Legalização do uso da cannabis: medo e ajustes jurisprudenciais necessários

A publicização midiática do julgamento do Recurso Extraordinário nº 635.659, oportunidade em que o Supremo Tribunal Federal decidirá sobre a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei n.º 11.343/2006 (Lei de Drogas), favoreceu o amplo debate sobre o tema, especialmente nas redes sociais, muitas vezes com projeções alarmantes sobre as consequências que a eventual descriminalização da maconha promoverá no cotidiano brasileiro.

A disseminação a jato de desinformações desnudou a necessidade de uma melhor reflexão sobre o uso de drogas, sobre o estágio civilizacional adequado para se experimentar a nova perspectiva e sobre os princípios de justiça que o envolvem.

A partir dos estudos lançados em ensaios anteriores desta coluna, se pretende aqui debater a respeito da inescapável “marcha do espírito” em favor da legalização do uso de drogas, do reconhecimento da maturidade social para o enfrentamento do fenômeno psicológico representado pelo medo e das estratégias empregadas pelo STF e pelo STJ para, paulatinamente, ajustar a interpretação da constituição, do direito e do processo penal à realidade mais recente que se consolida no horizonte. A conclusão conclama à perfeita delimitação da matéria a ser travada no âmbito do STF e aquela da competência infraconstitucional do STJ, evitando-se o contrassenso de eventuais divergências entre os dois tribunais máximos do país.

Confirmando a primeira hipótese, a exploração da maconha para fins medicinais bem demonstra o desbordo do plano meramente jurídico sobre o tema. Os pacientes simplesmente não podem ser alijados do tratamento canábico por mero capricho do legislador ou por imposições de ordem moral ou religiosa. Por outro lado, a indústria e o mercado igualmente estão reagindo às limitações da produção e cada vez mais pressionam para a normalização do plantio, da manipulação e do comércio da droga. A aceitação do uso recreativo em diversos países, como Estados Unidos, Canadá, Portugal, Espanha, Holanda, Argentina e Uruguai, não deixa dúvida sobre o caráter irrefreável da legalização da maconha.

O negócio já movimenta milhões de dólares e se sedimentou sem maiores rupturas nos países que a ele aderiram. Rápida pesquisa no âmbito do Google bem demonstra a fácil captura da planta pelo agro e a sua conformação com a indústria e o comércio.[1]

Além do reconhecido emprego medicinal, a cannabis e a sua variante, a fibra de cânhamo, são empregadas como matéria prima em mais de 5.000 (cinco mil) produtos de diferentes domínios da cadeia produtiva, como a indústria têxtil, a construção civil, o setor de combustíveis, entre outras. A sua regulamentação, tal como ocorrido nos EUA, onde já representa o quinto maior cultivo,[2] certamente abrirá espaço para o surgimento de outros mercados que ajudarão a desenvolver a economia.

Portanto, é uma realidade que não pode mais ser ignorada pelos poderes.

Ocorre que o discurso proibicionista ainda mantém o assunto como verdadeiro tabu, estigmatizando os usuários como corrompidos, amorais e perigosos, enfim, um risco para “as pessoas de bem”.

Conta muito com o medo decorrente dos falsos alarmes morais, a segunda premissa trabalhada neste artigo.

Para não se alongar o debate em demasia, tomam-se emprestadas as lúcidas conclusões do criminólogo Riccardo Cappi, professor da Uneb (Universidade do Estado da Bahia), ao estudar a influência imposta pelo medo para justificar o movimento em prol da redução da maioridade penal, que em tudo se aplica às drogas. Afirma o autor[3]:

A partir do medo, a percepção sobre o problema é reduzida. O meu medo faz com que eu esteja focado naquilo que pode me atingir, sem ver a complexidade, a circunstância, a história, as possibilidades e as alternativas. O medo e a dor são legítimos. Mas não podemos pautar políticas públicas com base no medo […]. Quando o estado e parlamentares apresentam uma saída distante da legalidade, essa solução mágica passa a ser atraente e a exclusão radical se apresenta como remédio. As entidades tomam a decisão de condenar o indivíduo à morte social. Na criminologia, a questão da periculosidade sempre foi um problema. É impossível fazer uma previsão absoluta e certeira. Há uma relativa incerteza com a qual temos que trabalhar.

Há o medo de a legalização das drogas determinar a piora do quadro e elevar o número de dependentes. Existe o caráter doloroso e amedrontador de que esse pesadelo possa fugir do controle e se tornar endêmico. Com base no discurso catastrófico, políticos reacionários se vestem com a capa da moralidade para obter ganhos junto ao eleitorado cristão-conservador. Tudo muito fora da racionalidade.

Daí a importância do debate sereno e equilibrado sobre a questão. A propósito, vale registrar o recente artigo assinado por David Pinter Cardoso aqui nesta coluna, quando projetou o círculo socialmente maduro alcançado pela sociedade brasileira a partir dos seguintes tópicos: (i) proibir drogas não reduz a oferta e nem a demanda de drogas ilícitas; (ii) regulamentar o uso não necessariamente aumenta o consumo; (iii) maior risco à saúde não guarda relação com drogas serem proibidas; (iv) uso de drogas não é problema de saúde; o problema é o uso abusivo de drogas; (v) a maconha não é porta de entrada para outras drogas; (vi) drogas não geram crimes; proibir drogas sim e (vii) mais prisões não necessariamente reduzem criminalidade.[4]

Apesar disso, o ambiente político atual não permite supor que a formalização da legalização do uso de drogas será enfrentada racionalmente por leis aprovadas pelo Legislativo ou por decisões do Executivo, ficando a problemática, mais uma vez, entregue ao Poder Judiciário.

