a alimentícia e de bebidas, também podem enfrentar custos mais altos, que serão repassados aos consumidores finais. Isso pode resultar em inflação generalizada, com efeitos adversos na economia. Além disso, o aumento nos preços dos alimentos pode levar a uma retração no consumo, afetando crescimento econômico e geração de empregos.

É importante ressaltar que o uso de defensivos agrícolas, embora necessário, deve ser feito de maneira racional e sustentável. A busca por alternativas mais ecológicas e menos prejudiciais ao meio ambiente é uma tendência crescente no setor agrícola.

No entanto, essa transição requer tempo e investimentos em pesquisa e desenvolvimento, além de uma infraestrutura adequada para a adoção dessas novas tecnologias. A eliminação dos benefícios fiscais em um momento crítico pode inviabilizar essa transição, uma vez que muitos produtores não terão recursos para investir em alternativas mais sustentáveis.

Diante desse cenário, a manutenção do Confaz 100/97 é fundamental para garantir a competitividade do agronegócio brasileiro, a segurança alimentar global e a estabilidade econômica. Uma discussão como essa deve ser pautada em dados e evidências, considerando não apenas aspectos tributários, mas também impactos sociais e econômicos.

Fonte: Jota

Cabe ação rescisória para adequar modulação ao Tema 69, decide STF

Por meio do Tema 69, conhecido como ‘tese do século’, Supremo excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins

modulação de efeitos tema 69

Sessão plenária do STF. | Crédito: Rosinei Coutinho/STF

Por unanimidade, os ministros do SupremoTribunal Federal (STF) votaram para definir, com repercussão geral, que cabe o ajuizamento de ação rescisória contra decisão transitada em julgado em desacordo com a modulação de efeitos do Tema 69. O STF fixou a seguinte tese: “Cabe ação rescisória para adequação de julgado à modulação temporal dos efeitos da tese de repercussão geral fixada no julgamento do RE 574.706 (Tema 69/RG)”.

Com os ministros favoráveis ao entendimento, a decisão do Supremo prevalece sobre a do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que já fixou tema repetitivo sobre o assunto. Porém, não há mudança prática, já que as posições não são conflitantes.

Na prática, a decisão permite que a Fazenda proponha ações visando a anulação de decisões favoráveis aos contribuintes relacionadas à exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins. É o caso, por exemplo, de decisões judiciais que permitiram a restituição de valores, porém foram proferidas em desacordo com a modulação do STF na “tese do século”.

Por meio do Tema 69, conhecido como “tese do século”, o Supremo excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. O STF ainda determinou que a decisão, favorável aos contribuintes, produza efeitos somente a partir da data de julgamento de mérito, de 15 de março de 2017, ressalvando-se as ações judiciais e os pedidos administrativos protocolados até a mesma data.

No dia 13 de setembro, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou os (REsps) 2054759/RS e 2066696/RS (Tema 1245), com a mesma discussão. O colegiado entendeu pelo cabimento da ação rescisória e fixou a tese de que “é admissível o ajuizamento de ação rescisória para adequar julgado de antes de 13 de maio de 2021 à modulação do Tema 69 do STF”.

No voto favorável à repercussão geral e ao cabimento da ação rescisória, o relator no STF, ministro Luís Roberto Barroso, observou que as duas turmas do Supremo já admitiram a possibilidade da ação rescisória contra julgados que não observaram a modulação de efeitos do Tema 69. O magistrado afirmou ainda que o debate diz respeito “à autoridade da jurisdição constitucional exercida pelo Supremo” e que esta é uma questão constitucional relevante.

O caso foi definido no RE 1489562 (Tema 1338) e envolve a empresa R. Milet Comércio de Calçados Ltda.

Fonte: Jota