A corte constitucional (STF) e a corte infraconstitucional (STJ) não fugiram do compromisso e passaram a enfrentar o tema, ambas com estratégias bem calculadas de não favorecer a ruptura brusca do modelo comportamental, indicativo claro de que também não se sentem imunes ao angustiante medo de não saber ao certo até onde a mudança alcançará.

Para a sorte de todos, embora nutrindo a tendência natural de se preocupar mais com os aspectos negativos em detrimento dos alcances positivos das decisões, as maiores instâncias do Poder Judiciário decidiram romper com a paralisia que se arrastava há anos sobre a sempre criticada criminalização do uso de drogas.

Desde a primeira edição do seu festejado “Introdução crítica ao direito penal brasileiro”, em 1990, Nilo Batista já não aceitava a tipificação penal do usuário:[5]

As aplicações legislativas do princípio da lesividade também comparecem como fundamento parcial da impunibilidade do chamado crime impossível (art. 17 CP). O mesmo fundamento veda a punibilidade da autolesão, ou seja, a conduta extrema que, embora vulnerando formalmente um bem jurídico, não ultrapassa o âmbito do próprio autor, como, por exemplo, o suicídio, a automutilação e o uso de drogas. No Brasil, o artigo 16 da Lei 6368/76 incrimina o uso de drogas em franca oposição ao princípio da lesividade e as mais atuais recomendações político-criminais.

Ainda assim, mesmo tardiamente, deve-se louvar as posturas atuais das cortes superiores.

Esta coluna também já deixou registradas as principais críticas ao controle penal e ao contundente fracasso da política de guerra às drogas. Não existem mais ilusões a esse respeito. Portanto, é de se aplaudir o movimento jurisprudencial ocorrido tanto no STF como no STJ.

O primeiro, em seu papel maior de guardar a Constituição, corajosamente colocou em pauta e iniciou o julgamento do citado Recurso Extraordinário n.º 635.659, caminhando para confirmar a inconstitucionalidade da tipificação do uso de maconha.

Sem dúvida, empregou postura cautelosa e limitou bastante o alcance do julgado, o que não retira o mérito do enfrentamento da questão e da busca por critérios formais para distinguir o usuário do traficante.

No artigo publicado em 8 de setembro passado, Cristiano Maronna descortinou o desenvolver do julgamento e deixou assentados importantes apontamentos na esperança de contribuir para que, ao final, o STF estabeleça parâmetros de produção e validade dos indícios, afastando-se da centralidade do testemunho policial e das provas a ele ancoradas para a tipificação do tráfico de drogas. [6]

Em acréscimo, considera-se fundamental a convalidação pelo STF da interpretação da legislação infraconstitucional adotada pelo STJ a partir de um sem-número de julgados sobre a matéria.

Controle da constitucionalidade pelo STF; controle da legalidade pelo STJ.

A jurisprudência atual do STJ passou a atacar o instrumento mais perverso da política de guerra às drogas, qual seja, o paulatino rebaixamento do standard probatório para fundamentar o decreto de prisões preventivas e a prolação de sentenças condenatórias.

Entre outros julgados, cuidou (i) de restabelecer a observância dos rigores legais para a validade das buscas domiciliares (HCs 598.051/SP e 766.654/SP), (ii) de considerar insuficientes para a condenação os conjuntos probatórios calcados somente em elementos informativos do inquérito ou em testemunhos indiretos para a sentença condenatória (AgRg no REsp 2.026.690/BA), (iii) de resgatar as formalidades exigidas pelo art. 226 do CPP para o reconhecimento de pessoas (HC nº 598.886/SC) e (iv) de elevar o standard probatório exigível para a busca pessoal ou veicular, sem mandado judicial (RHC 158.580/BA).

Recuperou, dessa forma, a vitalidade das normas infraconstitucionais encarregadas de dar efetividade aos postulados de garantia insertos na CF/88, favorecendo, rapidamente, melhores índices no enfrentamento da superlotação carcerária.

Contudo, conforme informado por esta ConJur, recente julgado do STF, sob o fundamento de violação do Tema 280 de Repercussão Geral, derrubou um acórdão do STJ que reconheceu a nulidade do flagrante em razão da violação de domicílio e, por conseguinte, das provas decorrentes do ato.

Vale destacar o seguinte trecho do voto condutor:[7]

[…] o Superior Tribunal de Justiça, no caso concreto ora sob análise, após aplicar o Tema 280 de Repercussão Geral dessa SUPREMA CORTE, foi mais longe, alegando que, não obstante os agentes de segurança pública tenham recebido denúncia anônima acerca do tráfico de drogas no local e o suspeito tenha empreendido fuga para dentro do imóvel ao perceber a presença dos policiais, tais fatos não constituiriam fundamentos hábeis a permitir o ingresso no domicílio do acusado, haja vista que não houve nenhuma diligência investigativa prévia apta a evidenciar elementos mais robustos da ocorrência do tráfico naquele endereço […].
Nesse ponto, não agiu com o costumeiro acerto o Superior Tribunal de Justiça, pois acrescentou requisitos inexistentes no inciso XI, do artigo 5º da Constituição Federal, desrespeitando, dessa maneira, os parâmetros definidos no Tema 280 de Repercussão Geral por essa SUPREMA CORTE.

A decisão, portanto, não merece prosperar.

Na presente hipótese, o Tribunal da Cidadania extrapolou sua competência jurisdicional, pois sua decisão, não só desrespeitou os requisitos constitucionais previstos no inciso XI, do artigo 5º da Constituição, restringindo as exceções à inviolabilidade domiciliar, como também, inovando em matéria constitucional, criou uma nova exigência — diligência investigatória prévia — para a plena efetividade dessa garantia individual, desrespeitando o decidido por essa Suprema Corte no Tema 280 de Repercussão Geral […].

Incabível, portanto, ao Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo a imposição de providências administrativas como medida obrigatória para os casos de busca domiciliar, sob o argumento de serem necessárias para evitar eventuais abusos, além de suspeitas e dúvidas sobre a legalidade da diligência, em que pese inexistir tais requisitos no inciso XI, do artigo 5º da Constituição, nem tampouco no Tema 280 de Repercussão Geral julgado por essa Suprema Corte.

O embaraço criado com a decisão acima não traz nenhum benefício para a segurança jurídica e representa grave retrocesso no avanço jurisprudencial iniciado pelo STJ em favor da maior racionalidade na aplicação da lei antidrogas.

Com a devida licença, tanto o objeto do Tema 280 como as circunstâncias fáticas que envolveram o caso concreto dizem muito mais respeito à legalidade do que à constitucionalidade, ou seja, a matéria é predominantemente de ordem infraconstitucional, da competência do STJ e não do STF.

O principal instrumento de garantia do indivíduo frente ao poder punitivo estatal é o princípio da legalidade, cuja origem histórica remonta à luta contra o arbítrio e a opressão impostos pelo sistema penal do final do século 18. Portanto, mais do que favorecer a igualdade de todos perante a lei, a busca pela uniformização da interpretação da lei penal e processual penal visa à proteção da liberdade individual, somente alcançável através da estrita observância do princípio da legalidade.

Decidir acerca da regularidade da prisão em flagrante determinada por busca domiciliar sem mandado judicial é tarefa exclusiva do STJ, pois, afinal, todo o procedimento está descrito e limitado em lei federal. Desse modo, é dele a competência para “promover a interpretação condizente do tipo com o espírito do ordenamento imposto pelo Estado Democrático de Direito, adequando o seu alcance até o limite permitido pelo princípio da legalidade”. [8]

A função de zelar pela uniformização da lei federal não pode e nem deve ser repartida com o STF, sob pena de o STJ se transformar em mera instância de passagem. As decisões do Superior Tribunal de Justiça, tratando-se de matéria infraconstitucional, “hão de ser finais, irrecorríveis, com autoridade de coisa julgada”. [9]

Nesse instante crucial da tão esperada travessia jurisprudencial para o enfrentamento mais efetivo, mais inteligente e mais humanitário do tráfico de drogas e das organizações criminosas que gravitam ao seu redor, avultam as singulares missões de guarda da Constituição pelo STF e de uniformização da interpretação da lei federal pelo STJ.

Espera-se, serenamente, que saibam divisar e respeitar reciprocamente a elevada competência de cada um.


[1] Os seguintes sítios eletrônicos demonstram a força do negócio: https://herbarium.la/https://highwaycannabis.com/https://www.thewoodsweho.com/https://en.cannabisstoreamsterdam.com/https://www.royalqueenseeds.pt/https://www.sirius.nl/https://plantamaestra.cl/https://expocannabis.uy/.

[2] Sobre a assertiva: https://forbes.com.br/forbesagro/2022/11/cannabis-legal-nos-eua-rende-us-5-bi-aos-produtores-em-2022/.

[3] Cappi, Ricardo. A maioridade penal nos debates parlamentares: motivos do controle e figuras de perigo. São Paulo: Editora Casa do Direito, 2017.

[4] CARDOSO, David Pinter. O básico sobre a criminalização de drogas. Disponível em https://www.conjur.com.br/2023-set-29/repensando-drogas-basico-criminalizacao-drogas; Acesso em 11.10.2023.

[5] BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 92-3.

[6] MARONNA, Cristiano.  Ganhou, playboy!: o standard probatório no crime de tráfico de drogas. Disponível em < https://www.conjur.com.br/2023-set-08/ganhou-playboy-standard-probatorio-trafico-drogas>. Acesso em 11.10.2023.

[7] Disponível em < file:///C:/Trabalho/icp%20e%20mais/repensando/stf-cita-inovacao-derrubar-acordao-stj.pdf>. Acesso em 11.10.2023.

[8] MARCHI JÚNIOR, Antônio de Padova. Princípio da legalidade penal: proteção pelo STJ e parâmetros de interpretação. Belo Horizonte: Del Rey. 2016, p. 178.

[9] NAVES. Nilson Vital. O Superior Tribunal e a Questão Constitucional. Revistra dos Tribunais. São Paulo: RT, v. 797, p. 28-42, mar. 2002.

Fonte: Conjur

Aprovada resolução que dispõe sobre os planos de contratação anual do CJF e da Justiça Federal

O documento foi analisado durante a sessão de julgamento do Conselho realizada nesta terça-feira (3)

O Pleno do Conselho da Justiça Federal (CJF) aprovou a Resolução n. 842/2023, que dispõe sobre o Plano de Contratações Anual e o Plano de Contratações Compartilhadas Anual, no âmbito do Conselho e da Justiça Federal de 1º e 2º graus. O processo foi relatado pela presidente do CJF, ministra Maria Thereza de Assis Moura, durante a sessão ordinária de julgamento do CJF realizada nesta terça-feira (3), na sede do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), no Rio de Janeiro. 

O normativo substitui a Resolução CJF n. 701/2021, que dispõe sobre o Plano Anual de Contratações de obras, serviços de Engenharia, Tecnologia da Informação, bens e serviços comuns no âmbito do Conselho e da Justiça Federal de 1º e 2º graus. A mudança visa adequar os procedimentos à Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei n. 14.133/2021.  

A elaboração do documento contou com a colaboração dos tribunais regionais federais (TRFs) e de algumas das seções judiciárias que os compõem, cujas sugestões foram consolidadas pela Secretaria de Administração do Conselho (SAD/CJF). A versão final do normativo foi submetida à apreciação das diretorias-gerais dos órgãos no Encontro das Seções Judiciárias da 3ª Região, realizado em 30 de agosto de 2023.    

Fonte: Conselho Justiça Federal

Moraes suspende julgamento sobre entrega de dados do Google

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista e suspendeu o julgamento de um recurso do Google para evitar a quebra de sigilo de pessoas que teriam buscado informações sobre a vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018.

O caso começou a ser julgado na semana passada no plenário virtual da Corte. Antes da interrupção provocada pelo pedido de vista, somente a relatora, ministra Rosa Weber, proferiu voto.

A defesa da plataforma recorreu ao Supremo após a Justiça determinar a identificação dos dados de um grupo indeterminado de pessoas que fizeram pesquisas sobre a vereadora dias antes do assassinato. A medida foi tomada na investigação que apura os mandantes do crime.

Ao analisar a questão, antes da aposentadoria, Rosa Weber destacou a importância da investigação, mas entendeu que quebra de sigilo indiscriminada é desproporcional e pode atingir até usuários comuns que procuraram informações sobre a morte da vereadora devido à repercussão na imprensa.

“Um número gigantesco de usuários não envolvidos em quaisquer atividades ilícitas, nos termos da decisão objurgada, teria seus sigilos afastados, a demonstrar indevida devassa e a sua absoluta desproporcionalidade em razão do excesso da medida”, argumentou a ministra.

Não há previsão para retomada do julgamento.

Fonte:

Logo Agência Brasil

CCJ aprova projeto que obriga presença de exemplar de Estatuto da Advocacia em delegacias

Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Marcos Pollon fala durante reunião de comissão

Marcos Pollon apresentou emenda autorizando estatuto em formato digital

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou projeto que torna obrigatória a manutenção de exemplar do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em delegacias e estabelecimentos prisionais estaduais e federais, para consulta sobre as prerrogativas do advogado junto a esses órgãos. 

O não cumprimento na norma, segundo o texto aprovado, implicará a responsabilização da autoridade que preside, chefia ou dirige o órgão, por transgressão disciplinar, a ser apurada pela autoridade administrativa competente.

O relator da matéria, deputado Marcos Pollon (PL-MS), apresentou parecer favorável ao Projeto de Lei 6116/16, do deputado Pr. Marco Feliciano (PL-SP), com emenda para prever a possibilidade, como alternativa, de órgãos de segurança disponibilizarem o estatuto em formato digital. 

“Ao serem divulgados o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil, divulgam-se também as garantias do advogado e do cidadão, pilares do Estado Democrático de Direito. Cabe um aperfeiçoamento ao projeto no sentido de garantir o acesso por meios digitais, uma vez que os recursos eletrônicos estão cada vez mais presentes no dia a dia da população e dos operadores do direito”, defendeu Pollon.

O projeto tramita em caráter conclusivo e, portanto, pode seguir ao Senado, a menos que haja recurso para votação pelo Plenário.

Fonte: Câmara Notícias

Plano não pode negar custeio de remédio registrado na Anvisa, mesmo que prescrição seja off-label

Para a Quarta Turma, ainda que o medicamento tenha sido indicado pelo médico para uso fora das previsões da bula ou para tratamento experimental, a recusa do plano de saúde é abusiva.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que uma operadora de plano de saúde deve custear tratamento com medicamento prescrito pelo médico para uso off-label (ou seja, fora das previsões da bula).

De acordo com o colegiado, se o medicamento tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – como no caso dos autos –, a recusa da operadora é abusiva, mesmo que ele tenha sido indicado pelo médico para uso off-label ou para tratamento em caráter experimental.

Na origem do caso, uma beneficiária do plano de saúde ajuizou ação contra a operadora para pleitear o custeio do medicamento antineoplásico Rituximabe, administrado durante a hospitalização para tratamento de complicações decorrentes de doença autoimune.

Uso off-label não constitui impedimento para cobertura

A operadora do plano alegou que o fármaco não estaria incluído no rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – não sendo, portanto, passível de cobertura – e, além disso, o uso off-label não estaria previsto no contrato.

As instâncias ordinárias, no entanto, entenderam que o uso off-label não é impedimento para a cobertura, ainda que o tratamento seja experimental.

O relator do recurso da operadora no STJ, ministro Raul Araújo, destacou que o tribunal, ao julgar o EREsp 1.886.929, estabeleceu critérios sobre a obrigatoriedade ou não de cobertura diante do rol da ANS, admitindo a possibilidade de cobertura no caso de não haver substituto terapêutico, dentro de certas condições.

Cobertura fora do rol da ANS deve ser analisada caso a caso

Pouco depois daquele julgamento, segundo o ministro, a Lei 14.454/2022, ao alterar a Lei dos Planos de Saúde para dispor sobre a possibilidade de cobertura de tratamentos não contemplados no rol da ANS, definiu que essa lista constitui apenas uma referência básica para os planos.

“Nesse cenário, conclui-se que tanto a jurisprudência do STJ quanto a nova redação da Lei dos Planos de Saúde admitem a cobertura, de forma excepcional, de procedimentos ou medicamentos não previstos no rol da ANS, desde que amparada em critérios técnicos, cuja necessidade deve ser analisada caso a caso”, concluiu Raul Araújo ao negar provimento ao recurso da operadora.

Fonte: STJ

Barroso é quarto ministro a votar contra marco temporal no STF

O ministro Luís Roberto Barroso (ao centro), do Supremo Tribunal Federal (STF), ampliou o placar contra o marco temporal para demarcação de terras indígenas. Na sessão desta tarde, Barroso proferiu o quarto voto contra o marco. Com o posicionamento do ministro, o placar do julgamento está em 4 votos a 2 contra a tese.

Após o voto de Barroso, o julgamento foi suspenso e será retomado na quarta-feira (6). 

Notícias relacionadas:

Em seu voto, Barroso citou o julgamento que garantiu a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, e afirmou que a Constituição protege o direito dos indígenas a sua identidade cultural e assegura direito à terra.

“Não existe marco temporal fixo e inexorável, e a ocupação tradicional também pode ser demonstrada pela persistência na reivindicação de permanência na área”, afirmou.

Votos

Até o momento, além de Barroso, os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin se manifestaram contra o marco temporal. Nunes Marques e André Mendonça se manifestaram a favor.

Moraes e Zanin votaram contra o limite temporal, mas estabeleceram a possibilidade de indenização a particulares que adquiriram terras de “boa-fé”. Pelo entendimento, a indenização por benfeitorias e pela terra nua valeria para proprietários que receberam do governo títulos de terras que deveriam ser consideradas como áreas indígenas.

Críticas

A indenização aos proprietários por parte do governo é criticada pelo movimento indigenista. Para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a possibilidade é “desastrosa” e pode inviabilizar as demarcações.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirma que a possibilidade de indenização ou compensação de território vai aumentar os conflitos no campo.

Brasília (DF) - 31/08/2023, Manifestação de Indígenas contra o Marco Temporal na praça dos Três Poderes.  
Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
Brasília (DF) - 31/08/2023, Manifestação de Indígenas contra o Marco Temporal na praça dos Três Poderes.  
Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
Manifestação de Indígenas contra o marco temporal na Praça dos Três Poderes – Joédson Alves/Agência Brasil

Entenda

No julgamento, os ministros discutem o chamado marco temporal. Pela tese, defendida por proprietários de terras, os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época. Os indígenas são contra o entendimento.

O processo que motivou a discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena (TI) Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da terra é questionada pela procuradoria do estado.

Fonte: Agência brasil

Limite da aplicação do art. 467 da CLT: do crédito trabalhista na recuperação judicial

Dentre os inúmeros problemas enfrentados na busca da correta aplicação da legislação recuperacional e falimentar está a indispensável necessidade de equilíbrio entre as normas trabalhistas e de insolvência que deverão ser interpretadas de forma concomitante e harmônica.

Dúvida não há de que a Justiça do Trabalho compete processar e julgar os conflitos trabalhistas. No entanto, também não há dúvida de que a satisfação do crédito deve ocorrer em conformidade com a legislação recuperacional ou falimentar.

A questão que mais gera, no nosso entender, problemas nessa equação está na necessidade de muitas vezes a legislação trabalhista ou os limites da competência da Justiça do Trabalho terem de dar espaço a aplicação da normas recuperacionais e falimentares em nome de um princípio inafastável que é a igualdade de credores.

Dentre esses pontos de conflito, temos o limite da aplicação do artigo 467 do Consolidação das Leis do Trabalho.

O artigo 467 da CLT dispõe que “em caso de rescisão do contrato de trabalho havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescida de cinquenta por cento”.

A intenção da norma é absolutamente clara no sentido de fixar uma multa para o caso de não cumprimento de obrigações incontroversas no prazo legal, servindo, portanto, de meio legítimo de coerção para que a empregadora, a despeito da existência de verbas controvertidas, não utilize escusa para postergar o pagamento daquilo que confessadamente é devido. Por essa razão tem valor elevado e, salvo melhor juízo, caráter moratório

No caso da recuperação judicial, no entanto, a questão ganha contornos mais complexos.

De fato, as normas extravagantes quando se encontram em aparente conflito devem ser interpretadas de forma a que coexistam harmonicamente.

Dessa forma, a despeito da norma trabalhista prever que o pagamento das verbas incontroversas deve ser efetuado na primeira audiência sob pena de sofrerem um acréscimo de cinquenta por cento, caso a empresa esteja em recuperação judicial, a questão deve ser analisada sob o prisma da coletividade de credores, sendo indispensável responder a seguinte pergunta: em conformidade com a lei recuperacional o pagamento pode ser feito?  E a partir dessa indagação, as normas devem ser equacionadas.

Com efeito é natural que a empresa em crise dispense funcionários como forma de reduzir suas despesas. Por razões estratégicas essas dispensas muitas vezes ocorrem antes do pedido de recuperação e não depois que é formulado. A razão é muito simples e decorre do próprio texto da lei: as dispensas anteriores ao pedido de recuperação judicial tornam o crédito trabalhista concursal e o contrário não.

A partir dessa simples diferença, a primeira conclusão que se pode chegar é que, caso o empregado seja dispensado após o pedido de recuperação judicial, o crédito é extraconcursal e, portanto, não pode o pedido de recuperação servir de anteparo ao não pagamento das verbas trabalhistas devidas. Ou seja, se não o fizer na primeira audiência, o artigo 467 da CLT deve ser aplicado em sua plenitude.

O problema está na rescisão do contrato de trabalho anterior ao pedido de recuperação judicial.

Nesse caso, salvo melhor juízo, nos deparamos com duas situações que, embora tenham como elemento comum a dispensa anterior a recuperação judicial, possuem solução diametralmente oposta.

Com efeito, não recebendo as verbas que entende devidas, ao trabalhador não resta alternativa a não ser o ingresso perante a Justiça Laboral. Ocorre que, em razão do procedimento previsto pela lei extravagante, deve ser designada a audiência inicial.

Se essa audiência ocorre antes do pedido de recuperação judicial não existe óbice ao pagamento, sendo irrelevante alegação de que a empresa estaria em crise e que não teria condições de fazê-lo. Tal argumento não afasta o inadimplemento, razão pela qual a multa deverá incidir e, no momento em que empresa ingressar com o pedido de recuperação judicial, o crédito trabalhista acrescido da multa serão considerados concursais.

Todavia, se a empresa ingressar com pedido de recuperação judicial antes da audiência, quando esta se realizar, a recuperanda não mais poderá efetuar o pagamento porque o mesmo deve ocorrer em conformidade com o plano de recuperação judicial a ser oportunamente aprovado e, caso este venha ser rejeitado e decretada a falência, o pagamento deve ocorrer em conformidade com a lei falimentar.

Ou seja, nesta última hipótese existe um óbice legalmente previsto para o pagamento não podendo, portanto, a empresa em recuperação ser considerada em mora, não sendo, portanto, devido o valor da multa.

Aliás, caso a empresa venha a efetuar o pagamento estaríamos diante de uma hipótese de rompimento do concurso de credores com consequências graves, dentre as quais, em tese, o crime tipificado no artigo 172 da lei recuperacional e consequentemente a possibilidade de ser inclusive afastado o administrador da recuperanda em consonância com o artigo 64 da mesma lei.

Por essas razões, nessa hipótese deve a Justiça Laboral afastar a incidência da multa. Aliás, nesse sentido é a Súmula 388 do TST (Tribunal Superior do Trabalho) que, embora seja direcionada a massa falida, na hipótese aqui tratada se aplica, pois, a situação fática é absolutamente igual: a impossibilidade legal do pagamento ocorrer naquele momento. Na falência, deve ocorrer a partir da formação do quadro de credores e nos limites da força da massa; na recuperação, em conformidade com o plano de recuperação judicial.

O problema final que surge é o seguinte: e se a Justiça do Trabalho entender de forma contrária ao exposto e condenar a empresa em recuperação judicial a multa.

Nesse caso, a menos que a empresa consiga reverter a condenação perante as instâncias superiores da JT, o valor será devido, pois a fixação do crédito trabalhista compete a esta, cabendo ao Juízo Recuperacional somente a fixação de eventual marco temporal de juros e correção e forma como se dará a satisfação do crédito.

Em outras palavras, embora se trate de norma recuperacional cabe a Justiça do Trabalho a sua correta aplicação em respeito ao princípio da igualdade de credores, não podendo o juízo recuperacional atuar no sentido da eventual correção.

Fonte: Conjur

Embargos de declaração interrompem apenas prazo de recurso, não de outros meios de defesa ou impugnação

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os embargos de declaração interrompem o prazo apenas para a interposição de recursos, não sendo permitido conferir interpretação extensiva ao artigo 1.026 do Código de Processo Civil de 2015 para estender o significado de recurso para as demais defesas previstas no processo de execução.

O entendimento foi estabelecido ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que, interpretando o artigo 1.026 do CPC, considerou que os embargos de declaração interrompem o prazo para interposição de qualquer defesa do devedor, incluindo a impugnação ao cumprimento de sentença.

No entendimento do TJPR, o sentido da atribuição de efeito interruptivo de prazos aos embargos de declaração é o de não causar prejuízo à parte que os opõe. Assim, segundo o tribunal, a oposição dos embargos contra decisão que intimou o devedor para pagar voluntariamente a dívida ou impugnar a execução interrompeu o prazo para exercício dessas faculdades – mesmo porque, para a corte estadual, a depender do que fosse decidido sobre os embargos, o conteúdo da decisão anterior poderia ficar sem efeito.

Como consequência desse posicionamento, o TJPR deu provimento a agravo de instrumento do executado para, revertendo decisão de primeiro grau, reconhecer a tempestividade de impugnação ao cumprimento de sentença.

Interpretação extensiva do artigo 1.026 do CPC viola competência do Legislativo

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso da parte exequente, apontou que o TJPR, apesar de fundamentar a sua decisão em interpretação teleológica do CPC, na realidade, realizou interpretação extensiva do artigo 1.026 da lei processual, a fim de expandir o significado de recurso e abarcar no dispositivo qualquer defesa ajuizada pela parte executada.

Entretanto, para o ministro, não é possível interpretar extensivamente o artigo 1.026 do CPC, sob pena de usurpação das competências do Poder Legislativo, tendo em vista que a expressão “recurso” não permite a extração válida do sentido mais amplo de “defesa ajuizada pelo devedor”.

Antonio Carlos Ferreira também lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, o rol de recursos trazido pelo artigo 994 do CPC/2015 é taxativo.

“Assim, por serem taxativas as hipóteses legais de recurso, não é possível atribuir interpretação extensiva ao texto normativo. Desse modo, confere-se previsibilidade e coerência na aplicação da lei, em observância à segurança jurídica que deve permear a hermenêutica das normas processuais”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso e julgar intempestiva a impugnação ao cumprimento de sentença.

Leia o acórdão no REsp 1.822.287.

Fonte: STJ

Abuso do direito de ação: o reconhecimento de limites no acesso à Justiça

O abuso do direito de ação é o uso exagerado ou desvirtuado desse direito, com o objetivo de atrasar ou impedir o andamento de processos, ou de obter alguma vantagem ilegítima.

O amplo acesso à Justiça é um direito fundamental cristalizado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Mas, como qualquer outro direito, o acesso à Justiça também encontra as suas limitações no ordenamento jurídico e deve ser exercido com responsabilidade.

O abuso do direito de ação é caracterizado pela utilização exagerada ou desvirtuada desse direito, com o objetivo de prolongar, atrasar ou impedir o andamento de processos. Há ainda os que ajuízam ações com conflitos forjados ou fictícios, pretendendo obter alguma vantagem de forma ilegítima.

O STJ já analisou diversos casos sobre abuso do direito de ação e definiu as possibilidades de reconhecimento dessa situação excepcional ao amplo acesso à Justiça, inclusive do chamado assédio processual.

Ajuizamento de sucessivas ações pode configurar assédio

Entrar na Justiça com sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa e levar ao reconhecimento do assédio processual. O entendimento foi adotado pela Terceira Turma, por maioria, ao dar parcial provimento ao REsp 1.817.845.

Duas famílias disputavam uma área de mais de 1.500 hectares de uma fazenda. Foram propostas diversas ações – entre elas, uma ação divisória, em 1988 – e interpostos diferentes tipos de recursos. Em 1995, foi proferida a sentença na primeira fase da ação divisória, em que se determinou a divisão do imóvel entre as famílias.

Às vésperas da restituição da área que cabia aos autores da ação divisória, a outra família ajuizou sucessivamente, entre setembro e novembro de 2011, uma série de novas ações, todas sem qualquer fundamento relevante, manejadas quando já estava consolidada, há mais de 16 anos, a propriedade da outra parte.

No voto que prevaleceu no julgamento, a ministra Nancy Andrighi apontou que tal atitude configurou abuso de direito, uma vez que, conforme o artigo 187 do Código Civil, comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 

“O abuso do direito fundamental de acesso à Justiça em que incorreram os recorridos não se materializou em cada um dos atos processuais individualmente considerados, mas, ao revés, concretizou-se em uma série de atos concertados, em sucessivas pretensões desprovidas de fundamentação e em quase uma dezena de demandas frívolas e temerárias, razão pela qual é o conjunto dessa obra verdadeiramente mal-acabada que configura o dever de indenizar”, concluiu.

Reiteração de medidas processuais descabidas autoriza trânsito em julgado

Com apoio em precedentes, em 2021, a Primeira Seção determinou a certificação imediata do trânsito em julgado na Rcl 41.549, por reconhecer abuso do direito de ação na insistência da parte em apresentar medidas descabidas. 

No caso, uma mulher ajuizou ação buscando receber a pensão especial deixada por ex-combatente, sob o argumento de que esta poderia ser requerida a qualquer tempo, não sendo aplicável a prescrição de fundo de direito. Com o objetivo de reverter o acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que negou sua pretensão, a mulher impetrou vários recursos e outras medidas no STJ – entre eles, agravo em recurso especial, ação rescisória, reclamação, agravo interno e pedido de reconsideração.

Após a Primeira Seção do STJ indeferir liminarmente a ação rescisória, a parte entrou com reclamação, sustentando que o colegiado teria usurpado a competência do próprio tribunal. Em decisão monocrática, o relator, ministro Og Fernandes, afirmou que não cabe reclamação dirigida ao STJ contra acórdão proferido por um de seus órgãos jurisdicionais.

“Não faz sentido reconhecer que a Primeira Seção do STJ tenha usurpado sua própria competência para julgamento da ação rescisória”, declarou o ministro ao considerar que a reclamação foi usada como sucedâneo de recurso, “o que é inadmissível”.

Não satisfeita, a parte recorreu com agravo interno. A seção negou provimento ao recurso e, em razão da insistência na utilização de um instrumento processual manifestamente descabido, aplicou a multa prevista no artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil (CPC), fixada em 1% sobre o valor atualizado da causa.

A parte, então, apresentou pedido de reconsideração, alegando não ter condições de pagar a multa processual e insistindo na procedência da reclamação. No entanto, não há previsão legal ou regimental desse tipo de pedido em relação a decisão colegiada. “A reiteração de medida judicial manifestamente descabida caracteriza abuso do direito de ação e autoriza a certificação imediata do trânsito em julgado da demanda”, decidiu Og Fernandes, que foi acompanhado de forma unânime pela seção.

Reconhecimento do abuso de direito de ação é medida excepcional

No julgamento do REsp 1.770.890, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma reafirmou a jurisprudência segundo a qual o reconhecimento de abuso do direito de ação é excepcional, por estar intimamente atrelado ao acesso à Justiça, devendo ser analisado com prudência pelo julgador e declarado apenas quando o desvirtuamento do exercício desse direito for amplamente demonstrado.

O colegiado afastou a condenação por danos morais de três ex-vereadores do município Rio do Sul (SC) em razão de ação popular ajuizada por eles para impugnar a venda de um imóvel pela prefeitura. Os ex-vereadores haviam sido condenados nas instâncias ordinárias porque teriam utilizado a ação popular para fins políticos, mas o STJ concluiu que não foram demonstrados nem o abuso do direito de ação nem o dano moral indenizável.

De acordo com o relator, a análise da configuração do abuso deve ser ainda mais minuciosa quando se tratar da utilização de uma ação constitucional, como é o caso da ação popular, voltada para a tutela de direitos coletivos e um importante instrumento para a efetivação da democracia participativa, pois possibilita a interferência do cidadão na gestão da coisa pública.

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, mesmo sendo válida a preocupação do julgador com um eventual uso político da ação popular – o que significaria desvirtuamento do instituto –, essa análise deve se pautar pela prudência, “de modo a não coibir o seu uso diante de possíveis lesões ao patrimônio público e à moralidade pública”.

Mandados de injunção idênticos com diferentes pessoas no polo ativo

Para a Corte Especial, a impetração de vários mandados de injunção, com diferentes indivíduos no polo ativo, não caracteriza assédio processual. O colegiado entendeu que, em tal situação, a parte impetrante não deve ser condenada ao pagamento de indenização ou multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação, pois a Constituição Federal autoriza a impetração de mandado de injunção sempre que a pessoa considerar que a demora do Estado em editar norma jurídica a impede de exercer direito assegurado constitucionalmente. 

No caso dos autos, um militar entrou com o pedido de mandado de injunção contra o comandante da Aeronáutica, alegando omissão dessa autoridade na edição de norma para disciplinar o direito de promoção do Quadro Especial de Sargentos.

Durante o trâmite do MI 345 no STJ, a União sustentou a ocorrência de assédio processual, que estaria caracterizado pela impetração de diversos mandados de injunção desprovidos de fundamentação idônea e intentados sem nenhum interesse legítimo a ser tutelado. Por isso, pediu que fosse fixada indenização ou multa contra o impetrante, por abuso de direito processual e litigância de má-fé.

Ao proferir sua decisão, o ministro Raul Araújo, relator, observou que o simples fato de o litigante utilizar ação ou recurso previsto em lei ou – como no caso – na própria Constituição não significa litigância de má-fé.

“O fato de terem sido impetrados vários mandados de injunção idênticos, cada qual com um indivíduo no polo ativo, não caracteriza, por si só, a litigância de má-fé. Julgando embargos de declaração similares aos dos presentes autos, a Corte Especial já teve a oportunidade de se manifestar, concluindo pela não configuração da litigância de má-fé e do assédio processual”, afirmou.

No AREsp 952.308, de forma semelhante, a Quarta Turma considerou indevida a aplicação de multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação contra a pessoa que utiliza legitimamente um recurso previsto na legislação processual civil com o objetivo de esgotar a instância ordinária e possibilitar a interposição do recurso especial ao STJ.

Nesse caso, foi ajuizada contra um banco ação declaratória de inexigibilidade de dívida, cumulada com pedido de indenização por danos morais. A instituição financeira foi condenada à reparação dos danos pela inscrição indevida do nome do autor em órgãos de restrição de crédito. Em embargos de declaração, o consumidor requereu o aumento da indenização, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), além de rejeitar o pedido, puniu o embargante com multas, dada a sua insistência em argumentos já rejeitados.

O relator, ministro Raul Araújo, ressaltou que, como a interposição de agravo interno configura legítimo exercício das garantias do devido processo legal, deve-se afastar não apenas a multa do artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, mas também a sanção por litigância de má-fé, pois ambas foram fundadas no mesmo fato (interposição do recurso).

Inversão automática do ônus da prova pode facilitar abuso do direito de ação

Ao julgar o REsp 1.866.232, a Terceira Turma entendeu que a inversão do ônus probatório a respeito da veracidade e da correção da informação publicitária, prevista no artigo 38 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), não se aplica a demandas que discutem concorrência desleal.

Nesse processo, a rede de lanchonetes Burger King buscava fazer com que o restaurante Madero Steak House, seu concorrente, parasse de veicular propaganda supostamente enganosa com a frase “o melhor hambúrguer do mundo”. A Burger King alegou que deveria haver inversão do ônus da prova, ficando seu concorrente responsável pelo custeio da produção da perícia, pois, embora não houvesse relação de consumo entre as partes, a aplicação do artigo 38 do CDC era necessária para proteger o consumidor de práticas abusivas e desleais.

O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), afirmou que a norma do CDC não poderia ser aplicada nas relações entre empresas concorrentes, pois poderia facilitar o abuso do direito de ação, incentivando estratégias anticoncorrenciais, uma vez que, a partir do ajuizamento de demanda fútil, o ônus da prova estaria direta e automaticamente imposto ao concorrente com menor porte econômico.

Em tal hipótese, comentou o ministro, o processo estaria sendo utilizado não para obter um provimento jurisdicional, mas, sim, “como meio de dificultar a atividade do concorrente ou mesmo de barrar a entrada de novos competidores no mercado”.

Fonte: STJ

CJF Apresenta Sistema Integrado ao Observatório da Justiça Federal

O Duto.JF foi desenvolvido para tornar mais prático e seguro o compartilhamento das informações

Imagem gerada por IA

A Secretaria de Estratégia e Governança do Conselho da Justiça Federal (SEG/CJF) lançou um novo sistema integrado ao Observatório da Estratégia da Justiça Federal. O Duto.JF foi desenvolvido pela Subsecretaria de Inteligência Analítica (SUIAN) para permitir a centralização do envio das planilhas e dos arquivos de dados das unidades da Justiça Federal de maneira mais rápida, direta e segura. 

O objetivo do Duto.JF é facilitar e otimizar a alimentação da Arquitetura de Analytics da Justiça Federal (datalake), por meio de uma interface intuitiva e amigável para os usuários. A solução permite ainda o acompanhamento em tempo real do envio, e fornece um feedback instantâneo sobre a recepção e processamento dos materiais. 

O novo sistema possui uma conectividade direta com o datalake do CJF e possibilita uma visão unificada dos dados entre as unidades, impulsionando análises mais precisas. O software também possui um protocolo de segurança atualizado, que reduz o risco de perda das informações e garante a integridade e confidencialidade dos dados. 

Utilização 

De acordo com o subsecretário de Inteligência Analítica da SEG/CJF, Alex Tosta, o Duto.JF substitui os métodos tradicionais de envio, como e-mail e FTP, eliminando barreiras técnicas e agilizando processos. 

“O sistema já está recebendo planilhas com as informações referentes à força de trabalho de magistrados e servidores dos Tribunais Regionais Federais (TRFs), ajudando a subsidiar a tomada de decisões da Secretaria de Gestão de Pessoas do CJF, e logo será utilizado pelas outras áreas para diversos propósitos”, afirmou o servidor.

Para conferir a novidade é necessário logar com usuário e senha na página do Observatório. Aqueles que ainda recebem dados por e-mail ou FTP e estejam interessados em migrar para o Duto.JF podem entrar em contato com a SUIAN pelo e-mail: SUIAN@cjf.jus.br.

Fonte: Conselho de Justiça Federal – CJF